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GAZETA MEDICA DA. BAHIA PUBLICAGAO MENSA: Anno XVI JANEIRO, 1886 N.7 O CONSELHEIRO DR. LUIZ ALVARES DOS SANTOS Com 61 annos d’edade, falleceu no dia 19 o Conselheiro Dr. Luiz Alvares dos Santos, victime de um carcinoma da prostate, que ha seis mezes 0 condemnara a permanecer n’um leito de dores, : Lente de materia medica e therapeutica na Faculdade de Me- dicina, de botanica e zoologia no Lyceo Provincial e nos Ex- ternatos Normaes, e Inspector da Satde Publica n’esta Pro- vincia, o Cons. Luiz Alvares dos Santos prestou nestes eleva~ dos cargos relevantes servicos ao ensino, 4 sciencia ea hygiene publica, Servio com distincgaio na campanha do-Paraguay, para onde seguio como cirurgido de um batalhdo de voluntarios, e foi promovido a cirurgiao de brigada honorario. Foi representante do Brazil nas exposigdes de Cordova, na Republica Argentina, ¢ de Vienna d’Austria em 1873. Como professor, foi sempre popular entre seus aluinnos, © reunia a uma locugAo facie elegante boa somma de conhe- cimentos, adquiridos desde seus primeiros annos de magis- terio, nos quaes obteve logo notavel réputacao sciontifica. Mais tarde as questies politicas e sociaes, que se tém agitado no paiz, attrahiram sua actividade e enthusiasmo, ¢ desviando-o dos trabalhos profissionaes, fizeram-no esquecer um pouco as glorias da carreira professoral pelos novos Iouros desta outra arena, em que conquistou applausos 6 ovagdes @ estendeu sua popularidade muito além dos circulos escolares, em que ja era vantajosamente conhecido e-apreciado. SERIE DM, VOL, HI. 38 290 Orador e poeta, possuindo uma educagao litteraria das mais esmeradas, 0 Cons. Luiz Alvares com a ductilidade admiravel de um talento brilhante, fez na imprensa e na tribuna, em co- micios populares e n’assembléa provincial uma figura saliente, tornando-se respeitado pela convicgda e firmeza com que se esforgara nas mais renhidas lutas, pondo-se sempre ao servico de causas nobres, como a da emancipayao dos escravos, que absorveo todas as suas sympathias e cuidados nos ultimos annos de existencia. Se a ligeira demasia alguma vez arrasiou-o o arrebatamento enthusiastico das ideas avangades, que impelliam esse adepto fervoroso do progresso, foi a rapida allucinagéo de uma paixao nobre, a que succediam logo as expansdes generosas de um coragao ber formado. A integridade de caracter, a probidade, de que deo constantes provas, quer na sua vida publica ¢ profissional, quer nas suas relagdes particulares, a amenidade do trato e a cortezia que a todos dispensava, grangearam-lhe geral estima e affeigio, Sua morte foi geralmente sentida pelos collegas e discipulos, que, em grande numero foram prestar-lhe as derradeiras ho- menagens, acompanhando-o ao ultimo jazigo, com grande muitiddo de pessoas de todas as classes, que expontaneamente concorreram a render este tributo de veneracdo e Saudade ao eminente patriota, A Gasela Medica, a cuja redacgio pertenceo por alguns aunos o Cons. Luiz Alvares dos Santos, registrando 0 pezar da classe medica bahiana por este infausto acontecimento, par- ticips deste sentimento, e deplorando tio prematura perda, apresenta suas sinceras condolencias 4 familia do illustre finado. 294 PTOMAINAS DA FEBRE AMARELLA Pelo Dr. DOMINGOS FREIRE (4) I reves consideragées sobre as ptomainas om eral Desde o anno de 1870 que Francisco Salmi, professor de medicina legal na Universidade de Bolonha, annunciou a des- coberta dos alcaloides cadavericos ou plomainas, chamadas com mais propriedade ploaninas por Chapuis. Deve-se esta descoberta a um oxame medico-legal sobre as visceras de.um individuo que se suppunha ter sido enyenenado. Entretanto, deduz~se da leitura da memoria que Selmi apeesentou & Academia das Sciencias de Bolonha que elle nao reconhecen nem a origem, nema natureza dos productos toxicos obtidos dos extractos cadavericos. Foi em 1872 que A. Gautier, estudando a putrefacgao