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HENDERS
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^ ^ u m e n to progressivo da técnica
T aw recendo a preponderância da máquina
teve particular incidência
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sobre o campo industrial.
Os séculos X I X e X X
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testemunharam uma autêntica revolução
que influiu de forma decisiva
nas ideias e na vida
do homem contemporâneo.
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REVOLUÇA
O presente estudo abre uma luz nova
sobre os acontecimentos e os nomes
que estiveram na origem e na sequência
deste fenómeno social
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INDUSTRIA
de repercussões ainda imprevisíveis.
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História Ilustrada da Europa r
1
Volumes publicados:
Romantismo e Revolta
A Form ação da Europa Cristã O
O Ancien Régime
A Evolução da Rússia
O Século X V
200811 38935
A Revolução Industrial 94(420)
HEN /rev
1527973
Próximo volume:
A revolução industrial 1780-1914
História
Bizâncio e Europa
Ilustrada
da Europ
n
A REVOLUÇÃO
INDUSTRIAL
1 7 8 0 - 1 9 1 4
y /. O. H E N D E R S O N
E D I T O R I A L VE R BO • LISBOA
Í N D I C E
I O D E S E N V O L V IM E N T O IN D U S T R IA L 7
As grandes invenções 12
A revolução do caminho-de-ferro 15
A adaptação social 22
O choque da guerra 26
II O S IN V E N T O R E S 35
Os magnates do ferro 35
Os construtores navais 40
Os inovadores têxteis 46
Os engenheiros 49
Os químicos industriais 53
Os técnicos da electricidade 57
Os engenheiros do automobilismo 60
Inventores americanos 60
Incentivos para a invenção 61
III O S E M P R E S Á R IO S 65
E S T E L IV R O F O I PU BLIC A D O O R IG IN A L M E N T E POR T H A M ES AND H U D SO N ,
LO N D R ES, COM O T ÍT U L O «THE IN D U ST R IA L IZ A T IO N O F EUROPE»
Prússia: Friedrich von M otz 69
C O P Y R IG H T B Y W. O. H E N D E R SO N , 1969 Prússia: Peter Beuth 72
TRA DUÇÃO D E M ARIA ONDINA
Prússia: Christian von Rother 74
N.° E D .-4 4 9
França: Luís Napoleão 77
ao passo que a moderna indústria se limitava a algumas bolsas o estado avançado da O Cidades em desenvolvimento
indústria britânica em N ew cástlêZ V < Movas fundições de ferro a carvão
na Renânia, Saxónia e Alta Silésia. Só depois da unificação 1815 — um ano to
«t Desenvolvimento das principais docas
das alfândegas alemãs ( Zollverein) e da construção dos caminhos- mado muitas vezes,
para marcar o começo
-de-ferro em 1840 é que um rápido progresso se conseguiu, da Revolução Industrial
e a região do Rur experimentou então a sua primeira explosão
industrial. Só depois da unificação política de 1871 é que o ritmo
no Continente. A pre
sença de áreas ricas
tanto em carvão como
& P r é sto n Leeds H ullV
da industrialização alemã alcançou o movimento febril que carac em ferro e prontamente B o ltõ n pl r
acessíveis ao transporte I7 0
Manchester,
terizou o último quartel do século X I X . da água explica, em Liverpoo]'
Em França, apesar das perdas territoriais e financeiras sofridas parte, a primazia da
Grã-Bretanha. Repare-
após Waterloo, as reformas revolucionárias e napoleónicas sobre -se na concentração das ^ N o ttin g h am >
indústrias manufactu- = O
viveram. A abolição do feudalismo, a criação de um banco central ^ = ~ S taffo rd O — fy * D e rb y
reiras nessas áreas. R e S h re w b u ry T S 1 _ --= o L c ic e s te r
e de um código comercial, a introdução do sistema métrico e os parar também no desen ^ B ir m in g h a m
volvimento urbano à
avanços nos conhecimentos químicos foram conquistas efectivas. Bew deyO ^ C ° v en try
medida que os operá
Mas o desenvolvimento industrial, muito vagaroso durante o rios são arrastados para
as minas e para as
período da Restauração (1815-1830), foi retardado por causa
cidades fabris.
da pobreza das comunicações, das escassas fontes de carvão L o n d re s
AS GRANDES INVENÇÕES
W 7 '
X ' 856'
Em 1870, uma teia de aço estendia-se por toda a Europa
Ocidental. Tinha-se tornado uma operação simples transportar
/
maquinismos pesados e matérias-primas, em grandes quantidades, dres
de um canto do Continente para outro. Já engenheiros ferro
viários haviam furado os Alpes em monte Cenis e os projectos
do túnel de St. Gottard saíam da prancheta dos desenhadores.
Para alguns países foi mais fácil do que para outros aceitar
as mudanças sociais envolvidas na transição de uma economia
agrária para uma economia industrial. Um a sociedade com uma Lião-S$.-Etienne[ í$3%f( \
classe média bem desenvolvida, divisões de classes flexíveis e
operários que podiam aprender novas técnicas e aceitar uma í
nova espécie de disciplina era própria para se abrir mais ràpi- ' Tunel dor
íte. Cenis'l871>
damente do que uma sociedade com uma classe média fraca,
barreiras rígidas de classes e camponeses altamente conservadores. wm l . os c a m in h o s de f e r r o n a c io n a is
Os legados do feudalismo retardaram por isso sèriamente a L in h a s de ca m in h o d e fe r r o
— 1 8 4 8 ____1 8 7 7
primeira industrialização da Europa. A sobrevivência da escra
O 500 km
vatura em muitos países — em França até à Revolução, e na
Alemanha, Áustria e Rússia até ao século X I X — tornou virtual
mente impossível o recrutamento de trabalhadores industriais
18. Mapa que indica a marcha do desenvolvimento dos caminhos-de-ferro na Europa
Central entre 1848 e 1877. O progresso industrial é mais marcado onde a rede é mais densa.
17. Atento às insuficientes fontes de carvão da Itália e ao entusiasmo pelos caminhos-de-
-ferro, um inventor patriótico idealizou a Im pulsoria de 1853.
em quantidade. Os operários estavam sujeitos às regras e privi
légios das associações de classe tradicionais e das municipali
dades e tinham, geralmente, de obter uma permissão para emigrar
de uma província para outra.
