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FACULDADE ÚNICA

DE IPATINGA

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Suelen Martins
Doutora em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em
Estudos de Linguagem pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais,
Especialista em Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e
graduada em Letras Português/Inglês e suas respectivas literaturas pelo Centro Universitário
de Belo Horizonte. Dedica-se ao estudo da divulgação científica em matérias jornalísticas
brasileiras e norte-americanas a partir dos aspectos que constituem essa prática textual,
principalmente, no que tange à perspectiva das metáforas cognitivas utilizadas para
esclarecer conhecimentos.

Natasha Ribeiro de Oliveira


Mestre e doutoranda em Linguística e Língua Portuguesa pela Faculdade de Ciências e
Letras de Araraquara. Possui graduação em Letras, com habilitação em Português e
Francês pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis. Desenvolve, atualmente, estudo
com referencial teórico-metodológico do Círculo de Bakhtin, com o apoio da CAPES,
intitulado "Arte, mídia e política: uma análise bakhtiniana de "bolsominions" e "petralhas".
Desenvolveu, em nível de mestrado e iniciação científica, pesquisas na mesma área da
análise do discurso, com ênfase na verbivocovisualidade da linguagem. Membro-
pesquisadora e secretariado GED - Grupo de Estudos Discursivos.

PRÁTICA PEDAGÓGICA INTERDISCIPLINAR:


LINGUÍSTICA GERAL

1ª edição
Ipatinga – MG
2022

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FACULDADE ÚNICA EDITORIAL

Diretor Geral: Valdir Henrique Valério


Diretor Executivo: William José Ferreira
Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos
Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira
Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa
Revisão/Diagramação/Estruturação: Bárbara Carla Amorim O. Silva
Bruna Luiza Mendes Leite
Carla Jordânia G. de Souza
Guilherme Prado Salles
Fernanda Cristine Barbosa
Design: Brayan Lazarino Santos
Élen Cristina Teixeira Oliveira
Maria Eliza Perboyre Campos
Taisser Gustavo de Soares Duarte

© 2021, Faculdade Única.

Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autorização
escrita do Editor.

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NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA


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Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300
www.faculdadeunica.com.br

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Menu de Ícones
Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo
aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos. Eles
são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um
com uma função específica, mostradas a seguir:

São sugestões de links para vídeos, documentos


científicos (artigos, monografias, dissertações e teses),
sites ou links das Bibliotecas Virtuais (Minha Biblioteca e
Biblioteca Pearson) relacionados com o conteúdo
abordado.
Trata-se dos conceitos, definições ou afirmações
importantes nas quais você deve ter um maior grau de
atenção!

São exercícios de fixação do conteúdo abordado em


cada unidade do livro.

São para o esclarecimento do significado de


determinados termos/palavras mostradas ao longo do
livro.
Este espaço é destinado para a reflexão sobre
questões citadas em cada unidade, associando-o a
suas ações, seja no ambiente profissional ou em seu
cotidiano.

4
INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA UNIDADE
APLICADA

01
Neste capítulo, conceitua-se a linguística aplicada (LA) como uma área que
se ocupa de investigar a linguagem como prática social contextualizada. A seguir,
é mostrado o percurso histórico da linguística aplicada desde o seu primeiro curso
em 1946 até a contemporaneidade. Por fim, são apresentadas as noções de
linguagem e de gramática à luz da linguística aplicada.

1.1 LINGUÍSTICA APLICADA: DEFINIÇÕES

De acordo com Battisti e Silva (2017), a linguística aplicada se destina à


investigação da linguagem em uso, ou melhor, trata-se do estudo da linguagem em
diferentes contextos sócio-históricos e com diferentes objetivos comunicativos. Sendo
assim, pensar nessa linguística é conceber o apagamento das fronteiras entre teoria
e prática, perspectiva presente na linguística tradicional. A ideia de língua enquanto
sistema, cunhado por Sausurre (1916), por exemplo, cai por terra para dar espaço à
língua em sua manifestação discursiva.

As pesquisas realizadas pela linguística aplicada, de maneira geral, são


voltadas à compreensão dos mecanismos de ensino e de aprendizagem da língua
(materna ou estrangeira). O linguista aplicado, como é chamado o pesquisador
dessa área, pode se interessar, por exemplo, pelo estudo da interferência da

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oralidade na produção de textos escritos em situações mais formais da língua (como,
por exemplo, crônicas, relatos científicos, editoriais) por alunos do 9.º ano do Ensino
Fundamental II. Ao analisar os textos escritos por esses alunos, esse pesquisador pode
encontrar algumas marcas de oralidade, tais como gírias, abreviaturas, expressões
de menos prestígio e desvios de norma em um gênero de texto escrito, como uma
carta do leitor. As pesquisas em linguística aplicada, de praxe, tentam propor
sugestões para “solucionar” as problemáticas envolvendo o uso social da língua.

Figura 1: Produção textual com interferência de oralidade

Fonte: Ferreira e Moreira (2014)

O texto acima consta no artigo A influência do texto oral nas produções


escritas dos alunos, de Ferreira e Moreira (2014), sobre as dificuldades enfrentadas por
alunos, advindos das séries iniciais, em identificar o que é relativo à modalidade
escrita da língua e o que é relativo à modalidade oral. O trabalho foi desenvolvido
com os alunos do 6.º ano do Ensino Fundamental II, do Colégio Estadual Padre José
de Anchieta de Apucarana (Paraná), em duas etapas: 32 horas/aula para
planejamento, organização e apresentação do projeto para a equipe pedagógica
e 32 horas/aula para a implementação das atividades pedagógicas. As aulas foram
divididas em unidades: 1) gênero textual “música”; 2) gênero textual “bilhete”; 3)
gênero “mensagem de texto por celular”; 4) gênero “causos”, 5) gênero “publicação
na internet (blog)”. As atividades foram desenvolvidas com 30 alunos.
Como é possível verificar, o autor do texto apresentado na figura 1, um aluno
do 6.º ano do Ensino Fundamental II, apresenta desvios de norma (fala, disgraça,
mudo, goisa, vouto e busca) que encontram respaldo na modalidade oral. É
importante ressaltar que o gênero textual “causo” é um bom mote para se trabalhar
retextualização da modalidade oral para a escrita. A análise dos textos e dos

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fenômenos relativos à dificuldade de transposição de uma modalidade a outra assim
como a proposta de um projeto de intervenção para auxiliar os alunos com
dificuldades perfila o trabalho desenvolvido pela linguística aplicada.
Apesar de a grande concentração dos trabalhos realizados em linguística
aplicada ser voltada para as questões de ensino e de aprendizagem,
contemporaneamente, essa área tem se mostrado cada vez mais interdisciplinar.
Segundo Moita Lopes (2009, p.18), a linguística aplicada “ao espraiar para outros
contextos, aumenta consideravelmente seus tópicos de investigação, assim como o
apelo de natureza interdisciplinar para teorizá-los”. Dessa forma, a linguagem tem
sido analisada a partir do prisma da filosofia, da sociologia e da psicologia, a saber.
Ao longo do livro, essa vertente interdisciplinar da LA é delimitada com afinco e com
detalhes.

1.2 PERCURSO HISTÓRICO DA LINGUÍSTICA APLICADA

Dentro de uma perspectiva histórica, os estudos envolvendo a linguística


aplicada podem ser considerados recentes. Esse campo de estudo tem a sua origem
nos estudos mirados no ensino e na aprendizagem de língua estrangeira. O primeiro
curso de LA data da década de 1940 (precisamente em 1946) e aconteceu na
Universidade de Michigan onde lecionavam Charles Fries e Robert Lado. A
motivação para o início do curso veio com a publicação, consoante Battisti e Silva
(2017), da revista Language Learning: a Journal of Applied Linguistics pela
Universidade de Michigan.

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Figura 2: Charles Fries

Fonte: https://bit.ly/3qcq6CN. Acesso em: 20 jan. 2022.

Figura 3: Robert Lado

Fonte: https://bit.ly/3q9DM1B. Acesso em: 20 jan. 2022.

Segundo Menezes, Silva e Gomes (2009, p. 28), “nos anos 50, a LA se


institucionaliza com a fundação, em 1956, da University of Edinburgh School of
Applied Linguistics, uma iniciativa do Conselho Britânico, e do Center of Applied
Linguistics, em 1957, com o apoio da Fundação Ford, em Washington”. O foco de
estudos do Centro de Linguística Aplicada é o letramento enquanto a Universidade
de Edinburgh concentra seus interesses no uso da linguagem na conversa cotidiana,
em contextos médicos, em variação linguística e diversidade social. Apesar dessas
iniciativas, na década de 1950, o estudo da LA ainda era fortemente influenciado
pela linguística funcional e estrutural.
Na década de 1960, a inauguração da Associação Internacional de
Linguística Aplicada, na França, representou um marco importante para a área, uma
vez que essa associação abriu possibilidades de estudos sobre multilinguismo,
bilinguismo, políticas linguísticas, sociolinguística e letramento. Segundo Battisti e Silva

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(2017), foi nessa época que os primeiros congressos em linguística aplicada surgiram.
Em 1965, no Rio de Janeiro, entre os dias 12 e 23 de julho, houve o 1º Seminário
Brasileiro de Linguística, uma iniciativa do Instituto de Idiomas Yázigi. Um dos
destaques desse seminário foi o curso ministrado por Francisco Gomes de Mattos e
intitulado Orientação de Linguística Aplicada.
A linguística aplicada ganhou destaque no mundo a partir da segunda
metade do século passado. Na década de 1970, os linguistas dessa área
questionaram, a título de ilustração, a aplicação das teorias linguísticas sem a devida
preocupação com os sujeitos aprendizes de uma língua estrangeira. Nesse caso, o
indivíduo, usuário da língua ou aquele que a fazia funcionar no mundo real, deveria
ser também objeto de estudo. Há, para Menezes, Silva e Gomes (2009), alguns
marcos da expansão da LA a partir da década de 1970. O primeiro deles foi a
abertura, em 1970, do Programa de Linguística Aplicada ao Ensino de Línguas da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O segundo é a criação do
Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL)
em 1980 e do Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada na Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP).
A partir da década de 1980, a linguística aplicada que, até então era
associada às discussões sobre o ensino e a aprendizagem de línguas, amplia o seu
escopo de debate e começa a ter contornos interdisciplinares. Emergem, assim,
pesquisas focando nas temáticas do bilinguismo, da análise do discurso, da
tradução, dentre outras, como mostra os artigos publicados no periódico Applied
Linguistics de 1980. Essa revista tinha o propósito de incentivar o diálogo entre
diferentes campos e diversas teorias que envolvem a linguagem, problematizar a
linguagem em seu uso no mundo real além de mostrar diversos métodos de pesquisa.
A autonomia da linguística aplicada no Brasil veio na década de 1990 com a
fundação da Associação de linguística aplicada no Brasil (ALAB) que se deteve a
compreender as questões sociais relacionadas à linguagem. Com a LA ganhando
força no cenário brasileiro, muitos congressos, revistas e programas de pós-
graduação surgiram.
De acordo com Menezes, Silva e Gomes (2009), se os programas de pós-
graduação se destacaram entre os anos 80 e 90, somente em 2004 houve o
reconhecimento sobre a necessidade de contratação do profissional da LA para um
curso de graduação. A Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais

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(UFMG) foi a pioneira na abertura de concurso público para esse fim. Em 2007, essa
mesma instituição propôs duas áreas para a linguística aplicada: 1) LA e ensino de
línguas estrangeiras e 2) LA e tradução.
Atualmente, a pesquisa em linguística aplicada apresenta estudos em
potencial, voltados para diferentes áreas como análise do discurso, aquisição de
segunda língua, letramento, fluência e precisão, psicologia educacional e
educação linguística. A tendência é que a linguística aplicada se diversifique em
temáticas. Uma área que vem crescendo, em LA, é a relacionada à observação da
aprendizagem de línguas mediada pelo computador. Nesse tipo de pesquisa, o
computador é uma ferramenta, um médium, para que a aprendizagem ocorra; isso
significa que ele seja apontado como mais importante (ou menos importante) do que
as figuras do professor e do aluno. Leffa (2006) afirma que essa pesquisa é,
certamente, a mais interdisciplinar daquelas que compõem o hall de estudos em LA.
Do ponto de vista metodológico, adota-se o estudo de caso (estratégia ampla de
pesquisa científica sobre um fenômeno atual em seu contexto real, no caso, o
impacto do uso de computadores na aprendizagem de língua). Para tanto, o
pesquisador se utiliza de questionários, entrevistas, testes de proficiência, dentre
outros.

1.3 CONCEPÇÕES DE LINGUÍSTICA APLICADA: LINGUAGEM E GRAMÁTICA

A linguística aplicada pode ser definida, de acordo com Menezes, Silva e


Gomes (2009), como a área que pesquisa o ensino e a aprendizagem, que estuda a
aplicação da linguagem e que a analisa como prática social. Para compreender
como os estudos em LA se processam, há de se considerar quais são as concepções

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de linguagem e de gramática pertinentes a esse campo de investigação.
A linguagem pode ser compreendida sob três ópticas: a) linguagem como
espelho do pensamento, b) linguagem como instrumento de interação, c) linguagem
como processo de interação. A primeira concepção prevê que a linguagem tem
caráter monológico e é a materialização do pensamento em forma de palavras. A
concepção de gramática adotada é a normativa ou tradicional. A segunda diz
respeito à preocupação com os elementos de comunicação. A terceira diz respeito
à linguagem como importante instrumento para o processo de interação em uma
situação comunicativa.
Sob o viés da linguística aplicada, a linguagem é definida pelo contexto e
pelos sujeitos envolvidos na interação. Para Mulik (2019), a discussão sobre língua e
linguagem é central para a linguística aplicada, já que a forma como o professor lida
com esses conceitos pode determinar o direcionamento pedagógico adotado por
ele.

A noção de linguagem, para os linguistas aplicados, procede de um olhar pós-


estruturalista. Conforme essa vertente, a linguagem, que não é neutra, está
construída junto à realidade. Para a LA, não se comunicam ideias e valores por meio
da linguagem, mas “criam-se ideias e valores por meio dela” (MULIK, 2019, p.51). A
linguagem, na visão pós-estruturalista, é estruturada, no entanto, não é fixa ou
estável, pois é dinâmica a depender do contexto.
A gramática é comumente associada a uma concepção relativa ao conjunto
de regras que regem o uso de uma língua. Esse conceito é considerado tradicional
ou normativo, quer dizer, tem caráter prescritivo, visto vez que prevê um compilado
de normas que precisam ser seguidas pelos usuários da língua, de modo que eles
escrevam e falem bem.
Há, no entanto, outras duas concepções de gramática que precisam ser
consideradas nos estudos linguísticos como a internalizada e a descritiva. A

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gramática internalizada diz respeito ao conjunto de regras dominadas pelos falantes,
os quais são dotados de uma gramática internalizada. Já a gramática descritiva visa
descrever como a língua ocorre sem, entretanto, como conduz a gramática
normativa, prescrever regras a serem seguidas.

Das gramáticas acima referendadas, a que mais é interessante para a


linguística aplicada é a gramática descritiva, já que esta não dita regras, mas
descreve a língua em uso. A partir da década de 1980, com o avanço da LA, que
prioriza, dentre várias abordagens, a observação das condições de ensino e de
aprendizagem da língua em uso, houve uma mudança de paradigma na produção
das gramáticas que tiveram um caráter escolar/pedagógico. Estes manuais
abordam temas voltados ao uso da língua, tais como variação linguística, linguagem
verbal, não verbal, funções da linguagem, dentre outras.

O professor Ataliba de Castilho, do Departamento de Letras Clássicas e


Vernáculas da FFLCH da Universidade de São Paulo (USP), idealizou, em 1988, o
Projeto Gramática do Português Falado (PGPF), uma iniciativa responsável pela
escrita de uma coletânea de gramáticas de uso. Essas gramáticas descreviam a
estrutura e o funcionamento da língua e, segundo Battisti e Silva (2017),

Diferentemente da gramática tradicional, não há noção de certo e


de errado, é considerado gramatical tudo o que está em
consonância com as regras de funcionamento da língua em qualquer
uma de suas variantes – a noção de certo e de errado é substituída
pela noção da diferença. (BATTISTI e SILVA, 2017, p.22)

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As gramáticas descritivas não são doutrinárias, como as gramáticas normativo-
tradicionais. Pelo contrário, esses manuais se ocupam da descrição e da análise do
português em uso. Se por um lado as gramáticas normativas são excludentes, as
gramáticas descritivas são includentes por abarcarem as diversas manifestações da
língua em uso. Afirma-se, então, que a perspectiva de gramática descritiva rompe
com a tradição das regras impostas pela gramática normativa.
A gramática, para os linguistas aplicados, deve ser trabalhada em uma
perspectiva contextualizada e precisa estar a favor da linguagem em uso e das
necessidades reais dos estudantes. A seguir, são apresentadas algumas gramáticas
descritivas mais conhecidas no mercado editorial brasileiro.

Figura 4: Gramáticas descritivas

Fontes: Perini (1995), Neves (1999) e Castilho e Elias (2010)

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FIXANDO O CONTEÚDO

1. A respeito da consolidação da LA, avalie as afirmativas a seguir.

I. O objeto de estudo da LA é a linguagem em uso.


II. A LA está preocupada com questões reais do uso da língua.
III. A concepção de linguagem que predomina na LA é a estruturalista.
IV. Desenvolver novos métodos de ensino é o único objetivo da LA.
V. A LA é a aplicação da Linguística.

Assinale a alternativa correta.

a) Todas as afirmações são verdadeiras.


b) II e III são verdadeiras.
c) I e II são verdadeiras.
d) I, IV e V são verdadeiras.
e) I, III, IV e V são verdadeiras.

2. (ENADE) Tomando por base o trecho escrito que representa a fala de Nhinhinha:
“Mas, não pode, ué...”, assinale a opção correta a respeito dos processos de
transposição da linguagem oral para a linguagem escrita.

a) As letras do alfabeto do português representam palavras da língua portuguesa.


b) Em língua portuguesa, a relação entre a letra e o som, como [e] no exemplo, é
regular: mantém-se a mesma em qualquer palavra.
c) Por serem usadas em início de frases ou nomes próprios, as letras maiúsculas
correspondem, na fala, a maior impacto e força sonora.
d) Os sinais de pontuação marcam, na escrita, a organização dos fragmentos
linguísticos, que são marcados, na linguagem oral, pela entonação.
e) Os signos do código escrito são mais complexos que os signos do código falado;
por isso, as interjeições, como “ué”, são características de oralidade.

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3. Leia a placa a seguir atentamente.

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3MTY8FM. Acesso em: 23 jan. 2021.

Analise as proposições a seguir e assinale (V) para as alternativas verdadeiras e (F)


para as alternativas falsas.

( ) O autor do texto, devido aos erros ortográficos na placa, parece entender a


escrita como um registro da fala, o que é um equívoco.
( ) O autor, ao confundir fala com escrita, acaba por comprometer o sentido do
texto, obrigatoriamente, produzido pela norma gramatical.
( ) O autor da placa parece ter frequentado a escola durante poucos anos. Além
disso, parece ser falante de uma variedade estigmatizada do português.
( ) O autor, além de apresentar problemas com a produção escrita, também
desconhece as determinações do gênero proposto e não procura organizar as
informações textuais como de costume em um anúncio.

A seguir, marque a alternativa que contém a sequência correta.

a) F-F-F-V.
b) V-V-V-F.
c) F-V-V-F.
d) V-V-V-V.
e) V-F-V-F.

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4. (FUMARC) Leia o texto a seguir.

NÃO E NÃO
Antônio Prata

Assistindo a "Nemo" pela quinquagésima nona vez, meu filho enfia o dedo no nariz. "Não,
filhote, dedo no nariz não pode", digo - e sou tomado por um desconforto. Alguns nãos eu
falo com convicção: não pode mamar às três da manhã, não pode regar o aparelho da
Net, não pode comer bola de gude, por mais que elas insistam em imitar lindas uvas ou
jabuticabas. Essas não são proibições vazias: se meus filhos não tivessem só dois e três anos,
eu lhes explicaria direitinho as razões.
"Não pode mamar às três da manhã, porque se tiver tudo que quiser a hora que bem
entender você vai crescer achando que a vida é um Club Med 'allinclusive' e quando o
mundo começar a te negar todas as mamadeiras que inevitavelmente te negará você vai
ficar deprimidíssima e desorientada e vai terminar viciada em crack, em Negresco com
Nutella ou coisa pior, tipo bingo – então abraça esse coelhinho e vamos dormir bem
gostoso até amanhã, tá?"
"Não pode regar o aparelho da Net, porque ele é elétrico e vai causar um curto circuito e
talvez pegue fogo no prédio e embora eu entenda que você queira regar todos os objetos
à sua volta com o regador da vovó Tuni pra ver se eles crescem ou florescem, melhor se
restringir ao vaso de girassol. (Além do mais, te garanto por experiência própria que os
botões do aparelho da Net não são do tipo que se abrem em flores)." "Não pode comer
bola de gude porque, embora o Homo sapiens seja onívoro, na ampla lista que inclui
alface, boi, ouriço, ovo, alga, cogumelo e gafanhoto, não se encontra o vidro."
Com relação a enfiar o dedo no nariz, contudo... Convenhamos: eu, você, o papa
Francisco e o Wesley Safadão enfiamos, só não saímos por aí, tipo, admitindo aos quatro
ventos num grande jornal de circulação nacional. Para ser coerente eu deveria dizer: "Filho:
dedo no nariz é uma coisa que todo mundo acha nojento nos outros, mas não em si
próprio, de modo que só se faz escondido. Esse é um pacto silencioso da nossa espécie.
Um segredo guardado pelos 7 bilhões de habitantes do planeta."
O problema de tal confissão é que ela me obrigaria a dar um segundo passo. "É o que
chamamos de hipocrisia. Muito do que ensinamos a vocês é isso: hipocrisia. Quando a
gente fala que tem que emprestar as coisas pros outros, por exemplo. Os adultos não agem
assim. Veja: 1 bilhão de adultos têm um monte de coisas e 6 bilhões de adultos não têm
porcaria nenhuma, mas esse 1 bilhão não empresta as coisas pros descoisados nem a pau.
Quando a gente diz que só ganha sobremesa se comer brócolis, por exemplo, é outra
tremenda hipocrisia. Ontem o papai e a mamãe saíram pra jantar e racharam um
cheesecake do tamanho de um jabuti depois de comerem x-salada e batata frita,
bebendo cerveja. Quando a gente diz que tem que falar sempre a verdade, então, é a
maior hipocrisia de todas. A gente mente a torto e a direito. Se todos falassem a verdade
teríamos que admitir, por exemplo, que 1 bilhão de pessoas têm todos os brinquedos e não
deixam os outros 6 bilhões brincarem, que a Gisele Bündchen põe o dedo no nariz ou que
a mamãe do Nemo não está no trabalho, como sempre te digo, ela é devorada por um
tubarão na primeira cena do filme, por isso toda vez nós começamos pelo minuto sete. Um
mundo assim seria impraticável, não?"
"Ei, Dani. Tira esse dedo do nariz. Isso."
Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3qb59rY. Acesso em: 23 jan. 2022.

Há marcas de oralidade, exceto em:

a) "Ei, Dani. Tira esse dedo do nariz. Isso."


b) “[...] então abraça esse coelhinho e vamos dormir bem gostoso até amanhã, tá?"

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c) “Quando a gente fala que tem que emprestar as coisas pros outros, por exemplo.”
d) “Se todos falassem a verdade, teríamos que admitir, por exemplo, que 1 bilhão de
pessoas têm todos os brinquedos [...]”.
e) “esse 1 bilhão não empresta as coisas pros descoisados nem a pau”.

5. Sobre o percurso histórico da linguística aplicada no mundo, assinale a alternativa


correta.

a) A primeira revista de LA foi Language Learning: a Journal of Applied Linguistics.


b) Essa área teve sua origem nos estudos de língua materna.
c) O primeiro curso de LA aconteceu na Universidade de Michigan em 1950.
d) Os estudos em linguística aplicada são considerados antigos (década de 1940).
e) Os pioneiros nos estudos em LA foram Charles Fries e Ferdinand de Saussure.

6. (FEPESE) Considerando as diversas concepções de linguagem, assinale a


alternativa correta.

a) Na Concepção da Linguagem como Forma de Interação, a linguagem é lugar de


convívio. Através dela o sujeito que fala pratica ações que não conseguiria
praticar a não ser falando. Há um aprendizado mais ativo por parte dos alunos.
b) Na Concepção da Linguagem como Instrumento de Comunicação, fica evidente
uma ênfase ao ensino da gramática normativa, norteando o aprendizado dos
alunos como “certo e errado”. Foco na exteriorização do pensamento.
c) Na Concepção da Linguagem como Forma de Interação, a língua é vista como
um código que transmite uma mensagem e toma forma fora do pensamento.
d) Na Concepção da Linguagem como Forma de Expressão do Pensamento, a
língua é compreendida como homogênea e estática. O professor deve trabalhar
a leitura, interpretação e produção de textos variados, enfatizando as variedades
da língua.
e) Na Concepção da Linguagem com Instrumento de Comunicação, a língua é vista
como um código que transmite uma mensagem e toma forma fora de nosso
pensamento. As formas gramaticais pré-estabelecidas são enfatizadas,
configurando o ensino como prescritivo.

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7. Sobre o percurso histórico da linguística aplicada no Brasil, assinale a alternativa
incorreta.

a) Em 1970, foi inaugurado o Programa de Linguística Aplicada ao Ensino de Línguas


da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
b) A partir da década de 1980, as pesquisas de linguística aplicada ampliaram o seu
escopo de debate e passaram a ter contornos interdisciplinares.
c) Atualmente, a pesquisa em linguística aplicada apresenta estudos voltados para
a análise do discurso, a aquisição de segunda língua e letramento.
d) A Faculdade de Letras da Universidade Federal Fluminense (UFF) foi a pioneira na
abertura de concurso público para linguística aplicada.
e) Em 2007, a UFMG propõe duas áreas para a linguística aplicada: LA e ensino de
línguas estrangeiras e LA e tradução.

8. (Prefeitura Municipal de Cachoeira dos Índios) Para estudiosos, o trabalho com a


gramática na escola deve dar prioridade para a leitura, para a escrita, a narrativa
oral, o debate e todas as formas de interpretação e, também precisa trabalhar as
variedades linguísticas.

No que diz respeito aos diferentes conceitos de gramática, analise os itens a seguir.

I. Para a gramática ____________, as regras operaram como obrigações a serem


seguidas a rigor e, por esse motivo, tudo aquilo que foge à norma de prestígio seria
reprovado, taxado como um erro. Temos aí uma perspectiva de língua em que a
modalidade culta deve servir de referência a todo custo, desconsiderando-se
assim, as demais variedades.
II. A gramática _______________, por sua vez, segundo o autor, formula regras
mediante a observação da realidade da língua, sem atribuir valor a uma
variedade linguística ou outra. Por levar em consideração o fator de variação na
língua, são considerados erros apenas as construções que não integram nenhum
dialeto, que sejam, portanto, agramaticais (inexistentes) na língua.
III. Na gramática ______________, o conhecimento sistemático que o falante tem da
língua expressa suas regras de uso, sem apresentar nenhuma preocupação de
cunho valorativo. Portanto, nesse caso, erros aconteceriam somente quando o

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falante acionasse hipóteses que foram interiorizadas de maneira equivocada.

Assinale a opção correta que completa as lacunas dos itens respectivamente.

a) Normativa, descritiva e internalizada.


b) Descritiva, internalizada e normativa.
c) Internalizada, normativa e descritiva.
d) Normativa, internalizada e descritiva.
e) Descritiva, normativa e internalizada.

21
LINGUÍSTICA APLICADA NA UNIDADE
CONTEMPORANEIDADE

02
Neste capítulo, discute-se como a linguística aplicada tem sido compreendida
atualmente. A LA é hoje tida como uma área interdisciplinar e dinâmica que porta
diferentes concepções em si. Em seguida, é debatida a relação entre linguística
aplicada e formação docente. Por último, é mostrado como a linguística aplicada
se comporta socialmente em uma dinâmica de mundo globalizado.

2.1 LINGUÍSTICA APLICADA E INTERDISCIPLINARIDADE

A linguística aplicada é, hoje, considerada uma área multifacetada, já que


considera questões de linguagem pertinentes a diversos campos de observação da
realidade, quer dizer, a LA é uma ciência de caráter adaptativo. Segundo Tílio e
Mulico (2016, p. 63), “a adaptação é um processo pelo qual um organismo encaixa-
se no ambiente por meio da experiência, responsável por guiar mudanças na
estrutura do organismo ao longo do tempo”. Respaldando essa citação, a linguística
aplicada está a serviço de pesquisas relacionadas à Psicolinguística, por exemplo.
Essa característica respalda a interdisciplinaridade típica da LA atualmente.
Sá et al. (2021), no artigo “Um teste de verificação lexical de português brasileiro
(TVLPB) como língua adicional: criação e validação”, da área de Psicolinguística,
mostram a criação e a validação de um Teste de Verificação Lexical do Português
Brasileiro. O teste, uma ferramenta padronizada para medir proficiência na língua
portuguesa, foi aplicado em 115 participantes falantes nativos do português
brasileiro e em 23 falantes de herança do português brasileiro (língua herdada por
filhos de brasileiros imigrantes).

22
O caráter dinâmico da LA diz respeito à superação da ideia de ela ser uma
subárea da linguística ou um campo que se dedicava a estudar basicamente a
aplicação dos conhecimentos linguísticos. Essa afirmação se justifica pelo fato de a
linguística aplicada ter passado por inúmeras mudanças que incluem pesquisas que
se debruçam sobre questões de linguagem cada vez mais contemporâneas.
A linguística aplicada é considerada imprevisível, uma vez que, além de
refletir sobre a linguagem, também pondera o papel dos sujeitos que produzem essa
linguagem. Uma pesquisa que investiga o processo de aprendizagem de uma língua
deve levar em consideração o perfil dos usuários da língua, o contexto em que eles
estão inseridos, as ferramentas e a metodologia usadas no processo de ensino e de
aprendizagem. Por mais que se prevejam hipóteses e resultados, esses fatores que
impactam no ensino e na aprendizagem podem trazer diferentes conclusões
daquelas tiradas a priori. Esse fato ocorre, pois a pesquisa em LA não é linear e, no
seu decurso, vários instrumentos, por exemplo, podem influenciar os resultados
obtidos.
Como foi possível verificar no capítulo 1, desde a década de 1980, a linguística
aplicada tem se preocupado com pesquisas para além do estudo da aquisição de
língua materna e estrangeira. A partir das características básicas da LA
apresentadas nesta seção e do marco histórico de 1980, nota-se que a área recorre
a outros quadros teóricos, o que a confere perfil interdisciplinar. Para Moita Lopes
(2006), a linguística aplicada ganhou status “de disciplina mestiça ou nômade” que
articulou múltiplos domínios do conhecimento (educação, antropologia, sociologia,
filosofia) sob um viés integrador.

Para ilustrar a linguística aplicada como interdisciplinar, segue o esquema 1


com algumas das áreas de interesse da LA na atualidade. Evidentemente, que a
reflexão sobre o campo de investigação dessa ciência não se esgota na figura
seguinte, mas é uma amostra da multiplicidade de campos científicos que
estabelecem diálogo com a LA.

23
Esquema 1: Áreas de interesse da LA

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

Mesmo com todo o esforço de integrar diferentes campos, os linguistas


aplicados viram que o conceito de interdisciplinaridade precisava ser revisto, pois
não estava funcionando adequadamente dado aos limites impostos pela teoria de
cada área do conhecimento. Na tentativa de propor uma articulação mais genuína,
em meados de 2000, surgiu a noção de transdisciplinaridade que poderia, realmente,
efetivar a justaposição entre os domínios. Segundo Moita Lopes (2004), a LA
transdisciplinar dá ênfase à resolução de problemas da prática social e à geração
de conhecimento útil para os sujeitos, quer dizer, investiga o que tem relevância
social. Nas pesquisas transdisciplinares, em linguística aplicada, os resultados são
contextualizados.

2.2 LINGUÍSTICA APLICADA E FORMAÇÃO DOCENTE

Mesmo que os domínios da linguística aplicada tenham se expandido para


abarcar pesquisas transdisciplinares, é inegável a associação entre a LA e a área da
educação. No campo educacional, essa área presta serviço à elaboração e análise

24
de materiais didáticos, à reflexão sobre metodologias de ensino e de aprendizagem
e à discussão sobre formação de professores. Conforme Mulik (2019),

(...) a LA cumpre seu papel quando ajuda a fomentar as discussões a


respeito da formação de professores; quando nos auxilia a pensar
sobre as tendências educacionais e o modo pelo qual elas afetam
nossas práticas pedagógicas; quando nos auxilia a desenhar políticas
de ensino e de planejamento linguístico (...). (MULIK, 2019, p. 292)

A formação de professores é, atualmente, um grande desafio devido às


inúmeras mudanças sociais, políticas e culturais que acabam impactando no ensino
de língua estrangeira e materna. A LA, enquanto área versátil e dinâmica, pode
apresentar algumas respostas para o ensino crítico de línguas.

A formação docente é dividida em reflexiva e colaborativa. Para Mulik (2019),


a primeira diz respeito às práticas de empoderamento, considerando as teorias
cognitivistas, já a segunda tem relação ao cumprimento de propósitos anti-
hegemônicos. No quadro 1, são ressaltadas as características da vertente da
formação reflexiva e colaborativa.

Quadro 1: Formação reflexiva e colaborativa


Tipo de formação Características

Reflexiva O professor é visto como o agente responsável pela preparação


do indivíduo que atuariam na sociedade. Sendo assim, o
professor deve organizar situações de aprendizagem, envolver
os alunos em suas aprendizagens e no trabalho, trabalhar em
equipe, envolver os pais e utilizar as novas tecnologias.

Colaborativa O professor é formado com respeito às perspectivas


socioculturais e a partir de processos dialógicos e parcerias. A
formação de profissionais é compreendida como processo
dinâmico de transformação.
Fonte: Elaborado pela autora com base em Mulik (2019)

25
No que concerne à linguística aplicada, a formação reflexiva está
contemplada em pesquisas sobre crenças dos professores sobre ensino-
aprendizagem, estudo sobre conhecimento prático e profissional, além de cultura do
ensinar a aprender. Exemplo de pesquisa em LA com base na perspectiva reflexiva é
a dissertação “Crenças de professores de espanhol sobre a avaliação no ensino-
aprendizagem de LE”, de autoria de Mariana Rabelo Rocha, defendida em 2019, na
Universidade Federal do Amazonas (UFAM). No trabalho, a autora investiga quais são
as crenças dos professores egressos do curso de Letras – Língua e Literatura Espanhola
sobre a avaliação no ensino-aprendizagem de língua estrangeira. Rocha (2019)
chegou à conclusão de que as avaliações são pautadas em práticas tradicionais
como a avaliação somativa. Essas pesquisas, em resumo, focavam em reflexão sobre
a práxis do professor na escola.

