Você está na página 1de 27

Volume 2 Nº 1

Janeiro-Fevereiro-Março de 2022
www.jbmede.com.br
Jornal Brasileiro de Medicina de Emergência

O Jornal Brasileiro de Medicina de Emergência (JBMEDE) inicia a sua história como mais um
marco na consolidação da jovem especialidade de Medicina de Emergência no Brasil e ratifica um dos
pilares da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE) como força motriz e difusora
do conhecimento da especialidade no país. O periódico nasce com periodicidade trimestral, um corpo
editorial fortemente associado à área e revisores comprometidos com a geração e prática baseada nas
melhores evidências científicas. Com orgulho, a ABRAMEDE constrói ações em prol do desenvolvimento
da educação médica permanente, fortalecimento da especialidade e contínua melhoria das práticas
assistenciais

EDITOR -CHEFE EDITOR-ASSOCIADO


Helio Penna Guimarães Vitor Machado Benincá

COMITÊ EDITORIAL:

Antônio Pazin Filho Júlio Cesar Garcia de Alencar


Carlos Henrique Miranda Julio Marchini
Cleverson Rodigues Fernandes Karina Magalhães Alves da Mata Fernandes
Ellen Cristiny Ribeiro Silva Luiz Alexandre Alegretti Borges
Eloisa Bohnenstengel Marcus Vinicius Melo de Andrade
Felipe Piza Maria Cecilia Damasceno
Fernando Uzuelli Ricardo Galesso Cardoso
Frederico Carlos de Sousa Arnaud Ricardo Luiz Cordioli
Giovanna Marques Resende Roseny Rodrigues
Gustavo P. Fraga Suzana Margareth Ajeje Lobo
Henrique Herpich Thiago Domingos Corrêa
João Carlos Santana Thiago Martins Santos
Jorge Michel Ribeira Tiago de Araujo Guerra Grangeia
José Leão de Souza Júnior Uri Adrian Prync Flato
Jule Rouse de Oliveira Gonçalves Santos Welfane Cordeiro Júnior

CONTATO:
Secretaria Executiva ABRAMEDE JBMEDE
Avenida Ipiranga, 40 – Sala 2002 International Standard Serial Number
Porto Alegre – Rio Grande do Sul- Brasil ISSN 2763-776X
secretaria@abramede.com.br
Telefone: +55 51 3094 2777
SUMÁRIO
JBMEDE 2022; 2(1)

Editorial
Mulheres e Medicina de Emergência: uma combinação divina ..................................................... e22001
Eloisa Bohnenstengel

Revisão de Tema
Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de
Emergência: Revisão da Literatura ............................................................................................................ e22002
Lucas Certain

Artigos Originais
Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise
em um serviço de emergência ...............................................................................................................…….. 22003
Mariana Cosmo Marques, Helena Caetano Gonçalves e Silva

Pearls from the Cochrane Library for Emergency Physicians


Ocitocina profilática intravenosa versus intramuscular para reduzir o sangramento no terceiro
período do trabalho de parto: uma Revisão Cochrane ...............................................................…….. 22004
Olufemi T Oladapo, Babasola O Okusanya, Edgardo Abalos, Ioannis D Gallos, Argyro Papadopoulou

Cloroquina ou hidroxicloroquina para prevenção e tratamento da COVID‐19: uma Revisão


Cochrane……....……………………………....................................................................................………………… e22005
Bhagteshwar Singh, Hannah Ryan, Tamara Kredo, Tamara Kredo, Marty Chaplin, Tom Fletcher
JBMEDE 2022;2(1):e22001

Editorial

Mulheres e Medicina de Emergência:


uma combinação divina

Eloisa Bohnenstengel1*
1 Médica do IMEDGROUP
*Autor correspondente. Endereço de e-mail: elo.bohnens@gmail.com