Na Grã-Bretanha do século X V III, contudo, a escravatura
tinha já desaparecido e as restrições impostas pelas guildas e
pelas autoridades municipais aos industriais pioneiros não eram
tão severas como em muitos lugares do Continente. Os empre
sários tinham pouco a recear da interferência do Governo,
particularmente se erguiam as suas fábricas fora dos limites
municipais. Os trabalhadores podiam mudar-se livremente de
um lado para outro do país. Na Grã-Bretanha, além disso, não 23
19, 20. Que uma roda de
fiar podia fazer as vezes de
mil fusos é uma regra da
Revolução Industrial. À es
querda, «A solteirona à lareira»
— uma cena tradicional de
casa de campo. Por baixo, «má
quinas de fiar algodão» (1835).
2 1 . À direita, o empresário e
titular britânico do século
X V I I I , Francis Egerton, ter
ceiro duque de Bridgewater,
construtor de canais e magnate
do carvão.
OS MAGNATES DO FERRO
OS CONSTRUTORES NAVAIS
OS PIONEIROS DO CAMINHO-DE-FERRO
OS TÉCNICOS DA ELECTRICIDADE
Nem sempre foi possível aos Governos concederem as con mento de Estradas e Pontes, afirmava que as estradas francesas
dições favoráveis que desejavam. Durante a Revolução Fran estavam em condição deplorável e que as regiões industrializadas,
cesa, a depreciação da moeda pela emissão de assignats foi um como a de Lião e de Saint-Étienne, tinham estradas péssimas.
dos factores que atrasou o desenvolvimento industrial nessa Além disso, a eficiência do impulso governamental dependia
ocasião, e, durante a maior parte do século X I X , o rublo russo da qualidade dos funcionários públicos que em vários países
foi uma moeda notàvelmente instável. Depois das guerras napo- deixava muito a desejar.
leónicas o Banco Real de Berlim tinha um débito tão grande que Aconteceu também que alguns Governos, apesar das suas
não podia cumprir com as funções normais de um banco cen boas intenções, estorvavam mais do que ajudavam o desen
tra l— e, ao mesmo tempo, o estado desorganizado das finanças, volvimento industrial, pela própria perfeição das suas tentativas
tanto nacionais como locais, em quase todos os Estados alemães, para regular a produção. Não restam dúvidas de que, na primeira
impedia-os de auxiliarem os projectos urgentemente neces metade do século X I X , o código prussiano de minas, que deu
sários de obras públicas. Em França, em 1818, o eminente aos inspectores do Governo extensos poderes para regular o
engenheiro Louis de Gallois-Lachapelle queixava-se Qjam rela trabalho diário nas minas de carvão e outras, não estimulava
tório da falta de caminhos-de-ferro em minas de carvão, enquanto, o investimento de capitais nessas indústrias e atrasava, assim,
66 seis anos depois, F . L . Becquey, director-geral do Departa- o seu desenvolvimento. Por seu turno, o sistema centralizado
59. Nunca f o i tão
bom. Caricatura do interesses da defesa nacional. Certas fábricas, assim como
rei Luís Filipe (1773-
algumas explorações agrícolas do Estado, eram estabelecimen-
1850), despejando so
bre o povo o dinheiro tos-modelo, destinados a indicar o caminho às empresas pri
que à indústria escas
seava para promover
vadas, utilizando os maquinismos mais modernos e as melhores
o d ese n v o lv im e n to técnicas de produção. Construíram-se também algumas fábricas
económico.
estatais em regiões onde as velhas indústrias estavam a declinar,
a fim de fornecerem trabalho aos desempregados. Deve acen-
tuar-se que, durante o século X I X , a política de nacionalizações
raramente foi influenciada por doutrinas socialistas. A obra de
Motz, Beuth e Rother, na Prússia; de Napoleão III, em França;
do conde W itte, na Rússia, ilustram pormenorizadamente as
intenções e o papel dos Governos.
p r ú s s ia : c h r is t ia n von ro th er
laridade — Széchenyi foi uma figura dominante na política magiar a melhorar a sorte dos seus servos, distribuindo terras para uso
e um poderoso advogado da reforma constitucional. pessoal deles e aconselhando-os sobre os mais eficientes métodos
Depois de herdar uma parte das propriedades do pai, voltou de agricultura.
a sua atenção para o melhoramento delas. Importou garanhões Enquanto se ocupava em beneficiar as suas propriedades,
e éguas puro-sangue de Inglaterra, e foi largamente responsável Széchenyi promovia também activamente a constituição de
pela fundação de uma sociedade de corridas de cavalos que se empresas industriais. Tom ou-se membro da Dieta em 1826,
transformou dez anos mais tarde na Sociedade Agrícola Nacional e seis anos mais tarde juntou-se a uma comissão que se tinha
Húngara. Importou gado da Holanda e porcos da Sibéria. Pro criado para fundar um banco comercial. Ele era a força
duziu melhor lã nas suas quintas melhorando a qualidade dirigente por trás do esquema e, após longa demora, teve a
dos seus rebanhos de carneiros e foi um dos primeiros senhores satisfação de ver a constituição do Banco Comercial Húngaro
de terras da Hungria a plantar amoreiras para criar bichos-da-seda. de Peste (1841). Advogando fortemente a construção de uma
Usou utensílios modernos nas suas propriedades, drenou campos moderna ponte suspensa sobre o Danúbio, para ligar Buda com
pantanosos e modificou o sistema de rotação de colheitas, semeando Peste e substituir a velha ponte de barcos, persuadiu um banqueiro
mais batatas e vegetais. As instruções que dava ao seu adminis vienense a financiar o projecto, e a ponte, desenhada por uma
trador Janos Lunkanyi em 1828 mostram que estava resolvido firma inglesa, ficou pronta em 1849. Széchenyi foi também
designado pelo Governo para alto comissário responsável por -servo, chamado E. Grachev, dirigia uma fábrica de linho e outra
um esquema regulador da navegação sobre o Danúbio na Porta de algodões estampados nas propriedades da família Sheremetev.