da fibrina do sangue 6 as metamorphoses reciprocas das substan- clas albuminoides, isoloa ama pequena quantidade dealcaloides fixos e volateis, que viu-se depois serem identicos aos prepa- rados pelo professor italiano. Mais tarde, em 1876, o professor Moriggia, da Universidade de Roma, procedeu da sua parte a experiencias muito curiosas sobre a virulencia dos extractos cudavericos, que enfeixou em uma memoria com otitulo— Sulla celenosita del cadavere umang. Este interessante trabalho, com que o distincto inves- tigador teve a bondade de brindar- me quando estive em Roma, tem passado desapercebido por aquelles que se occupam do historico das plomainas, € compraz-me lembrar as’ contri~ buigdes valiosas que elle encerra em relacdo ao estudo dos venenos cadavericos. Para este fim, aos que nao puderem compulsar as poginas do citado opuseilo, bastard, areio, trans - crever as seguintes conclusies a que chega 0 mesmo autor, @) Memoria apresentada 4 academia maperial “de Medicina do Rio de Ja~ neiro, 202 depois da descripgio minucicsa de uma extensa-serie de experiencias « 41°. 'O veneng cadaverico existe nos cadaveres das pessoas mortas. de diversas molestias, exhumadas 80 dias depois da morte e sendo enterradas em estagdo 6 logar bastante quentes. « 2. © veneno cadavorico pdde-se extrahir por diversos methodos, Por meio do ether péde-se tiral-o nao sd des liquidos aquosos alcalinos, mas tambem acidos. O alcool amylico eo ethylico séo bons dissolventes desse veneno ; de sorte que por esta razdo-ndéo se poderia recommendar o ultimo, como -fez Dragendorff, para a extraceSo da curarina dos liquidos putridos, » Para complemento deste mui rapido eghogo historico convéem recordar que na sesso de 14 de Fevereiro deste anno de 1885, na Sociedade de Biologia de Paris, Oechsner de Coninck apre- sentou © resumo de suas pesquizas sobre us bases da serie. pyvidica ¢ da serie quinoleica, declarando haver realisado a synthese de um dihydrureto pyvidico mui proxcimo daqueile que Gautier e Etard retiraram do producto da pntrefacedo animal. Finalmente, permitta-se-nos tirar do olvido, como curiosi- dade historica, a t&éo debatida © n&éo menos contesiada— sepsing—que Panum extrahin em 1885 das feridas putridas, e que foi entretanto o precursor das actuaes ptomainas, cuja realidade ninguem mais ousaria discutir. Assim uma idéa nova surge, é desprezada pela época, para resurgir wais tarde victoriosa, mas deixando quasi sempre na penumbra o seu primeiro autor | PROPRIEDADES DAS pTOMAINAS—~SUA FORMAGAO E EXTRACCAO E’ fora de ‘contestagdio que nfo existe uma sé: ptomaina, mas muitas se formam durante o processo de fermentagdo putrida. Ha muitas condigdes que podem fazer variar asua formacio, entre ellas ‘a data mais ou menos recente da morte, ou em outros iermos o gréo mais ou menos adiantado da 293 fermentagéo putrida. A immers&o prolongada contribue igual- mente para a, produccao de ptomainas differentes, e que por suas propriedades geraes muito se assemelham a certos alea- loides solidos. E’ assim que os residuos de um cadaver, que esteve 18 mezes submerso, deram como acido niirico as mesmas reaccées que a codeina, a morphina, a brucina,’ a atropina ea verairina, sé se differencando destes alca- loides pela reacgio productora do azul'da Prussia, da qual fallaremos daqui a pouco. Aléna das ptomainas que resultam da decomposicao cada~ verica, ha outras que se produzem durante a vida, ja por actos physiologicos, ji por evolugdo pathologica. Na urina, no succo que banha as fibras musculares, na bilis, foram por Gantier encontrados alcaloides constituidos em virtude do processo ordinario da vida dos tecidos. As peconhas devem provavel- mente a sua actividade toxica excepcional a presenga de ptomainas. Gautier achou na saliva mixta normal do homem uma substancia soluvel, tao energica que inoculada em ddse minima dava logar rapidamente a uma “estupefacedo profunda das aves. No curso de varios estados