Sob o viés da formação colaborativa, a LA considera pesquisas que integram


formação integral e continuada, tendo a escola como um espaço para isso. A
linguística aplicada se destaca, assim, por mirar seus interesses na formação de
professores que possuem seus saberes legitimados. Além disso, para essa visão
formativa, as práticas pedagógicas devem incluir as questões sociais. A dissertação
“Letramento acadêmico: uma proposta para formação continuada dos professores
de língua materna”, de Aurilene Ferreira de Oliveira, defendida em 2019, na
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), é um exemplo de pesquisa
realizada sobre formação de professores. A autora faz uma ponderação sobre a
importância do letramento científico para a constituição da identidade do professor
de língua materna. O trabalho apresenta, como conclusão, que a formação
continuada, com o aporte da universidade, pode representar um ganho para as
práticas dos professores de Língua Portuguesa assim como para os alunos desses
docentes.
Os desafios enfrentados pelos professores no processo de formação são

26
constantes e cabe ao docente o movimento de buscar sempre alternativas que
possam agregar. Para Gimenez (2005), há, no campo da LA, sete desafios como
mostra o esquema 2 a seguir.

Esquema 2: Desafios para a formação docente

Fonte: Elaborado pela autora com base em Gimenez (2005)

De maneira sintética, é necessário tratar cada um dos desafios acima


apontados. O primeiro diz respeito à dificuldade de se uniformizar os cursos de Letras
e, simultaneamente, respeitar as necessidades locais em um país com dimensões
continentais. Como a LA trabalha com a língua e a linguagem dentro de uma
perspectiva social, logo, essa área pode contribuir para a resolução deste desafio. O
segundo e o terceiro desafios podem ser debatidos em conjunto, visto que apontam
para a necessidade de articulação entre teoria e prática nas pesquisas. A linguística
aplicada contempla pesquisas que trabalham a observação da prática,
considerando uma perspectiva teórica. O quarto e o quinto aspectos possuem uma
relação estreita com o segundo e o terceiro desafio, já que se relacionam com a
continuidade da pesquisa para além do término do projeto. Por último, o sexto e o
sétimo aspectos dizem respeito à identificação do perfil docente por parte do próprio
professor e à percepção de que é preciso estar sempre se atualizando, que dizer, há
uma formação docente constante.

2.3 LINGUÍSTICA APLICADA E SOCIEDADE GLOBALIZADA

A globalização é conceituada, de maneira mais ampla, como um


fenômeno político, social, cultural e econômico o qual faz com que as

27
pessoas e as nações estejam cada vez mais interconectadas. O mundo
globalizado é caracterizado pela diminuição espacial, isto é, as pessoas são
afetadas tanto por eventos locais quanto por eventos mundiais. As fronteiras
geográficas, então, apresentam-se como fluídas cada vez mais. Além disso,
no mundo globalizado, há uma redução temporal em razão da tecnologia
que torna tudo mais ágil.

Figura 5: Globalização

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3qa3t1X. Acesso em: 20 jan. 2022.

Esse processo tem impacto na vida cotidiana e, consequentemente,


na educação. Para Mulik (2019, p. 295), “pensar na LA e na sua relação com
a globalização é algo essencial”, talvez, porque a linguística aplicada analisa
os processos envolvendo a linguagem e investiga os indivíduos e o mundo em
que essa linguagem se manifesta. Dessa maneira, refletir sobre a LA e a
sociedade é pensar em globalização, pois vivemos em uma sociedade
globalizada.

Um mundo globalizado exige o uso de uma língua que seja comum, a fim de
facilitar a comunicação entre os sujeitos de diferentes comunidades de fala como
é o caso do inglês. Essa área contribui também para a problematização sobre o

28
papel da língua inglesa em uma dinâmica de sociedade em rede. Muitas pesquisas
surgem para discutir o processo de aquisição do inglês por parte de não falantes e
por parte de pessoas que estão aprendendo a língua para fins empresariais. Por fim,
a LA coopera para o debate sobre a sobreposição do inglês em se tratando de
outras línguas e como o domínio da língua inglesa pode colocar o falante em uma
posição de prestígio no mercado de trabalho.
A LA se preocupa com os estudos culturais, o que se relaciona com o conceito
de globalização. Na aprendizagem de uma língua, os aspectos linguísticos são
importantes para o processo de aquisição, mas é preciso considerar outros como os
pontos de vista cultural, social e discursivo. As pesquisas sobre a indissociabilidade
entre a língua e a cultura são características da linguística aplicada e vem
ganhando força no âmbito acadêmico. As pesquisas interculturais também são
representativas da linguística aplicada. Neste tipo de investigação, o linguista
aplicado estuda as relações e as trocas que se dão entre culturas diferentes. A sala
de aula, laboratório para esse linguista, vira, então, um espaço intercultural para a
observação de vários aspectos: o papel da língua e as escolhas dos falantes
envolvidos na comunicação, a valorização da língua por parte dos usuários da
língua, a abertura desses participantes da comunicação aos aspectos da cultura do
outro e a construção de identidades.

29
FIXANDO O CONTEÚDO

1. (ENADE)

Muitas vezes, os próprios educadores, por incrível que pareça, também vítimas de uma
formação alienante, não sabem o porquê daquilo que dão, não sabem o significado
daquilo que ensinam e quando interrogados dão respostas evasivas: “é pré-requisito para
as séries seguintes”, “cai no vestibular”, “hoje você não entende, mas daqui a dez anos
vai entender”. Muitos alunos acabam acreditando que aquilo que se aprende na escola
não é para entender mesmo, que só entenderão quando forem adultos, ou seja, acabam
se conformando com o ensino desprovido de sentido.

(VASCONCELLOS, C. S. Construção do conhecimento em sala de aula. 13ª ed. São Paulo: Libertad, 2002, p. 27-8.)

Correlacionando a tirinha de Mafalda e o texto de Vasconcellos, avalie as


afirmações a seguir.

I. O processo de conhecimento deve ser refletido e encaminhado a partir da


perspectiva de uma prática social.
II. Saber qual conhecimento deve ser ensinado nas escolas continua sendo uma
questão nuclear para o processo pedagógico.
III. O processo de conhecimento deve possibilitar compreender, usufruir e transformar
a realidade.
IV. A escola deve ensinar os conteúdos previstos na matriz curricular, mesmo que
sejam desprovidos de significado e sentido para professores e alunos.
V. Os projetos curriculares devem desconsiderar a influência do currículo oculto que
ocorre na escola com caráter informal e sem planejamento.

É correto apenas o que se afirma em

30
a) I e III.
b) I e IV.
c) II e IV.
d) I, II e III.
e) II, III e IV.

2. (UNB- CESPE)

A questão da formação docente, ao lado da reflexão sobre a prática educativo-


progressista em favor da autonomia do ser dos educadores, é a temática central em torno
da qual gira este texto. É também temática a que se incorpora a análise de saberes
fundamentais àquela prática e aos quais espero que o leitor crítico acrescente alguns que
me tenham escapado ou cuja importância não tenha percebido.

(Paulo Freire. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 13. Adaptado)

De acordo com o pensamento predominante no texto, o ato de ensinar exige

I. Rigorosidade metódica, pesquisa e criticidade.


II. Respeito aos saberes dos educandos, estética e ética.
III. Corporificação das palavras pelo exemplo.
IV. Risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação.

A quantidade de itens certos é igual a

a) 0.
b) 1.
c) 2.
d) 3.
e) 4.

3. (Prefeitura Municipal de Tijucas do Sul) O saber docente não é formado apenas


da prática, sendo também nutrido pelas teorias da educação. Considerando
essa informação, julgue os itens que se seguem.

I. A teoria não dita a prática; em vez disso, ela serve para manter a prática ao
alcance de todos, de forma a se mediar e a se compreender, de maneira crítica,

31
o tipo de práxis necessário em um ambiente específico e em um momento
particular.
II. O exercício da docência, enquanto ação transformadora que se renova tanto
na teoria quanto na prática, requer necessariamente o desenvolvimento de uma
consciência crítica.
III. Dentro do processo pedagógico, teoria e prática precisam dialogar
permanentemente, fugindo da ideia tradicional de que o saber está somente na
teoria, construído em um local distante ou separado da ação/prática.

Assinale a alternativa correta.

a) Nenhum item está certo.


b) Apenas os itens I e II estão certos.
c) Apenas os itens I e III estão certos.
d) Apenas os itens II e III estão certos.
e) Todos os itens estão certos.

4. Leia o texto a seguir para responder à questão.

"(...) pode-se caracterizar a psicolinguística como um ramo do conhecimento


científico que consiste em uma 'área de transvariação que requer conhecimentos
linguísticos e psicológicos' para a exploração profícua e eficiente dos fatos que estuda.”

(PAIS, C. T. Manual de linguística. Petrópolis: Vozes, 1979. p. 180.)

Assinale a alternativa correta sobre a psicolinguística.

a) A psicolinguística é uma área de estudo específica e restrita.


b) Uma noção de psicolinguística deve apontar que ela exclui de sua investigação
o sujeito falante.
c) A psicolinguística investiga os processos mentais pertinentes à aquisição, à
produção e à compreensão da linguagem.
d) A psicolinguística deve ser definida como uma extensão da psicologia aplicada.
e) A psicolinguística emergiu e evoluiu dentro das fronteiras da linguística aplicada.

5. (INSTITUTO EXCELÊNCIA) No quadro das atuais concepções psicológicas,

32
linguísticas e psicolinguísticas de leitura e escrita, a entrada da criança (e também
do adulto analfabeto) no mundo da escrita ocorre simultaneamente por esses
dois processos: pela aquisição do sistema convencional de escrita
__________________ e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema
em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua
escrita ________________.

Assinale a alternativa que completa correta as lacunas do texto.

a) o letramento / a alfabetização.
b) a alfabetização / o letramento.
c) o letramento / a codificação.
d) Nenhuma das alternativas.
e) Todas as alternativas.

6. (FCC) Analise as proposições:

I. A Análise do Discurso estabelece uma tipologia das diferentes formações


discursivas, de modo a destacar constantes de articulação entre o linguístico e o
social.
II. O termo sociolinguística recobre trabalhos diversos, tais como: etnografia da
comunicação, variação linguística, variação fonética e mantém interface até
mesmo com a Análise de Discurso.
III. Segundo Benveniste, a "linguagem está de tal forma organizada que permite a
cada locutor apropriar-se da língua toda designando-se como eu".

É correto o que consta em

a) I e II, apenas.
b) II e III, apenas.
c) I e III, apenas.
d) I, apenas.
e) I, II e III.

33
7. (CETREDE - ADAPTADA) A formação de professores no contexto contemporâneo
está permeada de muitos desafios, face às exigências de um mundo globalizado
que exige, cada vez mais, profissionais capacitados e multifuncionais. Nesse
sentido, analise as afirmativas a seguir.

I. A formação de professores está situada num contexto de complexidade,


diversidade e imprevisibilidade.
II. Para lidar com a diversidade na sala de aula, é necessário que o professor tenha
a capacidade de definir as melhores estratégias que favoreçam a aprendizagem
de todos os alunos.
III. O problema da formação docente concentra-se na necessidade de atualização,
pois a formação continuada tem a função de preencher as lacunas da formação
inicial.
IV. O fracasso escolar é determinado pela fragilidade na aprendizagem dos alunos,
independente do trabalho desenvolvido pelo professor.
V. A educação contemporânea exige um profissional comprometido com
aprendizagem dos alunos, que promova a transformação por meio do diálogo,
encantamento e conhecimento.

Marque a opção que apresenta as afirmativas corretas.

a) I – II – V.
b) I – III – IV.
c) II – III – V.
d) I – II – III.
e) I – II – III – V.

8. Sobre o caráter interdisciplinar da linguística aplicada, assinale a alternativa


correta.

a) A linguística aplicada é multifacetada, mas não considera as questões de


linguagem de diversos campos da realidade.
b) Pelo seu caráter pouco dinâmico, a LA se dedica a estudar basicamente a
aplicação dos conhecimentos linguísticos.

34
c) São áreas de interesse da LA a análise do discurso, a análise da conversa, a história
e a ergonomia.
d) Nas pesquisas transdisciplinares, em linguística aplicada, quase sempre os
resultados são contextualizados.
e) A pesquisa em LA é linear e só alguns instrumentos podem influenciar os resultados
obtidos.

35
GÊNEROS TEXTUAIS UNIDADE

A linguística aplicada volta-se, contemporaneamente,


03 dentre outras
possibilidades, para o trabalho com o texto; dessa forma, se torna necessário abordar
a noção de gênero textual. As concepções circulantes mais evidentes sobre o
gênero são a sócio-histórica e a discursiva. Neste capítulo, conceitua-se, em primeiro
lugar, o gênero como uma prática sócio-histórica. Logo em seguida, são mostradas
as características do gênero discursivo. Por fim, reflete-se sobre os gêneros híbridos e
como a teoria sobre os gêneros textuais-discursivos serve à linguística aplicada.

3.1 A CONCEPÇÃO DE GÊNERO COMO PRÁTICA SÓCIO-HISTÓRICA

Os gêneros são, para Marcuschi (2007), uma manifestação textual com


relevância na vida diária do ser humano e uma forma pela qual as atividades
comunicativas cotidianas ocorrem. Nesta concepção, o gênero textual é definido
pelas funcionalidades comunicativas, cognitivas e institucionais, e, não, por seus
aspectos formais, estruturais ou linguísticos. Sendo assim, ao perder a sua
aplicabilidade cotidiana, um gênero tende a desaparecer como é o caso do
telegrama.
Para ilustrar o gênero como prática sócio-histórica, tomam-se como exemplo
o “artigo científico” e o “artigo de divulgação científica”. Apesar de esses dois
gêneros terem a ciência como domínio discursivo, eles possuem funções e aspectos
sócio-comunicativos distintos. O “artigo científico” tem a função de divulgar
informações científicas dentro de uma comunidade de especialistas; sendo,
portanto, uma comunicação entre pares. Já o artigo de divulgação científica trata-
se da iniciativa de trazer, para a esfera pública, os conhecimentos que circulam
dentro da comunidade científica. Enquanto o artigo científico é publicado em
revistas especializadas, o artigo de divulgação científica circula em jornais diários.
Marcuschi (2007) propõe uma distinção entre tipo textual e gênero textual.
Enquanto a noção de tipo textual está relacionada à natureza linguística do texto
(aspectos sintáticos, lexicais, escolhas de tempos verbais etc.), o gênero é a própria

36
materialização de um texto, que, de modo geral, apresenta “conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição característica” (MARCUSCHI, 2007, p.
23). Cabe destacar que os tipos textuais são em número limitado, enquanto que os
gêneros são incontáveis. O quadro 2, a seguir, delimita as características do tipo e do
gênero textual:
Quadro 2: Tipo e gênero textual
Tipo textual Gênero textual
Definido por propriedades linguísticas Realizações linguísticas concretas
Sequências linguísticas Textos que cumprem determinadas funções
comunicativas
Conjunto limitado de categorias teóricas Conjunto aberto e ilimitado de manifestações
determinadas por tempos verbais, concretas marcadas por estilo, composição,
aspectos sintáticos, lexicais, expressões função
Divididos em: narrativo, descritivo, Divididos em: carta, artigo, e-mail, post, prova,
dissertativo, argumentativo, expositivo e piada, fábula, edital, bilhete, monografia,
injuntivo crônica, etc
Fonte: Elaborado pela autora (2022) com base em Marcuschi (2007)

Para exemplificar essas noções, toma-se como referência o gênero fábula. De


modo geral, ele é um texto ficcional que acaba personificando animais, plantas e
objetos inanimados; dando-lhes falas, atitudes, sentimentos e emoções humanas;
com o objetivo de dar conselhos, fazer críticas e transmitir ensinamentos. O tipo
textual predominante nesse gênero é o narrativo, uma vez que ele ajunta os cinco
elementos a seguir: o enredo, personagens, tempo, espaço e o foco narrativo. No
esquema 3, a seguir, é explica-se os elementos da narrativa:

Esquema 3: Elementos da narrativa

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

37
De modo a explicar o esquema 3, toma-se como exemplo a clássica fábula
“A cigarra e a formiga”, de Esopo, famoso escritor da Grécia Antiga. O enredo conta
a história de uma cigarra que, durante o verão, vivia a cantar, sem se preocupar em
guardar alimentos para o inverno; diferentemente da formiga, que era muito
trabalhadora e esforçada. A cigarra sempre criticava a formiga por ela não se divertir
durante o verão. Com a chegada do inverno, a cigarra passa por necessidades (frio
e fome), enquanto a formiga, providente, aproveita os frutos de seu trabalho
(alimento).
No que concerne aos elementos da narrativa, nesta fábula, as personagens
são a cigarra e a formiga; o tempo da narrativa é o verão e o inverno; a história se
passa no bosque e o foco narrativo é de 3ª pessoa (aquele que observa tudo sem,
entretanto, participar da história).

Por fim, um conceito relevante para o ponto de vista do gênero como sócio-
histórico é o de domínio discursivo. Os domínios são as esferas da atividade humana.
Eles não são textos nem discursos; todavia, são a matéria-prima para a constituição
de discursos bem específicos tais como o discurso publicitário (propaganda, folder,
classificado, post), o discurso jurídico (procuração, lei, ofício, sentença), o discurso
religioso (oração, ladainha, mantra), o discurso literário (poema, fábula, romance,
mito), discurso acadêmico (projeto, monografia, apostila, artigo científico). Os
gêneros textuais reportagem, notícia, editorial, entrevista, título, crônica, por exemplo,
pertencem ao domínio discursivo jornalístico, que é definido por privilegiar a
exposição de fatos de maneira imparcial e objetiva.

3.2 A CONCEPÇÃO DE GÊNERO TEXTUAL COMO PRÁTICA DISCURSIVA

O gênero discursivo, a partir das reflexões de Bakhtin (2010), é avaliado como


uma forma relativamente estável produzida pelos usuários da língua em situações de

38
interação. Por outras palavras, os gêneros podem ser compreendidos como
enunciados relativamente estáveis de cada uma das esferas da atividade humana
(cotidiana, científica, ideológica, escolar, jornalística, publicitária, religiosa, escolar
etc.). Em relação a essas esferas, de acordo com Wachowicz (2012, p. 24), “cada
época, cada cultura, cada comunidade e, no fim, cada esfera do comportamento
social têm suas opções de comunicação”.

Sendo assim, os gêneros textuais não são fixos, dado que, para cada situação
comunicativa e segundo cada uma das esferas da comunicação, há diferentes
enunciados (unidades efetivas de comunicação verbal). De acordo com Bakhtin
(2010),

A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque


são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e
porque em cada campo dessa atividade é integral o repertório de
gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que se
desenvolve e se complexifica um determinado grupo. (BAKHTIN, 2010,
p. 262)

A riqueza e a variedade dos gêneros são infinitas, e Bakthin (2010) não


pretendeu com a sua reflexão instaurar um catálogo de gêneros. A fim de respaldar
a citação acima, pode-se pensar na escola. Neste espaço, por exemplo, há
diferentes gêneros com características distintas os quais se encaixam na esfera
humana escolar: o currículo, o bilhete, o cronograma, a prova, a circular, dentre
outros. Interessa comentar que não há entre esses gêneros uma hierarquização, pois
cada um deles serve a um propósito comunicativo bem específico, a uma posição
social assumida na comunidade acadêmica e a um relacionamento estabelecido
entre os parceiros da comunicação.

39
Fora do âmbito escolar, há vários gêneros discursivos. O esquema 4, a seguir,
mostra algumas dessas formas relativamente estáveis de organização da
materialidade textual. Evidentemente que a lista de gêneros é incontável e não se
esgota no esquema seguinte; sendo, pois apenas uma referência sumária de alguns
textos que possuem uma satisfatória aderência social.

Esquema 4: Gêneros

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

A reportagem é um texto de caráter jornalístico, escrito ou falado, cuja função


é informar por meio de uma linguagem objetiva e impessoal. A crônica é uma
narrativa curta, efêmera e desenvolvida a partir da visão subjetiva (particular) do

40
cronista sobre um fato cotidiano. A sinopse é uma descrição sintética de um produto
cultural com a intenção de antecipar informações sobre esse produto. O resumo é
um texto que apresenta de maneira abreviada o conteúdo de um acontecimento.
A resenha é um gênero que mescla resumo e crítica com o objetivo de estimular ou
desestimular o leitor a consumir um bem cultural (livro, filme, música, peça de teatro,
exposição de arte, etc). A história em quadrinhos é uma narrativa organizada em
quadros que associam linguagem verbal e não verbal. Os fatos, nas histórias em
quadrinho, são sequenciados e organizados sob uma relação de causa e
consequência. O manual de instruções é um texto cuja intenção é instruir o usuário a
montar, a usar e a conservar um produto.
Os gêneros são um modo de organização das experiências com a linguagem
e com as relações dialógicas estabelecidas entre os usuários da língua que
interagem. Aqueles são considerados instrumentos de interação social os quais
revelam agentes desta comunicação dotados de vozes diversas (polifonia). É
interessante lembrar que esse conceito de gênero tem estreita conexão com o de
linguagem a qual também supõe essa polifonia e a existência de cosmovisões (visões
de mundo).

Os gêneros são constituídos por um conteúdo temático, uma construção


composicional e um estilo. O tema ou unidade temática é um domínio de sentido
típico do gênero. Fiorin (2006, p. 62), sobre o conteúdo temático (tema na
concepção bakhtiniana), afirma, por exemplo, que “as cartas de amor apresentam
o conteúdo temático das relações amorosas”. A forma composicional é a
organização do texto, a estrutura dele. Por exemplo, é de se esperar que uma carta
tenha local, data, vocativo, corpo do texto, despedida e referência de quem a
escreveu. Já o estilo é constituído pelas estruturas linguísticas como (aspectos lexicais,
fraseológicos e gramaticais) e é associado a determinadas unidades temáticas. O
estilo também está atrelado à forma composicional. Por exemplo, no gênero textual
receita ou manual, os verbos no modo imperativo (indicativo de ordem, pedido,

41
solicitação) fazem parte da composição desses textos. As unidades fraseológicas
“este trabalho tem como propósito”, “procedimentos metodológicos” e “nosso
embasamento teórico” sinalizam uma construção composicional típicas do gênero
artigo científico
Por fim, cabe afirmar que os gêneros discursivos alteram-se constantemente,
segundo Fiorin (2006, p. 65), “à medida que as esferas de atividade se desenvolvem
e ficam mais complexas”. Esses gêneros então aparecem, desaparecem, se
transformam, ganham novo sentido por estarem inseridos em um processo dinâmico.
Para exemplificar isso, é preciso refletir sobre os gêneros surgidos com o advento da
internet, como é o caso do post, do chat, do blog e do e-mail. Se antes a
comunicação se processava por meio de uma carta, um bilhete ou diário, hoje, ela
acontece por meio virtual por intermédio de e-mail ou de blog.

3.3 GÊNEROS HÍBRIDOS: CARACTERIZAÇÃO

Como abordado nas seções anteriores, os gêneros textuais são entidades


flexíveis e mudam de acordo com a dinâmica social e a função que ocupam. Os
estudos discursivos vêm apresentando interesses nos textos com características de
mais um gênero do discurso. Os gêneros também podem se mesclar para formar
outros como é o caso do e-mail, que, por permitir uma comunicação assíncrona,
acaba sendo uma mescla dos gêneros carta, telefonema e telegrama. Para Costa
Filho (2012, p. 82), sobre o processo de hibridização dos gêneros, “a esfera
publicitária, ainda hoje, tem sido palco privilegiado para este tipo de estudo, pelo
fato de ser o local mais evidente do fenômeno de mescla de gêneros do discurso”.
Esse fato ocorre, uma vez que, para atender às necessidades comunicativas
contemporâneas, a área da publicidade precisa mesclar estratégias linguísticas
variadas e criativas para cumprir o objetivo de convencer o interlocutor a adquirir o
produto vendido.

42
Essa transformação de um gênero a outro é o que se denomina hibridização
e, segundo Pagano (2001, p. 88), “o hibridismo parece surgir, assim, da práxis ou da
produção textual, que, se bem participa de um gênero específico ou se vincula a
ele, está sempre ativando outros gêneros”. A língua e a linguagem mudam o tempo
todo; conforme arranjos sociais, marcos ideológicos, históricos e culturais; e isso
justifica o fenômeno da hibridização dos gêneros, que ocorre na materialização da
linguagem em uso.
Os gêneros híbridos colocam em questionamento a clássica dicotomia entre
os gêneros orais e os escritos, dando espaço para a ideia de um contínuo existente
nessas duas modalidades da língua. Com a inserção de novas tecnologias e com a
ocorrência contextos multidisciplinares, por exemplo, os gêneros passaram a
observar novas linguagens (verbal, não-verbal, som, formas, dentre outras) e se
tornaram híbridos.

O hibridismo, para alguns estudiosos, tais como Koch e Elias (2008) e Marcuschi
(2008), pode ser denominado intergenericidade (apropriação de um gênero por
outro). Marcuschi (2008) vaticina que a intergenericidade é um fenômeno muito
mais natural e normal do que se possa imaginar. Os estudos da língua, nas instituições
escolares, vêm abordando a mescla de gêneros assim como as provas de larga
escala como a do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem). A habilidade de se
identificar a mescla de gênero tem sido cada vez mais incentivada e cobrada na
prática cotidiana de leitura e de escrita textual. O texto da figura 6, a seguir, fez
parte da prova do Enem de 2020, aplicada no início de 2021, e destaca como o
hibridismo ou a intergenericidade se processa.

43
Figura 6: Gênero híbrido

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3ibplp4. Acesso em: 01 jan. 2022.

Em primeira instância, vê-se um texto em forma de um típico cartaz,


denominado lambe-lambe, que é, mormente, colado em postes ou em muros com
o propósito de anunciar produtos. Em segunda instância, a partir da leitura textual,
observa-se que se trata de arte poética difundida em forma de cartaz e vinculada
ao projeto #UmLambePorDia de autoria de Leonardo Beltrão, natural de Varginha e
morador de Belo Horizonte. O texto apresenta lirismo e subjetividade típicos de uma
poesia, porém, bem distantes da linguagem objetiva utilizada no cartaz. Apesar de
o texto ter a forma de um cartaz, ele apresenta a função de uma poesia. Se antes o
cartaz estava alocado na esfera publicitária, ao ganhar contornos de poesia, passa
a figurar na esfera literária sem dúvidas. O efeito pretendido com essa hibridização
é o de levar, para os moradores e para as cenas urbanas, um pouco mais de alegria
e de poesia.

44
FIXANDO O CONTEÚDO

1. (ENADE)
Uma playlist comentada conta com texto de apresentação, que descreve ou relata algo
envolvendo as produções em questão, e trechos apreciativos, que podem envolver
argumentação, contemplando assim diferentes sequências textuais. Além disso, supõe a
produção de um roteiro e sua leitura oral/falada, o que requer observar a adequação da
linguagem oral, tendo em vista as condições de produção dadas. Em termos de ações,
práticas e procedimentos próprios da web, a produção de uma playlist comentada
permite vivenciar o papel do curador: alguém que seleciona exemplares entre muitos, no
caso músicas ou canções, a partir de algum critério, organiza-os de determinada forma e
destaca, a respeito das canções escolhidas ou de seus autores ou executores, algo para
comentar. Além disso, supõe a escrita de um roteiro e o manuseio de um editor de áudio.
Pode também supor a disponibilização desse arquivo na internet, o que poderia ensejar
ações de curtir e/ou redistribuir.
ROJO, R.; BARBOSA, J. P. Hipermodalidade, multiletramento e gêneros discursivos. São Paulo: Parábola editorial, 2015 (adaptado).

No texto apresentado, mencionam-se algumas ações, práticas e procedimentos


comuns em um ambiente digital. Considerando que tais informações permitem
que o trabalho do produtor de textos favoreça a reflexão sobre o gênero
discursivo e ambiente digital, avalie as afirmações a seguir, acerca do uso de
playlist nas aulas de língua portuguesa.

I. Atividades de reescritura de sequências textuais semelhantes ou diferentes


voltadas para o uso podem enriquecer a compreensão do gênero playlist
comentada.
II. A análise da estrutura de uma playlist comentada favorece a abordagem de
características que revelam as aproximações e os distanciamentos entre textos
orais e escritos.
III. A playlist comentada, enquanto recurso didático, permite a análise de diferentes
tipos de argumentação utilizados em ambiente digital.

É correto o que se afirma em

a) II, apenas.
b) III, apenas.
c) I e II, apenas.
d) I e III, apenas.
e) I, II e III.

45
2. (ENEM - ADAPTADA)
A trajetória de Liesel Meminger é contada por uma narradora mórbida,
surpreendentemente simpática. Ao perceber que a pequena ladra de livros lhe escapa,
a Morte afeiçoa-se à menina e rastreia suas pegadas de 1939 a 1943. Traços de uma
sobrevivente: a mãe comunista, perseguida pelo nazismo, envia Liesel e o irmão para o
subúrbio pobre de uma cidade alemã, onde um casal se dispõe a adotá-los por dinheiro.
O garoto morre no trajeto e é enterrado por um coveiro que deixa cair um livro na neve.
É o primeiro de uma série que a menina vai surrupiar ao longo dos anos. O único vínculo
com a família é esta obra, que ela ainda não sabe ler. A vida ao redor é a
pseudorrealidade criada em torno do culto a Hitler na Segunda Guerra. Ela assiste à
eufórica celebração do aniversário do Führer pela vizinhança. A Morte, perplexa diante
da violência humana, dá um tom leve e divertido à narrativa deste duro confronto entre
a infância perdida e a crueldade do mundo adulto, um sucesso absoluto – e raro – de
crítica e público.
(Disponível em: www.odevoradordelivros.com. Acesso em: 21 nov. 2021.)

Os gêneros textuais podem ser caracterizados, dentre outros fatores, por seus
objetivos. Esse fragmento é um(a)

a) Instrução, pois ensina algo por meio de explicações sobre uma obra específica.
b) Reportagem, pois busca convencer o interlocutor da tese defendida ao longo do
texto.
c) Resenha, pois apresenta uma produção intelectual de forma crítica.
d) Resumo, pois promove o contato rápido do leitor com uma informação
desconhecida.
e) Sinopse, pois sintetiza as informações relevantes de uma obra de modo impessoal.

3. (ENEM)
Isaac Newton nasceu em 4 de janeiro de 1643, no condado de Lincolnshire, Inglaterra.
Filho de fazendeiros, o cientista, físico e matemático nunca conheceu seu pai, morto três
meses antes de o filho nascer.
Estudou na escola King’s School, onde era um aluno mediano. Entretanto, depois de uma
briga com um colega de classe, começou a se esforçar mais nos estudos. Passou então a
ser um dos melhores alunos da escola. O sucesso nos estudos levou Newton a entrar na
Faculdade Trinity, em Cambridge, onde auxiliava outros alunos em troca de uma bolsa de
estudos paga pela faculdade.
Newton se interessava pelos pioneiros da ciência, como o filósofo Descartes e os
astrônomos Copérnico, Galileu e Kepler. Depois de formado, fez estudos em matemática
e foi eleito professor da matéria em 1669. Em 1670, começou a dar aulas de ótica. Nessa
época, demonstrou como, através de um prisma, é possível separar a luz branca nas cores
do arco-íris.
Em 1679, o cientista inglês voltou-se para mecânica e os efeitos da gravitação sobre as
órbitas dos planetas. Em 1687, publicou o livro Principia mathematica, em que demonstrou
as três leis universais do movimento. Com esse livro, Newton ganhou reconhecimento
mundial.
(Disponível em: www.invivo.fiocruz.br. Acesso em: 21 nov. 2021. Adaptado).

46
A análise dos elementos constitutivos desse texto, como forma de composição,
tema e estilo de linguagem, permite identificá-lo como

a) Didático, já que explica a importância das contribuições de Isaac Newton.


b) Jornalístico, pois dá a conhecer fatos relacionados a Isaac Newton.
c) Científico, pois investiga informações sobre Isaac Newton.
d) Ensaístico, já que discute fatos da vida de Isaac Newton.
e) Biográfico, pois narra a trajetória de vida de Isaac Newton.

4. (ENADE - ADAPTADA)
Texto I
Em nosso dia a dia, no contato com outras pessoas e com as diversas informações que
recebemos, estamos expostos a várias situações comunicativas, cada uma situada em
seu devido contexto. Na escrita e na fala, existem algumas estruturas padronizadas que
recebem o nome de gêneros textuais.
No simples ato de abrir um jornal ou uma revista, já estamos expostos aos diversos gêneros
textuais: nesses dois meios de comunicação é possível encontrar artigos, cartas de leitor,
artigos de opinião, notícias, reportagens, charges, tirinhas, ensaios, e-mails e tantos outros
textos que se adéquam às necessidades de que os escreve, apresentando finalidades
distintas e definidas. Assim são os gêneros, eles existem em grande quantidade justamente
porque as práticas comunicativas são dinâmicas e variáveis.

(Disponível em: <HTTPS://brasilescola.uol.com.br>. Acesso em: 7 jul. 2017. Adaptado)

Texto II
As reflexões teóricas sobre a noção de gênero do discurso (ou de texto, conforme a
perspectiva) têm sido ampliadas em vários campos de estudo e assumem especial
importância para a metodologia do ensino e da aprendizagem de língua portuguesa,
considerando os objetivos atualizados nas propostas curriculares contemporâneas.

(FURLANETTO, M.M. Gênero do discurso como componente do arquivo em Dominique Maingueneau. In: MEREU, A.B; BONINI, A; MOTTA-
ROTH, D. Gênero: teorias, métodos debates. São Paulo: Parábola, 2005. Adaptado).

Considerando os textos apresentados, avalie as afirmações a seguir.

I. Os gêneros textuais são formas relativamente estáveis de um enunciado,


determinadas sócio-historicamente.
II. Os gêneros textuais possuem características específicas, que dependem dos
usuários da linguagem e das necessidades em sua comunicação.
III. O leitor/produtor de textos é um usuário proficiente da linguagem à medida que
recorre aos gêneros textuais para, em diferentes situações comunicativas,
externalizar os sentidos dos textos que lê ou produz.

47
É correto o que se afirma em

a) I, II e III.
b) I, apenas.
c) II, apenas.
d) I e III, apenas.
e) II e III, apenas.

5. (ENADE)

Tanto a fala como a escrita se dão num contínuo de variações, surgindo daí
semelhanças e diferenças ao longo de dois contínuos sobrepostos, tal como ilustra
a figura a seguir.

Considerando o exposto, avalie as afirmações a seguir.