As mulheres estão envolvidas na medicina desde A maioria das coisas que vale a pena fazer exige
os tempos primitivos (Quando me refiro a mulheres, estou muito esforço. Equilíbrio entre vida profissional e pessoal
identificando o arquétipo feminino, não o gênero). requer constante atenção e dedicação. É preciso estabelecer
Muitos deuses míticos dos antigos gregos e prioridades, acionar cadeia de ajuda e contar com apoio dos
romanos foram mulheres. O próprio Esculápio, deus grego amigos e familiares, além de ter foco em suas conquistas.
da medicina perpetuou seu dom através de suas filhas, Reservar tempo para estar com pessoas queridas.
Higéia (preservação da saúde) e Panacéia (cura de todos os Renunciar a um dinheiro extra em plantão para dar atenção
males). Práticos médicos no Egito, China e Índia também a pessoa companheira (ou candidata a). Ter um bom senso
foram mulheres. Numa medicina rudimentar, misturando de humor ajuda bastante, também. Pensar sobre seus
religião, lendas e algum mínimo conhecimento científico, o próprios sonhos, seu propósito, sobre sua saúde. A Medicina
espaço ensejado a nós, mulheres, foi perdendo é belíssima e inebriante, mas ser médica não é tudo.
expressividade. Bem, foram muitas barreiras, fogueiras e E, por que ter tudo? Uma carreira de sucesso na
preconceitos para chegarmos até aqui. Apesar do início medicina dura muitas décadas. Ser mãe, ser filha, realizar
difícil, este cenário vem mudando. Nos últimos 20 anos, seus sonhos, ser boa amiga é para todo sempre. As
dobrou o número de mulheres médicas no Brasil e é responsabilidades de cada função são enormes e as
crescente a presença feminina na carreira médica. Na faixa recompensas são imensuráveis. Sob meu ponto de vista, é
etária mais jovem (até 34 anos), as mulheres já são maioria. uma dádiva poder experimentar as maravilhas de todos os
Em oito anos, as mulheres serão maioria entre todos os papéis a que nos propomos.
médicos e mais de 80% dessas profissionais, em 2030, terão 2. Desigualdades enfrentadas pelas mulheres no
entre 22 e 45 anos. É o que indica estudo que subsidia o departamento de emergência.
Plano Nacional de Fortalecimento das Residências em Pense em um diretor de hospital. Na tua imagem,
Saúde do Ministério da Saúde. era homem ou mulher? Pense num gestor liderando uma
E a carreira de emergencista, que tanto demorou a equipe de alta performance. Você pensou em homem ou
ser entendida, estabelecida e reconhecida, também foi difícil mulher? Pense em um profissional chorando escondido no
para nós mulheres. Afinal, é a primeira especialidade para hospital exausto por ter sido humilhado por um paciente ou
exigir a presença 24 horas de um médico assistente. Nós um chefe inescrupuloso. Esta pessoa fragilizada era uma
sacrificamos nossas vidas pessoais, famílias e nós mesmos mulher ou homem?
ao longo de nossa carreira para garantir cobertura 24 horas/7 Pelos últimos dados disponíveis da Pesquisa
dias por semana, 365 dias ao ano. É uma atividade com Demografia Médica no Brasil 2018, da Faculdade de
altíssima demanda física, emocional, mental. Medicina da USP (FMUSP) com apoio do Conselho Federal
Se por um lado, é uma carreira muito dura, existem de Medicina (CFM) e do Conselho Regional de Medicina do
muitas vantagens sobre ser uma médica emergencista. Estado de São Paulo (Cremesp), embora o público feminino
Nossas habilidades em estabelecer vínculos simbióticos que esteja em crescimento, o salário ainda é menor aos dos
vão além do trabalho e transbordam para a vida pessoal é homens que ocupam as mesmas posições. Temos menores
notável. E quem mais consegue manejar casa, família, probabilidades de sermos promovidas tão rapidamente na
amigos, resolver problemas do trabalho e ainda rir das liderança acadêmica e administrativa.
próprias mazelas? Outrossim, a flexibilidade em mudanças Atualmente, imagine uma mulher concorrendo a um
de cenários, a atenção a pequenos detalhes do paciente, do cargo de liderança ou entrevistando um novo emprego.
ambiente, do familiar, que muitas vezes escapam ao médico Durante suas entrevistas, ela afirma que está tentando
com olhar focado, com seus cones ávidos em precisão. ativamente começar uma família com seu parceiro. Quão
Quero refletir sobre 3 aspectos de uma mulher prejudicial isso é? Enquanto isso, um homem exatamente na
emergencista mesma posição não é visto negativamente. Uma das coisas
1. Equilíbrio vida pessoal e trabalho mais construtivas que um departamento pode fazer para

DOI: 10.54143/jbmede.v2i1.65
2763-776X © 2022 Associação Brasileira de Medicina de Emergencia (ABRAMEDE). This is an Open Acess
article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted
use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original article is properly cited (CC-BY).
Bohnenstengel Mulheres e Medicina de Emergência: uma combinação divina