pathologicos formam-se productos alcaloidicos analogos, ‘que foram extrahidos’ por Bouchard das urinas de grande numero de doentes ‘affectados de febre typhoide, pleurisia, pneumonia, ictericia maligna, que offereciam o caracter infecciosa. Convém observar que para a verificacio da presenca destas ptomainas 6 preciso empregar uma grande proporgdo de ma- teria (15 a 20 litros de urina) e evaporal-a até que fique redu- zida aum pequeno volume, representado apenas por alguns centimetros cubicos. Nas materias fecaes normaes Pouchet encontrou ptomainas semelhantes ds que séo eliminadas pela urina. Em certas molestias que sé caracterisam pele exagero das putrefacgtes intestinaes estas ptomainas podem formar-se em quantidade consideravel, como succede nos_casos de febre typhoide e de ‘enterites infecciosas, 294 Nao trataremos aqui de deserever o processo'utilisado para a extraccdo das ptomainas;é 0 mesmo processo empregado para-a pesquiza dos alealoides em geral, em casos de envene~ namento; s6 observaremos que ha umas ptomainas soluveis no ether, outras que o sio no chloroformio e outras no alcool amylico ou no ethylico. A escolha de um destes vehiculos é, pois, questéo importante emquanto se pde em pratica a ex- iraccio das ptomainas. Vamos agora dar os caracteres das ptomainas extrahidas dous a tres mezes post mortem, caracteres que sdo um pouco diversos dos que offerecem aquelias que sao recolhidas poucos dias depois do chito. Em collaboragio com Htard, Gautier iso- lou-as sobre a forma de um Jiquido de consistencia oleosa; caustico como os alcaloides naturaes liquidos, eotrando em ebulicso na temperatura de 210°, formando saes crystallisaveis com os acidos carbonico © chlorhydrico. O chlorhydrato forma com o tetrachlorureto de platina um chloroplatinato em bellos erysiaes muito esiaveis, As ptomainas expostas ao ar oxydam-se com muita facili- dade, tomando uma cor escura a decompondo-se ; desprandem entio um cheiro urinoso, ou cadaverico, ou viroso como a conicina ; as vezes, porér, o cheiro exalado é agradave!l como odacanella, do almiscar e das flores de larangeira. O seu sabor é picante ov amargo. Reduzem muitos acidos e saes, tres como os acidos chro- mico e jodico, os chloruretos de oure e de ferro, e sobretudo o ferri-cyanureto de potassio, produzindo azul da Prussia pela addicgao de uma gotta de perchiorureto de ferro. Sendo esta reacciio muito geral, e até considerada especifica por muitos autores, com o que ndo concordamos, insistiremos sobre ella durante alguns momentos. Brouardel e Boutmy, que querem fazer desta reaccio o caracter essencial das ptomainas, ponderam que emquanto em soluciio salina neutra ou levemente acida estas ptomainas tra- tadas successivamente pelo ferri-cyanureto ‘de potassio e 0 295 perchlorureto de ferro dio immediatamente azul da Prussia, quasi tedos os alealis vegeiaes toxicos néo dio coloragio de especie alguma. A ndo ser a morphina e a apomorphina, a muscarina e a hyoscyamina, que produzem tambem o azul da Prussia, os outros alcaloides mais communs, como a. nicotina, a emetina, a colehicina, a ergotinina, e até substancias ndo alealinas, como a digitalina, dio como reactivo ferrico uma coloragio verde que sé lentamente. passa ao azul. Esia reacgao teria wma importancia maxima em toxicologia criminal, se si caracterisasse pela universalidade, Todavia, em muitos casos pdde servir de criterio decisivo, ¢ ja tem servido, como na pesquiza judiciaria por envenenamento a que uitima- mente se procedeu na Italia: os peritos haviam conciuido admittindo o envenenamento de um general, quando acha- vam-se em presenga de uma ptomaina cadaverica. Além do reactivo de que avabdmes de fallar, e que 60 mais caracteristico, apresentam as ptomainas afnda as seguintes reacgées : Pelo acido sulphurico coloragio reseo-violacea ; pelo acido chlorhydrico, s6 ou addicionado de acido sulfurico, coloragio identica; pelo acido nitrico, aquecido com agua bromada