I. Ao comparar o texto de uma exposição acadêmica com o de uma conversação


espontânea, percebe-se que, embora os dois sejam representantes da linguagem
oral, o primeiro apresenta características muito próximas da linguagem escrita.
II. A proposta de perceber a fala e a escrita por meio de um contínuo reafirma a
necessidade de que sejam referendadas algumas dicotomias entre essas duas

48
modalidades, tais como: descontextualização (na fala) x contextualização (na
escrita), não planejamento (na fala) x planejamento (na escrita).
III. De acordo com o contínuo apresentado, está equivocada a perspectiva teórica
que considera a fala como dialogada e a escrita como monologada, já que o
diálogo e o monólogo correspondem a formas de textualização presentes nas
duas modalidades de língua.

É correto o que se afirma em

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) I e III, apenas.
d) II e III, apenas.
e) I, II e III.

6. (ENEM)

49
Os quadrinhos exemplificam que as Histórias em Quadrinhos constituem um gênero
textual:

a) Em que a imagem pouco contribui para facilitar a interpretação da mensagem


contida no texto, como pode ser constatado no primeiro quadrinho.
b) Cuja linguagem se caracteriza por ser rápida e clara, que facilita a compreensão,
como se percebe na fala do segundo quadrinho: “</DIV> </SPAN> <BR CLEAR =
ALL> < BR> <BR> <SCRIPT>”.
c) Em que o uso de letras com espessuras diversas está ligado a sentimentos
expressos pelos personagens, como pode ser percebido no último quadrinho.
d) Que possui em seu texto escrito características próximas a uma conversação face
a face, como pode ser percebido no segundo quadrinho.
e) Em que a localização casual dos balões nos quadrinhos expressa com clareza a
sucessão cronológica da história, como pode ser percebido no segundo
quadrinho.

7. (ENEM)
A DIVA

Vamos ao teatro, Maria José?


Quem me dera,
desmanchei em rosca quinze kilos de farinha,
tou podre. Outro dia a gente vamos.
Falou meio triste, culpada,
e um pouco alegre por recusar com orgulho.
TEATRO! Disse no espelho.
TEATRO! Mais alto, desgrenhada.
TEATRO! E os cacos voaram
sem nenhum aplauso.
Perfeita.

(PRADO, A. Oráculos de maio. São Paulo: Siciliano, 1999.)

Os diferentes gêneros textuais desempenham funções sociais diversas,


reconhecidas pelo leitor com base em suas características específicas, bem
como na situação comunicativa em que ele é produzido. Assim, o texto A diva

a) Narra um fato real vivido por Maria José.


b) Surpreende o leitor pelo seu efeito poético.
c) Relata uma experiência teatral profissional.

50
d) Descreve uma ação típica de uma mulher sonhadora.
e) Defende um ponto de vista relativo ao exercício teatral.

8. (FADESP - ADAPTADA) Leia o trecho seguinte.


“Os gêneros textuais surgem a partir da função específica de cada forma de
comunicação. Já os tipos textuais (tipologia) são as classificações dadas à estrutura
linguística padrão segundo a qual o texto é produzido.”

(Disponível em: https://bit.ly/34NQXOf. Acesso em: 07 jan. 2022)

A partir do texto e dos seus conhecimentos, é possível afirmar que Luiz Antônio
Marcuschi diferencia gêneros e tipos textuais, respectivamente, por critérios

a) Semânticos e sintáticos.
b) Linguísticos e estilísticos.
c) Estilísticos e sócio-comunicativos.
d) Sócio-comunicativos e linguísticos.
e) Estilísticos e semânticos.

51
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO UNIDADE

04
No campo da linguística aplicada, muitas pesquisas vêm se preocupando
com os processos de aquisição e de uso social da leitura e da escrita. Vários
estudiosos exploram como se processa a alfabetização e o letramento tanto na
língua materna quanto na língua estrangeira. Neste capítulo, conceitua-se, em
primeiro lugar, o que é alfabetização como uma prática de decodificar letras sem o
compromisso com as práticas sociais de leitura e de escrita. Em segundo lugar, é
apresentado o conceito de letramento como a apropriação das práticas de leitura
e de escrita para interpretar o mundo e ser um sujeito crítico atuante na sociedade.
Por último, são apontados alguns caminhos da prática de letramento na escola.

4.1 ALFABETIZAÇÃO

A alfabetização trata-se de um processo de aquisição da leitura e da língua


escrita. Para Hein (2016, p.4), “a alfabetização pode ser considerada o momento em
que se aprende a ler e a escrever”, quer dizer, esse processo tem conexão com o
aprendizado do código da língua e com o ensino das habilidades de leitura e de
escrita. Sendo assim, alfabetizado é o sujeito que aprendeu a decodificar sons e
letras, é apenas alguém que aprendeu a ler e a escrever. Um indivíduo, por exemplo,
é considerado alfabetizado se ele sabe ler e escrever um bilhete simples. Uma pessoa
que, no entanto, fosse apenas capaz de ler sílabas ou palavras isoladas não seria
considerada alfabetizada.

52
Atualmente, a alfabetização tem sido estudada sob vários prismas conforme
o campo profissional que investiga esse processo. Para Soares (2017), o processo de
alfabetização pode ser analisado sob a perspectiva psicológica, psicolinguística,
sociolinguística e linguística. O quadro 3 apresenta de uma maneira resumida cada
uma destas vertentes e suas respectivas características. Ainda que didaticamente
seja efetuada a divisão proposta no quadro 3, os estudos voltados para a
alfabetização estão exigindo a articulação entre as características a seguir
enfatizadas.

Quadro 3: Perspectivas da alfabetização


Perspectiva Características
Psicológica Estuda os processos psicológicos que são pré-requisitos para a
alfabetização assim como investiga como esses processos auxiliam
o sujeito na aquisição de leitura e de escrita
Psicolinguística Estuda como alguns problemas, maturidade linguística do aprendiz,
relação entre linguagem e memória X linguagem, influenciam no
processo de alfabetização
Sociolinguística Estuda como os usos sociais da língua podem influenciar no
processo de alfabetização. Averigua as diferenças dialetais e a
implicação delas na leitura e na escrita
Linguística Estuda o processo de transferência da sequência temporal da fala
para a sequência temporal da escrita
Fonte: Elaborado pela autora (2022)

A perspectiva psicológica, durante muito tempo, averiguou a interferência


entre os aspectos fisiológicos, neurológicos e psicológicos na alfabetização.
Conforme Soares (2017), como essa vertente relacionou inteligência e alfabetização,
a atribuição do sucesso ou do fracasso no processo de conquista das habilidades de
leitura e de escrita era associada ao Quociente de Inteligência (Q.I) de uma pessoa
e às disfunções neurais que um indivíduo poderia apresentar. Já a perspectiva
psicolinguística, além de perseguir os propósitos mostrados no quadro 3, examina a
interação entre a informação visual e não visual no processo de leitura e
compreende em qual intensidade a informação é apreendida quando uma criança
lê.

53
Figura 7: Criança sendo alfabetizada

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3whrrfs Acesso em: 22 jan. 2022.

A perspectiva sociolinguística verifica como uma diferença dialetal pode


afetar o processo de alfabetização. Isso ocorre, pois uma criança, ao adentrar uma
escola, “domina um determinado dialeto da língua oral” (SOARES, 2017, p. 22) que
pode estar mais perto ou mais longe da língua escrita ensinada e valorizada no
ambiente escolar. Essa situação tem impacto direto na alfabetização. Por fim, a
perspectiva linguística considera não haver uma correspondência perfeita entre o
sistema fonológico e o sistema ortográfico. Sendo assim a alfabetização é, por um
lado, um processo que relaciona o sistema fonológico e ortográfico, e, por outro, um
processo cognitivo utilizado pela criança para superar as barreiras de transferência
do sistema fonológico do dialeto oral para o ortográfico.

No processo de alfabetização, o professor adota algum método que, de


acordo com Soares (2016, p. 330), é “um conjunto de procedimentos que,
fundamentados em teorias e princípios, orientem a aprendizagem inicial de leitura e
da escrita, no que se refere à faceta linguística dessa aprendizagem”. Atualmente,
os debates sobre a melhor metodologia para fazer uma criança, pleno século XXI,
aprender a ler e a escrever são os mais intensos possíveis. Métodos mais ou menos
tradicionais coexistem e esse cenário ocorre, pois a escolha pela mais adequada

54
forma de alfabetizar tem vínculo com a concepção teórica adotada pela escola, a
qual determina as práticas pedagógicas a serem seguidas pelos docentes.

Os métodos de alfabetização são vários e são reunidos em dois grandes


grupos: sintético e analítico. O primeiro grupo abrange métodos com uma
perspectiva alfabética, ou silábica ou fônica e tenta estabelecer uma
correspondência entre o som e a grafia (escrita), entre o oral e o escrito. O segundo
grupo engloba métodos como a palavração, a sentenciação e o global. Este
método justifica a leitura como um ato global e audiovisual (audição e visão). Sendo
assim, na perspectiva analítica, toma como ponto de partida as unidades completas
de linguagem para depois analisá-las como unidades menores.
O método alfabético é o mais antigo de todos. A criança, em primeiro lugar,
aprende quais são as letras do alfabeto, logo em seguida, aprende as sílabas simples
para depois aprender as sílabas com três letras e, por fim, quais são os agrupamentos.
O professor ensina à criança todas as possíveis combinações para formar uma
palavra e, conforme Micotti (2012, p. 65), “a escrita gradua-se pela sequência: letras
isoladas, sílabas, palavras, frases curtas, textos”. Nesse método, a aprendizagem de
leitura e escrita segue uma sequência que vai desde a unidade mais elementar até
a mais complexa.
O método fônico ou fonético induz o aprendiz a achar a correspondência
entre fonemas (sons) e grafemas (grafias). O aluno primeiro aprende o som das letras
isoladamente. A ordem adotada pelo professor na apresentação das letras, nesse
método, é da mais simples (vogais) às mais complexas (consoantes). Depois disso, o
aluno aprender a reunir essas letras para formar sílabas que formam, posteriormente,
as palavras. Geralmente, o professor escolhe uma letra para trabalhar em sala e
apresenta uma palavra significativa com essa letra para fixar o conteúdo com o
aluno.
O método silábico é muito utilizado no ensino. Nele, o aluno aprende as sílabas
(ba, ca, da), resultantes da combinação entre consoantes e uma vogal, para depois

55
aprender a juntá-las com o intuito de formar palavras. O professor do ponto de vista
didático conta com a cópia, a leitura e o ditado das sílabas estudadas e das palavras
formadas. Segundo Micotti (2012, p. 67), no método silábico, “em cada lição, os
textos, em geral muito pequenos (quando não são substituídos por algumas
sentenças isoladas), restringem-se às palavras compostas pelas sílabas já estudadas”.
Essa situação impõe o uso de textos artificiais e distantes das vivências do aprendiz.
Após um breve resumo sobre os métodos sintéticos, é necessário refletir sobre
os métodos analíticos expostos resumidamente no esquema 5. Posteriormente, cada
um dos métodos é explicado.

Esquema 5: Métodos analíticos de alfabetização

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

No método de palavração, o ponto de referência é a palavra, sendo assim,


não há a necessidade de decompô-la em sílabas e letras, por exemplo. A criança
aprende as palavras e pode associá-las a imagens e a sons. Nesse método, é
importante que o aprendiz construa repertório antes de escrever frases ou pequenos
textos e é comum que o professor proponha atividades de memorização de palavras.
Por exemplo, o professor pode repetir a palavra cadeira e mostrar uma imagem de
cadeira para os alunos.
O método de sentenciação toma como referência a frase ou sentença. Nesse
sentido, o aluno compreende o significado da sentença inteiras para depois
entender partes mais elementares como as palavras, as sílabas e os sons. O professor

56
pode, a partir da fala das crianças, extrair sentenças simples, estimular a
memorização dessas frases, escrevê-las em papel e afixá-las na sala de aula. O
docente pode solicitar que as crianças ilustrem essas sentenças.
Por fim, o método global adota textos escritos que sejam interessantes,
possuem significado para a criança que está sendo alfabetizada e apresentam uma
sequência (começo, meio e fim). Nesse sentido, o aluno, ao analisar o todo, chega
às partes que o compõem (sentença e palavra). Esse método, também conhecido
como de historietas ou de contos, consiste em uma ampliação do método de
sentenciação, pois o aluno parte de historinhas para chegar às sentenças, palavras,
sílabas e letras.

4.2 LETRAMENTO

O termo letramento é uma adaptação do inglês literacy (letra – do latim littera,


e o sufixo –mento que significa ação), sendo mencionado pela primeira vez na
década de 1980 por Mary Kato em seu livro No mundo da escrita: uma perspectiva
psicolinguística, de 1986. De acordo com Soares (2007, p. 18), “letramento é, pois, o
resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a
condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-
se apropriado da escrita”. Por outras palavras, o indivíduo que se apropriou das
práticas de leitura e de escrita e faz uso destas para atuar criticamente na sociedade
em que vive é considerado letrado.

O processo de letramento ocorre desde o nascimento, quer dizer, quando o


indivíduo é inserido na cultura letrada, até o fim da vida do usuário da língua. Mesmo
que a criança ainda não saiba ler, ela já teve contato, a partir de seu círculo familiar,
com textos diversos, o que dá início ao seu letramento. Exemplo disso é quando a
criança formula e compreende historinhas “de faz de conta” ainda que não tenha

57
sido alfabetizada na escola. Na figura 8, vê-se uma criança que não tem idade para
estar alfabetizada, mas está inserida no mundo do letramento por meio de um livrinho
infantil colorido com textos e cheio de imagens.

Figura 8: Criança em processo de letramento

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/367lwyR Acesso em: 22 jan. 2022.

O letramento, como um processo contínuo, amplo e complexo, apresenta


vários aspectos. No esquema 6, são expostos alguns tipos de letramento aos quais os
usuários da língua estão expostos no decorrer da vida deles. Assim, como ocorrem
com os gêneros (capítulo 3), os tipos de letramento são múltiplos, pois são suscetíveis
às diversas situações da vivência do falante da língua.

Esquema 6: Letramento

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

O letramento científico tem relação com o entendimento e com a aplicação


dos conhecimentos científicos na vida cotidiana. Por exemplo, a pessoa letrada
cientificamente sabe que não é seguro ascender um fósforo dentro de um posto de
gasolina (um líquido inflamável), pois há risco de acidente grave. Já o letramento
matemático diz respeito à compreensão do uso da matemática na vida cidadã e

58
prática do indivíduo. Um indivíduo letrado matematicamente consegue calcular
quais são os juros aplicados sob o valor à vista de um tênis.
O letramento linguístico diz respeito à utilização de conhecimentos da língua
e da linguagem para interpretar, ler e escrever textos enquanto o letramento literário
diz respeito à apropriação da literatura como uma linguagem subjetiva. Por exemplo,
uma pessoa que consegue interpretar e escrever poemas, bilhetes e e-mails é
considerada letrada. O letramento acadêmico considera os conhecimentos
adquiridos no âmbito escolar e como esses conhecimentos podem se somar às
questões sociais. Por exemplo, alguém pode, a partir de conhecimentos sobre a
transmissão de vírus Sars-Cov2, prevenir o seu contato com o agente infeccioso,
usando máscaras e álcool em gel. Por fim, o letramento digital tem relação com o
uso proficiente de recursos digitais e como estes impactam na vida em sociedade.
O conceito de letramento pode ser interpretado a partir de duas dimensões:
a individual e a social. A dimensão individual prevê o letramento como um atributo
pessoal enquanto a dimensão social sugere o letramento como um fenômeno
cultural, “um conjunto de atividades sociais que envolvem a língua escrita, e de
exigências sociais de uso da língua escrita” (SOARES, 2007, p. 66). O sujeito, ao se
apropriar dessas dimensões, ocupa um lugar diferenciado na sociedade, como
profissional, como cidadão e como consumidor de bens culturais.
O letramento individual considera o desenvolvimento de habilidades
cognitivas (capacidade de adquirir conhecimento) e metacognitivas
(conhecimento que o indivíduo possui dos próprios produtos cognitivos) de escrita e
leitura, visto que alguém só pode ser considerado letrado se possui habilidade de ler
e escrever quaisquer categorias de texto para diferentes situações sociais. O
letramento social diz respeito ao que as pessoas fazem socialmente com as
habilidades de leitura e de escrita adquiridas. Essa dimensão letramento trata-se de
uma arma utilizada para responder às exigências sociais e é um meio para a
mudança social ao promover a consciência crítica frente às contradições sociais.
O letramento é um direito do ser humano e, para que aquele se efetive, são
necessárias algumas condições, conforme Soares (2007). A primeira condição diz
respeito ao direito à escolarização eficaz. Isso implica afirmar que as pessoas
precisam sair da escola sabendo ler e escrever para atender às diversificadas
demandas sociais. A segunda condição é a de haver material de leitura disponível
para a população. Para Soares (2007, p. 58), haveria um problema em relação à

59
manutenção da cultura letrada, pois, no país, “não há material impresso posto à
disposição, não há livrarias, o preço dos livros e até dos jornais e revistas é inacessível,
há um número muito pequeno de bibliotecas”. Atualmente, alguns estudiosos podem
creditar a essa argumentação certa fragilidade frente a um contigente interessante
de materiais de leitura disponibilizados gratuitamente on-line. No entanto, o fato de
terem vários livros dispostos na web não significa que a população em sua totalidade
tenha acesso à internet para lê-los, por exemplo. Há inúmeras pessoas no país à
margem da tecnologia digital por várias dificuldades de acesso e de infraestrutura.
A medição do letramento ocorre por meio de contexto escolar, censo
demográfico nacional e pesquisa em amostragem. Mesmo com essas tentativas de
observar o letramento, há falhas na metodologia adotada. Como o letramento, no
sistema escolar, é um processo e uma finalidade, é a escola que possui meios para
mensurá-los de forma gradual e contínua. Os testes aplicados, no entanto, para
medir o letramento, são padronizados e não atendem à necessidade de um
letramento multifacetado.
Os censos querem colocar a análise do letramento sob uma perspectiva
única, o que é um equívoco, pois as variáveis do letramento são sensíveis e contínuas.
Além disso, na ocasião do censo, as pessoas ficam intimidadas pela figura do
recenseador que possui como referência as informações prestadas pelo
entrevistado. No censo, uma única pessoa da casa pode responder para todos que
possuem graus de letramento bem diferentes por serem indivíduos diferentes.

Figura 9: Censo demográfico

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3thr1Uu Acesso em: 22 jan. 2022.

Por fim, o teste de amostragem seria um bom parâmetro para aferir o


letramento, pois permite avaliar tanto o letramento individual quanto o social. Além
dessa vantagem, segundo Soares (2007),

60
As pesquisas de letramento por amostragem fornecem dados não
apenas para a estimativa dos níveis de letramento, mas também, e
sobretudo, para a formulação de políticas educacionais e a
implementação de programas de alfabetização e de letramento
(SOARES, 2007, p. 105).

Este cenário reforça a relevância do método para medir o grau de letramento


funcional da população além de buscar aferir as verdadeiras e eficazes práticas de
leitura e de escrita do sujeito inserido na sociedade. Esse método é bastante utilizado
em países em que a população já atingiu um grau satisfatório de letramento básico.

4.3 PRÁTICAS DE LETRAMENTO NA ESCOLA

Atualmente, a abordagem em torno do letramento vem ganhando força no


campo de ensino de linguagens e seus códigos no ambiente escolar. Se, outrora, o
foco era exclusivamente a alfabetização, hoje, a escola, ciente de que o aluno
precisa se apropriar e fazer o uso de leitura e de escrita, investe também na prática
do letramento para que o estudante torne-se um cidadão crítico socialmente. Aliás,
a associação entre o processo de alfabetização e de letramento é o caminho mais
viável para a transformação social do educando para uma vida em sociedade
crítica, ética e autônoma.
Ancorado por documentos oficiais, por exemplo, os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o ensino deve voltar-
se para a educação linguística calcada no estudo de textos. Estes são o ponto de
partida para a construção do letramento social, visto que cada vez menos o
letramento individual interessa à nova escola que vem se constituindo. Esses textos
são percebidos sob o formato de gêneros como práticas discursivas, espaços para
a interação entre os sujeitos envolvidos no processo de letramento, como constructo
social e histórico. Os textos necessitam atender às demandas do grupo de alunos os
quais são heterogêneos e estão inseridos em grupos sociais e cotidianos variados.
Essa noção rompe, assim, com uma idealização de alunado homogêneo,

61
deslocado do seu tempo e do seu espaço.
A prática de escrita precisa ser situada com o intuito de atender às
necessidades de letramento fora do ambiente escolar. No cotidiano, o indivíduo vai
acionar a escrita para atender às heterogêneas situações de comunicação. Por
exemplo, alguém que vai dar uma festa de aniversário precisa escrever convites
eletrônicos para enviar aos seus convidados via mensagem de whatsapp. Assim
sendo, o usuário da língua precisa não apenas ser alfabetizado como também
necessita se apropriar das características dos gêneros convite e mensagem via
aplicativo. Cabe nesse caso, preparar o aluno não somente para lidar com a escrita
de gêneros “de instituições de prestígio na sociedade” (KLEIMAN, 2005, p. 27), mas
também prepará-lo para a produção de textos que atendam às situações
corriqueiras de comunicação.

Por fim, na prática escolar, o letramento deve se voltar para o acesso e o uso
de novas linguagens típicas das novas tecnologias digitais. Sendo assim, faz
necessária a inclusão de gêneros que pertençam a esse universo, como blog, vlog,
twitter, posts, fanfics, já que o aluno está inserido em um mundo tecnológico. Nesta
nova era, emergem textos multissemióticos ou multimodais, caracterizados pela
convergência de diferentes modos de representação (imagem, cores, músicas,
língua escrita e língua falada).

62
FIXANDO O CONTEÚDO

1. (ENADE)
Um olhar histórico sobre a alfabetização escolar no Brasil revela uma trajetória de
sucessivas mudanças conceituais e, consequentemente, metodológicas. Atualmente,
parece que, de novo, estamos enfrentando um desses momentos de mudança – é o que
prenuncia o questionamento a que vêm sendo submetidos os quadros conceituais e as
práticas deles, decorrentes que prevaleceram na área da alfabetização nas últimas três
décadas. Pesquisas têm identificado problemas nos processos e nos resultados da
alfabetização de crianças no contexto escolar, além de insatisfações e inseguranças
entre alfabetizadores, motivando propostas de reexame das teorias e práticas atuais de
alfabetização. Um momento como este é, sem dúvida, desafiador, porque estimula a
revisão dos caminhos já trilhados e a busca de novos caminhos, mas é também
ameaçador, porque pode conduzir a uma rejeição simplista dos caminhos trilhados.

(Fonte: Adaptado de: SOARES, M. Alfabetização e letramento: caminhos e descaminhos. Pátio Revista Pedagógica. Porto Alegre: Artes
Médicas Sul, 2004.)

Nesse contexto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

I. A criança constrói o seu conhecimento do sistema alfabético e ortográfico da


língua escrita em situações de letramento, isto é, na interação com o material
escrito real e não, artificialmente construído.

PORQUE

II. As práticas sociais envolvem a criança no contexto do processo de aquisição do


sistema alfabético e ortográfico da escrita, o que favorece o desenvolvimento de
habilidades e comportamentos de uso competente da língua escrita.

A respeito dessas asserções, assinale a opção correta:

a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da


I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa
correta da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

63
2. (ENADE - ADAPTADA)
O conceito de letramento é muito difícil de ser especificado, porque remete tanto a um
estado que acede um sujeito quanto às habilidades deste mesmo sujeito de movimentar-
se num mundo povoado de textos, tanto como leitor quanto como autor de novos textos
a enriquecer o patrimônio de enunciados concretos disponível em diferentes esferas da
comunicação social de uma dada sociedade. Ainda que o conceito teórico não se limite
aos processos de iniciação ao mundo da escrita, é particularmente estes processos de
iniciação que têm sido aplicados por nós, como se “letramento” fosse o nome a se dar à
iniciação dos sujeitos sociais num mundo a que, por este processo, passaria a ter acesso.
Uma escola, qualquer que seja a escola, não poderia adotar níveis de letramento distintos
para sujeitos sociais distintos, trabalhando para que alguns apenas cheguem a “respostas
adequadas” ao seu contexto e levando outros a um letramento que lhes permita
compreender as relações sociais, aprofundá-las ou trabalhar para modificá-las de forma
crítica. Uma escola jamais poderá pôr como seus objetivos “respostas adequadas”, mas,
sim, respostas críticas e, para chegar ao nível da crítica, é preciso definir-se como lugar de
ensino-aprendizagem não da totalidade dos campos das atividades humanas (e,
portanto, introdutora dos sujeitos sociais a todos os gêneros de discurso), mas de áreas
socialmente privilegiadas que levem à constituição de sujeitos sociais críticos e
eticamente responsáveis, no sentido de responsabilidade tal como cunhado por Bakhtin
(2010): não uma responsabilidade moral para consigo mesmo, mas uma responsabilidade
ética fundante da relação com a alteridade.

(GERALDI, J. W. A produção dos diferentes letramentos. Bakhtiniana, São Paulo, v. 9, n. 2, p. 25-34, 2014. Adaptado).

Com base no texto acima, avalie as afirmações a seguir.

I. O letramento remete a um estado em que o sujeito é o produtor de enunciados


nas diferentes esferas da comunicação e das relações sociais de uma sociedade.
II. Os processos de iniciação ao mundo da escrita caracterizam o letramento, sendo
fundamental ao ensino de todos os gêneros discursivos e textuais na escola.
III. O autor do texto compreende o processo de letramento na perspectiva da
formação de sujeitos críticos e eticamente responsáveis, não apenas com sua
individualidade, mas com a responsabilidade ética fundante da relação do Eu
com o Outro.
IV. No âmbito escolar, os processos de letramento devem ser direcionados para que
os estudantes alcancem as respostas adequadas ao seu contexto e,
posteriormente, compreendam, de forma crítica, as relações sociais.

É correto apenas o que se afirma em:

a) I e II.
b) I e III.
c) III e IV.

64
d) I, II e IV.
e) II, III e IV.

3. (ENADE)
Com base em estudos recentes, podemos afirmar que alfabetização e letramento
são processos construídos independentemente um do outro, de modo que cada
um deles deve ser assumido em sua particularidade e de forma independente,
especialmente
PORQUE

O processo motor da escrita na criança não é o mesmo que o do processo


cognitivo da leitura, sendo que ambos os processos se dão por acumulação de
informação, pela imitação de destrezas e habilidades repetitivas e em um saber
enciclopédico.

Acerca desse enunciado, assinale a opção correta.

a) As duas asserções são proposições verdadeiras, e a segunda é uma justificativa


correta da primeira.
b) As duas asserções são proposições verdadeiras, mas a segunda não é uma
justificativa correta da primeira.
c) A primeira asserção é uma proposição verdadeira, e a segunda é uma
proposição falsa.
d) A primeira asserção é uma proposição falsa, e a segunda é uma proposição
verdadeira.
e) Tanto a primeira como a segunda asserção são proposições falsas.

4. (UNESC - ADAPTADA) Magda Soares define letramento como “a participação em


eventos variados de leitura e de escrita, e o consequente desenvolvimento de
habilidades de uso da leitura nas práticas sociais que envolvem a língua escrita.”
(SOARES, 2003, p. 16).

Nesse contexto, são considerados conhecimentos específicos do processo de


letramento:

65
a) A convivência do aluno com muitos materiais escritos.
b) A leitura e escrita de letras, sílabas e palavras.
c) A aprendizagem das letras e sílabas.
d) A orientação sistemática da leitura e da escrita.
e) Respeito às variantes linguísticas dos estudantes.

5. (UNESC) No que concerne ao conceito de alfabetização, Magda Soares a define


como o “processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e de
escrita.” (SOARES, 1985, p. 20).

Nesse contexto podemos entender o conceito de alfabetização como:

I. O processo de apropriação do sistema de escrita.


II. O processo de inserção e participação na cultura escrita.
III. As manifestações da escrita na sociedade que se prolonga por toda vida.
IV. Sinônimo de letramento.
V. Contrário de letramento.

Analisando os itens acima, assinale a opção que contém somente as afirmações


corretas.

a) Somente I e III.
b) Somente I, Ill e V.
c) Somente a I.
d) Somente a II.
e) Somente I, Il e IV.

6. (EDUCA) “É uma palavra que tem conceito recente, introduzido na linguagem da


educação e das ciências linguísticas há pouco mais de duas décadas. Seu
surgimento pode ser interpretado como decorrência da necessidade de
configurar e nomear comportamentos e práticas sociais na área da leitura e da
escrita que ultrapassem o domínio do sistema alfabético e ortográfico, nível de
aprendizagem da língua escrita perseguido, tradicionalmente, pelo processo de

66
alfabetização”.

A concepção faz referência à(ao):

a) Aprendizagem significativa.
b) Alfabetização.
c) Linguagem.
d) Letramento.
e) Expressividade.

7. (EDUCA) Sobre o processo de alfabetização e letramento, assinale:

(1) Alfabetização.
(2) Letramento.

( ) É o processo de ensino e aprendizagem de um sistema linguístico e da forma


como usá-lo para se comunicar com a sociedade.
( ) É o desenvolvimento do uso competente da leitura e escrita nas práticas sociais.
( ) É o sujeito que sabe ler e escrever.
( ) É saber usar a leitura e a escrita de acordo com as demandas sociais.
( ) Organiza discurso, interpretação e compreensão de textos e reflexão.
( ) Codifica e decodifica a escrita e os números.
( ) É o estado que um indivíduo ou grupo social alcança depois de se familiarizar
com a escrita e a leitura, possuindo uma maior experiência para desenvolver as
práticas do seu uso nos mais diversos contextos sociais.

A sequência correta é:

a) 2 - 2 - 1 – 2 – 2 – 1 – 2.
b) 1 - 2 - 1 – 2 – 2 – 1 – 2.
c) 1 - 2 - 1 – 2 – 2 – 1 – 1.
d) 1 - 1 - 1 – 2 – 2 – 1 – 2.
e) 1 - 2 - 1 – 1 – 2 – 1 – 2.

67
8. (AMAUC) Uma professora do Primeiro Ano do Ensino Fundamental está em
dúvidas quanto ao uso de estratégias pedagógicas que possam auxiliar seus
alunos lerem e escrever de forma segura e autônoma.
Nesta direção, buscando auxiliá-la nesta reflexão, leia as alternativas que se
referem à leitura e escrita no contexto escolar e assinale (V) para a afirmativa
Verdadeira e (F) para a afirmativa Falsa:

( ) No processo de alfabetização devemos separar os alunos que aprendem


daqueles que não conseguem aprender, esta atitude deve ser tomada para não
atrasar a execução das atividades nem dificultar o aprendizado de toda a turma.
( ) É fundamental que a professora ofereça diversas experiências pedagógicas
aos alunos: acesso a diversos livros, jornais, revistas, diferentes jogos e brincadeiras
onde a leitura e escrita sejam exercitadas de várias formas e sob várias
perspectivas.
( ) É fundamental que a professora alfabetize na perspectiva do letramento, ou
seja, traga para a sala de aula estratégias pedagógicas que estejam dentro de
um contexto de práticas sociais da leitura e da escrita.
( ) A professora deve investir em atividades de cópia e leitura de sílabas simples e
posteriormente sílabas complexas. Partir das partes para o todo é essencial para
alfabetizar com segurança e qualidade, respeitando o ritmo e desenvolvimento
dos alunos.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta de cima para baixo:

a) V –F – F – V
b) F – F – V – V
c) F – V – F – F
d) V – V – F – V
e) F – V – V – F

68
LINGUÍSTICA APLICADA E ENSINO UNIDADE
DE LÍNGUA MATERNA

05
Neste capítulo, faz-se uma reflexão sobre o ensino de língua portuguesa. Em
primeiro lugar, é debatida a gramática normativa como um parâmetro que foi,
durante muito tempo, norteador do ensino de língua materna, mas que hoje perdeu
espaço para uma abordagem voltada para o uso. Em segundo lugar, há, no
capítulo, a discussão sobre o ensino atual da língua portuguesa calcado em estudo
dos textos. Por fim, as diversas concepções de avaliação são apresentadas com o
intuito de ponderar qual é a mais articulada com os propósitos de ensino
contemporâneo.

5.1 O ENSINO DE GRAMÁTICA EM USO

Durante muito tempo, o ensino de língua portuguesa, que passou a fazer parte
do currículo brasileiro somente no final do século XIX, era voltado para o ensino da
norma culta e das regras gramaticais. Sendo assim, o principal foco era a gramática
tradicional, cujo objetivo era instituir parâmetros normativos para que os alunos
lessem e escrevessem bem. Essa concepção é, hoje, insuficiente e muito criticada,
pois as regras não são capazes de suprir as dificuldades de interpretação e de
produção de texto. Outra crítica que se faz ao ensino da GT diz respeito aos exemplos
(sentenças) descontextualizados e com pouca relação com o cotidiano do aluno.
Atualmente, o ensino de língua pautado no ensino de Gramática Tradicional
vem sendo revisado e dando lugar às práticas discursivas relacionadas à oralidade,
à escrita e à leitura. Se na concepção de ensino essencialmente gramatical a língua
era tomada como um sistema inflexível e invariável, nos estudos linguísticos atuais, a
língua deve ser considerada em uso. Os exemplos forjados de outrora dão lugar
àqueles contextualizados e circulantes em textos veiculados na sociedade. A
gramática escolhida para ser trabalhada hoje na escola é a em funcionamento e
relacionada às práticas de linguagem.
A gramática em uso, contemporaneamente escolhida para ser trabalhada
em sala de aula, não prescreve regras. Estas são consideradas variáveis, pois a língua

69
é heterogênea e dinâmica. Essa concepção de gramática se ancora na análise de
textos de gêneros diversos, analisados em sua integralidade e não como meros
pretextos para o estudo puramente gramatical. As regras constantes na gramática
são baseadas no uso e na gramática internalizada que o sujeito traz para a sala de
aula. Esse indivíduo, assim, é considerado um sabedor das regras gramaticais.
A gramática de uso tem no texto a sua manifestação (pois é nele que se usa
a língua). Sendo assim, é emergencial refletir sobre como seria uma tarefa de língua
portuguesa em que a gramática é contextualizada. No site da Revista Nova Escola,
consta um plano de aula em que o tópico gramatical Concordância Verbal é
abordado à luz do gênero discursivo anúncio publicitário. A prática de linguagem
envolvida é a de análise linguística e análise semiótica.
O professor deve solicitar que os alunos produzam anúncios publicitários,
prestando a atenção na concordância. A dificuldade prevista pelo docente na
realização da atividade é a de os alunos não conseguirem realizar as concordâncias
verbais nos anúncios publicitários. O material disponibilizado para a produção dos
textos é o caderno, lápis, cartolina, revistas, jornais e canetinhas.
O primeiro passo é apresentar um anúncio para os alunos e perguntar a eles
em que locais o texto costuma circular, com qual intenção, quem são os produtores
e os leitores de anúncios. O segundo é perguntar aos alunos se há algum desvio de
concordância no anúncio (figura 10).

Figura 10: Anúncio publicitário

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3MWTGWB Acesso em: 22 jan. 2022.