de Ferro. Esteve no quadro dos dirigentes da Primeira Compa Comandava mais de 500 teares de linho, mas quatro quintos dos
nhia Imperial Privilegiada de Navegação do Danúbio (1829), seus tecelões trabalhavam nas suas próprias casas. As suas fábricas
que tinha um serviço de barcos entre Viena e Belgrado e contro de algodão estampado empregavam cerca de 120 homens. Instalou
lava uma companhia subsidiária estabelecida para dirigir um máquinas de fiação, calandras e prensas de estampar. Em 1800,
estaleiro em Altofen, subúrbio de Budapeste. Outro dos seus esta firma tinha-se tomado uma das mais importantes de Ivanovo.
empreendimentos foi a regularização do rio Tizsa, para o que foram Possuía quatro fábricas, com bons edifícios, e sete dormitórios que
expropriadas 150 milhas de terras baixas. Széchenyi foi ainda serviam de casa de habitação para os operários. Grachev, que
membro de um grupo que apadrinhou a formação de uma comprara a sua liberdade por 130 000 rublos em 1795, tornou-
companhia para construir um caminho-de-ferro na margem -se um homem rico, chegando a investir em propriedades rurais.
direita do Danúbio desde Budapeste a Viena. Em 1797, Asva Morosov, um servo da propriedade de N.
Széchenyi criticava os que consideravam as fábricas e as G. Ryumiri, ergueu uma pequena oficina de fitas de seda ná
máquinas a vapor «instituições infernais». Acreditava que a aldeia de Zuevo (distrito de Bogorodski) e logo a seguir, uma
Hungria devia seguir o exemplo de países mais avançados desen segunda fábrica. Ele dirigia os teares, enquanto a mulher era
volvendo a produção das suas próprias manufacturas. Contribuiu responsável pelo tinto da seda. Em 1811, a empresa de Morosov
para melhorar a Companhia da Fábrica de Farinhas a Vapor de era ainda pequena, pois tinha só dez teares. Durante algum tempo,
Peste, que começou a laborar em 1842. O sistema de cilindros de aço a invasão da Rússia por Napoleão e o incêndio de Moscovo
para moer trigo — inventado pelo engenheiro suíço Sullzberger — impediram a expansão das indústrias têxteis nessa zona do país,
foi usado, e trouxeram-se da Suíça vários peritos para trabalhar mas em 1820 Morosov estava a trabalhar com o dobro dos teares.
com as máquinas. Uma firma subsidiária, estabelecida para o Então, expandiu as suas actividades à fiação e tecelagem de
serviço de manutenção das máquinas, tornava-se independente algodão, mandando fazer a fiação fora, aos camponeses que
em 1847, sob a designação de Ganz & C°. Como proprietário viviam nas aldeias vizinhas. Em 1825, Morosov mudou-se para
de terras e empresário — e também como escritor e estadista — Moscovo, onde se aproveitou do aumento de consumo de artigos
Széchenyi representou um papel muito importante no avanço de algodão que então se verificava, ao mesmo tempo que se tornava
económico e político da Hungria entre o fim das guerras napoleó- possível adquirir, por preço acessível, grandes quantidades de fio
nicas e a Revolução de 1848. do Lancashire — apesar da alta tarifa de 1822. As fábricas de
Morosov produziam tanto tecido de algodão puro como misto
EMPRESÁRIOS-SERVOS RUSSOS de algodão e lã. Os seus dois filhos instalaram fábricas suas
que eram, no entanto, vigiadas de perto pelo pai. Nos princípios
Em S. Petersburgo, nos princípios do século X I X , havia um da década de 1850, um inventário das várias empresas de Morosov
certo número de servos que faziam um pagamento anual em moeda mostrava que a fábrica tinha 74 teares mecânicos, 456 teares
(em vez de prestação de serviços) ao proprietário da casa senho manuais e um volume anual avaliado em perto de 2 milhões
rial das suas aldeias natais. de rublos. Pelos fins do século X I X , a firma tinha-se transfor
Alguns servos russos conseguiram fundar empresas indus- mado numa das maiores de Moscovo, empregando 22 000 ope
120 triais. Em Ivanovo, nos fins do século X V III, um empresário- rários e produzindo artigos no valor de 32 milhões de rublos.
IV OS O P E R Á R IO S de trazer consigo cartões de identidade que permitiam aos patrões
e à polícia impedir-lhes os movimentos e mudanças de emprego.
Os trabalhadores achavam, pois, difícil adaptar-se à disciplina
imposta pela fábrica. No passado, os artífices e os camponeses
98. Brasão usado pela Associação de trabalhavam muitas horas, mas podiam descansar de vez em
tecelões de lã de Dewsbury. quando. A máquina cruel, contudo, precisava de atenção constante.
A pontualidade e a rigorosa atenção ao trabalho eram reforçadas
A Revolução Industrial teve consequências dramáticas por multas e pela ameaça de desemprego.
para todos os grupos de trabalhadores. Os operários nas fábricas, O novo sistema industrial arruinou a saúde de muitos tra
os mineiros nas minas de carvão, os artífices nas suas oficinas, balhadores. Quase todas as indústrias tinham as suas doenças
e os camponeses na terra, tinham de se ajustar a um modo de características e as - suas deformidades físicas. Os oleiros, os
vida inteiramente novo. Muitos entravam nas fábricas com pintores e os cortadores de arame sofriam de envenenamento
grande relutância. Para os artífices respeitáveis, as fábricas pare pelo chumbo; os mineiros, de tuberculose, de anemia, da vista,
ciam estar a atrair operários do mais baixo estofo e tais estabe e de deformações da espinha; os afiadores, de asm a; os fiandeiros,
lecimentos começaram a ser considerados quase como prisões de perturbações brônquicas; os fabricantes de fósforos, de envene
ou asilos. Os males sociais das fábricas, das cidades fabris e das namento pelo fósforo. Jules Simon, escrevendo acerca das fábricas
mineiras, e as tragédias dos trabalhadores domésticos agora francesas declarou: «Os visitantes não podem respirar nesses
desempregados estavam entre os primeiros aspectos da nova tristes lugares.» Nos países continentais que tinham recrutamento
ordem que requeria a atenção dos reformadores. militar, verificava-se que os recrutas das regiões industriais
Muitos operários das primeiras fábricas ficavam em completa tinham muitos mais defeitos físicos do que os jovens dos distri
dependência dos seus novos patrões. No século X V III, muitos tos rurais. A esperança de vida dos trabalhadores das fábricas
mineiros de carvão escoceses e operários das salinas eram servos, e dos mineiros era pequena. Tem -se dito que na indústria de
e do mesmo modo os operários de várias minas e fábricas do cutelaria de Sheffield, em 1865, a média da idade dos amoladores
Continente, em especial os dirigidos por magnates feudais na
Rússia, Silésia e Boémia. Mesmo depois dos servos terem sido 99. Servos russos no Don, princípios do século X I X . A escravatura só viria a ser abolida
na Rússia em 1861.