e sa~ turada de potassa, cor amare!la; pelo acido sulfurico e agua bromada cor rubra fugaz; pelo acide iodico misturado com acido sulphurico 6 bicarbouato sodico coloracio mais ou menos violacea. As ptomainas cadavericas séo muito venenosas. Um milli- gramma e meio, posio debaixo da peile de uma ave, mata-a em menos de 1 hora, com paralysia ¢ convulsdes tetanicas. De experiencias que se tem feito resulta que as ptomainas tem uma acgéo notavel sobre o coragdo, cujos batimentos per- turbam, fazendo-o perder a sua contractilidade ¢ parando-o em systole. A difatagdo das papillas alternando irregularmenie com a sua constricg’o, o estupor e mais tarde os movimentos convulsivos demonsiram que as ptomainas exercem influencia muito activa sobre o systema nervoso ‘central. 296 Ditas estas generalidades sobre as ptomainas, passo. a occu par-me- especialmente das ptomainas da febre amarella. A sepsina foi extrahida do. pis de uma ferida de uni. individuo atacado de infecc&o purulenta; na variola confluente e hemor- rhagica, ua erysipela e ontras affecgdes tem-se encontrado ptomainas. Eu consegui tambem extrahil-as de doentes e.cada- veres de febre amarella. . O mecanismo da formacado dessas ptomainas, tanto as da putrefaccao como as pathologicas, nao esta bem esclarecido. Suppoe-se que todas as vezes que as hematias néo podem mais distribuir pelos tecidos uma quantidade normal de oxy- genio durante a vida, ou todas as vezes que esse oxygenio falta depois da morte, as piomainas acham o momento opportuno para a sua formag&o. O ponto de vista que me proponho mirar em relacdo 4 febre amarella, é que a formacio das plometinas desta niolestia é correlativa com a marcha e desenvolvimento dos micro-orga- nismos que sio o seu elemento etiologico essencial. Provei este facto por experiencias concludentes, a que me hei de teferir mais longe. Cada organismo que se adapta ao meio em que vive deve necessariamente exercer sobre este meio modificagdes recla~ madas pela permanencia dos seus actos vitaes. Devem dar-se trocas entre o mesme meio ¢ o set tecido, e dessas trocas, que sio na essencia actos physico-chimicos, resultum mudancas notaveis do ambiente. Isto é lai geral para todos os entes vivos. Por que razioos seres microseopicos nao hio de estar igual- mente sujeitos a ella? Comoseexplicam as fermentagées todas, de que muitas vezes se formam productos destinados ao nosso uso, diario? Que escrupulo pdde haver em equiparar certas evolugdes pathologicas infecto-contagiosas a fermentagdes intestinas que decompdem as materias albuminoides e outras da nossa economia? E porque néio admittir que muitos dos ma- teriaes resultantes das motamorphoses morbidas sao factores etiologicos de grande numero de manifestogses symptomaticas? 297 Procuraremos agitar estas varias questdes, e apoiados sobre o methodo experimental, que cousideramos o melhor guinnesta elucidacdo, adduziremos vazdes prat! as, Cujo valor sera con= vincente. Assim ousainos esperar. PARTE CHIMiCA Si Origem, caracteres ¢ extracgic das ptomainas da febre wmarella Meditando sobre os estudos feitos sobre a materia do vomito preto, vé se que desde longa data varios autores assignalam a presenca de substancias de apparencia especial, que referiamn a influencias mal definidas, taes como a alteragio do sangue ex- travasado na mucosa gastrica, as modificagdes da bilis, ou ainda a degenericdo gordarasa dos tacidos. Assim, vemos que Andouard, tendo examinado as materias negras vornitadas pelos doentes de febre amarella, em 1821, concluiu que eilas se compunham de duas partes distinctas: uma serosu e outea glutinosa ou mucosa : admittindo nesta mistura a oxistencia de um principio acido e muita gelatina. Muito modernamento, 1882, Langier diz ter achado no vomito preto uma substancia albuminosa @ ouira oleosa. Estes e outros autores desconheceram completamente a natu- reza e origem destas producgdes, que nio sio outra cousa mais doque ptomainas