Logo após, o professor deve dividir os alunos em grupo e pedir a eles que
planejem anúncios sobre a importância de se frequentar a escola. Os estudantes

70
precisam pensar em um título chamativo e interessante e precisam usar expressões
como “a maioria de”, “a maior parte de” e “grande parte de”. Ao final, os alunos
devem apresentar os cartazes e comentar os casos de concordância verbal nos
anúncios dos colegas.

5.2 O ENSINO ATUAL DE LÍNGUA MATERNA

Desde a emergência dos estudos voltados para o letramento, para o gênero


discursivo e para a importância dos textos, o ensino de língua portuguesa mudou
significativamente. Se antes a gramática normativa era o objeto de estudo,
atualmente, o texto tornou-se o centro de interesse dos docentes. Sendo assim, o
texto é o objeto norteador das atividades propostas e do planejamento de aula. Esse
plano deve capacitar alunos para serem produtores independentes de textos de
diferentes gêneros, leitores críticos e para terem repertório sócio-cultural satisfatório
em língua portuguesa e sua respectiva literatura.
Ao se deslocar o foco do ensino da gramática para o estudo dos textos,
prevalece a dimensão da língua e de gêneros em uso. Para Battisti e Silva (2017 p.
74), “o eixo que norteia a preparação da aula se torna o uso-reflexão-uso”. Deste
modo, a aula de leitura trabalha com as condições de produção de texto: quem
produziu, em qual momento sócio-histórico, com que intenção, para qual leitor, com
qual nível de linguagem e em, qual forma relativamente estável de texto. Já a aula
de produção de texto aproveita desses conhecimentos para habilitar o estudante a
produzir seus textos, considerando essas condições textuais.
O trabalho de escrita de gêneros diversos é minucioso e apresenta várias
etapas. Nesse processo, é natural que haja a refacção ou a reescrita, a qual gera
inúmeras versões textuais até que o texto esteja satisfatório (o texto nunca está
pronto). Consoante os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), a refacção é um
processo mediado pelo professor que é responsável, simultaneamente, por induzir a
reflexão sobre os mecanismos linguístico-discursivos usados no texto produzido pelo

71
aluno e pelo ensino de técnicas de revisão textual tais como rasurar, substituir e
desprezar trechos.

O ensino de língua portuguesa também precisa considerar, atualmente, os


gêneros orais. Nesse âmbito, o trabalho docente é relacionado à preparação de
esquemas orais uma exposição, “elaboração de roteiros para a realização de
entrevistas ou encenação de jogos dramáticos improvisados” (PCN, 1998, p. 75),
memorização de textos dramáticos e declamação de textos poéticos. Na nova
dimensão do ensino de língua portuguesa, os gêneros orais são tão valorizados
quanto os gêneros escritos.
Aliás, em relação ao professor, este tem o papel de identificar os múltiplos
aspectos envolvidos na produção textual para assim propor a escrita, sempre
assumindo o papel de revisor e de leitor crítico dos textos produzidos. É tarefa do
docente ajudar o seu aluno a produzir, com o aporte da reescrita, produções textuais
cada vez mais interessantes. Segundo Battisti e Silva (2017), é tarefa do professor,
nesta nova organização do ensino de língua portuguesa, divulgar os trabalhos dos
alunos para que estes participem socialmente por meio de suas produções e possam
interagir com os seus leitores.
No que tange à avaliação, a escola deve priorizar a união entre a abordagem
de ensino, o planejamento das aulas e o material didático. A avaliação deve ser,
dessa forma, processual, configurar um ponto de partida para mensurar o que os
alunos realmente aprenderam e em quais momentos do processo de ensino-
aprendizagem é necessário revisar teorias e metodologias. Nas aulas de língua
portuguesa, as avaliações não se resumem a atividades mecânicas de memorização
de regras gramaticais apenas, mas também focalizam a atenção no texto escrito e
oral. A gramática deve ser avaliada em funcionamento na língua e de forma
textualmente contextualizada.
Em resumo, no que tange à linguística aplicada, o estudo dos gêneros nas
aulas de língua (não somente materna) ganhou força com a instituição dos
Parâmetros Curriculares Nacionais como documento norteador da prática docente.

72
Para Fiorin (2006, p. 60), esses parâmetros ou PCNs “(...) estabeleceram que o ensino
de português fosse feito com base nos gêneros”. Essa visão volta-se mais para a
produção e recepção de textos de diferentes gêneros e propõe um ensino menos
voltado para os aspectos normativos da língua. Nesse sentido, é de suma importância
que o aluno tenha contato com o máximo de diversidade de gêneros que circulam
socialmente. O trabalho na escola deve ser sistemático e deve contar sempre com
a retomada, o aprofundamento e a ampliação das características básicas com os
gêneros, respeitando o grau de maturidade dos alunos para a compreensão desses
textos.

5.3 CONCEPÇÕES DE AVALIAÇÃO

Refletir sobre as variadas formas de avaliação exige que se faça, em primeira


instância, uma discussão sobre o que é aprendizagem. Um estudioso dessa área foi
o psicólogo e pedagogo norte-americano Benjamim Samuel Bloom. Este refletiu
sobre o processo de aprendizagem a partir do ponto de vista psicológico e criou, em
1956, a taxionomia de Bloom, um sistema de classificação para definir diferentes
níveis da cognição. Segundo esse psicólogo, a aprendizagem é dividida em três
domínios como mostra o esquema 7.

Esquema 7: Domínios de aprendizagem

Fonte: Elaborado pela autora (2022)

O primeiro domínio (cognitivo) diz respeito à aprendizagem e ao


desenvolvimento intelectual. As categorias importantes nesse domínio são:
conhecimento, compreensão, aplicação, análise, síntese e avaliação. O segundo
domínio (afetivo) é ligado aos sentimentos, às emoções e à afetividade. As
categorias são receptividade, resposta, valorização, organização. O terceiro domínio

73
(psicomotor) é atrelado às habilidades físicas, reflexões e percepção. As categorias
desse domínio são a imitação, a manipulação, a articulação e a naturalização.
A noção de como um estudante aprende traz subsídio para a discussão sobre
o processo avaliativo. A avaliação é uma forma de repensar a prática pedagógica,
acompanhar a aprendizagem do aluno e contribuir para melhores condições de
ensino-aprendizagem. No que concerne a esse processo, a avaliação é dividida em
diagnóstica, formativa e somativa. Cada uma delas é organizada de tal maneira que
apresenta métodos e instrumentos para que se efetivem. Na figura 11, essas
avaliações são resumidamente caracterizadas.

Figura 11: Tipos de avaliação

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3JiC99n. Acesso em: 22 jan. 2022.

A avaliação diagnóstica é um instrumento muito utilizado nas escolas, pois, ao


ser realizada no início do ano letivo, permite ao corpo docente aferir quais os
conteúdos do ano anterior foram assimilados e quais precisam ser revisados para que
todos os alunos sejam nivelados. Segundo Guimarães (2017, p. 62), quanto à
avaliação diagnóstica “o aspecto preventivo é uma das suas principais
características”, exatamente, porque, por meio dela, ser possível prever as
dificuldades dos alunos e tentar resolvê-las ao longo do ano letivo corrente. A
avaliação diagnóstica se processa por meio de instrumentos como autoavaliação,
testes, provas, trabalhos em grupo, consulta ao histórico escolar individual e do grupo,

74
produção de texto, dentre outros.

A avaliação formativa é realizada de forma contínua na escola e visa à coleta


de informações sobre o processo de ensino e de aprendizagem, com a intenção de
o professor revisar as estratégias e as metodologias utilizadas e promover “a
qualificação de aprendizagem dos alunos” (GUIMARÃES, 2017, p.80). A partir da
avaliação formativa, o docente pode mensurar em quais aspectos avançar ou
regredir. Como essa avaliação é contínua, ela pode ocorrer por meio de
observações e anotações do professor sobre o desempenho do aluno, portfólios,
testes, provas, relatórios, escrita de gêneros discursivos diversos e leitura. Essas ações
permitem que o professor faça adaptações em seu programa de ensino

O professor, ao longo da avaliação formativa, deve, nas aulas de Língua


Portuguesa, observar se os alunos são leitores independentes de textos, se os
alunos atribuem sentido aos textos orais e escritos os quais são expostos e se
adotam uma postura crítica diante deles, se produzem textos de diferentes
gêneros, considerando as especificidades deles. É tarefa do professor de
língua materna, durante a avaliação formativa, averiguar se os alunos
escrevem textos coerentes, coesos e de acordo com os padrões da língua
escrita e se os estudantes são aptos a serem os próprios revisores de sua
produção textual.

75
A avaliação somativa ou classificatória, diferentemente da diagnóstica,
ocorre no final do processo educativo. Essa avaliação faz um “balanço” sobre o que
se aprendeu durante o ano letivo. Além disso, a avaliação somativa objetiva
selecionar aqueles aptos ou não para avançar para outra etapa, ou seja, para
Guimarães (2017, p. 64), “por essa avaliação, os alunos são aprovados ou reprovados
para o ano, série ou ciclo seguinte”. Por outras palavras, se o aluno alcançou os
objetivos propostos pelo professor e pela escola, então, ele está aprovado, caso não
tenha atingido os objetivos, logo, é reprovado e precisa estudar novamente os
conteúdos daquela série. A somativa tem caráter definitivo, por exemplo, a
reprovação de um aluno é irreversível bem como a sua aprovação.

76
FIXANDO O CONTEÚDO

1. (INSTITUTO UNIFIL) A avaliação diagnóstica tem por objetivo

a) Fazer uma sondagem, projeção e retrospecção da situação de desenvolvimento


do aluno, dando-lhe elementos para verificar o que aprendeu e como aprendeu,
fazendo as intervenções necessárias.
b) Verificar o que o aluno aprendeu e não desafiá-lo a se desenvolver.
c) Verificar o que o aluno não aprendeu no ano anterior, assim facilita a possível
retenção no ano seguinte.
d) Fazer uma sondagem, projeção e retrospecção da situação de desenvolvimento
do aluno, não lhe oferecendo elementos para verificar o que aprendeu e como
aprendeu.
e) Verificar em que medida os conhecimentos anteriores ocorreram e não interferir
no desenvolvimento do aluno.

2. (AEVSF/FACAPE)
Avaliação educacional é um ato eminentemente político, pois sempre está alicerçado e
a serviço de um modelo de sociedade. O que denota constantes reflexões política-
pedagógica sobre a avaliação do ensino-aprendizagem, em uma perspectiva
emancipadora e numa visão pedagógica libertadora e epistemológica sócio-histórica
que se concretiza numa dinâmica avaliativa mediadora do processo de desconstrução
e reconstrução da práxis pedagógica.

(Disponível em: https://bit.ly/3ibvphs Acesso em: 21 nov. 2021.)

Nessa linha de pensamento, a avaliação da aprendizagem ancorada numa


perspectiva formativa reguladora apresenta as seguintes características básicas:

I. A natureza classificatória, diversidade de instrumentos rígidos e intencionalidade


política.
II. Instrucionista, hierarquização do conhecimento e quantificação do saber
adquirido pelo aluno.
III. Atenção à eficácia, à quantificação dos dados para classificação do aluno.
IV. A natureza processual, a diversidade de instrumento e a intencionalidade
educativa.
V. A natureza seletiva, competitividade e cumulativa.

77
É correto o que se afirma em:

a) III, apenas.
b) II, apenas.
c) I, apenas.
d) IV, apenas.
e) V, apenas.

3. (CEV-URCA) Em relação aos tipos de avaliação da aprendizagem, analise:

I. Avaliação diagnóstica - O propósito da avaliação é identificar ou verificar os


conteúdos e o conhecimento dos estudantes para melhorar o ensino-
aprendizagem.
II. Avaliação somativa - As notas e os conceitos são atribuídos a fim de promover o
aluno para outra classe ou curso. É, geralmente, aplicada no bimestre ou
semestre.
III. Avaliação cumulativa - Essa avaliação é aquela voltada à retenção dos
conhecimentos repassados em sala de aula. O professor trabalha junto com o
aluno e o acompanha em seu dia a dia.
IV. Avaliação formativa - Seu objetivo é identificar se as propostas do professor são
alcançadas no processo de ensino-aprendizagem.

a) II e III estão incorretas


b) II está incorreta
c) I e IV estão incorretas
d) I está incorreta
e) Todas estão corretas

4. (PS CONCURSOS) Ao se tratar de avaliação, podemos aqui citar a avaliação


mediadora a qual se desenvolve em benefício do educando e acontece quando
o diálogo é estabelecido entre quem educa e quem é educado. Com respeito a
esta concepção de avaliação, leia os itens abaixo:

I. Cabe ao professor afirmar que o ato de examinar é uma das etapas do ato de

78
avaliar disciplinarmente o aluno.
II. Cabe o professor informar, através do diálogo, o processo de aprendizagem do
seu aluno.
III. O diálogo pode vir em forma de conversas, de comentários escritos nos trabalhos
dos alunos ou ainda nos relatórios.
IV. Cabe ao professor alimentar um debate inicial a respeito da avaliação
classificatória.

Assinale a alternativa correta:

a) Todos os itens estão corretos


b) Nenhum item está correto
c) Apenas o item I está incorreto
d) Apenas o item IV está correto
e) Apenas os itens II e III estão corretos

5. (CPCON UEPB - ADAPTADA) Partindo do princípio de que as práticas discursivas de


leitura e escrita são fenômenos sociais que ultrapassam os limites da escola, pode-
se afirmar que

I. O trabalho de leitura e produção de textos deve ser baseado, apenas, na


decifração e transcrição de signos linguísticos.
II. Leitura e produção de textos é construção de significado e atribuição de sentidos
mediante, não apenas, os elementos linguísticos.
III. A leitura e a escrita são atividades dialógicas e a imagem mútua dos
interlocutores é um elemento crucial para os processos que se realizam na
interlocução.

Está correto o que se afirma apenas em

a) I.
b) III.
c) I e II.
d) I e III.

79
e) II e III.

6. (CPCON UEPB) O ensino de Língua/linguagem tem como função social:

( ) Garantir a todos os alunos o acesso aos saberes linguísticos necessários para a


participação social e o efetivo exercício da cidadania.
( ) Avaliar o discurso didático do professor como transmissor de saberes a um
grupo, institucionalmente definido.
( ) Constatar que a questão linguística vai além de constituir um rol de palavras e
regras; pois entra no terreno do social, do cultural, do político, do simbólico e de
suas representações e valores.

O preenchimento correto dos parênteses está na alternativa

a) F, V e V.
b) V, V e F.
c) F, F e V.
d) V, F e V.
e) V, F e F.

7. (IDHTEC) Leffa afirma que a leitura com atribuição de sentidos atinge alguns
pressupostos, como:

a) Deve-se estabelecer uma prática padrão, sempre igual, para todos os tipos de
leitura.
b) A leitura depende majoritariamente de informações visuais.
c) O conhecimento prévio deve ser acionado sempre que necessário.
d) A previsão na leitura dificulta o processo.
e) O processo de leitura independe do conhecimento das normas gramaticais.

8. (NC-UFPR – ADAPTADA) Com relação ao ensino de português pautado na


concepção interacionista da linguagem, identifique como verdadeiras (V) ou
falsas (F) as seguintes afirmativas:

80
( ) As práticas de ensino da língua que a vinculam às circunstâncias concretas e
variadas de sua atualização são evidenciadas no estudo das regularidades de
seu uso, na produção e interpretação dos discursos.
( ) O trabalho didático com os gêneros textuais de diferentes esferas de circulação
implica o reconhecimento do papel central do texto como instrumento de
trabalho na sala de aula.
( ) O estudo dos recursos linguísticos nessa concepção é realizado por meio de
questões metalinguísticas de definição e classificação, para que o aluno
reconheça as unidades da língua.
( ) As práticas discursivas vão sendo desenvolvidas ao longo do ensino e
aprendizagem da língua a partir de uma distribuição e complexidade gradativas
do estudo dos gêneros textuais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta, de cima para baixo.

a) F – V – F – V.
b) V – V – F – V.
c) F – F – V – V.
d) V – V – V – F.
e) V – F – V – F.

81
PESQUISA EM LINGUÍSTICA UNIDADE
APLICADA

06
Neste capítulo, discute-se como é feita a pesquisa na área da linguística
aplicada, uma área interdisciplinar, e quais são as tendências contemporâneas
dessa área no que tange à língua materna. São apresentados alguns campos da
pesquisa em linguística aplicada e quais os seus principais questionamentos. Por fim,
uma breve noção de pesquisa quali-quantitativa, uma tendência na área de
linguagens, é dada.

6.1 LINGUÍSTICA APLICADA COMO CAMPO DE PESQUISA

Fazer pesquisa é um ato de produzir conhecimento motivado pela


necessidade de o sujeito descobrir as soluções para as questões dos sujeitos e do
mundo. Mulik (2019, p. 101) afirma que “é da natureza humana a procura pelo novo,
e o resultado disso são as grandes invenções que impactaram e que ainda vão
impactar nossa vida”. Na área de linguística, as pesquisas em LA são voltadas para a
investigação de fenômenos culturais, sociais, discursivos, políticos, digitais dentre
outros.
A linguística aplicada é uma área que vem atravessando fronteiras e vem se
firmando no cenário dos estudos linguísticos por trazer um profícuo debate sobre as
questões contemporâneas da linguagem e sobre o sujeito como heterogêneo e
multifacetado. Sendo assim, as pesquisas que emergem deste campo não possuem
uma visão unilateralista da realidade e do fazer científico, pelo contrário, as
investigações assumidas pela linguística aplicada são “mestiças” (MOITA LOPES,
2006).

82
O linguista aplicado precisa ponderar sobre as bases epistemológicas, em
constante revisão, da LA, uma área híbrida e mutável. Essas bases procuram a
compreensão de três aspectos: a) a linguagem é uma prática social, portanto, deve
ser estudada sob o viés da cultura; b) as práticas discursivas são atravessadas por
questões político-ideológicas, logo, não podem ser estudadas como neutras; c) a
construção de sentido engloba a multimodalidade (diferentes modalidades de
comunicação como texto, gesto, fala, imagem, etc).

A pesquisa em linguística aplicada apresenta, basicamente, três abordagens:


a) pesquisa-ação; b) etnografia; c) prática exploratória. Há outros tipos de pesquisa
em andamento na área de linguística aplicada, no entanto, de acordo com Mulik
(2019), essas são as mais recorrentemente observadas.
A pesquisa-ação é considerada uma pesquisa crítico-colaborativa, pois nessa
investigação o foco é dado à interação, ao contato humano e à problematização,
para que haja uma ampliação da consciência sobre a língua e da linguagem. Nessa
pesquisa, a dicotomia teoria x prática tem sido apagada, pois “(...) nas propostas de
pesquisa-ação, a teoria, ao ser colocada em prática, pode gerar ressignificações
com base nos contextos e sujeitos envolvidos” (MULIK, 2019, p.120). A prática também
pode gerar novos parâmetros para a teoria.
A LA também se aproveita dos estudos etnográficos, pois uma de suas
ocupações é analisar o uso da linguagem socialmente. Nesses estudos, três aspectos
básicos existem: a) o olhar; b) o ouvir; c) o escrever. O pesquisador apresenta um
olhar atento sobre a realidade e uma visão imbuída de subjetividade. O ouvir é
relacionado à escuta do informante, ao ato de o pesquisador se posicionar como o
mais neutro possível. O ato de escrever é o arremate do trabalho do etnógrafo e
representa a materialização do conhecimento adquirido.
Por fim, a pesquisa mais realizada é a do tipo prática exploratória que observa
o contexto de sala de aula com os seus agentes (aluno e professor). Esse tipo de
pesquisa, para Mulik (2019, p.124), “(...) compreende o papel do professor como
pesquisador e se apóia em outros princípios trazidos pela prática reflexiva (...)”. Na
prática exploratória, a escola é um espaço a ser explorado para que os resultados

83
obtidos possam ser usados para a melhoria escolar.

6.2 CAMPOS DA PESQUISA EM LINGUÍSTICA APLICADA

Atualmente, experimentam-se várias tendências de pesquisa em linguística


aplicada, à medida que essa área vai se consolidando como uma disciplina cada
vez mais permeada por diversos campos científicos. Nesta seção, são apresentados,
em vista das inúmeras possibilidades, três campos de pesquisa em linguística
aplicada, com exemplos de práticas investigativas que possam respaldar a
afirmação que se faz aqui.
Os estudos mais preponderantes são aqueles voltados para o ensino e a
aprendizagem de línguas materna e estrangeira. Nessa abordagem, é comum o
pesquisador submeter os alunos a testes com a finalidade de coletar dados que
possam auxiliar na compreensão sobre o processo de aprendizagem de língua. Essa
pesquisa pode ser qualitativa e de caráter diagnóstico, ao observar o processo de
ensinar e de aprender, como também, pode ser de intervenção, com o objetivo de
modificar condições de sala de aula. As pesquisas que visam detectar o
comportamento de alunos e de professores em sala de aula (ou seja, mais focadas
em aspectos interacionais) também são bem-vindas na área de linguística aplicada,
pois revelam quais aspectos interacionais interferem e em qual medida podem
intervir na aprendizagem.

Para ilustrar o que se afirma até então, toma-se a dissertação A formação do


professor de língua inglesa: um estudo interpretativo das ementas na formação

84
inicial, de Zamboni (2013). Nessa pesquisa qualitativa de cunho etnográfico (estuda
pessoas a partir dos comportamentos delas), a autora analisa a concepção
subjacente à formação de professores língua estrangeira em uma instituição de
ensino superior e toma como objeto de estudo as Diretrizes Curriculares Nacionais do
Curso de Letras e o documento curricular. Uma das conclusões a que Zamboni (2013)
chega é a de que a definição de proficiência em língua estrangeira que direciona a
formação de professor não é clara nos documentos oficiais.
As pesquisas na área de letramento digital são bem coerentes com a proposta
da linguística aplicada e constituem uma vertente bastante forte entre os linguistas.
Por letramento digital, entende-se a habilidade de usar ferramentas
computadorizadas em rede e de compreender e escrever informações por meio de
tecnologias digitais. Paiva (2021), por exemplo, investigou trechos de 28
tecnobiografias escritas no primeiro semestre de 2018 durante uma turma ministrada
na graduação de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) disciplina
sobre recursos tecnológicos e ensino. Foi proposto, para os alunos, que, seguindo um
roteiro de Barton e Lee (2013), fosse escrita uma tecnobiografia multimodal sobre o
primeiro contato dos alunos com o mundo digital. Ao final da pesquisa, Paiva (2021)
chegou à conclusão de que os narradores das tecnobiografias tiveram o seu primeiro
contato com a tecnologia digital por meio dos jogos, mesmo alguns relatando que o
contato com essas tecnologias tivesse ocorrido nas aulas de informática na escola.
A pesquisadora conclui que, apesar de os alunos não fazerem parte de um sistema
educacional que prezou pelo letramento, eles estão bem à vontade com o uso de
tecnologias digitais, pois sabem baixar jogos, arquivar e salvar documentos e fazer
transações bancárias por meio de aplicativos.

A linguística aplicada pode estabelecer uma intersecção também com a


análise do discurso (AD), uma área do conhecimento igualmente interdisciplinar. A
análise do discurso é uma “disciplina que estuda a linguagem como atividade
ancorada em um contexto” (CHARAUDEAU e MAINGUENEAU, 2006, p.44) e uma das
suas ocupações é a Teoria do Ethos. A partir dessa teoria, é possível entender, por

85
exemplo, a narrativa e a construção da imagem de uma professora em formação.
Exemplo disso é a pesquisa desenvolvida por Faria e Silva (2012) que analisam a
narrativa escrita por uma aluna do curso de Letras Português-Inglês de uma
universidade federal mineira. Essa narrativa versava sobre o ensino e a aprendizagem
de língua estrangeira e sobre a influência dos professores na vida profissional da
aluna. Foi realizada a análise discursiva da narrativa da aluna com ênfase na
influência da significação discursiva e os efeitos de linguagem na construção do
ethos do professor.

Figura 12: Identidade profissional

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3D2byLv Acesso em: 22 jan. 2022.

6.3 METODOLOGIA DA PESQUISA EM LINGUÍSTICA APLICADA

Para realizar uma pesquisa em linguística aplicada, é necessário traçar um


caminho, estabelecer um método, a fim de alcançar os objetivos pretendidos e de
obter respostas para os questionamentos levantados. Dessa maneira, é preciso
escolher uma linha metodológica, pois, segundo Gil (2002), o sucesso de uma
pesquisa encontra-se na metodologia, conceituada como um conjunto de
procedimentos para a realização do trabalho científico. As pesquisas são divididas

86
entre qualitativas e quantitativas. A primeira considera o sujeito e a sua relação com
o mundo (vista sob o ponto de vista da subjetividade) e a segunda se baseia em
dados amostrais, contagem, percentuais e estatísticas. Contemporaneamente, há
uma tendência em conduzir uma pesquisa mesclando os dois métodos.

A tendência é que, em LA, as pesquisas sejam da espécie qualitativa, porque,


consoante Mulik (2019), essa pesquisa visa entender a relação do homem com a
linguagem. Essa pesquisa segue alguns passos. O primeiro deles é a definição do
objeto de estudo e das perguntas exploratórias (também denominadas problemas
de pesquisa) baseadas no que é investigado. O segundo passo é construir os
objetivos de estudo: geral (resume a intenção da pesquisa) e específico (caminho
que auxilia no cumprimento do objetivo geral). Esses objetivos são relacionados às
perguntas exploratórias.

Na pesquisa, é necessário formular as hipóteses, ou seja, as suposições acerca


do objeto de estudo. Trata-se de uma aposta, que pode ser confirmada ou não,
acerca dos resultados alcançados ao final da pesquisa. Por exemplo, em uma
averiguação sobre o processo de aquisição de leitura, o linguista aplicado pode
formular a hipótese de que crianças expostas desde cedo aos livros não
necessariamente vão se tornar leitores contumazes. Esse pesquisador pode supor
que, uma criança, mesmo exposta a vários livros, desde pequena, pode ter sérios
problemas de aprendizagem que podem influenciar o seu hábito de leitura.

87
Os dados precisam ser gerados. Para tanto, o pesquisador escolhe um
instrumento de coleta de informações: diários, gravação em áudio e vídeos,
autorrelatos e/ou narrativas e desenhos, notas de campo, questionários, entrevistas,
etc. Apesar da relevância desses e de outros métodos para a pesquisa em LA, serão
caracterizadas as coletas de dados por meio de diários, entrevistas e questionários.

Na linguística aplicada, os diários vêm sendo cada vez mais utilizados como
uma ferramenta de reflexão sobre a realidade circundante. São utilizados na
formação inicial e na continuada e podem ser escritos em cadernos, em meio
eletrônico, bem como podem também ser gravados em forma de podcast, por
exemplo. Além de estarem à disposição de pesquisadores para análise, os diários
representam uma boa ferramenta que promove o debate sobre os desafios do
cotidiano escolar.

Figura 13: Diário

Fonte: https://gartic.com.br/thalyasantos/desenho-livre/diario

88
A entrevista é um método de coleta de dados que consiste em uma
conversação face a face ou qualquer outro meio de comunicação instantânea
(aplicativos de troca de mensagens, por exemplo). A entrevista precisa ser gravada,
transcrita, e o entrevistador pode selecionar partes que lhe sejam interessantes de
acordo com os propósitos da pesquisa em linguística aplicada. Sua construção pode
ser organizada em estruturada, semiestruturada e livre. A entrevista estruturada se
parece com um questionário, o que minimiza a possibilidade de incompreensão do
item proposto. São comuns, nesse tipo de entrevista, as perguntas de alternativa fixa,
as perguntas de sim e não e as perguntas abertas. A semiestruturada é mais flexível
do que a estruturada; o entrevistador não precisa seguir o roteiro, podendo, inclusive,
inserir outras perguntas no momento da entrevista. As entrevistas livres são bem
informais e não apresentando estruturada prévia.

Figura 14: Entrevista

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3IgYzqe. Acesso em: 24 jan. 2022.

O questionário é um método muito comum de coleta de dados e de fácil


aplicação, principalmente, com as novas ferramentas digitais que geram
questionários e tabulam os dados alcançados rapidamente. Pode conter itens
abertos e fechados e demandam tempo precioso do pesquisador que necessita de
atenção no momento de formulação dos itens. É recomendável que, antes da
aplicação do questionário, o pesquisador faça um teste piloto, ou seja, um teste feito
antes da aplicação definitiva com os sujeitos informantes da pesquisa.

89
Figura 15: Questionário

Fonte: Disponível em: https://bit.ly/3u7MYEV. Acesso em: 24 jan. 2022.

Esses dados precisam ser tratados (quali-quantitativamente) para que possam


gerar resultados que confirmam ou não as hipóteses levantadas. O momento da
discussão dos dados é ancorado pelo aporte (referencial) teórico do qual o
pesquisador dispõe. Esse referencial é responsável por dar rumo ou definição para a
pesquisa realizada. Logo após, é que se chegam às conclusões sobre as
contribuições prestadas pela pesquisa, sobre as falhas e as lacunas deixadas no
estudo, com o intuito de que alguém possa preenchê-las.

90
FIXANDO O CONTEÚDO

1. (ESAF) Numa comparação entre pesquisa qualitativa e quantitativa, podemos


afirmar:

a) Na pesquisa quantitativa, a amostra é maior.


b) Na pesquisa qualitativa, a representatividade do universo é relevante.
c) Na pesquisa quantitativa, o pesquisador pode acrescentar questões no momento
da entrevista.
d) Na pesquisa qualitativa, os resultados apontam incidências.
e) Na pesquisa quantitativa, o entrevistado determina o ritmo da aplicação do
questionário.

2. (FCC) No delineamento de projetos de pesquisa-ação, o pesquisador cumpre as


principais etapas de uma pesquisa, desenvolve uma fase exploratória e realiza um
seminário, que cumprem, respectivamente, os objetivos de:

a) Determinar o campo de investigação e expectativa dos interessados, recolhendo


propostas dos participantes e de especialistas convidados.
b) Realizar uma imersão sistemática na literatura científica e seminários educativos
com os pesquisadores.
c) Explorar o campo de pesquisa e realizar um seminário de padronização da coleta
de dados com os pesquisadores.
d) Formular o problema e definir os instrumentos de coleta de dados.
e) Operacionalizar e manipular as variáveis independentes e intervenientes.

3. (IBFC - ADAPTADA) O desenvolvimento dos métodos de pesquisa etnográficos,


desde os primórdios da moderna ciência sociológica, são um dos grandes
legados deixados às ciências humanas.

A respeito dos métodos etnográficos assinale a alternativa correta:

a) A etnografia tem como principal objetivo ratificar o conhecimento formal


acadêmico.

91
b) A etnografia tem a preocupação de elaborar descrições dos eventos, fenômenos
e fatos sociais a partir do olhar dos próprios sujeitos em análise.
c) Apenas é possível realizar pesquisas etnográficas em realidades tradicionais.
d) Por ser uma descrição pura do objeto analisado os dados etnográficos são uma
importante coleção de informações.
e) Necessariamente a pesquisa etnográfica é realizada por via de dados
secundários.

4. Leia as proposições sobre a hipótese de pesquisa.

I. Sempre confirmam os resultados da pesquisa.


II. São suposições sobre a explicação que se busca com a pesquisa.
III. Não são relevantes para os resultados.
IV. Podem ser obtidas por dedução dos resultados já conhecidos.
V. A sua elaboração não está relacionada à problemática da pesquisa.

Assinale a alternativa que apresenta as afirmações corretas:

a) I, II e IV.
b) I, IV e V.
c) II, III e V.
d) II e IV.
e) III e IV.

5. Considerando (V) se a afirmação abaixo, relacionada com elaboração de


pesquisas acadêmicas, for verdadeira e (F) se for falsa, a sequência correta é:

( ) Para a escolha do tema de pesquisa, deve-se levar em consideração a


questão do tempo disponível para desenvolvimento da pesquisa e os custos que
englobam a aquisição dos materiais necessários a esta pesquisa.
( ) A delimitação do assunto a ser pesquisado objetiva tratá-lo na sua
profundidade.
( ) Os objetivos gerais determinam o propósito da pesquisa e aprofundam os
objetivos específicos.

92
( ) A problemática da pesquisa refere-se a uma dúvida teórica ou prática
objetivando encontrar as respostas.
( ) As pesquisas acadêmicas, em sua maioria, não utilizam da problemática para
as suas investigações.

Assinale a alternativa correta:

a) (V), (V), (V), (V), (F).


b) (V), (F), (F), (V), (F).
c) (V), (V), (F), (V), (F).
d) (V), (V), (V), (V), (V).
e) (F), (F), (V), (V), (V).

6. Explicação cuidadosa, detalhada e exata de toda ação desenvolvida em um


projeto de pesquisa: bem como o tipo de pesquisa, os instrumentos para a coleta
dos dados, o tempo previsto para o trabalho, e a forma de tratamento dos dados
coletados.

a) Cronograma
b) Hipótese
c) Justificativa
d) Metodologia
e) Objetivos

7. Leia a definição a seguir.

“Toda ______ é uma investigação e estudo sistemático, com o fim de descobrir ou


estabelecer fatos e princípios relativos a um campo de conhecimento.”

O item que preenche corretamente a lacuna é:

a) Discussão.
b) Monografia.
c) Pesquisa.

93
d) Objetivo.
e) Resenha.

8. A respeito do planejamento e dos passos para a realização de um projeto de


pesquisa, assinale (V)] para as alternativas verdadeiras e (F) para as alternativas
falsas.

( ) O quadro metodológico adotado deve estar ao alcance da experiência do


pesquisador.
( ) Os objetivos definem a natureza do trabalho, mas não o tipo de problema a
ser selecionado e os documentos a serem pesquisados.
( ) O tema de uma pesquisa é o universo escolhido, para o qual você decide
voltar seu olhar.
( ) O levantamento bibliográfico deve considerar somente materiais de livros, de
periódicos e de revistas científicas, desconsiderando, textos da internet.

A seguir, marque a alternativa que contém a sequência correta.

a) F-F-F-V.
b) V-V-V-F.
c) F-V-V-F.
d) V-V-V-V.
e) V-F-V-F.