emancipados, havia operários que gozavam de muito pouca
liberdade. Nos princípios do século X I X , um mineiro de Durham
ou um oleiro de Staffordshire que tivesse assinado um contrato
por um ano e vivesse numa choupana da firma estava completa
mente à mercê do patrão. Havia outros modos dos patrões domi
narem os operários. Em certos distritos industriais era vulgar
homens receberem salários antecipados e assim caíam em débito
permanente. Os operários das fábricas e das minas não só estavam
sob o poder dos patrões como sob o poder público. Era-lhes proi
bido juntarem-se em sindicatos obreiros, fazer greve ou emigrar.
122 Em França, em grande parte do século X I X , os operários tinham
100. Acidentes industriais e doenças espe
cíficas infestavam as vidas dos operários das
minas e das fábricas do século X I X . Os
patrões interessavam-se geralmente pouco
pelas condições de trabalho e havia poucas
medidas de segurança. A primeira lei de
seguro obrigatório data de 1884. À esquerda,
uma multidão reunida em redor do poço
da mina de carvão de Oaks em Barnesly,
onde se dera um acidente, é saudada por
uma segunda explosão, 1866.
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não menos pálidas, não menos sujas, cobertas de farrapos, besun
tadas do óleo dos teares que as esparrinhou durante o trabalho.»
As queixas mais sérias dos operários das fábricas e das m in g s
referiam-se a excessivas horas de trabalho, salários baixos, multas,
e ao sistema de permuta segundo o qual os patrões pagavam
em géneros e não em dinheiro. Os homens, as mulheres e as
crianças trabalhavam doze horas ou mais por dia e estavam geral
mente exaustos quando regressavam a casa. Visto a certos patrões
interessar que as máquinas trabalhassem continuamente, intro
duziram-se turnos nocturnos em algumas indústrias. O número
de dias de trabalho no ano aumentava. Por vezes o domingo era
dia de trabalho também, apesar dos protestos das Igrejas. Nos
distritos onde os aprendizes costumavam ter as segundas-feiras
livres, os patrões faziam o possível por abolir esse hábito. E ,
nos países católicos, os dias santos eram gradualmente reduzidos
nas fábricas. Além disso, após a Revolução Industrial, um ope
rário tinha às vezes de percorrer uma considerável distância
a pé para chegar à fábrica, enquanto sob o anterior sistema
doméstico trabalhava em casa.
Os salários, geralmente muito baixos, eram ainda reduzidos
de vários modos: os operários sofriam multas por atrasos ou
trabalho estragado; se os salários se pagavam não em dinheiro 104. O meio habitacional das classes trabalhadoras: desenho de G . D oré de uma zona
miserável de Londres atravessada por viadutos de comboios (1870).
mas em vales trocáveis nas lojas do patrão, o operário tinha
muitas vezes de comprar artigos de mercearia estragados e imi As condições nos centros de trabalhadores das cidades indus
tações a preços altos. Para mais, se o negócio baixava, os patrões triais não eram melhores do que as condições nas fábricas. As
reduziam logo os salários a fim de diminuir os custos. Os salários casas, umas de encontro às outras, e os pátios esquálidos de
de muitos operários — mesmo de famílias inteiras — eram fre Inglaterra, tal como os amontoados igualmente sórdidos dos
quentemente insuficientes para pagar a renda de casa ou alimentar andares no Continente, depressa se transformaram em bairros
e vestir a família. Não espantava, pois, que mulheres e crianças miseráveis. St. Giles, em Londres, Little Ireland, em Manchester,
fossem trabalhar e que, mesmo quando tinham emprego, os o Voigtland, em Berlim, os subúrbios de Saint-Georges, e Croix-
operários fabris precisassem de contar com a caridade como -Rousse, em Lião, eram todos quarteirões de trabalhadores onde
suplemento dos seus ganhos. Um a vez que não podiam conseguir estes não gozavam de nenhuma das amenidades das habitações
nada melhor, os operários viviam em casebres ou em andares civilizadas. A falta de água potável e de retretes, os esgotos
húmidos, superlotados, doentios — mesmo em trapeiras, caves impróprios e a ausência de nitreiras, tornaram as cidades indus
e telheiros. As suas roupas eram esfarrapadas, a comida imprópria, triais lugares extremamente insalubres. Os piores bairros pobres
e a taberna o único refúgio dos desconfortos do lar. abrigavam grupos minoritários — os irlandeses em Liverpool e 129
106 blocos de apartamentos revelou que 19 eram estruturalmente
M anchester, os polacos no Rur — que vinham de países onde
inseguros, 15 eram insalubres e 6 absolutamente impróprios
o nível de vida era ainda mais baixo do que os deploráveis níveis
para habitação humana. Em Essen, 17 por cento das pessoas
das cidades industriais.
viviam em águas-furtadas e um inspector de construções local
Alguns operários possuíam alojamentos melhores do que
verificou que 2200 águas-furtadas não ofereciam segurança.
outros. Engels, escrevendo em 1844, descrevia a sordidez incrível
Consta que, numa quinta perto de Wattenscheid, em 1902, um
em que os irlandeses de Manchester viviam junto do rio Medlock
lavrador alugara um telheiro abandonado a 17 famílias, num
e na confluência do Irk e do Irwell, mas quando visitou Ashton-
total de 94 pessoas.