formadas no organismo dos doentes e expellidas por uma hypersecrec&o gastrica. Taes plomainas, conforme pude verificar, ndo se encontram s6 no vomito, mas tambem no sangue e na urina dos doentes. Nos liquidos rejeitados pelo vomito, as ptomainas existom no estado de butyrato de ptomaina, o que se pdde demonstrar decompondo pelo acide suurico, auxiliade de um ligeiro aque- cimento, uma pequena quantidade da substancia, que resulta do tratamento prévio pelo ether sulfurico das materias vomitadas. © acido sulfurico deiza em liberdade o acido buiyrico, cujo cheiro de rango é bem caracteristico. SERIE i111, VOL. U1. 39 298 Minhas experiencias provam que existem diversas piomainas nos-doentes de febre amarella. Com effeito, depois de haver extrahido do vomito negro uma ptomaina, conforme o processo que mais longe desereverei, o liqmido restante foi deixado debaixo de uma camada de ether em win frasco de grande capa~ cidade. Agitando todes os dias este frasco afim de que o ether se misturasse intimamente com o resto do liquida, no fim de pouces dias notuu-se a formagao de taes camadas differentes que eram, contando de cima para baixo: 1.° Camada de cdr amarella, constituida pelo ether, tendo em dissolugdo a ptomaina a que ja nos referimos. 2.° Camada intermediaria, mais pesada, oleaginosa, de cor amarella mais intensa, representandy um principio alcalino distincto do precedente. 8.° Liquido preto (pigmento em suspensio) onde existem os microbios especificos que fabricaram os dous principios men- cionados. Tanto aptomaina da camadan.1, como a den. 2 sitio muito azotadas, dotadas de um cheiro repugrante, que nada tem todavia de putrido, e que causa cephalalgia ¢ atordoamento. A plomaina n. 26 insoluvel no ether, ao passo- que an. i énelle soluvel. Esta ultima misturada com a agua determina uma emulsao leitosa; a primeira é miscivel em agua sem madanga de car. “Estas ptomainas constituem viveiros de microbios xantho- genicos, o que naoé de admirar sendo eilas seu producto de elaborugao. A cor escura da ptomaina n. 2 ¢ devidaem grande parte a estes microbios ¢ seus detritos, como bem demonstra o.exame microscopico. Se filtrarmos a ptomaina n. 2 por carvao animal oa por gesso reteremos a maior parte destes microbios nos intersticios destas substancias e obteremos para esta ptoraaina uma cdr tao clara como adaquella que occupa a camada n. 1. Ambas estas ptomainas, sendo exposias ao ar, absorveni 299 oxygenes, oxydam-se, espessam-se ¢ acabam por adgnirir a consistencia de resiia. A mesma modificagdo experimentam, quando aquecidas mufto tempo a 100° em uma estufa aB.M. Persistimos em dizer que estes productos aleatoidicos siio devidos & elaboracdo microbiana, o que puzemos féra de duvida por demonstragdo directa. Com effeito, retirando todos os-dias muitas grammas de ptomainas para as experiencias physiolo- gicas, novas porgdes ndo tardaram a apparccer em 2400 48 horas, substituindo as porgdes retiradas;.o que nfo poderia explicar-se sendo por um trabalho dos micro-organismes con- tidos na materia do vomits. De? em7 dias, accrescentava-se apenas uma pequena quantidade de gelatina dissolvidaem agua com 0 fim de fornecer alimento aos organismos, alimento nado sé albuminoide, mas ainda mineral; este ultimo, senda consti- tuindo por saes { chloruretos, sulfatos, etc.) que fazem parte da agua commum, na qual dissolvemos a gélatina. Vatnos agora caracterizar a ptomaina da camada n.1, que intitularemos ¢ ptomaina. FE’ um alcaloide liquido, de cor ligeiramente amarella, ccmo de ambar, oleaginozo, de cheiro acre e aromatico, volatil, formando com a agua ut liquido cpalino, sendo soluvel no alecol ethylico e no ether. Azula forternente o papel vermelho iournesol e encerra uma forte proporciio de azoto, pois fornece abundantes vapores ammoniacaes, quando aquecido com potassa. E’ inflaramavel, aquecido sobre uma lamina de platings arde com chamma amarella fuliginosa, deixando um residue de