94
UMA BREVE REFLEXÃO UNIDADE

07
LINGUÍSTICA

7.1 INTRODUÇÃO

Petter (2006) diz que o desenvolvimento dos estudos linguísticos levou muitos
estudiosos a proporem diferentes definições do que é a “linguagem”, sendo elas
muito próximas em alguns pontos, mas também muito diferentes em outros. Isso
significa dizer que não há como “fechar” uma definição ou uma conceituação sobre
o que é a linguagem, pois, automaticamente, perguntas como “para quem?”, “em
qual época?”, “sob qual perspectiva?” surgem à medida que se avança nos estudos.
Tampouco há a pretensão de se fazer uma definição fechada sobre a linguagem.
Ao contrário, a ideia principal deste material é a de proporcionar diferentes visões,
em diferentes momentos históricos, de maneira introdutória, sobre como os fatos
linguísticos foram percebidos pela humanidade.
Por isso, o pensamento linguístico de hoje é baseado e formado a partir de
diferentes princípios metodológicos de décadas e séculos atrás, que já se
preocupavam com essa questão, mesmo que não da mesma forma que atualmente
– afinal, as preocupações também eram outras, por isso os estudos tiveram outros
objetivos. Contudo, reforça-se que os estudos linguísticos atuais, ainda que derivem
parcialmente dos antigos, não dão conta de serem explicados e totalmente
relacionados com a antiguidade, pois não há dados científicos suficientes para
comprovar uma estreita ligação e relação de dependência entre povos geográfica
e temporalmente distintos.
Logo, todos os períodos e fatos históricos relacionados aos estudos linguísticos
devem ser compreendidos como momentos da história do pensamento linguístico,
não necessariamente como uma linha do tempo em que um fato sucede o outro.
Assim, é possível compreender como esse tema sempre esteve presente na vida dos
seres humanos, de uma maneira ou de outra, sem que haja a necessidade de
“esgotá-lo” como se só existisse essa possibilidade de olhar para os fatos da língua.

95
7.2 A LÍNGUA(GEM): ALGUMAS REFLEXÕES

Como será discutido, a Linguística não era considerada uma área autônoma,
pois carecia de cientificidade, método e objeto próprios. Por isso, se apoiava em
outras áreas de estudo, como a lógica, a filosofia e a retórica para trazer a base
científica para suas contribuições. Contudo, o que sempre houve nesses estudos,
apoiados ou não em outras áreas, foi a preocupação em definir o que é a linguagem,
tema este que não recai só sobre a linguagem humana, mas também sobre a
linguagem animal, como demonstra o estudo de Karl von Frisch, em 1959, sobre o
sistema de comunicação utilizado pelas abelhas. Ou seja, não só um tipo de
linguagem, mas quando o tema se volta aos seres humanos e ao sistema de
comunicação por eles utilizado, geralmente, a noção de “língua” está estritamente
vinculada.
Com base em Cunha, Costa e Martelotta (2011), identifica-se que a linguagem
é um termo polissêmico, isto é, apresenta mais de um sentido, uma vez que é possível
utilizá-lo para referir-se a qualquer processo de comunicação. Por isso, existe a
linguagem dos animais, a linguagem corporal, a linguagem das artes, a linguagem
da sinalização, a linguagem escrita, dentre outras, como aponta os autores. A língua
falada por um grupo de pessoas, dessa forma, é uma forma de linguagem. Nesse
sentido, para os autores, a linguagem é uma habilidade, ao passo que a língua é um
sistema de signos utilizados entre os membros de um grupo.

Quando falamos, então, que os linguistas estudam a linguagem,


queremos dizer que, embora observem a estrutura das línguas
naturais, eles não estão interessados apenas na estrutura particular
dessas línguas, mas nos processos que estão na base da sua utilização
como instrumentos de comunicação. Em outras palavras, o
linguista[...] [é] um estudioso dos processos através dos quais essas
várias línguas refletem, em sua estrutura, aspectos universais
essencialmente humanos (CUNHA; COSTA; MARTELOTTA, 2011, p. 15).

Como é possível observar, a partir da reflexão trazida pelos autores, há diversos


tipos de linguagens e diversas manifestações, uma delas é a língua (verbal/oral), tão
estudada pela Linguística desde antes de haver uma área consolidada. A língua é
um uso específico da linguagem (algo mais geral), ou seja, é uma das formas de
conceber o que é a linguagem, mais complexo e amplo. E é sobre esse tipo de
expressão que os linguistas, por meio dos estudos linguísticos, na e pela humanidade,
se dedicaram.

96
A língua(gem) é algo que exerceu e continua a exercer interesse nos homens,
seja pelo seu caráter de evolução, seja pelo seu caráter de comunicação. Petter
pontua que a linguagem “[...] permite não só nomear/criar/transformar o universo
real, mas também possibilita trocar experiências, falar sobre o que existiu, poderá vir
a existir, e até mesmo imaginar o que não precisa nem pode existir” (2006, p. 12). Ou
seja, a possiblidade que a língua(gem) tem de transmitir o mundo é o que a faz única,
do ponto de vista de um artefato cultural, pois utilizado por diversas culturas, em
diferentes épocas.

Assim como não há sociedade sem linguagem, não há sociedade


sem comunicação. Tudo o que se produz como linguagem ocorre em
sociedade, para ser comunicado, e, como tal, constitui uma realidade
material que se relaciona com o que lhe é exterior, com o que existe
independentemente da linguagem. Como realidade material –
organização de sons, palavras, frases – a linguagem é relativamente
autônoma; como expressão de emoções, ideias, propósitos, no
entanto, ela é orientada pela visão de mundo, pelas injunções da
realidade social, histórica e cultural de seu falante (PETTER, 2006, p. 12).

De acordo com a autora, a linguagem verbal (língua) é uma forma de


comunicação básica entre os seres humanos e, por isso, desperta e sempre
despertou diversos estudos, movidos, muitas vezes, pela curiosidade (fascínio) de
compreender o mundo e as formas de ser e de estar nele. Dessa curiosidade,
portanto, resultam as diversas formas de estudos, frutos da tentativa de compreender
e apreender melhor o que é esse instrumento de comunicação e como se ele
comporta diferentemente em cada sociedade.
Assim como os próprios estudos linguísticos sofreram alterações e variações ao
longo dos tempos, o mesmo ocorre com a língua, por isso é possível pensar em uma
variação linguística no que tange à história, mas também dentro de uma mesma
sociedade. Por isso, essa capacidade da língua de mudar e de se adaptar, por ser
um processo natural de evolução que ocorre por meio das interações entre os
falantes, sendo elas de sentido (semântica), de grafia (léxico), dentre outras. Essas
variações linguísticas podem ocorrer por fator histórico, regional, social ou até mesmo
de estilo do falante.

97
Cunha, Costa e Martelotta (2011) ressaltam que há diferentes formas de
compreender o fenômeno da linguagem, por isso, é possível apreendê-la como (1)
uma técnica articulatória complexa, relacionada aos sons que produzem a fala; (2)
uma base neurobiológica composta de centros nervosos que são utilizados na
comunicação verbal, em que o funcionamento da linguagem está relacionado a
uma estrutura biológica que o veicula; (3) uma base cognitiva, que rege as relações
entre o homem e o mundo biossocial e que representa esse mundo em termos
linguísticos; (4) uma base sociocultural que atribui à linguagem humana os aspectos
variáveis no tempo e no espaço; e (5)uma base comunicativa que fornece os dados
que regulam a interação entre os falantes.
Nota-se que dentro dessas 5 (cinco) possibilidades, há muitos e diferentes
estudos e pesquisas que foram e podem ser desenvolvidos. Ou seja, tratar da
(língua)gem não é uma tarefa simples nem que pode ser esgotada, por isso há muito
feito, mas também há muito a se fazer em relação aos fatos linguísticos.

7.3 LINGUÍSTICA OU GRAMÁTICA?

Como apontado por Cunha, Costa e Martelotta (2011), as pessoas confundem


a Linguística com a Gramática, que é normalmente ensinada nas escolas. Entretanto,
é importante que uma distinção seja feita, pois a forma de olhar para a língua(gem)
muda a depender de qual perspectiva for enfatizada. Como se percebe, é possível
conceber a linguagem e a língua em uso de diferentes formas e a partir de múltiplos

98
objetivos. Uma boa definição do que seria um estudo nesta perspectiva e o papel de
quem a estuda, seria o de que

Os estudos linguísticos não se confundem com o aprendizado de


muitas línguas: o linguista deve estar apto a falar “sobre” uma ou mais
línguas, conhecer seus princípios de funcionamento, suas
semelhanças e diferenças. A Linguística não se compara ao estudo
tradicional da gramática; ao observar a língua em uso o linguista
procura descrever e explicar os fatos: os padrões sonoros, gramaticais
e lexicais que estão sendo usados, sem avaliar aquele uso em termos
de um outro padrão: moral, estético ou crítico (PETTER, 2006, p. 17).

Importante pensar sobre essa distinção entre o trabalho realizado pela


linguística e pela gramática, pois não é só o objeto que muda (linguagem/língua),
mas a forma de refletir sobre eles. Um estudo linguístico considera qualquer expressão
como possível e passível de ser analisada, sem que juízos de valor, como certo ou
errado, sejam tidos como objetivo principal, uma vez que a descrição e interpretação
dentro de um escopo científico são seus principais objetivos. Por outro lado, há
estudos que se voltam ao modo “certo” ou “bonito” de falar e escrever, o que
configura, nesse sentido, não um trabalho expressamente linguístico, mas sim
normativo e prescritivo, pois desconsidera as diferentes realidades da variação
linguística, que fazem com que um falante cometa um ou outro desvio linguístico,
mas que não o torna menos falante.

Cunha, Costa e Martelotta fazem uma distinção entre a linguística e a


gramática tradicional, com o objetivo de elucidar o que cabe (ou não) à cada uma
delas. Primeiro, dizem os autores, a gramática tradicional foi desenvolvida pelos
filósofos gregos como forma de sistematizar, por meio da observação das formas
linguísticas, as leis de elaboração do raciocínio. Ressaltam que essa tendência
perdurou até o século XIX, quando uma nova ciência, a Linguística surgiu. Outro fato
importante sobre a Gramática é a sua instituição de um uso correto da língua,

99
considerado o mais adequado, por isso, pode ser caracterizada como normativa. Por
sua vez, a Linguística analisa e descreve o funcionamento da língua, sem se
preocupar com regras de uso.
A segunda diferença importante apontada pelos autores é a de que os
linguistas, diferente do que se concebe na gramática tradicional, consideram a
língua falada como primária, não escrita. Eles afirmam que “qualquer atividade de
escrita representa um processo mais sofisticado e adquirido mais tardiamente”, pois
eles afirmam que “[...] começamos a falar antes de aprender a escrever, falamos
mais do que escrevemos em nossa rotina diária, todas as línguas naturais foram
faladas antes de serem escritas” (CUNHA; COSTA; MARTELOTTA, 2011, p. 26).
Compreende-se, então, que ambas as abordagens se assemelham por
trazerem a linguagem, de uma maneira ou de outra, para seu interior, mas se
distinguem de maneira bem clara com o que fazem a partir deste tema: prescrever
o bom uso da língua, como um gramático tradicional o faz, está em uma situação
diferente da descrição da língua, como um linguista o faz. Reforça-se, então, que
essas distinções existem e, sobre elas, algumas reflexões são feitas, a fim de que cada
área de estudo tenha as condições ideais para realizar seus objetivos acerca da
(língua)gem.

Por fim, há de ressaltar que o trabalho proposto por uma gramática, seja de
qual caráter for, não deve ser ignorado tampouco desvalorizado. É preciso
reconhecer o lugar e a contribuição que este tipo de estudo tem para os estudos
linguísticos, principalmente quando falamos de tempos mais antigos e de povos mais
distantes, que não possuíam o mesmo tipo de objeto nem conhecimento científico
do qual se dispõe os dias atuais. A ressalva do que é o trabalho de um(a) linguista é

100
uma forma de mostrar como esse profissional atua e pode continuar atuando na
sociedade, contribuindo com o fazer científico ético e de qualidade, sem
desvalorizar, contudo, o trabalho de um(a) gramático(a), que muito tem a contribuir
também com esse fazer científico, dentro das suas especificidades.

101
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Na Linguística, o trabalho do linguista deve ser corretamente identificado com:

a) o estabelecimento de métodos históricos e comparativistas para a descoberta da


etimologia das palavras.
b) a definição de quais línguas são superiores e quais são inferiores.
c) intuições e percepções subjetivas sobre a linguagem a fim de relacioná-las com
uma teoria filosófica.
d) o estabelecimento de teoria linguística e criação de métodos rigorosos para a
descrição das línguas.
e) a elaboração de uma gramática normativa ou prescritiva a fim de estabelecer a
correção gramatical.

2. Não podemos analisar a língua simplesmente como uma quantidade de palavras


que comunicam, pois a língua faz parte da maneira de ser do indivíduo como um
todo. Podemos refletir, então, que:

a) a língua, além de um organismo vivo, mutante, é uma instituição social. Numa


mesma comunidade todos necessitam conhecer e dominar a mesma estrutura
linguística, porém, há variações.
b) as línguas obedecem a uma estrutura e jamais mudam.
c) as línguas só mudam nas camadas mais privilegiadas da população.
d) a língua não é uma instituição social. Em uma mesma comunidade nem todos
necessitam conhecer e dominar a mesma estrutura linguística.
e) A língua é uma instituição política e só muda quando são alteradas as leis de
Estado.

3. “Dada nossa tradição escolar, há uma tendência em se identificar o estudo da


linguagem com o estudar da gramática. A __________, no entanto, distingue-se da
gramática tradicional, normativa. Ela não tem, como esta gramática, o objetivo
de prescrever normas ou ditar regras de correção para o uso da linguagem. Para
essa ciência, tudo o que faz parte da língua interessa e é matéria de reflexão. (p.
10)"

102
Adaptado de ORLANDI, Eni. O que é linguística. São Paulo: Brasiliense, 1999.

Qual das alternativas a seguir preenche corretamente a lacuna?

a) Gramática Prescritiva.
b) Gramática Descritiva.
c) Gramática Internalizada.
d) Linguística.
e) Gramática Comparada.

4. Analise as seguintes sentenças:


I. Não se faz distinção entre língua e linguagem na Linguística, pois a língua não é
uma forma de linguagem.
II. É possível distinguir língua e linguagem, pois a primeira é um tipo de manifestação
da segunda.
III. Quando se fala de linguagem, só é possível pensar na língua verbal e escrita.

Está correto o que se afirma em:


a) I.
b) II.
c) III.
d) I e II.
e) Todas as sentenças estão corretas.

5. Sobre a Linguística, pode-se afirmar que:


a) corresponde aos estudos gramaticais, filológicos ou etimológicos realizados desde
a Grécia Antiga e estendendo-se até os dias atuais, com ênfase na investigação
empírica da linguagem.
b) consiste numa disciplina que trata da linguagem de uma forma normativa,
procurando estabelecer as regras e normas do uso padrão da língua.
c) consiste numa disciplina que se detém na investigação científica da linguagem.
d) corresponde aos estudos sobre a linguagem a partir de Ferdinand Saussure, em
que os estudos gramaticais e etimológicos são o cerne da investigação científica.

103
e) consiste numa abordagem científica de todos os tipos de linguagem utilizadas
pelos seres humanos, desde as primeiras gramáticas até os autores modernos do
Império Romano que influenciam diversos idiomas por conta do latim.

6. (ENEM 2016) “O acervo do Museu da Língua Portuguesa é o nosso idioma, um


“patrimônio imaterial” que não pode ser, por isso, guardado e exposto em uma
redoma de vidro. Assim, o museu, dedicado à valorização e difusão da língua
portuguesa, reconhecidamente importante para a preservação de nossa
identidade cultural, apresenta uma forma expositiva diferenciada das demais
instituições museológicas do país e do mundo, usando tecnologia de ponta e
recursos interativos para a apresentação de seus conteúdos.
Disponível em: www.museulinguaportuguesa.org.br. Acesso em: 16 ago. 2012 [adaptado]

De acordo com o texto, embora a língua portuguesa seja um “patrimônio


imaterial”, pode ser exposta em um museu. A relevância desse tipo de iniciativa
está pautada no pressuposto de que:

a) a língua é um importante instrumento de constituição social de seus usuários.


b) o modo de falar o português padrão deve ser divulgado ao grande público.
c) a escola precisa de parceiros na tarefa de valorização da língua portuguesa.
d) o contato do público com a norma-padrão solicita o uso de tecnologia de última
geração.
e) As atividades lúdicas dos falantes com sua própria língua melhoram com o uso de
recursos tecnológicos.

104
7. (UNICENTRO 2017 - adaptada) Leia o texto a seguir para responder à questão:

Disponível em http://www.chargeonline.com.br. Acesso em 23 set. 2017

Com base na leitura da charge supracitada, bem como de seus conhecimentos,


avalie as proposições a seguir:
I. A língua é entidade imutável, homogênea, cabendo aos falantes atender à
norma padrão culta.
II. Toda língua é um conjunto diversificado, porque as sociedades humanas têm
experiências históricas, sociais, culturais e políticas diferentes e essas experiências
se refletirão no comportamento linguístico de seus membros.
III. As variações (sintáticas e lexicais) são inerentes à fala e à escrita de pessoas pouco
escolarizadas.

A partir da análise é correto considerar que:


a) somente a alternativa I está correta.
b) somente a alternativa II está correta.
c) somente a alternativa III está correta.
d) as alternativas I e II estão corretas.
e) todas as alternativas estão corretas.

8. (UEG 2018) Observe a imagem a seguir, referente ao anúncio do primeiro


espetáculo da Semana de Arte Moderna de 1922.

105
Disponível em: https://ifhistoria.wordpress.com/2014/05/18/a-semana-de-arte-moderna/. Acesso em: 01 out. 2018.

Em termos de linguagem, verifica-se que há no anúncio a presença de formas


linguísticas que comprovam que:
a) a língua sofre variação no decorrer do tempo, passando por mudanças históricas
tanto em seus aspectos semânticos quanto em sua forma ortográfica.
b) há ocasiões em que os falantes mudam seu jeito de falar para se adequarem à
formalidade da situação, o que se chama de variação situacional.
c) há variações que são devidas ao gênero dos falantes, pois homens e mulheres
falam de modo diferente.
d) a origem geográfica do falante determina seu modo de falar, sendo o que se
chama de variação regional.
e) a idade dos falantes é fator importante no modo de falar das pessoas, como é o
caso das gírias.

106
OS PRIMEIROS ESTUDOS UNIDADE

08
LINGUÍSTICOS

8.1 INTRODUÇÃO

No início dos tempos, não havia uma Linguística como nós temos hoje, com
seu objeto e métodos próprios e bem definidos. Mas os estudos sobre a linguagem
humana existem muito antes da fundação da Linguística como uma ciência, no fim
do século XIX e início do século XX, pelo estudioso genebrino Ferdinand de Saussure.
Os seres humanos, com a necessidade básica da comunicação, sempre fizeram uso
da linguagem (em suas mais diferentes formas, verbal, sonora ou visual). Por isso, os
estudos acerca da linguagem acompanham toda a evolução humana, mesmo que
sem o rigor científico que hoje temos na área da Linguística, até pelo fato de não ser
uma preocupação de outras épocas.
O caminho percorrido pela Linguística para ganhar seu status científico e seu
objeto e métodos bem definidos é relativamente atual, em comparação com outras
áreas da ciência humana. Contudo, o interesse pela linguagem sempre existiu,
mesmo que uma disciplina que se preocupasse especificamente só com isso ainda
não existisse. Um exemplo de quão antigo é o interesse pela linguagem está no século
IV a. C., quando a preocupação dos povos hindus era a de fazer uma manutenção
da Gramática com propósitos religiosos, baseados no princípio de ler e escrever
corretamente. Mais à frente, já no século I a. C., os latinos tentaram implementar a
gramática grega no seu idioma (língua latina), pois acreditavam que, assim, a
interpretação literária (leitura e produção de poemas) seria melhor para todo o povo.
Percebe-se que a humanidade possui um interesse pelo tema “linguagem”
desde a antiguidade, ainda que cada povo possuísse traços de interesses distintos.
Portanto, contextualizar a linguagem como ciência é um trabalho anterior ao fim do
século XIX e início do século XX. Logo, para entender o que Saussure fez (um marco
histórico para a área), é preciso entender também o que veio antes dele e o que os
povos estudavam e buscavam a partir da temática da “linguagem”.

107
Traçar uma linha do tempo, linear, que dê conta de destacar todos os fatos,
cronologicamente, sobre os acontecimentos acerca dos estudos linguísticos é uma
tarefa difícil, uma vez que o seu desenvolvimento não ocorreu dessa forma. Como
diz Weedwood (2002):

No plano geográfico, é vão tentar ligar todas as tradições lingüísticas


numa única seqüência cronológica, saltando da Índia à China, à
Grécia e a Roma, aos povos semíticos e de volta ao Ocidente. Cada
tradição tem sua própria história e só pode ser explicada à luz de sua
própria cultura e de seus modos de pensamento. Cada uma tem sua
contribuição particular a dar à percepção humana da linguagem
(WEEDWOOD, 2002, p. 22).

Com base no que é dito pela autora, pode-se perceber que o interesse pela
linguagem é muito antigo, de modo que há acesso a mitos, lendas, cantos, rituais e
trabalhos eruditos que refletiam sobre e buscavam entender essa capacidade
humana, como também diz Petter (2006)
O crescente interesse dos povos pela linguagem, não é de se estranhar que
diferentes e variadas culturas, em diferentes e variados tempos, tenham se dedicado
a essa questão que está presente na vida cotidiana de todos os seres humanos, de
maneira mais sistematizada ou não. Há de se considerar, nesse momento de primeiros
estudos linguísticos, que eles foram desenvolvidos de maneira isoladas, em cada
cultura, mas que também, em alguns momentos, o desenvolvimento ocorre numa
relação de certa dependência.

A lingüística grega e a romana formam um continuum com a


medieval: os romanos se basearam nas iniciativas dos gregos (e, de
maneira limitada, desenvolveram-nas), enquanto os pensadores
medievais estudaram, digeriram e transformaram a versão romana da
tradição lingüística antiga. Alguns aspectos do pensamento pré-
renascentista, sobretudo a etimologia e a teoria da littera, são mais
facilmente apreendidos se as idéias antigas e medievais forem
consideradas em conjunto; para outros temas, uma discussão

108
cronológica oferecerá um arcabouço adequado (WEEDWOOD, 2002,
p. 23 – destaques da autora).

Como é possível observar, existe uma continuidade em alguns estudos


linguísticos, principalmente os ocidentais. O que não se pode levar para todos os
outros, como os primeiros textos religiosos escritos em sânscrito, uma vez que não há
relação direta entre eles com outros estudos que eram feitos em outras partes do
mundo, por outras sociedades. Por isso, a ideia de “linha do tempo” é falha para se
pensar esse momento dos estudos linguísticos, de modo que adiante, alguns
momentos importantes para esses estudos são elencados, com o objetivo de
compreender como a preocupação dos povos antigos se voltava, de uma forma ou
de outra, à linguagem, sem que, necessariamente, elas ocorressem de maneira
dependente entre si, ainda que tivessem o mesmo tema em comum.

8.2 A GRAMÁTICA DE PANINI

Um primeiro nome importante para compreender os estudos linguísticos pela


e na humanidade é o de Panini que, no século IV a.C., compilou, com o devido rigor
científico para a época, uma gramática para o sânscrito, uma língua antiga indiana,
originado, assim, a Gramática de Panini. O estudioso observou e descreveu os
processos que ocorriam na língua, de modo que complementou o trabalho de vários
outros sábios estudiosos que o antecederam.
Os estudos tiveram como objetivo principal preservar diversos textos sagrados,
que eram passados de geração a geração por tradição oral, com especial cuidado
em cada som e em cada palavra. Por isso, o trabalho realizado por Panini é
considerado válido pela sua base filosófica, de modo que mostrou ter um padrão
elevado comparado ao das gramáticas tradicionais ocidentais. Nele, são
compilados mais de 4000 (quatro mil) regras em sutras que descrevem a línguas com
detalhes minuciosos e precisos.
Uma grande contribuição da gramática dessa época é a de que as palavras
são formadas por raízes e afixos que, juntos, modificam o significado de diversas
palavras. A limitação desses estudos residia em ser uma descrição e classificação do
que observavam a partir dos fatos da língua, sem que nenhuma explicação ou
análise fosse feita.
Por muito tempo, esses estudos ficaram limitados geograficamente ao próprio
povo hindu, de modo que a sua descoberta, tempos depois, no século XVIII, consistiu

109
em um momento importante para os estudos linguísticos, um século antes da
sistematização feita por Saussure na área da Linguística, em 1916.

8.3 OS FILÓSOFOS NA GRÉCIA ANTIGA

Considera-se que a língua grega foi bastante estudada ao que tange aos
procedimentos de estilo e de adequação da linguagem ao pensamento. No
contexto da cultura ocidental, a Grécia Antiga voltou sua atenção aos aspectos
linguísticos a partir de estudos com base lógica e natureza filosófica, de modo que
Câmara Jr. (2011) afirma que a principal abordagem, na Grécia, aos estudos
linguísticos foi por meio da filosofia, o que significa que quase todas as preocupações
e as investigações incluíram a linguagem como um de seus objetos de investigação.
A preocupação inicial era a de estabelecer um paralelo entre o pensamento
e a palavra. Para eles, o problema filosófico relativo à linguagem era a definição
entre a noção e a palavra que a designa. Para isso, esse tema era observado a partir
das questões da naturalidade e da arbitrariedade da linguagem, o que significa que
os fatos linguísticos eram observados pela natureza ou pela convenção na língua
grega, de modo que muito se especulava a respeito disso.
Durante vários séculos, esse tipo de preocupação dominou todos os estudos
sobre a origem da língua, com ênfase na relação entre as palavras e o seu
significado. Weedwood (2002) diz que, com isso, duas escolas opostas surgiram na
época: anomalistas e analogistas. A primeira considerava que a linguagem era
irregular, justamente por refletir a própria irregularidade da natureza. A questão
equivalia a dizer que tinha sua origem em princípios eternos e imutáveis fora do
próprio homem.
Já os analogistas pensavam na regularidade básica da linguagem, baseados
na convenção. A questão significava dizer que ela era o resultado de algum acordo
tácito, um tipo de contrato social entre os membros da comunidade. Ressalta-se,
com isso, que ambas as visões eram importantes para a época e foram responsáveis
pela sistematização da gramática grega, ou seja, não havia, para a época, um lado
“certo” ou “errado”, mas visões que se complementavam e contribuíam para ao
avanço dos estudos sobre a língua.
Outras contribuições foram feitas por Protágoras, no século V a. C., ao
estabelecer a distinção de três gêneros. Já Platão fez a importante distinção de
“substantivos” e “verbos”, ao passo que Aristóteles, seu discípulo, acrescentou

110
também as “conjunções”. Contudo, como aponta Camara Jr. (2011), seus principais
trabalhos se voltam ao diálogo de Crátilo (um filósofo seguidor de Heráclito) e
Hermógenes (seguidor de Demócrito). Segundo o autor, Platão se identificava com
Heráclito e, Aristóteles, com Demócrito:

Platão, no seu diálogo do Crátilo, discutiu principalmente a questão


relacionada com o seguinte: a linguagem é imposta aos homens por
uma necessidade da natureza ou se origina do poder de julgamento
dos homens. Pessoalmente parece ele participar da primeira dessas
opiniões, a qual está de acordo com a metafísica das ideias que
regem, de fora, a mente humana. Aristóteles, por outro lado, crê que
a linguagem surgiu por convenção ou acordo entre os homens mas
faz uma distinção entre a linguagem propriamente como um produto
de convenção, e o conteúdo da linguagem que está de
conformidade com as coisas e assim o é (CAMARA JR, 2011, p. 24).

São os chamados estóicos, com uma base de estudo anomalista, que mais se
dedicaram à questão da língua, dentre todas as escolas. Eles consideravam a língua
fundamental, principalmente em termos de lógica, além de terem sido os
responsáveis pela distinção entre forma e significado (o que será chamado de
significante e significado por Saussure).
Por sua vez, os gramáticos da Escola de Alexandria, que eram analogistas,
deram continuidade aos estudos feitos pelos estóicos e, nesse momento, a
“gramática grega”, de fato, foi convencionada. A perspectiva era mais filológica e
os textos estudados eram de antigos poetas, originado um movimento de estudar os
textos literários como fonte de um bom e correto uso da língua. No final do século II
a.C., a gramática de Dionísio Trácio acrescentou algumas questões às já tratadas
pelos estóicos, como o advérbio, o pronome, a preposição e o particípio. Já Apolônio
Díscolo, no século II, tratou da gramática com ênfase na sintaxe, em que ele propõe
a análise linguística como composto da análise, que compreende a definição das
partes da oração, e a síntese, que corresponde à sua disposição em um todo
coerente.

111
Figura 1: Representação moderna do interior da Biblioteca de Alexandria

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3NZP3uz. Acesso em: 20 jan. 2022.

A contribuição da gramática grega aos estudos linguísticos foi de finalidades


práticas, uma vez que se voltava para a ação (fazer), o uso da língua. Com isso, o
próprio campo filosófico foi importante na construção da gramática da língua grega.
Os estudos sobre essas questões levantadas pelos gregos foram também estudadas
pelos romanos, tempos depois, de modo que se encarregaram de transmitir os
estudos adiante, com as suas contribuições, de modo que conseguiram impulsionar
o progresso da gramática no Ocidente.

112
8.4 ROMA E A LÍNGUA LATINA

Como dito, os estudos linguísticos em Roma tiveram forte influência dos gregos,
de modo que a sua gramática serviu de modelo, uma vez que, segundo Lyons (1979),
as duas línguas eram bastante semelhantes em sua estrutura geral, o que os levou a
pensar que as categorias gramaticais, elaboradas pelos gregos, eram universais.
Neste momento,

[...] Em que a gramática grega começou a influenciar a cultura latina,


o latim não era ainda uma língua fixada e os hábitos linguísticos das
classes rurais estavam em conflito com a “urbanitas”, isto é, o
estabelecimento de uma norma oficial para as classes superiores da
cidade. À medida que o Estado crescia através de suas conquistas,
crescia também, assim, a necessidade de uma língua única tendo sob
seu domínio todo o Império Romano (CAMARA JR., 2011, p. 28).

Como é possível observar, o avanço dos estudos linguísticos está relacionado


com as conquistas e expansões territoriais, ou seja, a necessidade de pesquisas e
investigações da e na língua, foram surgindo à medida em que a própria
configuração daquela sociedade mudou. Contudo, neste primeiro momento, a
língua latina, estudada pelos romanos, tinha uma perspectiva mais normativa, o
objetivo principal era o “Estudo do Certo e Errado”. Também havia a tentativa de
manter o latim clássico em uso, no lugar da fala plebeia e provinciana utilizada por
populações heterogêneas, algo semelhante também ocorreu com a língua grega,
por iniciativa dos estóicos. Um outro ponto em comum entre romanos e gregos foi
continuar com o embate entre analogistas e anomalistas.
Nesse sentido, os estudos gramaticais continuaram, de modo que se chegou
a um modelo básico de gramática latina dividida em 3 (três) seções, dentre elas: (1)
a “gramática” ou a arte de falar e compreender bem os poetas; (2) as “partes do
discurso” e suas variações de gênero, tempo, número etc.; (3) o “estilo”, com o
objetivo de evitar erros. O último período da gramática latina foi na “idade do
classicismo”, que compreende o período de 400 d.C., com Donato, e Prisciano, em
500 d. C., com o objetivo didático de descrever a língua dos melhores escritores da
época, como Cícero e Virgílio, ao passo que desprezavam a língua utilizada pelos
homens comuns. Camara Jr. (2011) pontua que, neste momento, há um esforço para
manter a norma do latim clássico diante da língua popular do Império, o que se
manteve até a Idade Média, em um esforço de conservar a língua latina como
universal.

113
Dentre os estudiosos da língua no Império Romano, pode-se destacar Marcos
Terêncio Varrão, no século II a. C., autor dos 25(vinte e cinco) originais do compêndio
intitulado “De Língua Latina”, que apresentava forte influência dos estóicos. Também
dividiu os estudos linguísticos em etimológicos, morfológicos e sintáticos. Por sua vez,
o retórico Marco Fábio Quintiliano, no século I d. C., contribuiu com temas
educacionais na sua obra “Instituto Oratória”, ao passo que Élio Donato, por volta do
século IV d.C., escreveu sua gramática “Arte Menor” que, por muitos anos,
permaneceu como o modelo mais autorizado de gramática expositiva, além de
fazer uma descrição minuciosa das letras, o que contribuiu em termos fonéticos, e um
compilado dos traços estilísticos de autores clássicos.

Entretanto, os estudos sobre a língua latina não se mantiveram da mesma


maneira por muito tempo, de modo que, após a grande aceitação dos estudos
gramaticais com paralelos literários, abriram-se os estudos linguísticos com fins
propriamente gramaticais, inclusive, com mudança de objeto de estudo, não mais
os textos literários, mas os próprios textos gramaticais. Weedwood relata que

À medida que a educação romana foi gradualmente estreitando seu


escopo, o foco de atenção se transferiu para as gramáticas em si
mesmas, abandonando os textos literários que elas supostamente
deviam acompanhar. Gramáticos do final do século IV em diante
(Sérvio, Sérgio, Cledônio, Pompeu) passaram a escrever comentários
sobre a Ars maior de Donato, em vez de sobre a Eneida de Virgílio,

114
uma tendência que foi prosseguida na Idade Média por estudiosos
que exerciam a exegese bíblica (WEEDWOOD, 2002, p. 40).

Por fim, segundo Lyons (1979), o latim não era só uma língua utilizada com fins
religiosos, mas também era considerada a língua universal da diplomacia, da cultura
e da erudição. Daí surgirem vários manuais de língua latina, pois era uma língua
estrangeira que deveria ser aprendida nas escolas por diversos outros povos.
Contudo, tomavam especial cuidado com essa língua, pois valorizavam o seu
aspecto intocável, que buscava sempre ser preservado à medida em que outros
povos começavam a falá-la e, assim, davam sentidos linguísticos diferentes a ela.

