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Sinopse:

Cuidado, leitor, este livro requer coragem. Parece ser o desafio lançado por
Clarice Lispector no prefácio “Explicação” de A via crucis do corpo, livro de 1974.
Nele, a autora simula uma Clarice diferente da que os leitores estavam
acostumados desde sua primeira obra, Perto do coração selvagem, de 1944. No
entanto, ela é a mesma de sempre, a que nunca se recusou a fitar com os olhos
abertos a selvageria do desejo humano, da avidez humana, da sordidez humana.
O que se modificou foi o espanto se convertendo em escândalo, o sobressalto em
ferocidade. Neste livro, Clarice está próxima à literatura maldita ou, como quer
Georges Bataille, próxima à literatura do mal. Afrontando os limites morais, a
autora adverte: “Fiquei chocada com a realidade. Se há indecências nas histórias
a culpa não é minha.” O deslocamento da noção de indecência para o âmbito total
da realidade cria um estado de perplexidade no leitor que poderá levá-lo a
exclamar como a própria narradora de um dos contos: “A vida era isso, então?
essa falta de vergonha?” São 14 textos ficcionais – 13 contos mais o prefácio
“Explicação” – compondo para o leitor um panorama de vicissitudes do corpo – o
grande personagem destas histórias. O corpo nos seus desarranjos pulsionais, na
tirania de seus desejos, nas suas fraturas e feridas, nos seus êxtases. O corpo
como bênção e maldição. Como tudo que excede, o que sobra, mas que não
chega nunca a suprir a falta primordial. Enigmático e severo, óbvio e exultante.
Além do ousado tratamento temático da paixão do corpo (paixão entendida
etimologicamente como pathos), o estilo de Clarice está mais depurado e enxuto
neste pequeno livro. À primeira vista, se poderia pensar no estilo realista. Não se
engane, todavia, leitor: nada é tão simples nem tão evidente quanto parece. O
realismo destas histórias encontra-se sob forte pressão e o efeito é sempre
desconcertante, tal como no detalhe final do fecho narrativo do conto “Melhor do
que arder”:
“Tiveram quatro filhos, todos homens, todos cabeludos.”
Aceite o desafio e enfrente o desconcerto, caro leitor. A literatura de Clarice tem
força.
— ANA CRISTINA CHIARA, Profª. Adjunta de Literatura Brasileira na UFRJ

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https://livrariapublica.com.br/livros/a-via-crucis-do-corpo-clarice-lispector/

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