carvao. trrita. a membrana pitvitaria e pdde determinar nella inflam- macho e erostes. Todavia seu cheiro nao é suffocante. Ao contacto do acide chlorhydrico, assim como a ptomaina n. 2, dé espessas fumagas brencas, semelhantes as produzidas nas mesmas condigdes pela nicotina e pela cicutina. Segundo uma determinagao que fiz, a composicgao centesimal desta ptomaina, preparada o mais possivel com todas as garan- tias de pureza, seria: 300 Carbono 20,976 Hydrogeneo ..... - 15,098 Azoto - 63,926 100,000 Um litro de materia preta proveniente do vomito forneceu pertode 4a5 grammas de ptomaina. Este alealoide precipita pelo todureto de potassio, precipitado gue angmenta pela agitagdo. Precipita tambem pelo tannino. Da com o ferri-cyanureto de potassio addicionado de perchlorn- reto de ferro e de algumas gottas de acido chlorhydrico umu bella cor verde osmeraida, semelkante dquella que se preduz pelo contacts da quinina coma agua chlorada ammoniacal. Vé-se que esta ptomaina constitue excepedo ao reactivo de Brouardel e Boutmy, visto nado dar logar a formag3o de azul da Prassia. Usta ptomaina offerece propriedades reductoras. Entre estas citaromos a seguinte muito curiosa e que podera talvez servir para caracterisal-a. Com effeito, ella descora o iodureto de amido. Para disto nos certificarmos, prepara: se um pouco de grude de atnido a que juntam-se algumas gottas de tintura de iodo ; depois trata-so um pouco da materia azul assim obtida per uma solugio de piomaina e agitu-se; a cor azul nao tardard a desapparecer gradual mente, provavelmente porque ojoco combina-se coma ptomaina para formar um jodureto incoior. Para extrahir da materia negra vomitada a @ ptomaina de qne nos Ce¢upamos, procede-se da maneira seguinte : Agita-se esta materia com a metade do seu volume de ether suifurico. Deixa-se repousar e decanta-se a parte etherea por meio de.um funil de torneira, Depois abandona-se 4 evaporagdo espontanea. O residuc desia evaporagio 6 tratade pelo bi-car- benato de sodio solido e uma pequena quantidade de agaa. Addiciona-se de novo ether e agita-se muite tempo. A parte etherea que sobrenada é separada e abandonada 4 evaporagdo. 301 Filtra-se para separar os crystaes de bi-carbonato de sodio erm excegso © evapora-se o liquido até a dessecagéo em.uma estufa mantida na temperatara de 100° centig. O liguido resultante representa a ptomaina, cujas propriedades ji estudamos. em * Deserevamos em seguida os caracteres da ptomaina da cama- Ga n. 2, que designaremos scb o nome de —D ptomaina, Ella é mais densa do que a primeira, tem uma cor amarella semelhante 4 do mél de abelhas on Ado cleo de croton tiglium. Seu cheiro ¢ levemente ammoniacal. BH’ soluvel na agua e nd alcool, insoluvel no ether. Mancha o papel como um carpo gar~ duroso, mag anodoa nio é persistente. Tem um sabor acre @ deixa sobre a lingua uma sensagao de aspereza. EvaporadaaB. M. em vaso chato, resinifica-sé. Embebida em papel de filtro ¢ assim abandonada ao ar durante 24 horas em um local quente (24° a 26°} decompie-se, exhalando cheiro ammoniacal. Filtrada sobre carvao animal, com que foi prévia- mente agitada, atravessa o filtre tomando uma cor branca leve- mente amarellada, som perder cousa elguma da sua aleaiinidade- Azula o papel vermelho de tournesol. Espalha fumagas es- pessas pela approximagie de um agitador molhado em acido chlohydrico. E? precipitada pelo iodareto de potassio iolurado Nio 4 precipitada pelo tannino. Da coloragio verde esmeralda com o ferri-cyanurelo de potassio addicionado de perchlorureto de fervo, Faz dosvanecer-se a cor azul produzida pela reacgio entre o grude do amido e a tintury. de iodo, communicando ao licor um colorido esverdeado. Precipita pela sclugio chlorhydrica de tetra-chlorureto de piatina. : Um litro de vomito proto, abandonado em vaso fechado, debaixo de ums camada de ether, durante alguns mezes, for- neceu 7) grammas desta plomaina. Purifica-se-a pelo pro~ cosso ja descripto para a ptomaina—alpha. 