8.5 O INTERESSE RELIGIOSO DA IDADE MÉDIA

A língua latina continua a ter sua importância durante anos, de modo que
chega até à Idade Média como a mais estudada e expandida, em particular, por
ser o idioma oficial da igreja ocidental. Camara Jr. (2011) diz que a mais completa
expressão da gramática normativa na Idade Média foi a “Doctrinale Puerorum”, de
Alexandre de Villedieu, no século XII. O caráter pedagógico deu lugar ao tom
filosófico, com base na gramática de Prisciano.
Quando os escolásticos ganharam espaço na sociedade, a abordagem
filosófica da língua voltou a se desenvolver também, com influência dos
ensinamentos de Aristóteles, a partir da ideia de que a gramática era “auxiliar da
lógica”. Na Idade Média, então, desenvolveu-se um estudo lógico da linguagem,
que até os dias atuais possui a sua relevância, tamanho foi o impacto não só no
período, mas também nos séculos posteriores. Também nesse período a disputa entre
analogistas e anomalistas se mantém presente, agora com outro nome (realistas e
nominalistas) e com uma abordagem filosófica da linguagem, com ênfase ao papel
do gramático.
Segundo Camara Jr. (2011), é também parte do pensamento medieval a ideia
de que existe uma estrutura gramatical comum a todas as línguas, sendo mais
evidente no latim: “[...] encontramos aqui a ideia de uma gramática geral que tem
dominado o pensamento dos homens, acerca da linguagem, por muitos séculos”
(CAMARA JR., 2011, p. 31).
Os estudos gramaticais latinos continuaram avançando no período medieval,
mas disputaram “forças” com as línguas faladas que, neste momento, começaram
a despertar certo interesse e curiosidade, devido à expansão do cristianismo. E,

115
justamente pelo avanço dos motivos religiosos, a necessidade de comunicação para
evangelizar outros povos com a doutrina cristã tornou-se um ponto a ser explorado.
Estudiosos da área consideram este momento da história como o embrião dos
estudos de línguas estrangeiras. Nesse sentido, o trabalho de Aelfric, um abade, no
século XI, mostra o interesse entre o anglo-saxão e o latim, na obra “De Grammatica
Latino-Saxonica”, seguida de um “Glossarium”.
Exemplos de estudos nessa direção são sobre as línguas orientais e indígenas
americanas, como os desenvolvidos por Victorinus, Caninius e Pizza, ao longo do
século XVI. Ao mesmo tempo, também surgia um interesse crescente pelas línguas
faladas no mundo que, segundo Camara Jr. (2011), era consequência da
curiosidade do homem do Renascimento, diante de tudo que o circundava na
natureza e na sociedade.
Por fim, o período medieval é marcado por uma concepção de linguagem
como um espelho, em que se deu importância ao significado (aspectos semânticos)
da língua. Dessa forma, a partir do século XV, a tradição de gramáticas gregas e
romanas começou a perder o seu valor, na medida em que estudos de outras
naturezas começaram a ganhar relevância, como o de línguas vernáculas e
exóticas.

8.6 IDEIAS RENASCENTISTAS

Weedwood (2002) distingue duas abordagens diferentes da linguagem neste


momento chamado Renascimento: a abordagem “particular”, com ênfase nos
fenômenos físicos que diferenciam as línguas, e a abordagem “universal” que,
concentra-se nos princípios subjacentes à linguagem, com preceitos filosóficos e
lógicos. Segundo a autora, desde 1500, há uma alternância entre essas duas
abordagens na pesquisa linguística.

116
Para Camara Jr. (2011), as principais manifestações da gramática filosófica no
século XVI foram as obras “De Causis Linguae Latinae”, de Julius Caesar Scaliger, e
“Minerva”, do espanhol Francisco Sanchez de las Brozas. Ambos buscaram
desenvolver uma estrutura lógica que julgavam inerente a todas as línguas.
A valorização da língua latina começou a perder sua força, ao passo em que
as línguas estrangeiras ganharam espaço nos estudos linguísticos europeus, pois cada
país começou a ter interesse e entusiasmo por sua própria língua, resultando nos
louvores em francês, italiano etc., como pontua Camara Jr. (2011). Também crescem
os estudos linguísticos com orientação lógica e preceitos do que é certo e errado,
como as gramáticas francesas e castelhanas, que tinham como objetivo ensinar
cada qual a sua língua para os estrangeiros.
O autor também pontua que o aspecto oral da linguagem começou a ganhar
espaço e uma teoria fonética, preocupada com os sons e com os órgãos envolvidos
na fala, também começou a ser desenvolvida (estudos de cunho biológico), algo
que não ocorreu com tamanha sistematização entre os gregos e romanos,
tampouco na Idade Média.
O ápice do século XVII foi a publicação da “Gramática de Port-Royal”, em
1660, dos autores Claude Lancelot e Antoine Arnauld. O trabalho é considerado
pioneiro nos estudos da filosofia da linguagem e representou um corte
epistemológico (mudança radical de pensamento) e uma ruptura com o modelo
latino de conceber a linguagem. A ideia principal, difundida ao longo de todo o

117
estudo, é a de que a gramática é um conjunto de processos mentais e universais,
logo, a gramática é universal. Chomsky, nos estudos modernos da Linguística,
classifica este período como a “linguística cartesiana”, pela forte influência de René
Descartes e do racionalismo francês.
O caráter do estudo era racional e filosófico e entrava em embate com os
estudos linguísticos da época, voltados ao bom uso da linguagem, que enfatizavam
a parte estilística, sem se interessar pelas causas e fundamentos que estruturam a
linguagem. Segundo Ranauro (2003),

[...] surgem as tentativas de elaboração da gramática filosófica, a


partir do princípio de que a língua é a expressão do pensamento e
que o pensamento é governado pelas mesmas leis em todos os seres
humanos, daí concluir-se que deveria a língua refletir essas mesmas
leis, sendo possível, pois, a elaboração de uma gramática geral,
comum a todas as línguas (RANAURO, 2003, s/p).

Como se observa, a importância dessa gramática reside em ser uma base


para a gramática tradicional, por sua apresentação e descrição dos fatos linguísticos,
sendo de grande relevância também para as gramáticas filosóficas de Portugal e da
Itália, como afirma Ranauro (2003). Por fim, neste período renascentista, segundo
Camara Jr., “[...] a mais importante corrente no século XVII a respeito do estudo da
linguagem foi o esforço de comparar as línguas e classificá-las de acordo com suas
semelhanças” (2011, p. 34), considerando o hebraico como a língua original de toda
a humanidade. Tais preocupações já preconizavam o que, alguns séculos mais tarde,
seria desenvolvido com os estudos histórico-comparativistas, a partir do contato com
o sânscrito, a língua utilizada pelo povo hindu.

8.7 O CONTATO EUROPEU COM O SÂNSCRITO

O sânscrito é uma língua antiga de origem indiana, que possui


aproximadamente 2200 elementos básicos (raízes), capaz de gerar milhões de
palavras a partir deles. No sânscrito, as raízes são o ponto de partida para a formação
de cada palavra derivada, além disso, o próprio radical já indica qual a natureza do
objeto que tal palavra significa. A palavra “sânscrito” significa “aquilo que foi bem
feito”, a partir da raiz ‘kr’ (fazer) e do prefixo ‘sam’ (bem), indicando uma língua bem
elaborada. Por se tratar de uma língua antiga, a sua importância para os estudos
linguísticos advém dos hinos védicos, que são considerados até mais antigos do que
os primeiros textos gregos.

118
Considera-se o contato com o sânscrito um grande marco para os estudos
linguísticos, principalmente no campo das pesquisas de cunho histórico-
comparativista, pois foi graças a essa língua que os estudos comparativos entre uma
língua e outra teve seu início. Estudiosos europeus tiveram contato com o sânscrito e
com a cultura indiana e puderam perceber, a partir de reflexões, que essa língua
possui graus de parentesco com o latim, o grego, o germânico e o persa. Uma língua
distante, originária do dialeto penjabi no nordeste da Índia, foi a responsável por
impulsionar diversas pesquisas acerca de sua origem e de suas relações
genealógicas, como ser membro linguístico de uma família indo-européia.

Por fim, o contato com o sânscrito é considerado um momento importante na


história dos estudos linguísticos pela humanidade, pois foi a partir dele que chegaram
à ideia de língua-mãe. A hipótese principal, percorrida pelos estudiosos, era a de que
as línguas europeias eram a transformação natural dessa língua-mãe, o sânscrito, que
representava um modelo bem próximo dessa “origem”. Foi desse modelo próximo da
língua-mãe que boa parte das línguas ocidentais modernas foram derivadas.

119
120
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Observe a imagem:

Fonte: Vydia Mandir

Com base nos seus conhecimentos sobre os primeiros estudos linguísticos pela
humanidade, é correto relacionar a imagem com

a) a Gramática de Panini e a língua indo-europeia, pois foram responsáveis por


propagar os textos religiosos hindus e os sutras por toda a Europa.
b) o contato com o sânscrito feito pelos povos europeus que tentaram reconstruir a
língua-mãe, chegando até o indo-europeu a partir dos estudos histórico-
comparativistas da Gramática de Panini.
c) os estudos de textos religiosos pelo povo hindu, que culminou nos estudos da
Antiguidade Clássica a partir da Gramática de Panini.
d) a Gramática de Panini, que descreveu os processos que ocorriam no sânscrito,
uma língua antiga indiana que, tempos depois, foi um ponto de partida para os
estudos histórico-comparativistas quando chegaram em solo europeu.
e) o contato entre as línguas indo-europeias e a Gramática de Panini, que é uma
compilação dos conhecimentos difundidos desde a Antiguidade Clássica na
língua indiana antiga, o sânscrito.

2. Considere as seguintes afirmativas sobre os estudos da linguagem na Grécia


Antiga:

121
I. Havia a preocupação em explicar a relação entre o conceito e a palavra utilizada
para designá-lo. Uma questão importante era: havia alguma relação entre a
palavra e seu significado?
II. Ocorreu um embate entre Naturalistas e Convencionalistas, que discutiam se o
processo da língua era algo “normal” ou obedecia a determinadas “convenções”
estabelecidas pela sociedade.
III. Platão e Aristóteles são dois pensadores que exemplificam os estudos
paralinguísticos, tratando da linguagem a partir de uma análise filosófica.
IV.Não houve discussões sobre os processos de funcionamento das línguas.

Estão corretas somente as afirmativas:


a) I, II e IV.
b) I, II e III.
c) I e III.
d) I e II.
e) I, III e IV.

3. Das definições abaixo, qual melhor descreve as tendências analogistas e


anomalistas, que perduraram nos estudos linguísticos desde a Grécia Antiga até a
Idade Média?
a) Anomalistas (convenção): a linguagem é considerada regular, justamente por
refletir a própria regularidade da natureza, sua origem está em princípios mutáveis
que existem fora do próprio homem. Analogistas (natureza): consideram a
irregularidade básica da linguagem como resultado de um tipo de “contrato”
entre os membros da comunidade.
b) Anomalistas (natureza): a linguagem é considerada irregular, justamente por
refletir a própria irregularidade da natureza, sua origem está em princípios eternos
e imutáveis fora do próprio homem. Analogistas (convenção): consideram a
regularidade básica da linguagem como resultado de um tipo de contrato social
entre os membros da comunidade.
c) Anomalistas (natureza): a linguagem é considerada irregular pois sua origem está
em princípios eternos e imutáveis de um contrato social. Analogistas (convenção):
consideram também a irregularidade básica da linguagem, mas como resultado
de um contrato social entre os membros de comunidades linguísticas diferentes.

122
d) Anomalistas (convenção): a linguagem é o reflexo dos princípios eternos e
mutáveis do homem. Analogistas (natureza): a regularidade básica da linguagem
é resultado de um tipo de contrato social entre os membros da comunidade e a
natureza.
e) Anomalistas (natureza):sua origem está em princípios imutáveis dentro do próprio
homem. Analogistas (convenção): sua origem é a linguagem como resultado da
mistura dos membros de uma mesma comunidade.

4. Quais são os componentes básicos de uma gramática latina?


a) A parte gramatical, com as normas linguísticas, as partes do discurso com suas
variações de gênero, tempo, número etc. e a parte de estilo com os gêneros
épico, lírico e romântico aplicados ao ensino de línguas.
b) A parte gramatical, dedicada ao uso correto das palavras nos textos literários, as
partes do discurso, que não admitia o uso incorreto dos gêneros literários e o estilo,
relacionado aos poetas e às formas literárias.
c) A parte gramatical, que trata das variações de gêneros literários, as partes do
discurso, que trata do falar bem e compreender os poetas gregos, e aparte de
estilo com variações de gênero, tempo e número.
d) A parte gramatical, que se dedica a falar e compreender bem os poetas, as partes
do discurso com suas variações de gênero, tempo, número etc. e a parte de estilo
com indicações de precaução contra erros e empregos incorretos de palavras.
e) A parte gramatical, dedicada ao uso correto dos gêneros, as partes do discurso,
que não admitia o uso incorreto das palavras e o estilo, relacionado aos poetas e
seus textos literários.

5. “Desenvolveu-se também intensamente a abordagem ______________ à medida


que os ________________ ganharam terreno. Sob as influências dos ensinamentos de
_____________, a gramática era vista como ‘auxiliar da lógica’” (CAMARA JR.,
Joaquim Mattoso. História da linguística. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2011. p. 31).

Dentre as alternativas abaixo, qual melhor preenche as lacunas sobre as


influências gramaticais nos estudos linguísticos da Idade Média?
a) Lógica / Escolásticos / Platão
b) Filosófica / Estoicos / Platão

123
c) Filosófica / Escolásticos / Aristóteles
d) Etimológica / Gramáticos / Aristóteles
e) Lógica / Gramáticos / Protágoras

6. (UEL - Adaptado)O Renascimento, amplo movimento artístico, literário e científico,


expandiu-se da Itália por quase toda a Europa, provocando transformações na
sociedade. Sobre o tema, é correto afirmar que:
a) o racionalismo renascentista reforçou o princípio da autoridade da ciência
teológica e da tradição medieval, resultando na publicação da Gramática de
Port-Royal.
b) houve o resgate, pelos intelectuais renascentistas, dos ideais medievais ligados ao
uso da língua como fonte de inspiração divina, por isso buscavam fazer um bom
uso, para fins de evangelização.
c) nesse período, reafirmou-se a ideia de homem cristão, que reforçou os sentimentos
de identidade nacional e cultural ao entrarem em conflito com as ideias
gramaticais da Grécia e Roma antigas
d) o humanismo pregou a determinação das ações humanas pelo divino e negou
que o homem tivesse a capacidade de agir sobre o mundo, transformando-o de
acordo com sua vontade e interesse, o que está relacionado aos estudos
linguísticos anomalistas e analogistas dos séculos anteriores.
e) os estudiosos do período buscaram apoio no método experimental e na reflexão
racional, valorizando a natureza e o ser humano. Resultado disso é a Gramática
de Port-Royal, que pensava em um conjunto de processos mentais e universais.

7. Quais foram as duas abordagens linguísticas mais expressivas no início do período


renascentista?
a) A abordagem “particular”, com ênfase nos fenômenos físicos que diferenciam as
línguas, e a abordagem “universal” que, concentra-se nos princípios subjacentes
à linguagem, com preceitos filosóficos e lógicos.
b) A abordagem “anomalista”, com ênfase nos fenômenos físicos ligados à natureza,
e a abordagem “universal”, ligada às expressões gramaticais que existem em
todas as línguas.

124
c) A abordagem “particular”, com ênfase nos fenômenos gramaticais que
diferenciam as línguas, e a abordagem “universal” que, concentra-se nos
preceitos filosóficos e lógicos.
d) A abordagem “universal”, com ênfase nos fenômenos físicos ligados à natureza, e
a abordagem “anomalista”, ligada às expressões gramaticais que existem em
todas as línguas.
e) A abordagem “anomalista”, com ênfase nos fenômenos universais que
diferenciam as gramáticas, e a abordagem “universal” que, concentra-se nos
princípios particulares à linguagem, com preceitos filosóficos e lógicos.

8. Sobre o contato europeu com o sânscrito, é incorreto o que se afirma em:


a) Por se tratar de uma língua antiga, a sua importância para os estudos linguísticos
advém dos hinos védicos, que são considerados até mais antigos do que os
primeiros textos gregos.
b) O sânscrito permitiu inaugurar uma escola linguística europeia a partir dos estudos
sobre a Gramática de Panini no século V a.C.
c) Considera-se o contato com o sânscrito um grande marco para os estudos
linguísticos, principalmente no campo das pesquisas de cunho histórico
comparativista.
d) Graças ao sânscrito, os estudos comparativos entre uma língua e outra teve início
na Europa.
e) Estudiosos europeus tiveram contato com o sânscrito e com a cultura indiana e
puderam perceber que essa língua possui graus de parentesco com o latim, o
grego, o germânico e o persa.

125
OS ESTUDOS HISTÓRICO- UNIDADE

09
COMPARATIVOS NO SÉCULO XIX

9.1 INTRODUÇÃO

Dentre diferentes momentos importantes para a constituição da Linguística


enquanto uma área consolidada, destacam-se o dos estudos histórico-comparativos,
no século XIX. Definido como o estudo da história das línguas, ou seja, o estudo ao
longo do tempo (de maneira diacrônica, isto é, através do tempo), esse é o momento
em que diferentes línguas (como o francês, alemão, inglês etc.) são comparadas
com o objetivo de ver as relações de parentesco que podem ter umas com as outras.
Sendo assim, famílias linguísticas podem ser identificadas entre as diferentes línguas
existentes no mundo.
Uma família linguística é, portanto, um grupo de línguas que possuem o mesmo
ancestral comum que, na área, é chamado de protolíngua. Diante disso, a hipótese
genealógica é assumida pelos estudos histórico-comparativos de que línguas podem
ser classificadas em famílias e consideradas como organismos vivos, isto é, com
possibilidade de mudança ao longo do tempo. Como hipótese principal desses
estudiosos, estava o de que, ao longo do tempo, essas línguas passavam por
mudanças, de progressos ou retrocessos.

Segundo os estudiosos da gramática comparada, esses princípios estão


presentes em todas as línguas. Para eles, a linguagem é regida por princípios gerais e
racionais, de modo que as diferentes línguas são tratadas como casos particulares,
isto é, formas específicas de uso desses princípios que se aplicam a todas as outras.
O estudo de cunho comparativo situa-se na base da formação da linguística

126
moderna com o estudo das línguas indo-europeias e propunha a “gramática
comparada”, que visava à reconstituição da “língua-mãe”.
Orlandi (2009, p. 11) pontua que no início dos estudos, antes das investigações
de cunho histórico-comparativista, a ênfase estava no racionalismo: “os pensadores
da época concentram-se em estudar a linguagem enquanto representação do
pensamento e procuram mostrar que as línguas obedecem a princípios racionais,
lógicos”. Esse estudo lógico da linguagem buscou estabelecer a relação do
pensamento com a linguagem, utilizando a filosofia e a linguística para tal finalidade.
Já em um segundo momento, no século XIX, Orlandi (2009) diz que o ideal
universal não possui a mesma credibilidade e validade dos séculos anteriores. O foco
dos estudos se volta para o fato da linguagem se transformar com o passar do tempo.
O que é preciso e exato não importa como antes e cede o lugar para que a
mudança seja o principal aspecto nesses novos estudos. Como dito pela autora, nos
estudos históricos “[...] se procura mostrar que a mudança das línguas não depende
da vontade dos homens, mas segue uma necessidade da própria língua, e tem uma
regularidade, isto é, não se faz de qualquer jeito” (ORLANDI, 2009, p. 13).
Adiante, são apresentados o surgimento desses estudos histórico-
comparativos, bem como os pressupostos teóricos e os principais autores desse
movimento. Como pontuado anteriormente, tais estudos possuem relevância para a
constituição da área da Linguística enquanto ciência. Deste modo, é importante
olhar para esses momentos históricos dos estudos da linguagem como uma
continuidade, não como uma ruptura entre um momento e outro.

9.2 BREVE HISTÓRICO E PRINCIPAIS ESTUDIOSOS

O século XIX, na Europa, foi o cenário de desenvolvimento dos estudos


histórico-comparativos. Em partes, pois havia um forte interesse pelas antigas línguas
faladas no continente europeu, principalmente na Alemanha e pelas línguas
germânicas. Neste primeiro momento do século XIX, o caráter “informal” desses
estudos era evidente, de modo que a partir da segunda metade do século, foi-se
abrindo espaço para desenvolvimentos teórico-metodológicos. Deste modo, os
estudos linguísticos histórico-comparativos ganharam uma maior formalidade e se
tornaram mais maduros e científicos pelo continente. Assim, os estudos da época
foram se aperfeiçoando de maneira progressiva, com cada nova contribuição sendo
de total importância para o devido reconhecimento da área de estudos.

127
A primeira notícia que se tem sobre o surgimento dos estudos histórico-
comparativos é do final do século XVIII pela identificação das semelhanças lexicais
entre o sânscrito e algumas línguas europeias, o que já havia sido observado e
descrito, inclusive, por um italiano chamado Filippo Sassetti, no século XVI, ao
comparar o sânscrito e o italiano. Pouco antes disso, um jesuíta inglês chamado
Thomas Stephens, em 1583, escreveu sobre a existência de semelhanças entre o
côncani, o grego e o latim. Em 1768, Gaston Coeurdoux, um jesuíta francês, também
apresentou seus estudos comparativos sobre o sânscrito, o grego e o latim,
apontando que as semelhanças derivavam de uma origem comum.
Considera-se que William Jones, um estudioso de origem inglesa, foi o
responsável por apontar as semelhanças entre o grego, o latim, o persa e o sânscrito
e, assim, dar início aos estudos histórico-comparativos pelo continente, de maneira
oficializada, no ano de 1786. Ele reconheceu a existência de uma relação
(parentesco) entre essas línguas, de maneira que fez um estudo descritivo sobre, não
evoluindo tal descrição para um sistema comparativo que explicasse as semelhanças
e diferenças entre as línguas descritas. O seu objetivo não era abordar a questão da
proximidade entre essas línguas, mas de demonstrar a antiguidade dos povos
indianos, examinando as suas línguas, sua filosofia e religião, e, também suas artes,
de modo que estendeu os estudos comparados também a estes outros aspectos da
cultura desses povos.
Após este apontamento de William Jones, um estudioso alemão, em 1808,
chamado Friedrich von Schlegel, publicou a obra Über die Sprache und Weisheit der
Indier (em português, “Sobre a linguagem e a sabedoria dos indianos”). Nela, o
estudioso faz comparações sistemáticas e pontua critérios que auxiliam na
classificação das e entre as línguas. Para ele, existem três tipos de línguas: (1) isolantes,
sem flexões, (2) sintéticas, com flexões, e (3) aglutinantes, sequências de unidades
presas.
Seguindo essa distinção de Schlegel, as línguas isolantes são o chinês, o
tailandês e o vietnamita, pois não possuem fragmentos menores, como as línguas
sintéticas. Estas, por sua vez, apresentam diferentes morfemas e são possíveis de
serem flexionada, como o português e as línguas de base indo-europeia. Já as línguas
aglutinantes são como o japonês, o turco e o húngaro, pois utilizam na formação de
palavras muitos morfemas aglutinados (unidos).
Em 1816, um estudioso alemão chamado Franz Bopp publicou a obra Über das

128
Conjugationssystem der Sanskritsprache in Vergleichung mit jener der griechischen,
lateinischen, persischen, und germanischen Sprache (em português, “Sobre o sistema
de conjugação da língua sânscrita em comparação com o das línguas grega, latina,
persa e germânica”). Considerado o fundador da gramática comparada, nela, o
autor conseguiu defender a hipótese de uma origem comum para as línguas, a partir
de correspondências sistemáticas em sua estrutura gramatical, com análises
baseadas em dados comparativos.
Como apontado por Faraco: “Com isso, podemos [....] explicitar o parentesco
entre línguas (isto é, dizer se uma língua pertence ou não a uma determinada família),
[...] determinar, por inferência, características da língua ascendente comum de um
certo conjunto de línguas. (2005, p. 134). Embora a visão ainda fosse considerada um
pouco romântica e pouco científica, a contribuição de Bopp para os estudos
comparativos é inegável e influenciou diversos outros trabalhos na área, direta ou
indiretamente.

Na sequência, em 1822, Jacob Grimm conduziu um trabalho de comparações


sistemáticas de cognatos entre línguas indo-europeias na busca por
correspondências fonéticas (sonoras). Com isso, a Primeira Lei de Grimm, publicada
no mesmo ano, consistiu na observação de correspondências fonéticas entre
aspectos de línguas germânicas com línguas indo-europeias.
Um outro estudioso importante para o movimento histórico-comparativista,
que tentou desemaranhar a natureza e o mecanismo da linguagem, é o alemão
Wilhelm von Humboldt. Esse autor utilizou a classificação das línguas em isolantes,
aglutinantes e flexionais em sua obra de 1836, Über die Verschiedenheit des
menschlichen Sprachbaus und seinen Einfluss auf die geistige Entwicklung des Men-

129
schengeschlechts (em português, “Sobre a diversidade da estrutura da linguagem
humana e sua influência sobre o desenvolvimento espiritual da humanidade”) para,
dentre outras contribuições, identificar a linguagem humana como um sistema
governado por regras e não um agrupamento de palavras e frases.
Em seguida, o estudioso August von Schleicher publica, em 1861, a obra
Compendium der vergleichenden Grammatik der indogermanischen Sprachen (em
português, “Um compêndio da gramática comparativa das línguas indo-européias,
sânscritas, gregas e latinas”). Nela, são apontadas as características comuns das
línguas com a tentativa de reconstruir a língua original proto-indo-europeia. Sua
hipótese era a de que a linguagem é um organismo vivo e, por isso, passa por
períodos de desenvolvimento, maturidade e declínio.
Para tanto, ele desenvolveu um sistema de classificação de linguagem
próximo à taxonomia botânica, em que traçou grupos de línguas relacionadas e fez
a organização em uma árvore genealógica. Seu modelo ficou conhecido como
ostammbautheorie (em português, “teoria da árvore genealógica) e se transformou
em uma grande contribuição para os estudos em linguística histórica. Segundo o
modelo, há uma língua antepassada que, ao se modificar, gerou diversas
ramificações.
O autor teve influência dos estudos desenvolvidos na área das ciências
biológicas, de modo que aproveitou e utilizou nos estudos linguísticos o que
metodologicamente aparecia em pesquisas das ciências naturais, por isso, inclusive,
alguns nomes são “emprestados” da biologia. Com isso, ele foi o responsável por
aplicar o modelo da árvore filogenética (utilizada na biologia) para representar
famílias linguísticas.
Em 1870, a Lei das Palatais (creditada a diversos autores que observaram tal
descoberta ao mesmo tempo) é um avanço importante em termos metodológicos
para a área, pois colocou fim ao mito de que o sânscrito era uma língua perfeita, o
que ajudava a solidificar alguns preconceitos, como o proferido no discurso de
William Jones, em 1816. Com a maior ampliação dos objetivos da análise
comparativa, foi possível estabelecer correspondência entre o grego e o latim e o
sânscrito. Uma outra lei importante neste cenário de estudos linguísticos comparativo-
históricos é a Lei de Verner, também de 1870. Nela, o estudioso dinamarquês Karl
Verner, a partir da Lei de Grimm, conseguiu explicar algumas exceções apontadas
pela Grimm e, assim, ampliou a comparação entre as línguas.

130
Como é de se observar, desde o início do século XIX até o seu fim, diversos
estudos e descobertas aconteceram, o que ajudou no amadurecimento da área e
na consolidação do método histórico-comparativo, que veremos adiante. Por fim,
segundo Bossaglia (2019, p. 95)., “com os Neogramáticos, ao final do século XIX, a
linguística histórico-comparada já pode ser considerada uma disciplina teórica e
metodologicamente madura” Aqui, observa-se como uma tendência de estudos
está diretamente relacionada à outra, seja para dialogar de maneira harmônica ou
tensa. Mas é inegável as influências que ocorrem entre um grupo de estudiosos e
outros, de modo que cada nova descoberta é uma contribuição que ajuda a
consolidar os conceitos e métodos de uma disciplina/área de estudos.

9.3 O MÉTODO HISTÓRICO-COMPARATIVO

Falar da estrutura de uma família linguística é pensar em uma representação


que se dá no formato de uma árvore genealógica. Como já visto, o modelo foi
proposto por August Scleicher no século XIX. Em uma árvore genealógica, como a
da figura abaixo, cada nó (círculo) representa uma língua conforme explica
Bossaglia (2019, p. 72). Logo, 25 línguas são identificadas como provenientes de uma
mesma protolíngua, que no caso é P, a língua mais antiga:

Figura 2: Exemplo de árvore filogenética de família linguística

Fonte: Bossaglia (2019, p. 71)

No caso dessa árvore genealógica, também chamada de filogenética,


identifica-se P como a língua mais antiga e as línguas de 01 a 15 como as mais

131
recentes, pois estão mais distantes da língua representada pelo nó P. Os nós A, B e C
também são protolínguas de cada grupo de língua que se ramifica a partir delas.
Com isso, A, B e C são irmãs, ao mesmo tempo em que também são mães de cada
uma das línguas derivadas delas (no caso, A é mãe das línguas a1, a2 e a3; B é mãe
das línguas b1 e b2; c é mãe das línguas c1 e c2), como aponta Bossaglia (2019).
Essa relação genética entre as línguas é importante, uma vez que, a partir
dela, pode-se observar melhor o funcionamento do método histórico-comparativo.
Há dois pressupostos que fundamentam esse momento dos estudos, segundo
Bossaglia (2019): (1) a concepção de que as línguas que são diferentes se originam a
partir de um processo de crescente diversificação tendo como ponto de partida uma
mesma língua ancestral; (2) a ideia de que essa crescente progressão das línguas
corresponde a uma progressiva perda do léxico compartilhado entre as línguas.
Ainda segundo a autora, “[...] quanto maior for a distância genética entre
duas ou mais línguas, menor será a quantidade de itens lexicais cognatos”
(BOSSAGLIA, 2019, p. 73). Os cognatos são, palavras que nasceram juntas a partir de
uma mesma palavra-mãe na língua ancestral (como é o caso da língua
representada no nó P na imagem anterior). A respeito disso, Bossaglia diz que

Os cognatos, portanto, são as únicas provas de existência de relação


genética entre línguas diferentes. Sem conseguir identificar cognatos
entre as línguas comparadas, não é possível afirmar que entre elas
exista relação genética, pois faltariam provas (BOSSAGLIA, 2019, p. 73
– destaque da autora).

Com isso, o objetivo da metodologia histórico-comparativa é comprovar que


há uma relação genética entre as línguas analisadas, de modo que o linguista as
seleciona por já haver observado um grau de semelhanças lexicais entre elas. Deste
modo, há 4 passos importantes para que o método seja devidamente aplicado, de
acordo com Bossaglia (2019): (1) seleção de conjunto de cognatos nas línguas a
serem analisadas; (2) identificação das correspondências fonéticas (sonoras) dentro
de cada conjunto; (3) reconstrução de protofonemas (fonemas da protolíngua); (4)
reconstrução do léxico da protolíngua.
Com o método histórico-comparativo, é possível chegar em desvios e,
também, em correspondências entre as línguas comparadas, e são justamente essas
correspondências que permitem reconstruir vários aspectos linguísticos da
protolíngua (língua-mãe). Assim, o linguista que se aventura por esse caminho
percorre o caminho do “fim” ao “início”, com o intuito de chegar até o estado inicial,

132
para observar os léxicos daquela língua-mãe. Só assim ele consegue comprovar a
relação de parentesco entre as línguas, pois neste momento da história, já é aceitável
a ideia de que as línguas evoluem e mudam com o passar do tempo.

De acordo com Schleicher, de fato, as línguas deviam ser


consideradas como organismos que evoluem de acordo com
determinadas leis, passando por diferentes fases/estágios, a saber:
uma fase inicial monossilábica, uma fase aglutinante, uma fase
flexional (a mais perfeita) e, finalmente, uma fase de decadência. Esta
última corresponde às fases históricas (i.e., documentadas) das
línguas, aquelas que o linguista pode examinar (BOSSAGLIA, 2019, p.
94 – destaque da autora).

Por fim, ressalta-se a importância, a partir do pensamento da autora, baseado


em Schleicher, de que é natural que as línguas evoluam, e se torna tarefa da
linguística histórica estudar e percorrer como essas mudanças ocorreram. Faraco
(2005) pontua que a mudança linguística possui certas características, como ser
contínua, pois ocorre em todas as línguas, ao mesmo tempo em que também é
gradual e lenta, não ocorre do dia para a noite, mas se forma pouco a pouco.
Também, outro aspecto a se observar na mudança das línguas é de que há
regularidades, ou seja, não ocorrem de maneira desordenada, sem um porquê, mas
seguem um “padrão”. Com isso, é possível chegar às relações genéticas entre as
línguas, respeitando seus processos de mudanças, que se deram durante anos e
séculos, até se constituírem em uma família linguística.

133
134
FIXANDO O CONTEÚDO

Utilize o quadro “A árvore genealógica das línguas germânicas” para


responder às questões de 1 a 3:

1. É correto afirmar, com base no quadro, que:


a) o holandês é a língua-irmã do inglês.
b) o dinamarquês é uma língua mais antiga do que o sueco.
c) há um total de 15 línguas nesta árvore genealógica.
d) o alto alemão e o iídiche são línguas-mães do baixo alemão.
e) o gótico é a língua mais antiga, por isso está mais distante das outras.

2. Sobre o proto-germânico, é incorreto:


a) é a língua-mãe de diversas outras línguas.

135
b) é a língua mais antiga, a ancestral.
c) não possui nenhuma língua-irmã representada no gráfico.
d) é a língua mais utilizada de todas as línguas germânicas.
e) é a língua em comum entre o inglês, holandês, norueguês, dentre outras.

3. Observe as sentenças a seguir:


I. A língua-mãe é qualquer língua que dá origem à outra, como o proto-germânico.
II. As línguas-irmãs precisam derivar da mesma língua-mãe, como o islandês e o
sueco.
III. O inglês e o gótico não podem ser da mesma família de línguas pois estão muito
distantes na árvore genealógica.

É correto o que se afirma em:


a) I somente.
b) I e II.
c) I e III.
d) II somente.
e) Todas as sentenças estão corretas.

4. Observe atentamente as sentenças a seguir:


I. O período conhecido como Linguística apresenta uma preocupação investigativa
em relação ao estudo da linguagem.
II. O estudo histórico-comparativo das línguas analisa as línguas, buscando as
semelhanças e diferenças entre as palavras de cada uma de modo a reconstruir
o idioma primitivo do qual teriam se originado.
III. O estudo lógico da linguagem mesclou filosofia e linguística e buscou descobrir a
relação entre pensamento e linguagem.

A partir da sua leitura:


a) Somente II está correta.
b) Somente I está correta.
c) I e III estão corretas.
d) I e II estão corretas.
e) Todas as alternativas estão corretas.

136
5. Qual dos autores está corretamente relacionado aos estudos histórico-
comparativistas?
a) William Jones, por ter descoberto a relação genética entre o sânscrito e o hindu.
b) Karl Verner, por ter estabelecido os critérios de análise da árvore genealógica das
línguas.
c) August Schleicher, por ter proferido o discurso inaugural em 1816 sobre o sânscrito
e as línguas indo-europeias.
d) Franz Bopp, por ter fundado a gramática comparada.
e) Jacob Grimm, por ter discutido como os cognatos auxiliam na recuperação da
língua-mãe (protolíngua).

6. Qual é a relação entre a Lei das Palatais e o discurso de William Jones?


a) A Lei das Palatais acabou com o mito de que o sânscrito era uma língua perfeita,
como proferido no discurso de William Jones e que ajudou a construir alguns
preconceitos com outras línguas.
b) William Jones foi o responsável por, em 1816, criar a Lei das Palatais e inaugurar o
movimento dos estudos histórico-comparativistas.
c) A Lei das Palatais contribuiu com o pensamento de William Jones de que o
sânscrito era uma língua perfeita, o que ajudou a dar mais evidência para seu
discurso inaugural.
d) Em 1816, a Lei das Palatais e o discurso de valorização do sânscrito, feito por William
Jones, foram marco importante para a o método histórico-comparativista.
e) Não há relação entre a Lei das Palatais e o discurso de William Jones.