-under-Lyne, só a algumas milhas de distância, viu que «as ruas
Disciplina rigorosa, horas excessivas de trabalho, salários
são mais largas e mais limpas, ao passo que as casinhas novas,
baixos e acomodações pobres, não esgotavam os males do novo
de tijolo vermelho, dão todo o aspecto de conforto». Más condições
sistema industrial. Havia pouca certeza de emprego, o que não
de alojamento não conheciam fonteiras nacionais. Mais de meio
representava nenhum novo problema, visto a vagabundagem
século depois de Engels ter descrito as condições de alojamento
— por vezes em larga escala — ter sido comum em sociedades
em Inglaterra, Loienz Pieper, num livro sobre os mineiros do
rurais do passado. Com o advento da indústria moderna, muitos
Rur, dedicou um capítulo a situação semelhante nessa região.
operários acharam-se em emprego casual ou temporário: os
Contava que em Hõrde, em 1896, uma inspecção oficial de
Mesmo os operários ocupados em ramos de fabrico livres
de trabalho ocasional não podiam esperar emprego regular por
que toda a economia industrial estava sujeita a grandes flutuações.
Patrões e operários habituaram-se a um ciclo de curtas depres
sões em cada dez anos, mais ou menos, até 1870, quando as
breves ciises foram substituídas por uma bastante prolongada.
Para o tiabalhador, uma baixa podia significar um período de
semiemprego ou de desemprego que se estendia por muitos
meses, durante os quais tinha de recorrer, para comida e roupas,
à generosidade pública ou à caridade particular. E m períodos
de extrema crise o Êstado podia promover a realização de certas
obras públicas, como no caso das Oficinas Nacionais de Paris
em 1848, a fim de aliviar o desemprego.
A Revolução Industrial teve lugar na Grã-Bretanha mais
cedo do que em qualquer outra parte, foi aí que o fenómeno
dos ciclos comerciais se observou primeiramente. Mas quando
outros países se tomaram industrializados, sofreram a mesma
experiência desagradável e o desenvolvimento de uma economia
106. Vítimas da escassez do algodão, no Lancashire, trocam senhas por comida num
armazém dirigido por uma associação de socorros mútuos (1861). de tipo internacional fez com que os efeitos das crises nos países
industriais se espalhassem para as regiões agrárias e tropicais,
trabalhadores dos portos e da construção eram muitas vezes interessadas na produção de alimentos e matérias-primas: a grande
contratados ao dia. Os construtores estavam mais ocupados crise de 1857 foi a primeira depressão a nível mundial.
no Verão do que no Inverno. As fábricas de ferro e as fábricas As altas e as baixas de valores ocorriam tão regularmente
têxteis, que dependiam da energia hidráulica, tinham de fechar que podiam ser previstas com certa exactidão. E ra natural que
se não havia, água bastante para mover a roda que punha o maqui- os economistas pensassem que cada ciclo seguiria precisamente
nismo em movimento. O grito de Alfred K rupp: «Se ao menos o padrão dos anteriores, mas embora houvesse um ritmo de activi
eu tivesse água suficiente para fazer trabalhar o meu martelo dade industrial — a uma fase de prosperidade seguia-se uma
só um dia!» era repetido por muitos patrões na primeira era depressão — , cada subida e cada baixa tinham as suas próprias
das máquinas. U m Inverno severo podia levar a produção indus características particulares. Nos princípios de 1850, a Europa
trial à paralisação, se as estradas ficavam intransitáveis. Por Ocidental experimentou uma subida que ficou a dever muito
vezes, contudo, os operários podiam voltar às suas aldeias quando a uma súbita afluência de oiro da Califórnia e da Austrália, en
o movimento diminuía nas cidades industriais. Os artífices rurais quanto a crise nas indústrias de algodão, dez anos depois, foi
dividiam frequentemente o seu tempo entre a indústria e a agri devida a acontecimentos no outro lado do Atlântico, nomeada
cultura. Um estudo de uma região rural francesa (Sobre le Château) mente à guerra civil nos Estados Unidos Ora, nem as descobertas
em 1848 mencionava: «os cardadores de lã gostam de trabalhar de oiro nem a guerra civil se adaptavam muito bem a qualquer
132 nos campos durante o Verão e regressar às fábricas no Outono». padrão universal de subidas e baixas industriais. Karl M arx
A indústria do algodão era uma das maiores e mais florescentes
do pais mas a sua prosperidade estava ameaçada por descidas
periódicas devido à competição que aumentava no estrangeiro
e à dependência de uma fonte irregular de fornecimento — as
plantações de algodão dos Estados Unidos — em mais de três
quartas partes da sua matéria-prima. A erupção da guerra civil,
em 1861 foi seguida por um bloqueio dos portos do Sul dos
Estados Unidos. Os estados da Confederação estavam isolados
do mundo exterior e o Lancashire não podia assegurar-se dos
seus fornecimentos normais de algodão. O resultado foi que os
fabricantes tiveram de reduzir as horas de trabalho ou mesmo
de fechar as fábricas. Calculou-se em mais de 60 milhões de
libras a perda líquida da indústria durante a fome do algodão.
Para os operários, a fome do algodão foi um período de
desemprego e aflição. Em Novembro de 1862 as autoridades
108. Uma idealização vitoriana do trabalhador manual e das suas condições. U m pormenor
do T rabalho (1863) de Ford Madox Brown.
AS COOPERATIVAS
AS COOPERATIVAS
operários, proibia a intimidação dos furadores de greve e tornava puseram reduzir os salários na renovação dos contratos anuais
muito difícil aos sindicatos conservarem-se dentro da lei quando dos mineiros. Após sete semanas, os patrões cederam e conce
organizavam uma greve. Começavam então a fazer-se tentativas deram aumento de salário e uma redução no número de horas
para a criação de sindicatos numa base mais ampla do que a pura de trabalho. Mas quando os mineiros, animados por esse sucesso,
mente local. John Doherty criou a União Nacional dos Fian fizeram uma segunda greve, um ano depois, os patrões esta
deiros de Algodão (1829) e a Associação Nacional de Protecção vam prontos para a luta e substituíram os grevistas por homens
ao Trabalho (1830), a última das quais declarava possuir 100 000 de outras áreas mineiras. Os grevistas recorreram à violência,
associados entre os operários têxteis do Norte e Leste dos Midlands, e cerca de 50 foram punidos nos tribunais locais. Em Setembro,
mas ambas fracassaram após alguns anos. os grevistas tiveram de admitir a derrota e o sindicato falhou.