302 Além destas duas. ptomainas liquidas, demonstramos a pre- senga de um principio alealino gazoso, de natureza organica, tambem producto da elaboragdéo microbiana. : Procedemos da madeira seguinte: Em um pequeno fraseo, de capacidade de 200 grammas pouco mais ou menos, jntroduzimos atéos 2/3 a materia do vomito preto, enchendo o oulro tergo com ethersulfurico até occupar a totalidade do frasec. A addigko do ether impede aalteragio da materia do vomito. Com effeito, o sangue, aurina, o vomito, @ outros humores podem conservar se muitos dias debaixo de uma camada espessa de ether sem decompor-se, mesmo sendo elevada a temperatura exterior. O frasco communica por meio de um tubo recurvado tambem cheio de ether com um provete completamente cheio de mercuric e repousando sobre uma cuba de mercurio. No fim de alguns dias, notei que destacava-se da parte superior do frasco uma camada oleaginosa constituida por uma ptomaina semelhante 4 da camada n. 2, antes descripta (8 ptomaina). Aqueci um pouco de agua em uma caldeira a B..M. entre 50° e 60° centig., e nella mergulhel o trasco. Esta temperatura sufficientemente baixa para n&o matar os microbios nem dar logar 4 decomposigao das materias contidas no liquido, foi sufficiente para deslocar todes os gazes em dissolugdo no mes— mo liguido e dilatal-os de maneira a poder permittic-lhes ven- zer a pressio do mercurio. D’estarte recolheu-se no provete um volume total de 5 +*°.,7 de gazes. Depois introduzimos no provete um fragmento de potassa humida que operou uma notavei absorpgdo, ¢ o volume ficou reduzido adcentim., (absorpgio==0,7), Este facto demonstra a presenga do anhydrido carhonico entre os gazes recolhidos. Fazendé agir-em seguida uma solacdo de pyrogalloi, o volume gazoso de 5 ¢., ficou reduzido a 4 8, ( absorpgaio = 0,2). Havia portanto oxygeneo na mistura gazosa. Emfim, intro- duzimos um pouco de acido sulfurico concentrado eo volume 303 reduzio-se a2 °° 2, (absorpeio==2,6). Esta ultima absorpeaio. foi muito rapida.e o acido sulfurico adquiria immediatamente uma coloracdo amarella. O residuo 2°, 2 inabsorvivel apagou um fragmento de palito phosphorico acceso: eva constituido por azote. Quanto ao gaz que foi rapida e quasi instantaneamente absor- vido pelo acido suifurico, forneceu as reacgdes que caracterisam os alcaloides; isto nos explica a facilidade com que foi avida- mente absorvido. A ammonea e os alcalis organicos aerifor- mes dao logar ao mesmo phenomeno. A soluedo sulfurica do gaz, sendo diluida em uma grande quantidade de agua distillada, foi submettida aos reactivos se- guintes: tetra-chlorareto: de platina, que wrvou o licor, ‘da meésma sorte que ¢ tannino e o iodureta de potassio iodado; o jodhydrargyrato de potassio deu um precipitado pulverulento amarello, A solugdo n&o deu azui da Prussia quando tratada pelo ferri- eyanureto de potassio misturado com perchlorureto de ferro, Aquecida com potassa caustica em excesso emittiv fumagas es- pessas ao approximar-se uma gotta de acido chiorhydrico sus- pensa na extremidade de um agitador de vidro( vapores ammo- niacaes, prova da existencia do azoto como um dos elementos do gaz). Estes vapores azularam o papel de tournesol, Um pouco de solugdo sulfurica evaporada e¢ aquecida forte- mente decompoz-se deixando residuo de earvio. Trata-se, pois, de uma amina ou ammonea composta, cuja analyse centesimal ainda néo pratiquei. Nao pude obter crystallisado este sulfato de ptomaina, apezar de varias tentativas neste sentido. Nao se péde negara correlagio intima entre a avolugio mi- crobiana e a produccao do principio gazoso de que tratamos. As experiencias que seguem vio proval-a. Depois de ter pela primeira. vez expellido totalmente os gazes dissolvidos dentro do frasco deixei que decorressem oito dias. No fim deste prazo, aqueci. de novo o frasco ndo ultrapassando 50° a 60° centig.;

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