7. “Diferentemente dos estudos linguísticos hegemônicos nos séculos XVII e XVIII, que
abordavam a língua como uma realidade ___________, atemporal e organizada
segundo princípios da lógica (assumidos como necessariamente universais e não
históricos); e diferentemente do pensamento linguístico predominante no século
XIX, que enfocava a língua como uma realidade ____________, entendendo a
ciência da linguagem como apenas e necessariamente histórica [...]” (FARACO,
Carlos Alberto. Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das
línguas. Parábola Editorial: 2005, p. 95)

137
Qual das alternativas a seguir preenche corretamente a lacuna?
a) Estável / Em manutenção.
b) Estável / Em transformação.
c) Em transformação / Estável.
d) Em transformação / Instável.
e) Em manutenção / Instável.

8. Sobre a metodologia utilizada nos estudos histórico-comparados, é correto afirmar


que:
a) tem como objetivo comprovar que as línguas indo-europeias possuem um grau de
semelhança com nenhuma outra língua.
b) prova que não há relação entre árvores genealógicas de famílias linguísticas.
c) utiliza a gramática comparada para analisar as protolínguas e os protofonemas
com o auxílio da Lei de Verner.
d) busca comprovar que há uma relação genética entre as línguas analisadas a
partir de um grau de semelhanças lexicais entre elas.
e) analisa línguas diferentes para chegar à conclusão de que as línguas que não
estão na mesma árvore genealógica são mais ancestrais do que outras.

138
OS ESTUDOS PRÉ-SAUSSURE: O UNIDADE
SÉCULO XIX

10.1 INTRODUÇÃO
10
É de grande importância, neste momento histórico, os estudos paralinguísticos,
que se dedicam aos aspectos não verbais que acompanham a comunicação
verbal. Esses aspectos incluem o tom de voz, o ritmo da fala, o volume de voz, as
pausas utilizadas na pronúncia verbal. A fonética, antes de se consolidar como uma
área, estava inicialmente atrelada aos aspectos auditivos e fisiológicos, mas
conseguiu sua autonomia mais próximo ao fim do século XIX. Ressalta-se, entretanto,
como esses momentos de especulações linguísticas, com tentativas bem-sucedidas,
ou não, de dar conta de uma parte importante para o que é a língua(gem),
contribuíram decisivamente não só para o que temos hoje, mas para o próprio
período.
Mesmo não sendo uma linha do tempo cronologicamente detalhada, é
importante observar como os fatos e os acontecimentos se sucedem uns aos outros
e, assim, permitem a evolução e o aprimoramento da área, até chegar ao que
conhecemos hoje na linguística, com as suas áreas e níveis de análise da língua bem
definidos.
O momento é considerado como “pré-Saussure” (antes do corte
epistemológico instaurado pelo estudioso). E é o estudo completo da fonética, o
trabalho dos neogramáticos e os primórdios de uma filosofia da interação que surtem
um efeito significativo para a linguística que será conhecida no próximo século, o XX.
Segundo Faraco (2005), o corte de Saussure é considerado uma ruptura e, também,
uma continuidade da antiga intuição de que as línguas humanas são “totalidades
organizadas”, de modo que esse pensamento é encontrado em todo o século que
antecedeu o corte saussuriano.

139
10.2 O ESTUDO COMPLETO DA FONÉTICA

Camara Jr. (2011) diz que foi no século XIX que os estudos linguísticos
ganharam uma grande contribuição com os aspectos fonéticos da língua. Resultado
disso é que os aspectos da escrita eram valorizados em detrimento dos aspectos do
som. Como salienta o autor, as questões que envolvem a fala eram tidas como
espontâneas e naturais, o que não gerava grandes reflexões e análises. Não significa,
contudo, que os sons foram observados somente no século XIX, pois os gregos e os
gramáticos romanos, mesmo que de maneira simplória e superficial, observaram
alguns aspectos da audição. Na Idade Média, tal estudo foi deixado completamente
de lado.
Nos séculos XVII e XVIII, com o estudo das línguas estrangeiras, possibilitou o
contato maior com a questão dos órgãos fonadores, especificamente por conta da
pronúncia das palavras. Em sequência, no século XIX, a gramática do sânscrito foi
uma forma de contemplar a parte fonética de uma língua. Os hindus desenvolveram
uma descrição completa dos sons vocais de sua língua, registrando as mudanças
sonoras com uma abordagem articulatória, isto é, observando os movimentos dos
órgãos fonadores responsáveis pela produção dos sons.
Segundo Camara Jr., “a fonética se desenvolveu nos meados desse século
através de um estudo biológico da linguagem, quando as ciências naturais
ganhavam impulso decisivo” (2011, p. 81). Isso significa que os aspectos fisiológicos
ganharam espaço dentro dos estudos linguísticos, principalmente nos estudos do
alemão K. N. Rapp, que buscou a evolução dos sons vocais do grego, latim e gótico
em paralelo com as línguas atuais europeias, em meados de 1830.
Em 1840, os estudos continuaram com a publicação do livro Fisiologia da voz
humana, do estudioso alemão Liskovius. Dentre os anos de 1850 e 1870, diversos
estudiosos se voltaram aos estudos da voz humana e dos órgãos da fala. Entretanto,
é em 1876, com a publicação de Fundamentos da fisiologia vocal, por Eduard

140
Sievers, um estudioso alemão, que foi o ponto alto dos estudos fonéticos. Isso ocorreu,
pois “[...] assinala o advento da disciplina fonética, separada da fisiologia e colocada
sob o domínio da linguística” (CAMARAJR., 2011, p. 82).
A fonética, nestes termos, contribuiu tanto para os estudos histórico-
comparativistas, desenvolvidos paralelamente na época, e com a constituição da
linguística, ainda que ela não tenha sido incluída devidamente na área, como
pontuado pelo autor. Os estudos se desenvolveram no limite entre a linguística e as
ciências naturais, dada a natureza dos sons vocais e sua produção fisiológica.
Contudo, tal problemática foi resolvida na segunda década do século XX e a
fonética, com seus procedimentos de análise bem definidas, tornou-se uma área
bem consolidada dentro da linguística, a partir do interesse inicial pelos sons vocais
das línguas.

10.3 NEOGRAMÁTICOS

Na década de 1870, surge o movimento dos neogramáticos, considerado


paralelo ao dos estudos históricos. Sua ênfase estava, contudo, em conferir aos
estudos um tom de cientificidade e precisão não presentes antes. Faraco (2005) diz
que a Neogramática foi um movimento no século XIX de uma nova geração de
estudiosos das línguas que foram contrários a certos pressupostos da gramática
histórico-comparativa praticada na época. Em consonância, Silva (2008) diz que eles
“[...] pregavam a teoria da transformação das línguas à imagem e semelhança da
transformação dos seres vivos, isto é, eles acreditavam que a língua tinha seu ápicee
seu declínio” (s/p). O aspecto da transformação significa pensar nas línguas vivas
como seres vivos.
As ideias desenvolvidas pelo estudioso alemão Wilhelm Scherer, em 1868, data
da publicação do seu livro A respeito da história da língua alemã, foram de grande
relevância para o movimento denominado “neogramático”. Segundo Camara Jr.
(2011), Scherer defendia as leis fixas na mudança fonética e enfatizava a importância
da fonética para o estudo histórico da linguagem. Por isso, considera-se que o
movimento teve início por meio de um comunicado que criticava os métodos mais
antigos praticados na comparação linguística.
A principal hipótese dos estudos é a de que as relações linguísticas são
perceptíveis na fala individual, o que permite pensar na pesquisa linguística e na

141
pesquisa psicológica, juntas. Com isso, torna-se importante relacionar o uso coletivo
e o individual da língua, para entender melhor o mecanismo da mudança linguística,
percorrida por esses estudiosos. Para eles, a língua sofria alterações por meio de
fatores fonéticos, mas não incluíram em seus estudos os aspectos morfológicos ou
sintáticos.
Os neogramáticos “formularam uma teoria, na qual se assumiu que as
mudanças fonéticas tinham um caráter de absoluta regularidade e, portanto,
deveriam ser entendidas como leis que não admitiam exceções” (FARACO, 2005, p.
51-2). Isso significa que a mudança sonora é entendida como automática, por
considerar somente os aspectos fonéticos nesta linha de reflexão. A analogia
também foi um princípio importante para o desenvolvimento das teorias
neogramaticais, uma vez que via nela a impossibilidade do funcionamento das leis
fonéticas, pois consideravam que a mente humana podia interferir na mudança
linguística.
A sua posição contrária aos gramáticos histórico-comparativistas está em não
reconstruir estágios antigos das línguas (como aqueles faziam), mas em focalizar os
mecanismos da mudança, os princípios gerais responsáveis que fazem com que as
línguas mudem. Os neogramáticos buscavam, em síntese, formular uma teoria da
mudança.
O alemão Hermann Paul foi um estudioso expressivo para esse período dos
estudos linguísticos. Ele foi um dos neogramáticos cujo trabalho tinha o objetivo de
explicar como se dava a mudança no indivíduo e na sociedade em geral, resultando
na identificação das regularidades das mudanças linguísticas, o que foi uma grande
contribuição para a área. O autor afirma em seus estudos que a mudança se dá por
meio dos "passos infinitesimais", sendo que a expressão ficou conhecida como "lei do
mínimo esforço".
Essa lei está relacionada ao princípio do “maior conforto”, em que a
articulação da língua se adapta às mudanças fonéticas e a espontaneidade da
produção dos sons, sendo que até mesmo em línguas distintas as mudanças podem
coincidir, pela acomodação entre os sons mais próximos produzidos por um aparelho
fonador semelhante.

142
Importante frisar que as teorias evolucionistas, como a de Charles Darwin, e as
recentes descobertas de que a língua é um organismo vivo, com nascimento,
desenvolvimento e morte, fizeram com que os neogramáticos atribuíssem a evolução
histórica das línguas (já estudada anteriormente) a determinadas leis fonéticas,
consideradas, por eles, regulares e imutáveis. Com isso, seria possível reconstruir as
formas originais de que haviam surgido, embora houvesse algumas limitações nessa
perspectiva fonética.
A ideia defendida pelos neogramáticos, de que a língua está no indivíduo e,
por isso, não pode ser vista como independente do falante, contribuiu e influenciou
os linguistas posteriores. É por esse motivo que, para eles, as mudanças têm origem
nesse indivíduo falante e, por consequência, uma orientação psicológica subjetivista
foi inserida no estudo da mudança defendida pelos estudiosos da época.

10.4 OS PRINCÍPIOS DA FILOSOFIA DA INTERAÇÃO

Uma tendência nos estudos linguísticos que começou a dar seus primeiros
indícios já no século XVIII e ao longo do século XIX foi o estudo da interação. Nesse
momento, não há uma sistematização tal qual explorada, atualmente, com as
abordagens discursivas e interacionais, entretanto, é de suma importância o
vislumbre das contribuições que essas primeiras reflexões delegaram à linguística.
Faraco (2011) ressalta que, ao mesmo tempo em que a língua era pensada como
um sistema (gramatical), também foi vista como uma atividade sistemática (do
espírito humano).
É neste momento que o pensamento interacional começou a conquistar o seu

143
espaço, mesmo diante da perspectiva estrutural da língua. Contudo, “[...] o tema da
interação, da intersubjetividade, do dialógico, ou [...] o tema da relação EU-TU foi
copiosamente tratado” (FARACO, 2011, p. 46). Isso significa, portanto, que essa
perspectiva da interação, mesmo que sem afetar os estudos estruturais amplamente
difundidos por Saussure e seus sucessores, teve a sua importância já no início do
século XX.
No pensamento moderno, data do século XVIII o surgimento da temática da
relação EU-TU, estritamente relacionada com o sujeito cartesiano (transparente a si
mesmo no ato imediato de refletir sobre si e de dar fundamento à sua atividade
cognitiva), como diz Faraco (2011). Entretanto, ainda que haja um pensamento
acerca do “eu” na linguagem, a ênfase estava no objeto (o “ele”, e não outro sujeito
(o “tu”).
Credita-se a Friedrich H. Jacobi, um linguista alemão do século XVIII com base
filosófica, as primeiras reflexões sobre essa relação EU-TU na linguagem, presente,
principalmente, na sua crítica à obra sobre Baruch Spinoza (filósofo holandês). A
proposição de Jacobi “O EU é impossível sem o TU” (FARACO, 2011, p. 47), no formato
de nota de rodapé, já declarava o seu posicionamento acerca das relações
interacionais que envolvem os sujeitos.
Outros nomes importantes para esse princípio da interação são dos filósofos
Georg Hegel e Ludwig Feuerbach, que continuaram as reflexões acerca da questão
interacional. Hegel argumentou acerca da autoconsciência nascer do outro (outra
consciência), já Feuerbach teceu reflexões acerca da questão do intersubjetivo
enquanto papel constitutivo das relações e não só de subordinação.
Como pontua Faraco (2011), ainda que não se discorresse sobre a questão da
linguagem junto ao intersubjetivo, amplamente contemplado pelos filósofos, é
considerado já uma base para o que surgirá no início do século XX, com a obra do
Círculo de Bakhtin que, de maneira articulada, relaciona a linguagem ao sujeito. A
base dessa relação é o princípio do dialogismo, que é constituído por relações
ideológicas em um enunciado, compreendido por esses estudiosos como uma
unidade da interação social.
Dessa forma, o sujeito de linguagem (que não é o sujeito de carne e osso, mas
o sujeito do intelecto, das relações sociais), ao ter contato com outros enunciados,
interage com os discursos dos outros por meio da dialogia, concordando ou
discordando, complementando e se construindo na interação. A linguagem, para

144
eles, é dialógica e os enunciados são proferidos por vozes sociais que encontram
outras vozes sociais, por meio do diálogo, de uma interação viva. O dialogismo não
se restringe ao diálogo face a face, mas a todo enunciado no processo de
comunicação.
Ainda que a questão da interação, tão cara e presente no pensamento do
Círculo de Bakhtin, e da intersubjetividade tenha se desenvolvido de maneira mais
explícita entre os filósofos do século XVIII e XIX, considera-se que o que foi
desenvolvido até este momento histórico é anterior à linguística moderna, fundada
por Saussure. Estudiosos se referem a esse período como o dos estudos históricos, que
se contrapõe aos estudos sincrônicos, intensamente praticados no século XX. Faraco
(2011) pontua que

O século XIX nos deixou [...] o delineamento claro da língua como uma
realidade com história (sob mutação permanente no eixo do tempo);
reorganizou nossa percepção da diversidade (demonstrando
sistematicamente a existência de uma rede de relações ‘genéticas’
entre várias línguas diferentes); deu forma ao senso de sistema
(exercitando perspectivas biologizantes, psicologizantes e
sociologizantes, bem como lançando as condições para o grande
corte sistêmico saussuriano) (p.45).

Por isso, é importante frisar que os estudos desenvolvidos nesse momento foram
de grande importância para o que será a consolidação da Linguística como uma
área propriamente dita. Portanto, mesmo que os estudos estejam desenvolvidos em
outras áreas (próximas à linguística, pois são de natureza humana), há uma
confluência que os aproxima e os faz serem vistos de maneira próxima, para a
compreensão de como os pensamentos se constituíram, mesmo que sejam ideias
opostas. Os estudos linguísticos (junto às outras áreas do conhecimento) são vistas
como um continuum, não como uma ruptura.

145
146
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Em 1876, a publicação do livro “Fundamentos da fisiologia vocal”, do autor Eduard


Sievers, foi considerada um marco para os estudos linguísticos. A justificativa
correta para esse fato está em:
a) A publicação do livro tem relação direta com o surgimento da disciplina fonética,
agora separada da fisiologia e colocada junto à linguística.
b) A publicação do livro tem relação direta com o surgimento da linguística, unindo
fisiologia e fonética.
c) A publicação do livro tem relação direta com o surgimento da disciplina fonética,
pois uniu a fisiologia e a linguística.
d) A publicação do livro não tem relação direta com o surgimento da disciplina
fonética, a sua importância está em separar a fisiologia como área autônoma da
linguística.
e) A publicação do livro tem relação direta com o surgimento da disciplina linguística,
a sua importância está em unir a fisiologia e a fonética.

2. Sobre o estudo completo da fonética, um grande avanço para o século XIX, pode-
se afirmar que:
a) Inicialmente, os estudos fonéticos se desenvolveram no limite entre a linguística e
a filosofia, dada a natureza dos sons vocais e sua produção filosófica.
b) Inicialmente, os estudos fonéticos se desenvolveram no limite entre a linguística e
as ciências naturais, dada a natureza dos sons vocais e sua produção fisiológica.
c) Desde o início, os estudos fonéticos já eram consolidados e faziam parte da
linguística, pois as ciências naturais não se importavam com a emissão dos sons
vocais e sua produção fisiológica, cabendo à linguística estudá-los.
d) Desde o início, os estudos fonéticos já eram consolidados e faziam parte das
ciências naturais, pois os sons vocais não tinham lugar na linguística por se tratar
de uma produção fisiológica e não gramatical.
e) Desde o início, os estudos fonéticos encontraram dificuldade para se
consolidarem, não faziam parte da linguística nem das ciências naturais, pois não
se sabia a origem dos sons vocais.

147
3. Sobre os gramáticos histórico-comparativistas e os neogramáticos, escolha a
alternativa correta.
a) Os gramáticos histórico-comparativistas buscavam reconstituir estágios antigos das
falas e das línguas, já os neogramáticos focalizavam reconstituir as gramáticas e
seus mecanismos de mudança.
b) Os gramáticos histórico-comparativistas buscavam mudar os estágios atuais das
línguas, já os neogramáticos focalizavam a mudança que as línguas sofriam nos
séculos anteriores.
c) Os gramáticos histórico-comparativistas buscavam reconstituir estágios atuais das
línguas, já os neogramáticos focalizavam os mecanismos da estabilidade, o que
faz com que as línguas evoluam.
d) Os gramáticos histórico-comparativistas buscavam reconstituir estágios antigos das
línguas, já os neogramáticos focalizavam os mecanismos da mudança, o que faz
com que as línguas mudem.
e) Os neogramáticos buscavam reconstituir estágios antigos das línguas, já os
gramáticos histórico-comparativistas focalizavam os mecanismos da mudança, o
que faz com que as línguas mudem.

4. “O último quarto do século XIX ficou caracterizado como a época dos


_____________ [...]. A característica do programa desse grupo foi o questionamento
dos pressupostos tradicionais da prática ____________________ [...] e o
estabelecimento de uma orientação metodológica diferente e de um conjunto
de postulados teóricos para a interpretação da __________________” (FARACO,
Carlos Alberto. p. 34)

Qual das alternativas a seguir preenche corretamente as lacunas?


a) Neogramáticos / Gramatical / Mudança fonética.
b) Neogramáticos / Histórico-comparativa / Mudança linguística.
c) Histórico-comparativos / Neogramatical / Mudança linguística.
d) Histórico-comparativos / Gramatical / Mudança fonética.
e) Neogramático / Histórico-comparativa / Mudança gramatical.

5. Qual das opções abaixo melhor define o que é a “lei do mínimo esforço”,
creditada a Hermann Paul?

148
a) A “lei do mínimo esforço” está relacionada ao princípio do “menor conforto”, uma
vez que os gramáticos histórico-comparativistas consideram que a articulação da
língua se adapta às mudanças fonéticas e não à espontaneidade da produção
dos sons.
b) A “lei do mínimo esforço” está relacionada ao princípio do “maior conforto”, uma
vez que os neogramáticos consideram que a articulação da gramática se adapta
às mudanças do meio, como Charles Darwin propôs nas teorias evolucionistas.
c) A “lei do mínimo esforço” está relacionada ao princípio do “maior conforto”, uma
vez que os neogramáticos consideram que a articulação da língua se adapta às
mudanças fonéticas e à espontaneidade da produção dos sons.
d) A “lei do mínimo esforço” está relacionada ao princípio do “maior conforto”, uma
vez que os neogramáticos consideram que a articulação da língua se adapta às
mudanças morfológicas e à espontaneidade da produção das gramáticas.
e) A “lei do mínimo esforço” não se relaciona a Hermann Paul, mas sim às teorias
evolucionistas de Charles Darwin, em que considera que a articulação da língua
se adapta às mudanças fonéticas e à espontaneidade da produção dos sons.

6. Considere a afirmação a seguir:


“Os neogramáticos possuíam como principal postulado o de que as mudanças
sonoras ocorriam através de um processo regular chamado ‘leis fonéticas’”.
RODRIGUES, Letícia; FERNANDES, Paula. Os neogramáticos. In: https://petletras.wordpress.com/2015/10/27/os-neogramaticos/.

A afirmação sobre os neogramáticos está


a) correta, pois desenvolveram essa ideia com base na filosofia da interação.
b) correta, pois foram os responsáveis por essa ideia ao longo do século XIX.
c) errada, pois eles buscavam as regularidades e não as mudanças, por isso o nome
“leis fonéticas”.
d) errada, pois eles se dedicaram às “leis morfológicas” e não as “leis fonéticas”
e) correta, pois foram eles e que se dedicaram e foram os responsáveis pela criação
da Fonética junto aos estudos histórico-comparativistas.

7. “A __________ foi utilizada pelos ____________ como um recurso para explicar


mudanças que escapavam às __________________, quer dizer, um fator de natureza
que pretendiam ser possível isolar e controlar” (BATTISTI, Elisa; OTHERO, Gabriel;

149
FLORES, Valdir do Nascimento. Conceitos básicos de linguística: noções gerais. São
Paulo: Contexto, 2022, p. 152)

Qual das alternativas a seguir preenche corretamente as lacunas?


a) Analogia / Neogramáticos / Leis analógicas
b) Fonética / Neogramáticos / Leis fonéticas
c) Fonética / Neogramáticos / Leis gramaticais
d) Analogia / Neogramáticos / Leis gramaticais
e) Analogia / Neogramáticos / Leis fonéticas

8. Jacobi, um filósofo alemão do século XVIII, fez a seguinte proposição: “O EU é


impossível sem o TU”. Com isso, ele declarava o seu posicionamento sobre:
a) As relações interacionais que envolvem os sujeitos, tema que só foi explorado
significativamente nos estudos linguísticos anos mais tarde.
b) As relações interacionais que envolvem os sujeitos, tema que foi explorado
significativamente nos estudos linguísticos no século XVIII.
c) As relações filosóficas que envolvem os sujeitos, tema que foi explorado
significativamente nos estudos linguísticos anos mais tarde.
d) As relações filosóficas que envolvem os sujeitos, tema que foi explorado
exaustivamente nos estudos linguísticos do século XVIII.
e) As relações interacionais que envolvem os sujeitos, tema que ainda não foi
explorado nos estudos linguísticos.

150
A LÍNGUA COMO OBJETO DA UNIDADE
LINGUÍSTICA: O SÉCULO XX

11.1 INTRODUÇÃO
11
É neste momento da história dos estudos linguísticos que há uma mudança de
perspectiva para o que vinha sido estudado como língua(gem). Não se opera mais
fortemente com a descrição histórica da língua, como faziam os gramáticos histórico-
comparativistas. Os estudos começam a enfatizar a linguagem em si mesma e o seu
caráter sociocultural (ainda que não de maneira expressiva). O estruturalismo é o
movimento de estudos linguísticos responsável por essas mudanças, sendo o nome
de Ferdinand de Saussure e Leonard Bloomfield os mais notáveis do período para a
Linguística, que ganha o status de ciência, logo no início do século XX.
Inaugura-se, assim, o que se convencionou chamar de “linguística moderna”,
visto que as contribuições dadas por Saussure foram decisivas para a consolidação
da área. Contudo, convém ressaltar que os avanços nos estudos da área não se
limitam a esse estudioso, tampouco a essa perspectiva. Junto ao estruturalismo,
também há o crescimento de uma forte tendência nos estudos linguísticos, que se
contrapõe diretamente às suas ideias: o formalismo. É possível observar, portanto,
como os acontecimentos se relacionam de maneira a criar um embate de ideias (o
que não significa que uma é melhor do que a outra, mas que pensam de maneira
diversa sobre um mesmo objeto, a língua).

11.2 O ESTRUTURALISMO E SUAS PRINCIPAIS IDEIAS

As teorias estruturalistas constituem, na linguística moderna, um significativo


avanço. Os estruturalistas contribuíram para o desenvolvimento de pesquisas sob o
título de uma ciência da linguagem que, com o corte epistemológico de Saussure,
conferiu à linguística a cientificidade que muitos não observavam nos estudos
anteriores, ao afirmar que o objeto da área é a língua. A partir de seus pressupostos,
diversos linguistas ampliaram os conhecimentos e acrescentaram novas concepções
acerca dos estudos linguísticos.
O estruturalismo, em linhas gerais, busca uma base comum para todos os

151
elementos de um sistema e, assim, torna possível entender como o conhecimento se
dá naquela área (na psicologia, é no intelecto psicológico, na sociologia, é na
estrutura da sociedade, na linguística, é na linguagem e assim por diante). Assim, o
estruturalismo linguístico, de Saussure, no século XX, afirma que a língua é um sistema,
o que significa dizer que é um conjunto de elementos organizados dentro de uma
estrutura.
Embora a ideia tenha se concentrado entre os intelectuais em solo francês,
com os estudos linguísticos, o estruturalismo é um método de análise científica que se
desdobra pelas Ciências Humanas em geral, em áreas como a psicologia, a
sociologia, a filosofia, a antropologia e a própria linguística. Ou seja, o estruturalismo
é um movimento intelectual que não se restringe somente à linguística, mas também
está presente em outros segmentos da sociedade. Assim como também não se limita
à Europa, mas se desenvolve em outros locais, como a América do Norte.
A ideia básica do estruturalismo, na linguística, com seus métodos e princípios,
é a de que a língua é uma estrutura (sistema), o que significa que uma parte depende
da outra para fazer sentido, de modo que cabe ao linguista analisar o funcionamento
e a organização desses elementos dentro da estrutura. Sobre a noção de “sistema”,
Costa (2011) salienta que ele é o resultado “[...] da aproximação e da organização
de determinadas unidades. Por possuírem características semelhantes e
obedecerem a certos princípios de funcionamento, essas unidades constituem um
todo coerente, coeso” (p. 113). Portanto, ao pensar na organização e
funcionamento de um sistema, é possível chegar às unidades que o constituem como
tal e que permitem a organização dessa estrutura.
O Curso de linguística geral, obra que reúne as ideias de Saussure anotadas
por seus alunos, defende a hipótese de que a língua funcionava como um sistema,
um todo coerente e organizado. Uma análise do funcionamento do sistema, como
esse se estrutura, foi capaz de mostrar quais eram as unidades mínimas que o
constituíam. Esse pensamento foi a base de todo o estruturalismo linguístico ao longo
do século XX, em que a língua é entendida como forma (estrutura) e não como
substância (matéria pela qual ela se manifesta).

11.3 FERDINAND DE SAUSSURE E O CORTE EPISTEMOLÓGICO

Entre 1906 e 1910, Saussure ministrou 3 (três) cursos sobre linguística na


Universidade de Genebra. Após a sua morte, em 1916, dois de seus discípulos, Charles

152
Bally e Albert Sechehaye, compilaram as anotações de alunos que compareceram
a estes cursos e, juntos, publicaram o conhecido Curso de linguística geral. Desse
modo, o acesso às ideias de Saussure é feito por intermédio de seus alunos e das
anotações e reflexões vistas ao longo dos seus cursos ministrados, tornando-se,
portanto, uma obra póstuma.

Figura 3: Ferdinand de Saussure

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3miX7Lr. Acesso em: 20 jan. 2022.

Saussure compreendia a Linguística como um ramo da ciência mais geral dos


signos, chamada de Semiologia. Ou seja, para ele, a Semiologia é uma ciência que
estuda a vida dos signos no seio da vida social (SAUSSURE, 2006), o que significa
pensar a Linguística como uma parte que também se beneficia da teoria dos signos
e da própria Semiologia. Considera-se, com isso, que Saussure instaurou um corte
epistemológico nos estudos linguísticos, ao propor uma forma específica de reflexão
e análise, tendo a língua como objeto de estudo. Para Faraco, “[...] Saussure realizou
um grande corte nos estudos linguísticos. Suas concepções deram as condições
efetivas para se construir uma ciência sincrônica da linguagem (2005, p. 28).
Considera-se o corte epistemológico feito por Saussure, dentro dos estudos
linguísticos, como a possibilidade da imanência, o que significa pensar a língua como
um sistema de signos independentes. O resultado disso é se constituir, nesse
momento, uma ciência autônoma da linguagem sob a perspectiva sincrônica

153
(estudo da língua em um momento específico), sem deixar de lado o fato de que só
foi possível por todos os outros estudos existentes antes desse.
Este corte epistemológico se deu pela necessidade que havia dentro dos
estudos linguísticos, desenvolvidos até então, de tomar uma direção mais precisa
quanto aos seus métodos e objeto. A necessidade levou o campo dos estudos
linguísticos, na figura de Saussure, à preocupação de comprovar que a Linguística,
enquanto uma área, devia se ocupar da língua. Refere-se à língua, na concepção
saussuriana, como um conjunto de elementos (um sistema) que obedecem a certos
princípios de funcionamento que podem ser estudados de maneira simultânea
(sincronia) ou ao longo do tempo (diacronia). Nesse sentido, distingue-se, no Curso
de linguística geral, língua e linguagem:

Mas o que é a língua? Para nós, ela não se confunde com a


linguagem; é somente uma parte determinada, essencial dela,
indubitavelmente. É, ao mesmo tempo, um produto social da
faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias,
adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade
nos indivíduos. Tomada em seu todo, a linguagem é multiforme e
heteróclita [...], ao mesmo tempo física, fisiológica e psíquica
(SAUSSURE, 2006, p. 17).

Como é possível observar, a distinção de Saussure entre língua e linguagem


busca dar uma direção precisa aos estudos linguísticos e, além disso, delinear o
caminho pelo qual ele iria percorrer na instituição simbólica de uma ciência da
língua. Com esse recorte do que é compreendido como língua (um produto social
da linguagem), Saussure consegue legitimar uma ciência da língua, a Linguística.

Figura 4: Diagrama representativo dos conceitos de língua e linguagem

Fonte: Nunes (2018, p. 11)

154
Pensar língua e linguagem, para Saussure, era uma forma de mostrar o que ele
priorizaria naquele momento de estudo, sem deixar de lado a importância da outra
parte, uma vez que estão diretamente relacionadas. Por definição, a língua se
beneficia de aspectos da linguagem para que, assim, possa ser compreendida como
uma parte significativa dentro dos estudos. Como é possível encontrar no Curso de
linguística geral (2006), Saussure se dedicou a conceituar o que é língua: “ela é a
parte social da linguagem” (p. 22), “constitui-se num sistema de signos onde, de
essencial, só existe a união do sentido e da imagem acústica” (p. 23) e “é um objeto
de natureza concreta” (p. 23).
Tais ideias, utilizadas para se pensar a língua, como “signos”, “social” e
“sentido”, se filiam ao estruturalismo, do qual Saussure faz parte. O movimento possui
uma visão sistemática da língua que, posteriormente, será o centro das discussões de
outros estudiosos, uma vez que não conseguem compreender a linguagem somente
a partir da língua, mas também consideram outros elementos, como o sujeito, a
história e a fala (o uso da língua feito por cada sujeito falante). Nesse sentido, os
estudos posteriores se voltam à relação entre o nível linguístico e o extralinguístico,
desconsiderado por Saussure no momento de suas contribuições.

155
11.4 O SIGNO LINGUÍSTICO E AS DICOTOMIAS SAUSSURIANAS

No estruturalismo, o movimento intelectual ao qual Saussure se filia, a língua é


compreendida como um sistema articulado e homogêneo, em que elementos
estabelecem uma relação de coesão. O estudo da língua se centra nela mesma,
como diz Costa (2011): “é o [...] estudo imanente da língua, o que significa dizer que
toda preocupação extralinguística deve ser abandonada, uma vez que a estrutura
da língua deve ser descrita apenas pelas suas relações internas (p. 115). Nesse
sentido, o fato de a língua ser um sistema, para os estruturalistas, significa dizer que só
possui relevância o que é puramente imanente, a língua como um sistema de signos
independentes, de modo que os aspectos extralinguísticos ou contextuais ficam de
fora de suas preocupações.

156
No Curso de linguística geral (2006), Saussure opera com algumas dicotomias
(pares de oposição) para fundamentar o seu pensamento. Discorre, então, sobre a
natureza do signo linguístico, o que possibilita compreender a visão estruturalista de
língua. Dentre as principais dicotomias saussurianas, destacam-se a língua e fala, a
sincronia e diacronia, o paradigma e sintagma e o significante e significado. A
primeira dicotomia, língua (langue) e fala (parole), opõe a ideia de algo social
(língua) e individual (fala). Para ele, a língua é um sistema de valores em oposição e
está presente como produto social na mente de cada falante, é a vertente social da
linguagem. Já a fala, por sua vez, é um ato individual e, portanto, se relaciona com
fatores externos (extralinguísticos). Convém ressaltar que foi a língua, não a fala, o
objeto delimitado por Saussure como o central para suas análises.
A dicotomia sincronia e diacronia está relacionada ao método de
investigação e se manifesta pela forma que o objeto (língua) poderá ser observado.
Uma visão sincrônica da língua prevê um estudo descritivo em determinado período,
sem precisar considerar toda a sua história, o que não ocorre com a visão diacrônica
da língua, voltada para um viés histórico e evolutivo. Ao propor uma perspectiva
sincrônica, Saussure conferiu à estrutura da língua o caráter de funcionamento em
um determinado momento, se opondo à linguística histórico-comparativista
amplamente desenvolvida no século anterior.
Por sua vez, a dicotomia sintagma e paradigma está relacionada ao
encadeamento de elementos linguísticos (sintagma) e ao conjunto desses elementos
que se associam na memória do falante (paradigma) e que assim formam conjuntos.
Conhecido como o “eixo da combinação”, o sintagma representa a impossibilidade
de um falante pronunciar dois elementos ao mesmo tempo, uma vez que este só
passa a existir (ter valor) quando está em contato com outro elemento. O paradigma,
conhecido como “eixo da seleção”, é uma reserva de elementos da língua, são as
diferentes possibilidades existentes para serem escolhidas e utilizadas na
comunicação.
No exemplo, é possível observar como o eixo seletivo (paradigmático) e o eixo
combinatório (sintagmático) se relacionam:

157
Figura 5: Exemplo de relações entre sintagma e paradigma

Fonte: Disponível em https://bit.ly/39dy4GD. Acesso em: 20 jan. 2022.