Enquanto os operários do algodão do Lancashire estavam O falhanço dos fiandeiros de algodão e dos mineiros de carvão
a ser organizados por Doherty, os mineiros de carvão de Durham foi seguido pelo falhanço do Grande Sindicato Nacional, que
e Northumberland formavam uma união que convocou uma pretendia a organização de uma greve geral de todos os assala
156 greve em Abril de 1831, quando os senhores do carvão se pro- riados e, através dela, conquistar o domínio do sistema económico. 157
O movimento falhou ràpidamente, em parte por causa das O falhanço dos motins do Plug Plot no Lancashire e da greve
disputas internas, em parte por os patrões enfrentarem o dos mineiros de Durham e Northumberland — seguido pelo
desafio à sua autoridade processando tuna quantidade de sindi colapso final do Cartismo em 1848 — marcou o fim da primeira
calistas. fase histórica do unionismo operário inglês. Nos meados do
Durante algum tempo, os operários ingleses abandonaram século X I X , o centro de gravidade do movimento sindicalista
as tentativas de melhorar as suas condições por acção directa, operário deslocou-se do Norte para Londres, e a direcção, de
voltando-se, em vez disso, para a acção política. Esperavam que futuro, ficou nas mãos de trabalhadores altamente qualificados
a aprovação da lei de reforma parlamentar de 1832 levasse à e relativamente bem pagos. A Amalgamated Society of Engi-
eleição de uma Câmara de Comuns que estaria disposta a escutar neers (1851) foi típica do unionismo do «novo modelo» de 1850-
os seus agravos. Apoiavam todos os movimentos a favor de u m a 1870. Essas uniões, dirigidas por homens como William Newton,
«Carta do Povo», do dia de dez horas de trabalho e da modificação William Allan, Daniel Guile, Edward Coulson e George Odger,
da nova Lei dos Pobres. Quando a Câmara dos Comuns rejeitou foram organizadas muna base nacional, impunham subscrições
a «Carta» pela segunda vez, em 1842, era manifesto que pouco muito altas, designavam funcionários permanentes, concediam
tinham conseguido com o apelo ao Parlamento, e verificou-se subsídios no desemprego e na doença, e tentavam resolver as
uma renovação da actividade directa dos sindicatos, tanto entre disputas industriais mais por meio de negociações que por
os fiandeiros do Lancashire como entre os mineiros de Durham meio de greves. Os seus secretários, que tinham sede em Londres,
e Northumberland. Em 1842 as perturbações do trabalho no trabalhavam juntos, e essa «junta» exerceu uma influência consi
Lancashire deram origem aos motins do Plug Plot. Os mineiros derável na modelação da política das ttades unions. Foi importante
do carvão fundaram uma nova união em Wakefield, em 1841, o seu papel para a criação, em 1868, do Congresso das Trades
e, quando realizaram a sua primeira Convenção Nacional, em Unions. Pela mesma época foi estabelecido com êxito o maqui-
Manchester, em Janeiro de 1844, afirmaram agregar mais de nismo para solucionar, por conciliação ou arbitragem, as dis
60 000 operários. Os mineiros de Durham e Northumberland putas industriais, por A. J. Mundella na indústria de meias de
— o grupo maior e mais militante do sindicato — contrataram o Nottingham e pelo juiz R. A. Kettle na indústria de construção
hábil advogado W . P. Roberts para seu conselheiro legal. Em de Wolverhampton. O significado das novas amalgamated societies
Abril de 1844, quando os seus contratos anuais terminaram, os e da «junta» não devia contudo ser exagerado. Elas representavam
mineiros do Norte recusaram-se a renová-los segundo os velhos uma minoria dentro do movimento trade-unionista e em muitas
termos. Roberts propôs um novo contrato para assegurar o dia indústrias o controle dos sindicatos conservou-se totalmente
de dez horas, garantir trabalho quatro dias por semana, abolir as nas mãos de organizações locais que eram frequentemente muito
multas, e reduzir o prazo do contrato para seis meses em vez vigorosas na sua defesa dos interesses dos operários. A guerra
dos doze habituais. Os patrões, contudo, dominaram a greve dos sindicatos na década de 1850 levou às greves dos engenheiros
importando outros mineiros para os jazigos de Newcastle e expul (1852), dos operários de algodão de Preston (1853) e dos operários
sando os grevistas das casas que ocupavam e pertenciam às de construção de Londres (1859-1860).
minas. Após 19 semanas, os homens voltaram ao trabalho, acei Em 1865-1866, os Ingleses tiveram de se recordar de que o
tando pràticamente as condições dos patrões. Mas tinham conse lado negro do movimento sindicalista ainda existia. A burguesia
guido alguma coisa. O contrato anual desaparecera e os mineiros surpreendeu-se ao ler nos jornais os ultrajes cometidos contra não
eram agora contratados mensalmente. unionistas e patrões por certos operários da indústria de cutelaria
da Grã-Bretanha eram provàvelmente cerca de um décimo da
população trabalhadora masculina, mas o período de 1871 a
1914 assistiu a uma grande expansão de trade-unionismo. Embora
a união dos trabalhadores agrícolas de Joseph Arch, de 1872,
fosse desfeita pelos proprietários e lavradores, a união de Ben
Tillett, de estivadores de Londres, conseguiu assegurar o salário
mínimo de 6 dinheiros por hora a partir de uma greve em 1889,
enquanto os esforços de Annie Besant para organizar as operá
rias fosforeiras de Londres tinham também alcançado um certo
êxito em 1888. Estas novas uniões da década de 1880 eram
geralmente associáçõés* de operários mal pagos, sem qualificações
ou semiqualificados. Os seus membros podiam contribuir apenas
com baixas subscrições e gozavam de poucos benefícios mutua-
listas. Eram porém mais militantes do que as estabelecidas sm
1850, e, além disso, os seus chefes acreditavam na influência
política tanto como na influência industrial e estavam intima
mente associados com as organizações que se iam desenvolvendo
no seio do Partido Trabalhista. Os trabalhistas que eram eleitos
120. Os operários das fábricas de fósforos de Londres marchando para W estm inster para
uma petição (malograda) de salário mínimo e de melhores condições de trabalho, 1871.