Os elementos combinados formam a frase “Prazer em ver” que, por sua vez,
geram um sentido. Se os elementos fossem combinados de outra forma, com outras
escolhas de palavras, sentidos diferentes seriam gerados por outras combinações,
como “Orgulho em visualizar” ou “Satisfação em observar”. Isso porque foram
selecionadas certas palavras para ocuparem certos lugares na frase. Ou seja, a
possibilidade de escolher entre diferentes substantivos (orgulho, gosto e satisfação) e
verbos (visualizar, assistir e observar) é o que constitui o paradigma. Já o sintagma é
a materialização dessas escolhas, combinadas e observadas nas falas das pessoas,
nos textos etc.
Por fim, a dicotomia significante e significado está estritamente ligada ao
entendimento do signo linguístico. Para o autor, a combinação do significante e do
significado resulta no signo, sendo a união de uma imagem acústica (o significante,
uma cadeia de sons) e o conceito (o significado, no plano do conteúdo). Como é
possível observar na imagem representativa do signo, ambos se relacionam
mutuamente, de maneira que não é possível conceber um sem o outro.

158
Figura 6: Representação do signo linguístico

Fonte: Nunes (2018, p. 14)

Para exemplificar o que é signo para Saussure, eis um exemplo:

Figura 7: Exemplo de signo linguístico

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xlNIZH. Acesso em: 20 jan. 2022.

No exemplo, o signo “mesa” é uma junção do significante (imagem acústica)


e significado (conceito). Juntos, eles formam o signo e não existem de maneira
isolada. Isto significa que a imagem acústica é uma cadeia de sons e diz respeito à
parte física (material) do signo, seja em sua sonoridade ou grafia. E significado é o
conceito, a imagem que vem à mente de uma pessoa quando ouve ou lê. Por ser a
representação mental de um objeto de acordo com a realidade social de cada
pessoa, o signo “mesa” pode trazer a ideia variável de ser uma mesa de madeira,
uma mesa retangular, uma mesa de ferro, uma mesa de bar ou uma mesa de
estudos. Contudo, todas essas ideias giram em torno de uma mesma definição: “um
móvel composto por uma ou mais tábuas que assentam e se apoiam em cima de
um ou vários pés”.

159
Ainda sobre a noção de signo linguístico, Saussure diz que a arbitrariedade é
uma característica importante. Segundo ele, o significante e o significado não têm
relação direta, ou seja, é arbitrária a relação que os une. Também pontua a
importância de pensar a linearidade do significante, pois tem uma natureza auditiva
e desenvolve-se no tempo, explicando, assim, que um signo é proferido após o outro,
de modo que haja uma sequência de signos dotados de significação, graças à
linearidade. A convencionalidade também é outro aspecto importante para a
compreensão do signo, pois, segundo Saussure, o significante e o significado não
possuem relação direta com os objetos por eles designados, ou seja, para ele, o
nome das coisas não tem relação com as coisas (o que se relaciona com a
arbitrariedade).
Uma outra noção importante para a compreensão do pensamento
saussuriano é acerca da “teoria do valor”, que postula que os signos linguísticos estão
em uma relação dentro do sistema da língua, sendo esta relação baseada na
diferença, ou seja, um signo só adquire valor na medida em que não é outro signo
dentro desse sistema.
Essas dicotomias saussurianas são importantes, pois contribuíram para a
construção de uma ciência linguística. Para ele, refletir sobre a natureza do signo
linguístico a partir de determinadas características e dicotomias é fundamental, pois
é neste momento que ele consegue se opor a uma visão histórica e tradicional de se
conceber o que é a língua. Foi possível, a partir do seu gesto, que novos olhares
fossem lançados aos estudos linguísticos.

160
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Sobre a dicotomia língua e fala, é correto afirmar que:


a) De acordo com Saussure, a língua não é condição da fala.
b) De acordo com o pensamento de Saussure, a fala estabelece o uso individual do
sistema linguístico.
c) O objeto de estudo da linguística estrutural é a fala, por suas características
individuais.
d) Para Saussure, a língua estabelece o caráter individual do sistema linguístico.
e) Para Saussure, quando falamos não estamos submetidos à língua.

2. Em seu Curso de Linguística Geral, Saussure afirma que o objeto de estudo da


Linguística é a linguagem humana, composta por língua e fala. Leia as afirmativas
a seguir sobre a visão saussuriana de língua e fala.
I. A fala é uma instituição social, uma realidade sistemática e funcional.
II. A fala como instituição social impõe-se ao indivíduo, mas o indivíduo tem a
capacidade de criá-la e pode modificá-la.
III. A língua é uma realidade psíquica formada dos significados e imagens acústicas.

A partir de sua leitura, pode-se afirmar que:


a) I e III estão corretas.
b) Somente III está correta.
c) II e III estão corretas.
d) Somente III está correta.
e) I, II e III estão corretas.

3. Na dicotomia língua e fala, proposta por Saussure, à língua é atribuído o caráter


social e à fala, o caráter individual. A alternativa que define corretamente o
caráter social da língua e o caráter individual da fala é:
a) O caráter social da língua se relaciona ao exterior do indivíduo que existe em
decorrência de um contrato coletivo de comunicação entre as pessoas. O caráter
individual da fala diz respeito à utilização que cada indivíduo faz da língua.

161
b) O caráter social da língua se relaciona ao interior do indivíduo que existe em
decorrência de um contrato coletivo de comunicação entre as pessoas. O caráter
individual da fala diz respeito à utilização que cada grupo faz da língua.
c) O caráter social da língua não se relaciona ao exterior do indivíduo e não existe
em decorrência de um contrato coletivo de comunicação entre as pessoas. O
caráter individual da fala diz respeito à utilização que cada indivíduo não faz da
língua.
d) O caráter social da língua se relaciona ao exterior do indivíduo que existe em
decorrência de um contrato coletivo de comunicação entre as pessoas. O caráter
individual da fala diz respeito à utilização que cada indivíduo faz da língua.
e) O caráter social da língua se relaciona ao exterior do indivíduo, sem a necessidade
de um contrato coletivo de comunicação entre as pessoas, já que o caráter
individual da fala não existe, pois cada indivíduo está submetido ao sistema da
língua e não da fala.

4. O signo linguístico une não uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma
imagem acústica, ou seja, um significado e um significante. Sobre o significado,
pode-se afirmar que é:
a) a impressão psíquica do som.
b) a parte perceptível.
c) o som.
d) a imagem sensorial.
e) o conceito.

5. Еntrе аѕ dісоtоmіаѕ еѕtаbеlесіdаѕ роr Ѕаuѕѕurе ѕе еnсоntrа а dісоtоmіа


dіасrоnіа/ѕіnсrоnіа. Аѕѕіnаlе а аltеrnаtіvа іnсоrrеtа ѕоbrе еlа.
a) А lіnguíѕtіса dіасrônіса é аquеlа quе еѕtudа а línguа еm mаіѕ dе umа vаrіаçãо,
оu ѕеја, ѕuа еvоluçãо durаntе о tеmро.
b) Dеntrо dеѕѕа dісоtоmіа, Ѕаuѕѕurе dеfеndе quе о métоdо dе еѕtudо mаіѕ
аdеquаdо ѕеrіа о dіасrônісо.
c) А lіnguíѕtіса ѕіnсrônіса é аquеlа quе еѕtudа а línguа еm еѕtаdо еѕtátісо, оu ѕеја,
rесоrtа а línguа еm um dеtеrmіnаdо реríоdо.
d) А dіасrоnіа é nаdа mаіѕ dо quе um соnјuntо dе ѕіnсrоnіаѕ, оu ѕеја, várіоѕ еѕtаdоѕ
dе umа línguа.

162
e) Тоdаѕ аѕ аltеrnаtіvаѕ асіmа еѕtãо іnсоrrеtаѕ.

6. (FUNIVERSA - 2016) Assinale a alternativa correta em relação às ideias


apresentadas no texto.

a) Saussure foi o primeiro linguista a valorizar a dimensão individual do funcionamento


da linguagem.
b) O objeto de estudo da linguística estruturalista centrou-se essencialmente na
precária regularidade dos atos de fala.
c) Ao propor a dicotomia entre langue e parole, Saussure rompeu com os estudos
científicos da linguagem.
d) Os linguistas estruturalistas priorizaram o estudo do sistema linguístico, da langue,
em detrimento da dimensão individual da linguagem, ou parole.
e) A regularidade precária da dimensão social da linguagem impede que se
desenvolvam estudos verdadeiramente científicos a respeito da língua.

7. (ENADE – 2001 – adaptada) Leia a tirinha de Calvin. A questão da natureza do


signo linguístico é um dos problemas clássicos da linguística, discutido por Saussure no
“Curso de Linguística Geral”. Relacionando-se a tirinha e as proposições aussurianas,
é possível afirmar:

163
I. Para Calvin, a relação significante/significado é, nos termos de Saussure,
convencional.
II. Nos quadrinhos, aponta-se a possibilidade de uma interferência individual no
significado das palavras, alterando-o; essa abordagem coincide com a de Saussure.
III. Calvin faz duas rupturas da convenção linguística: na relação
significante/significado e na função comunicativa; Saussure prevê a possibilidade
dessas rupturas pela atuação individual.

Após a análise das afirmações, está(ão) correta(s):


a) I.
b) II.
c) III.
d) I e II.
e) I, II e III.

8. (OBJETIVA - 2018 - Prefeitura de Bossoroca – RS) Em relação a Saussure, assinale a


alternativa que preenche as lacunas abaixo corretamente.

164
“Chama-se __________ a combinação do conceito e da imagem acústica. Propõe-
se a conservar esse termo para designar o total, e a substituir conceito e imagem
acústica, respectivamente, por __________ e __________”.
a) signo - significado – significante.
b) símbolo - significante – significado.
c) signo - significante – significado.
d) símbolo - significado – significante.
e) signo - símbolo - significante e significado.

165
A LINGUÍSTICA MODERNA PARA UNIDADE
ALÉM DE SAUSSURE

12.1 INTRODUÇÃO
12
A Linguística moderna, desenvolvida no século XX, se beneficia dos princípios
metodológicos elaborados no século anterior, mas com bases diferentes, como
pontua Petter: "O estudo comparado das línguas vai evidenciar o fato de que as
línguas se transformam com o tempo, independentemente da vontade dos homens,
seguindo uma necessidade própria da língua e manifestando-se de forma regular"
(PETTER, 2006, p. 08).
Com isso, temos na Linguística moderna não mais o caráter evolucionista, que
imperou ao longo dos séculos anteriores com a linguística de cunho histórico. Uma
nova forma de observar a transformação da língua é feita com o corte
epistemológico de Saussure, sendo possível pensá-la numa visão sincrônica e não só
diacrônica.
No início, havia o predomínio de uma visão estritamente formal da língua,
desenvolvida pelo estruturalismo, especialmente na figura de Saussure. Entretanto,
outro ponto importante é destacar os movimentos que mais se expressaram ao longo
do século XX, sendo eles o funcionalismo e o formalismo, responsáveis pela maioria
dos estudos linguísticos desenvolvidos nos últimos anos.
O formalismo, enquanto movimento, tem a sua expressão em autores como
Leonard Bloomfield, estruturalista norte-americano. A principal característica é pensar
a língua como um objeto formal abstrato. Ao passo que o funcionalismo, também um
movimento, foi mais difundido entre os estudiosos do Círculo Linguístico de Praga e
em autores como Michael Halliday e Simon Dik. Sua característica está em pensar a
língua como um meio utilizado na interação social, ou seja, ela existe em função do
seu uso.

166
Embora as visões pareçam opostas, pela maneira que concebem a língua, é
sabido que os funcionalistas se aproveitaram da concepção estrutural da língua
(forma) e acrescentaram a noção de funcionalidade. Para Pezatti (2004), embora os
objetos não sejam diferentes, as duas abordagens possuem diferentes formas de
olhar para esse mesmo objeto, isso porque “[...] enquanto a linguística formal gera
explicações a partir da própria estrutura”, a linguística funcional “encontra bases
explanatórias na função que exercem as unidades estruturais” (PEZATTI, 2004, p. 168).

12.2 LEONARD BLOOMFIELD

No estruturalismo europeu, o nome de Saussure foi considerado o mais


expressivo, dadas as suas contribuições para a linguística. Contudo, é sabido que no
estruturalismo norte-americano, cujo nascimento está atrelado à antropologia, foi o
nome de Leonard Bloomfield que se destacou. Como dito, foi um grande
representante do formalismo no século XX e o seu principal trabalho é a obra
Language (em português, “Linguagem”), do ano de 1933, considerado um texto
importante para a linguística estrutural, pois sintetizou a teoria e a prática de análise
linguística.
A concepção de Bloomfield tem por objetivo a descrição total de um estado
sincrônico da língua, com base no behaviorismo. Assim, na sua teoria, um sujeito só
consegue identificar um objeto se tiver o contato para entendê-lo. Logo, uma
“maçã” só será “maçã” para alguém que teve contato com a fruta e assim a
identificou. O contato entre sujeito e objeto se justifica, assim, pela forma que o autor
concebe a língua, sincronicamente.
Segundo Nascimento e Nascimento, Bloomfield optou pela psicologia

167
behaviorista e, com isso, estabeleceu um método investigativo que possibilita analisar
qualquer língua do mundo: “Influenciado pelos estudos behavioristas que
desconsideravam qualquer influência mentalista no processo de aquisição e uso da
linguagem, Bloomfield voltou-se para o que é exterior ao indivíduo e, portanto,
observável”. (NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2014, p. 34-35). Com isso, era possível
compreender os fenômenos linguísticos e descrever e prever os possíveis usos da
língua em determinadas situações, como apontam os autores.
A visão de Bloomfield apresentava muitos princípios básicos semelhantes ao
formalismo de Saussure, contudo, a sua teoria da linguagem, conhecida como
distribucionalismo, introduzia um método de análise linguística com base na posição
contextual dos fonemas e combinação com outros fonemas (ou distribuição), o que
se diferenciou do trabalho feito pelo outro estruturalista na Europa, mas não a ponto
de ser um confronto opositivo.
Bloomfield propôs a sua teoria baseado na fonologia, na morfologia e na
sintaxe, sendo 3 (três) níveis diferentes de língua. Ele foi responsável, por meio do
descritivismo e distribucionalismo, pelos avanços nos estudos dos sons, como aponta
Bertucci (2008, p. 76), ao dizer que a linguística estabeleceu, a partir de Bloomfield,
uma diferença entre fonética (que estuda a estrutura acústica do som) e a fonologia
(responsável por definir as unidades distintivas, chamadas de fonemas). Também é
creditado a Bloomfield a identificação de estruturas constituintes como um meio de
análise sintática, isto é, os elementos frasais que expressam as categorias de sujeito,
verbo e objeto na sintaxe:

"O aluno comprou um livro" é descrita como a combinação de dois


constituintes: um sintagma nominal ("o aluno") e um sintagma verbal
("comprou um livro"). Por sua vez, cada um desses dois constituintes
imediatos é formado por outros constituintes: o sintagma nominal "o
aluno" é formado por um determinante ("o") e por um substantivo
("aluno"); o sintagma verbal "comprou um livro" é formado por um
verbo ("comprou") e por um sintagma nominal ("um livro") (COSTA,
2011, p. 125).

Na análise feita por Costa (2011), é possível observar elementos que são tidos
como objeto da Sintaxe enquanto uma área, e é nesse ponto que interessa pensar
em como os estudos atuais se baseiam em construtos teóricos de décadas atrás.
Contudo, mesmo na época ou anos depois, as ideias não só são aproveitadas como
também refutadas, criticadas e reelaboradas, como é o caso de Bloomfield, uma vez
que o consideraram demasiadamente formal em suas análises, desconsiderando

168
aspectos importantes em seus estudos, como o contexto, por exemplo. Mas é
inegável que Leonard Bloomfield, no estruturalismo norte-americano, é um nome
consolidado na linguística.

12.3 CHARLES BALLY

Charles Bally também é um autor importante quando o assunto é o formalismo.


Ele foi aluno de Saussure e, junto com Albert Sechehaye e Albert Riedlinger, reuniu as
diferentes lições de Saussure, postumamente, para a publicação do que é
conhecido como o Curso de linguística geral. Bally é considerado o responsável pela
Estilística ser estudada como um ramo da linguística, um campo do conhecimento
independente.
Flores e Teixeira (2005) pontuam que “o autor busca uma estilística da língua,
propriamente linguística, e não somente da literatura ou dos escritores” (p. 16), o que
significa pensar no uso da língua para expressar os mais diferentes sentimentos, com
ênfase não só no resultado, mas no processo de gerar esse resultado. Ainda segundo
as autoras, “o autor parte de um princípio: a linguagem é apta a expressar
sentimentos e pensamentos, e é próprio da estilística estudar a expressão dos
sentimentos” (p. 16).
Bally assumiu as dicotomias saussurianas, de modo que viu na estilística um
estudo que busca investigar os processos linguísticos por meio da forma que os
falantes se expressam, sendo possível dar conta do caráter coletivo da
expressividade linguística (FLORES; TEIXEIRA, 2005, p. 16). Ainda, é possível pensar em
Bally com seus estudos voltados à fonética, ao léxico e à sintaxe, diferentes áreas da
linguística que, juntas, se apresentam como partes importantes da sua estilística.
É possível pensar em alguns recursos estilísticos que se utilizam de aspectos
linguísticos para gerarem alguns efeitos de sentido, seja no texto literário ou não. Por
exemplo, assonância e aliteração são comumente utilizadas no âmbito literário como
formas de criar efeitos a partir do som (fonética), isto porque a assonância é a
repetição de sons em um mesmo verso ou frase, ao passo que a aliteração é a
repetição de consoantes ou sílabas. Como exemplo, observe uma estrofe do poema
Violões que choram (1893) de João Cruz e Sousa, considerado o fundador do
Simbolismo no Brasil:

169
"Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas"

Nota-se a repetição de consoantes e vogais como uma característica


proeminente nessa estrofe, como é o caso das vogais “a” e “o”, marcadas em
vermelho e azul, respectivamente. Também há a repetição da consoante “v” e “z”,
em negrito. Juntos, esses recursos estilísticos, de aliteração e assonância, formam
sentidos a partir do trabalho fonológico (som) e lexical (escolha das palavras), de
modo a despertar sentimentos no leitor/ouvinte por meio da mobilização de
diferentes níveis da língua, típico da estilística. O sentimento transmitido por um
sussurro, por meio das vozes veladas e veludosas, encobertas e macias, imagens e
sons que são repetidas ao longo do poema.

12.4 LOUIS HJELMSLEV

Outro discípulo de Saussure é Hjelmslev, um estudioso dinamarquês,


responsável por trabalhar a dicotomia do significante e significado, além de ter se
dedicado à proposta do plano da expressão e do plano do conteúdo, com ênfase
na substância e na forma. Suas ideias foram a base para o Círculo Linguístico de
Copenhague, uma vez que estava comprometido com a descrição das
características formais da linguagem, ao apresentar um rigor lógico em seus estudos.
Sua obra mais conhecida é Omkring sprogteoriens grundlæggelse
(“Prolegômenos a uma teoria da linguagem”), de 1943, em que critica as
metodologias predominantes na linguística da época. Para o autor, elas eram
descritivas ou até anedóticas, ou seja, não eram sistematizadoras, de modo que se
propôs a uma teoria linguística destinada a formar a base de uma linguística de
cunho mais racional.
É nessa obra, ainda, que Hjelmslev desenvolve a ideia do plano da expressão
e do plano do conteúdo, ao escrever sobre os signos e sobre a função sígnica, além
de como se dá a relação entre conteúdo e expressão. De forma sintética, o plano
do conteúdo é o significado de um dado texto, o sentido que dele emerge, ao passo
que o plano da expressão é a manifestação do conteúdo de um texto, o modo pela
qual ele se formou. Ou seja, o plano do conteúdo trata do que o texto diz, sendo que
o plano da expressão se refere à como é expresso o conteúdo desse texto (com

170
palavras, imagens, sons). Considera-se, assim, o trabalho de Hjelmslev o responsável
por possibilitar a análise e reflexão de textos não-verbais.

12.5 ROMAN JAKOBSON

Considerado pioneiro na análise estrutural da poesia e da arte, Jakobson,


estudioso russo, é um dos mais importantes linguistas do século XX, pelas suas
contribuições acerca da função poética da linguagem (que não está presente só
em textos literários). Esse autor se filia à perspectiva funcionalista da língua, uma das
principais do século XX, além de ser um dos membros do Círculo Linguístico de Praga.
Ele foi responsável por cunhar a Teoria das funções da linguagem. Essa teoria
depende das relações estabelecidas entre elas e dos elementos que dela participam
no funcionamento da comunicação. A saber, os elementos são: o emissor, o
receptor, o canal, o referente (contexto), a mensagem e o código como partes da
comunicação. Com isso, Jakobson estabeleceu que cada função é centrada em
um dos elementos, de modo que 6 (seis) funções foram estabelecidas a partir dos
elementos. Para ele:

O REMETENTE envia uma MENSAGEM, ao DESTINATÁRIO. Para ser eficaz


a mensagem requer um CONTEXTO a que se refere [...], apreensível
pelo destinatário, e que seja verbal ou suscetível de verbalização; um
CÓDIGO total ou parcialmente comum ao remetente e ao
destinatário [...]; e, finalmente, um CONTACTO, um canal físico e uma
conexão psicológica entre o remetente e o destinatário, que os
capacite a ambos a entrarem e a permanecerem em comunicação
(JAKOBSON, 2005 [1960], p. 123).

A seguir, observa-se a representação feita pelo linguista:

Figura 8: Elementos das funções da linguagem

Fonte: Jakobson (2005 [1960], p. 123)

Em síntese, a figura representa diferentes elementos que compõem a


comunicação, associadas à uma função: a função referencial ou denotativa, cujo

171
foco está no objeto da mensagem; a função emotiva ou expressiva, com foco no
emissor; a função conotativa ou apelativa, com foco no receptor; a função fática,
com foco no canal e no contato com os sujeitos; a função metalinguística, com foco
na própria linguagem (o código); e, por fim, a função poética, cujo foco está na
mensagem, relacionado à literatura. Importante ressaltar que cada um dos
elementos da comunicação determina uma função de linguagem.
Martelotta (2011a) lembra que para compreender a perspectiva de função
da linguagem é necessário “[...] lembrar daquilo que Jakobson caracterizou como os
dois tipos básicos de arranjos utilizados no processo verbal: seleção e combinação”
(p. 34 – destaque do autor). Isso porque, ao formar uma frase, o falante inicialmente
seleciona as palavras para expressar melhor a sua ideia em determinada situação
comunicativa, ou seja, é um processo psicológico, não visível aos demais.
Ao mesmo passo, também combina essas palavras selecionadas de acordo
com as regras sintáticas de sua língua, o que é uma manifestação na superfície da
frase e pode ser percebida pelo seu ouvinte. Assim, juntas, seleção e combinação
formam um enunciado com sentido para o interlocutor, segundo Martelotta (2011a),
com base nas ideias de Jakobson.

12.6 ANDRÉ MARTINET

Outro funcionalista importante, também membro do Círculo Linguístico de

172
Praga, foi Martinet. Ele afirma que a linguagem só pode ser conhecida a partir das
suas diferentes modalidades, o que são, no caso, as línguas (para ele, signos vocais).
Para ele, o objeto da linguística é o modo como as pessoas conseguem se comunicar
pela língua, sendo que o papel do estudioso da língua é a de observar essa
comunicação.
Foi o responsável por pensar a dupla articulação da linguagem humana, uma
organização em que todo enunciado se articula em 2 (dois) planos. Na primeira
articulação, ou primeiro plano, estão as unidades significativas da língua, que são os
morfemas. Já na segunda articulação, ou segundo plano, estão as unidades
distintivas, os fonemas.
Segundo Martinet (1974), “Para compreender bem como uma língua pode ser
definida como duplamente articulada, é preciso convencer-se de que a função
fundamental da linguagem humana é de permitir a cada homem comunicar a seus
semelhantes sua experiência pessoal” (p.12). Por isso, as articulações propostas por
Martinet, com a presença ou a ausência de significado, é importante para conceber
o que o autor compreendia como a comunicação humana. Utilizou, para tanto,
conceitos como morfema, fonema, lexema, estudados com maior especificidade
pelas áreas da Morfologia e Fonética/Fonologia.
A saber, Martinet considerava os morfemas como os menores segmentos de
discurso possíveis de serem atribuídos algum sentido, sendo eles os responsáveis por
remeter ao mundo da realidade concreta ou abstrata, a partir do aspecto nocional.
Já os fonemas são unidades menores ausentes de significados, formam o corpo
sonoro de um vocábulo e, por isso, possuem a função de distinção, já que a
mudança de um fonema por outro pode gerar diferentes palavras.
Como exemplo, é possível observar as palavras “mala” e “bala”, em que /m/
e /b/ são fonemas que, sozinhos, não significam, mas distinguem uma palavra da
outra e, assim, configuram sentidos diferentes ao segmento “-ala”. Por sua vez, se
acrescentado um “-s” ao final de cada palavra, a ideia de plural é acrescida, o que
configura um morfema, por carregar o sentido em “malas” e “balas”, não mais no
singular.
Segundo Martelotta (2011b), ao afirmar que a linguagem humana é
articulada, a ideia de que os enunciados podem ser divididos, desmembrados em
partes menores, é possível. Resultado disso é o fato de que há uma união de
elementos que podem ser encontrados em outros enunciados.

173
Outro ponto importante sobre as contribuições de Martinet é pensar em uma
economia da articulação. O fato de as línguas serem duplamente articuladas revela
uma economia benéfica aos seus falantes, pois segundo Martelotta, “[...] melhor se
adapta às necessidades comunicativas humanas, permitindo que se transmita mais
informação com menos esforço” (2011b, p. 40), além de evitar uma sobrecarga na
memória. Depreende-se que, sem essa característica, haveria a necessidade de
recorrer a morfemas e fonemas diferentes para expressar cada nova palavra.
Essas ideias de Martinet, junto com as de Jakobson (e de muitos outros autores),
influenciaram o movimento funcionalista da língua, que concebe qualquer
fenômeno linguístico a partir de uma função (um motivo). O contrário é o movimento
estruturalista, com ênfase no aspecto arbitrário e imotivado da língua, cujos
representantes são Saussure, Bloomfield, Bally, Hjelmslev, dentre muitos outros. Ambos
os movimentos linguísticos predominaram no século XX e foram importantes para a
linguística moderna.

174
FIXANDO O CONTEÚDO

1. O movimento estruturalista se desenvolveu e se ressignificou conforme as


necessidades teóricas da conjuntura social onde estavam estabelecidos seus
pesquisadores, justificando sua subdivisão em europeu e americano. Assinale a
alternativa que não corresponde ao movimento estruturalista em tais continentes.

a) Na Europa, surgiram as ideias estruturalistas de Ferdinand de Saussure,


proporcionando o surgimento de novas teorias linguísticas.
b) Novas teorias linguísticas fundadas se firmaram em Círculos Linguísticos promovidos
no continente europeu, tais como o de Praga, Genebra e Copenhague.
c) O linguista Roman Jakobson se destacou no Círculo Linguístico de Praga.
d) O movimento estruturalista no continente norte-americano deu ênfase para o
estudo de Louis Hjelmslev sobre forma e substância.
e) Leonard Bloomfield é considerado um teórico importante do movimento
estruturalista norte-americano.

2. Embora Saussure seja considerado um importante teórico para a Linguística, por


ter dado caráter científico aos estudos sobre a língua, há outros estudiosos
importantes no desenvolvimento dessa ciência. Assinale a alternativa que
completa corretamente as afirmações abaixo.
I. Para _________, o trabalho linguístico consiste em uma descrição total de um
estado sincrônico da língua, com base no behaviorismo.
II. Para _________, as funções da linguagem estabelecem a comunicação.
III. Para _________, o uso da língua permite expressar os mais diferentes sentimentos.

Assinale a alternativa que preenche corretamente os nomes dos autores acima:


a) Charles Bally / Roman Jakobson / Leonard Bloomfield.
b) Roman Jakobson /Charles Bally / Leonard Bloomfield.
c) Leonard Bloomfield / Charles Bally / Roman Jakobson.
d) Leonard Bloomfield / Roman Jakobson / Charles Bally.
e) Roman Jakobson / Leonard Bloomfield / Charles Bally.

175
3. Considere as afirmações abaixo:
I. O princípio da imanência consiste no estudo daquilo que transcende a língua.
II. O Estruturalismo, teoria que assumiu caráter rigoroso e consciente, a partir de
Saussure, influenciou várias correntes linguísticas, como a Escola de Funcionalistas
e Formalistas, no século XX.
III. A Glossemática foi expressivamente estudada por André Martinet e encara a
língua como um conglomerado de fenômenos extralinguísticos.
IV. Saussure postula dois planos para a língua: o plano do conteúdo e o da expressão.
Está correto o que se afirma em:
a) I e II.
b) I, II e IV.
c) III e IV.
d) Todas as afirmações estão corretas.
e) Nenhuma afirmação está correta.

4. (Instituto Machado de Assis - 2018 - Prefeitura de Caxias - MA) Faça uma


correlação entre as colunas, considerando as funções da linguagem conforme o
linguista russo Roman Jakobson:

A relação correta entre as colunas é:

176
a) 2, 5, 1, 3, 6, 4.
b) 2, 3, 1, 5, 6, 4.
c) 2, 5, 1, 4, 6, 3.
d) 1, 3, 2, 5, 6, 4.
e) 1, 5, 2, 4, 4, 6.

5. (UNAR) Hjelmslev, seguidor de Saussure, procura completar as noções de “forma”


e “substância” dividindo-os em dois planos. Eles são:
a) рlаnо fоrmаl е plаnо subѕtаnсіаl, аmbоѕ dіvіdіdоѕ еm ехрrеѕѕãо е соntеúdо.
b) рlаnо dе ехрrеѕѕãо е plаnо dе соntеúdо, аmbоѕ dіvіdіdоѕ еm fоrmа е ѕubѕtância.
c) рlаnо cоnсrеtо е plаnо subјеtіvо, аmbоѕ dіvіdіdоѕ еm fоrmа е ѕubѕtânсіа.
d) рlаnо dа línguа е plаnо dа fаlа, оѕ рrіmеіrоѕ соmроѕtоѕ роr mоrfеmаѕ е о ѕеgundо
роr fоnеmаѕ.
e) рlаnо pѕíquісо е plаnо fíѕісо, о рrіmеіrо соmроѕtо роr formas е о ѕеgundо роr
substâncias.

6. Leia a sentença e responda:


“Nо ѕéсulо ХХ, а lіnguíѕtіса se tornou uma área indереndеntе е gаnhоu
rесоnhесіmеntо соmо сіênсіа. Várіоѕ nоmеѕ se destacaram no período, соmо
Fеrdіnаnd dе Ѕаuѕѕurе, Rоmаn Јаkоbѕоn, Lеоnаrd Вlооmfіеld e Lоuіѕ Нјеlmѕlеv”.

Com base na sentença, é correto o que se afirma em:


a) todos os autores mencionados pertencem ao formalismo, um movimento que
pensa a língua a partir da sua forma.
b) todos os autores mencionados pertencem ao formalismo, um movimento que
pensa a língua a partir da sua função linguística.
c) todos os autores mencionados pertencem ao funcionalismo, um movimento que
pensa a língua a partir da sua função.
d) todos os autores mencionados pertencem ao funcionalismo, um movimento que
pensa a língua a partir da sua forma linguística.
e) todos os autores mencionados pertencem ao estruturalismo, também conhecido
como funcionalismo, pois pensa a língua a partir de sua função, não de sua forma.

177
7. Segundo Martinet (1971), não podemos analisar as unidades da primeira
articulação em unidades menores com um sentido. Por exemplo: é o conjunto
escola que significa "escola" e não a soma dos eventuais sentidos de cada um dos
segmentos em que podemos dividi-lo (es-co-la).
MARTINET, André. Elementos de Linguística Geral. Tradução de Jorge Morais-Barbosa. 3. ed. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora,
1971, p. 111.

Alguns autores chamariam a unidade da primeira articulação de signo. Martinet,


que trabalha a dupla articulação da linguagem, propôs que se chamasse a
unidade mínima da primeira articulação de
a) Morfema.
b) Fonema.
c) Gramema.
d) Lexema.
e) Entimema.

8. Para a dupla articulação da linguagem, estabelecida pelo linguista André


Martinet, as funções das unidades de articulação, para a 1ª articulação e para a
2ª articulação, respectivamente, são:
a) diferenciar e distinguir.
b) distinguir e sistematizar.
c) significar e distinguir.
d) significar e organizar.
e) diferenciar e distinguir.

178
RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO

UNIDADE 01 UNIDADE 02

QUESTÃO 1 C QUESTÃO 1 D
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 E
QUESTÃO 3 E QUESTÃO 3 E
QUESTÃO 4 D QUESTÃO 4 C
QUESTÃO 5 A QUESTÃO 5 B
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 B
QUESTÃO 7 D QUESTÃO 7 A
QUESTÃO 8 A QUESTÃO 8 C

UNIDADE 03 UNIDADE 04

QUESTÃO 1 E QUESTÃO 1 A
QUESTÃO 2 C QUESTÃO 2 B
QUESTÃO 3 E QUESTÃO 3 C
QUESTÃO 4 A QUESTÃO 4 A
QUESTÃO 5 C QUESTÃO 5 C
QUESTÃO 6 D QUESTÃO 6 D
QUESTÃO 7 B QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 D QUESTÃO 8 E

UNIDADE 05 UNIDADE 06

QUESTÃO 1 A QUESTÃO 1 A
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 A
QUESTÃO 3 E QUESTÃO 3 B
QUESTÃO 4 E QUESTÃO 4 D
QUESTÃO 5 E QUESTÃO 5 C
QUESTÃO 6 D QUESTÃO 6 D
QUESTÃO 7 C QUESTÃO 7 C
QUESTÃO 8 B QUESTÃO 8 E

179
RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO

UNIDADE 07 UNIDADE 08

QUESTÃO 1 D QUESTÃO 1 D
QUESTÃO 2 A QUESTÃO 2 B
QUESTÃO 3 D QUESTÃO 3 B
QUESTÃO 4 B QUESTÃO 4 D
QUESTÃO 5 C QUESTÃO 5 C
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 E
QUESTÃO 7 B QUESTÃO 7 A
QUESTÃO 8 A QUESTÃO 8 B

UNIDADE 09 UNIDADE 10

QUESTÃO 1 C QUESTÃO 1 A
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 B
QUESTÃO 3 B QUESTÃO 3 D
QUESTÃO 4 E QUESTÃO 4 B
QUESTÃO 5 D QUESTÃO 5 C
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 B
QUESTÃO 7 B QUESTÃO 7 E
QUESTÃO 8 D QUESTÃO 8 A

UNIDADE 11 UNIDADE 12

QUESTÃO 1 B QUESTÃO 1 D
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 D
QUESTÃO 3 A QUESTÃO 3 E
QUESTÃO 4 E QUESTÃO 4 A
QUESTÃO 5 B QUESTÃO 5 B
QUESTÃO 6 D QUESTÃO 6 A
QUESTÃO 7 B QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 A QUESTÃO 8 C

180
REFERÊNCIAS

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