para o Parlamento recebiam, frequentemente, apoio financeiro Partido Trabalhista teriam sido sèriamente limitadas. Por uma
das uniões. Em 1900, o total de membros dos sindicatos britâ lei de 1909, os membros do Parlamento passaram a ter ordenado,
nicos subira a cerca de dois milhões. enquanto uma outra lei de 1913 legalizava a colecta política, mas
Nos princípios do século X X , os adversários das organi puramente voluntária.
zações operárias atacaram os sindicatos através dos tribunais. Noutros pontos da Europa, o desenvolvimento dos sindicatos
A Companhia de Caminhos-de-Ferro T a ff Vale recebeu em 1901 operários foi impedido por restrições legais. Algumas antigas
23 000 libras de indemnização da Amalgamated Society of Railway organizações de operários — as associações de mineiros na
Servants por prejuízos causados por uma greve, embora esta não Alemanha, as associações de caixeiros-viajantes em França e os
tivesse carácter oficial. Em 1906, contudo, a lei de Conflitos de artels na Rússia — puderam sobreviver na nova era industrial,
Trabalho veio proteger os sindicatos contra casos semelhantes. mas as uniões mais modernas de artífices e operários fabris
Em 1909, W . V. Osborne ganhou uma acção contra uma trade foram muitas vezes impedidas de subsistir pela hostilidade de
union (a que ele pertencia), impedindo-a de realizar uma colecta patrões e Governos. Em França, muitas associações primitivas
política para sustentar membros trabalhistas do Parlamento. de operários disfarçavam-se em associações de socorros mútuos.
Se esta sentença se tivesse mantido em uso, as actividades do Em Lião, em 1830, desenvolveu-se um tipo de união — o devoir 163
»I
123. À esquerda: A lência. Os operários resistiram a uma redução de salários e à
B arricad a , uma lito
grafia de Steinlen que tentativa dos donos das fábricas de obrigar cada tecelão a tra
evoca o horror e a balhar com dois teares em vez de um. O governo anunciou ime
violência que acompa
nharam a Comuna de diatamente que, de futuro, as autoridades não manteriam a
Paris de 1871.
proibição de sindicatos operários, embora nenhuma mudança
se desse na lei. Esta concessão foi logo seguida de várias greves,
sendo uma das mais sérias a das fábricas de aço L e Creusot,
em 1870, quando 3000 soldados tiveram de ser enviados para
lá a fim de manter a ordem. O movimento do sindicalismo ope
rário em França sofreu nova paragem quando a França foi derro-
184 132. Alguns dos muitos panfletos marxistas em circulação nos fins do século.
Logo a seguir, várias firmas de algodão, em Stalybridge e como uma minoria fanática de militantes dedicados podia repre
Ashton-under-Lyne, anunciaram uma redução de salários. A sentar papel importante na política industrial, em total despropor
8 de Agosto, em Stalybridge, a multidão marchou de uma fábrica ção com o número dos seus sequazes. A revolta dos sindicalistas
para outra, chamando os operários para a greve e arrancando as em França estava intimamente associada com o movimento
válvulas das caldeiras para assim os encorajar. Os grevistas anarquista que se originou na última parte do século X V III.
prosseguiram para Dukinfield, Ashton, Oldham, Denton e William Godwin, cujo Enquiry Concerning Political Justice apa
Hyde, percorrendo fábricas de algodão e minas de carvão. A 9 receu em 1793, foi um dos primeiros anarquistas, opondo-se a
de Agosto, um cortejo de grevistas de Ashton-under-Lyne toda e qualquer espécie de restrição à liberdade do indivíduo,
entrou em M anchester, tendo sido expulso pela polícia. Na mas defendendo o estabelecimento de uma nova sociedade por
mesma altura, grevistas locais encerraram várias fábricas na cidade. métodos pacíficos e não violentos. Pierre Proudhon, que em 1840
A violência cresceu quando alguns proprietários de fábricas deci inventou o slogan revolucionário «O que é a propriedade? A pro
diram fechar as suas portas e se recusaram a ser intimidados pela priedade é um roubo», também pensava que a sociedade podia
populaça. No dia seguinte, uma grande multidão reunida em ser transformada por meios pacíficos. Todavia, a sua opinião
Manchester obrigou várias fábricas a fechar e atacou uma fábrica de que o homem era por natureza irracional e violento, teve
de gás e uma estação de polícia. As desordens continuaram, mas, subsequentemente uma forte influência nos extremistas tanto da
dois dias depois, com o auxílio de 2500 agentes especiais, a polí esquerda como da direita. Mikhail Bakunin, por outro lado, não
cia e as autoridades militares conseguiram restabelecer a ordem. só pregava a violência mas também punha as suas teorias em
Entretanto, grevistas de Hyde e Ashton-under-Lyne tinham prática. A sua reputação como revolucionário ficou firmada
feito parar fábricas em Glossop, Disley e Stockport, tendo a de após a sua luta nas barricadas de Dresden em 1849, pelo que
Stockport sido atacada e saqueada. A seguir, a inquietação foi preso na Rússia e exilado na Sibéria. Reclamava a ruína com
espalhou-se para sul, para Macclesfield, Congleton, Leek e pleta de «este exausto mundo social que se tornou impotente e
Potteries, e para norte, atingindo muitas cidades algodoeiras estéril». Em 1860, a sua experiência como agitador em Inglaterra,
do Lanchashire, como Bumley, Bolton, Blackbum, Chorley e Itália, e Suíça, convenceram-no de que os camponeses da Rússia,
Preston. No conjunto, as autoridades encontraram pouca dificul da Itália e da Espanha, e os habilidosos relojoeiros domésticos
dade em proteger as fábricas, e na primeira semana de Setembro a do Jura estavam tão maduros para a revolução como o prole
maioria dos grevistas tinha regressado ao trabalho. Os tecelões de tariado industrial de Inglaterra. Ai divergia de M arx, que defendia
M anchester, contudo, não desistiram da luta até 26 de Setembro. que a revolução devia entrar primeiro nas sociedades altamente
Com poucas excepções, não mais se ouviu falar de redução de industrializadas.
salários, e nesse aspecto as revoltas atingiram o seu objectivo. Bakunin ligou-se à Associação Internacional dos Trabalha
dores e depressa se envolveu numa disputa com M arx, o que
ANARQUISTAS E SINDICALISTAS causou o colapso da associação. Enquanto M arx esperava fundar
um partido político disciplinado, que assumiria a autoridade
Nos fins do século X I X , extremistas franceses, como Sorel, quando os Governos existentes caíssem, Bakunin denunciava
Pouget e Paul Louis tentaram dar uma aparência intelectual e o comunismo como a «negação da liberdade» e defendia o esta
filosófica à doutrina da violência industrial. As actividades da belecimento de comunas independentes como base da futura
186 secção «sindicalista» do movimento unionista francês mostraram organização da sociedade. U m movimento anarquista, inspirado
133. A L ag oa de Londres (1906), de André Derain, mostra, simultâneamente, o sentido de
auto-suficiência do homem industrial e a presença de correntes radicais e anárquicas na vida
cultural da Europa.
por ideias de Bakunin, floresceu em Itália durante certo tempo dos trabalhadores em Paris. E m M arço e em Maio de 1909,
na década de 1870, mas o maior sucesso de Bakunin foi em houve greves nacionais de funcionários dos correios e dos telé
Espanha. Aí, o seu discípulo Giuseppe Fanelli organizou um grafos. E m Outubro de 1910, uma greve nos Caminhos-de-Ferro
movimento anarquista que se conservou activo até à guerra do N orte espalhou-se para outras linhas, e Briand, o primeiro-
civil de 1936. E m 1880, o príncipe Kropotkin firmou a sua -ministro, que era socialista, chamou os reservistas. Muitos
posição como filósofo do movimento anarquista. Fora enviado grevistas foram recrutados desta maneira e tiveram de fazer, de
para a prisão, na Rússia, em 1874 por causa das suas actividades uniforme, o trabalho que se tinham recusado a fazer à paisana.
revolucionárias, mas conseguiu fugir e instalou-se em Londres, E m 1914, a acção firme de Governos sucessivos havia lutado contra
onde se dedicou a escrever e à investigação científica. a ameaça do sindicalismo, e o povo francês tinha mostrado cla
Nos começos do século X X , o anarquismo pareceu declinar. ramente que não queria ser dominado à toa por um punhado
Havia actos isolados de terrorismo, mas isso mal podia ser con de fanáticos. ' ~
siderado como movimento político sério. Depois, deu-se uma E m Espanha, existia desde 1870 um movimento anarquista,
renovação do anarquismo — em especial em França — quando inspirado pelas ideias de Bakunin. Apelava para os trabalhadores
revolucionários inspirados pelas ideias de Bakunin, Kropotkin das indústrias de Barcelona e Bilbau, para os mineiros das Astú-
e Sorel, penetraram no movimento dos sindicatos operários e, rias, para os pequenos proprietários e para os trabalhadores
durante certo tempo, o dominaram. Tirando vantagem do des rurais do Sul de Espanha. A insurreição dos operários do papel
contentamento social geral — pois não só operários fabris mas de Alcoy, em 1873, quando as fábricas foram queimadas e o
também funcionários públicos, ferroviários, professores e tra alcaide assassinado, mostrou que a introdução das modernas
balhadores rurais tinham os seus agravos — , os sindicalistas indústrias em Espanha era acompanhada de problemas sociais
aventuraram-se a um programa de «acção directa» que envolvia que os países industriais mais velhos há muito conheciam. Em
sabotagens de máquinas, destruições de produtos fabricados, 1880 e 1890, os anarquistas provocaram conflitos industriais e
e tácticas de atraso, com o objectivo de impedir o rendimento motins de camponeses. Em 1911, fundou-se a Confederación
das fábricas e o movimento regular de transportes e serviços Nacional del Trabajo que, tal como a federação francesa dos
de correio. Deste modo, os sindicalistas — e os seus joguetes — sindicatos, que lhe servira de modelo, foi dominada pelos anar
infligiam o máximo de prejuízos ao público com o mínimo de quistas. Entretanto, as doutrinas anarquistas faziam progresso
inconvenientes para eles próprios. Não era fácil descobrir homens entre os camponeses, em especial na Andaluzia, onde as condições
que punham limalha nas máquinas, arrancavam válvulas de rurais eram excepcionalmente más.
caldeiras ou cortavam fios eléctricos. O anarquismo espalhou-se da Europa para a América do
A última arma dos sindicalistas foi a greve geral, que eles N orte e do Sul. As regiões fabris dos Estados Unidos, onde os
esperavam derrubasse a ordem social existente. E m 1899, vima males sociais associados à primeira industrialização eram tão
comissão da Confédération Générale du Travail declarou que a sérios como tinham sido na Europa, mostraram ser um campo
greve geral era «o único método prático pelo qual a classe tra fértil para as actividades dos anarquistas. Em Chicago, em 1886,
balhadora podia libertar-se completamente do jugo dos capi por exemplo, os anarquistas exploraram as queixas dos grevistas
talistas e do Governo». E m 1906, a propaganda dos sindicalistas das fábricas de máquinas de ceifar McCormick e aí se verificaram
tornara-se tão activa e tão violenta que as autoridades temeram sérios motins com perda de vidas. Na América Central e do Sul,
que as demonstrações de 1 de Maio levassem a uma revolta anarquistas italianos e espanhóis aproveitaram-se quanto puderam
135. A p artid a. U m ca
sal de emigrantes olha
fixamente por sobre as gra
des da popa em T he L ast
o f England (1864-1866),
de Ford Madox Brown.
EMIGRAÇÃO
A EUROPA EM 1914
IJM
1'Tireccndo a p re p o n d e râ n cia da m áq u in a
t . . e p a rtic u la r in cid ên cia
sob re o cam p o in d u strial.
Os sécu los X I X e X X
te ste m u n h a ra m u m a a u tê n tica revo lu ção
que influiu de fo rm a decisiva
nas ideias e na vida
do h o m em c o n te m p o râ n e o .
O p re se n te estu d o ab re u m a luz nova
s o b re 'o s a co n te cim e n to s e os n om es
que e stiv e ra m na o rig e m e na seq u ên cia
d este fen óm en o social
de repercusMjcN ainda im p revisíveis.
Volumes publicados:
R o m a n tism o e R ev o lta
A F o r m a ç ã o da E u ro p a C ris tã
O A n cien R egim e
A E v o lu çã o da R ú ssia
O S écu lo X V
A R ev o lu çã o In d u strial
Próximo volume:
B izân cio e E u ro p a
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