ajudar todos os funcionários é oferecer políticas de apoio às flexibilidade (lidando com mudanças e gerenciando as
licenças materna e parental. À medida que nossas famílias possibilidades); visão holística (intuindo sobre situações
se tornam mais diversificadas, políticas como essa se tornam baseada em repertório e informações, utilizando suas
ainda mais importantes na criação de igualdade e capacidades sociais de relacionamento); comunicação
oportunidades para todos os membros de um departamento. (posicionando-se de forma franca, utilizando seu tom de voz
Finalmente, o papel da mulher em sua família não termina como arma de persuasão); confiança (liderando pelo
quando uma criança nasce ou deixa de amamentar. Estudos exemplo e inspirando todos ao seu redor).
nos mostram que as mulheres muitas vezes carregam muito Imbuída desta paixão e força de vontade, agradeço
mais do que 50% da carga de cuidado/corrente doméstica. por fazer parte da diretoria da ABRAMEDE, que confia a mim
Embora isso possa ter funcionado na década de 1950, não e a mais 3 mulheres em cargos de liderança, a
funciona para a médica moderna e continua a distorcer as responsabilidade de fazer a diferença.
regras do jogo. Sem reconhecimento e tentativa de
mitigação disso, as médicas estão continuamente em
desvantagem. Acrescento, que a desigualdade nem sempre
está relacionada a maternidade. Ás vezes é puro preconceito
mesmo.
Lutar por políticas inclusivas nos hospitais e preferir
trabalhar em locais que tenham este tipo de respeito, não
apenas as mulheres, mas a diversas outras condições que
causam preconceito parece um bom começo para
começarmos a mudar este cenário.
3. O pedregoso caminho da gestão
Certamente você já deve ter ouvido a frase: “não
nasci pra liderança”. Realmente, não é uma característica
inata, afinal, tudo pode ser aprendido. Habitualmente faço
uma pergunta para meus pupilos e mentorados: se todos os
médicos da escala fosse clones teus, o plantão seria melhor?
Os pacientes seriam melhor cuidados? Se a resposta for sim,
é possível que o teu caminho seja, sim, pela gestão.
Sabemos que uma das habilidades almejadas para o
emergencista é a liderança, não exercida por ocupar um
cargo, mas atuando de fato num papel de olhar sistêmico
sobre tudo o que está acontecendo simultaneamente num
departamento de emergência, estabelecendo prioridades,
otimizando recursos, mesmo em situações de crise.
E, dentro das desigualdades enfrentadas pelas
mulheres que já comentei, seguimos tirando as pedras do
caminho.
E como se desenha o pipeline da liderança?
Primeiramente entendo que é necessário um envolvimento
em tudo que envolve gestão, a busca por oportunidades.
Uma constante inquietação em perguntar-se como melhorar
cada processo.
Em segundo lugar, a capacitação. O médico, tendo
exercido seu papel assistencial, detendo o conhecimento de
um gestor, consegue aliar e alinhar os dois horizontes e criar
soluções com muito mais segurança ao paciente e a
assistência. Em terceiro lugar, tendo inspiração em líderes
que não apenas deem o exemplo, mas também possam
apoiá-lo em seus sonhos e dificuldades.
Entendo que é hora de mudar esse cenário de
desvalorização da mulher e ver cada vez mais mulheres
dando sua importante contribuição para a defesa dos
interesses da Medicina de Emergência, dos médicos, dos
pacientes e da população.
Assim poderão influenciar com suas melhores
características: a sensibilidade (com o poder de escuta e
observação empática, exercendo seu caráter solidário);

2 JBMEDE 2022;2(1):e22001
JBMEDE 2022;2(1):e22002

Revisão de Tema

Contraindicações e complicações do uso da ventilação não


invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

Lucas Certain1*
¹ Médico do SAMU 192 Regional Bragança, São Paulo, Brazil.
* Autor correspondente. Endereço de e-mail: lucas_certain@hotmail.com

RESUMO
Introdução: A VNI consiste em se pressurizar as vias aéreas com o uso de uma interface paciente-
ventilador externa. Compreendendo que a VNI é uma importante estratégia de suporte ventilatório, torna-
se relevante identificar possíveis contraindicações e complicações dessa técnica. Método: Foram
considerados artigos científicos publicados nos últimos 10 anos, utilizando fontes nacionais e
internacionais, com a seguinte estratégia de busca: (NIV OR non-invasive OR noninvasive OR artificial)
AND (ventilation OR respiration OR breathing) AND positive AND pressure AND emergency AND
(contraindication OR complication), em inglês e português. Resultados: Foram identificados 22 artigos
que responderam à estratégia de busca. Destes, 13 foram eliminados, restando 9 artigos para revisão.
Conclusões: A VNI pode levar a um colapso do sistema cardiovascular quando não realizada
adequadamente. Pacientes com estado mental alterado são considerados contraindicação à VNI, e
recomenda-se que esta não seja realizada em pacientes com Escala de Coma de Glasgow inferior a
10,34. Outros problemas relacionados à VNI são redução da salivação, escape de ar, falta de sincronia
entre o paciente e o aparelho de ventilação artificial, formação de úlceras por pressão relacionadas à
própria interface respiratória, além de distensão e desconforto gástrico.

Palavras-chave: Emergência; Ventilação Não-Invasiva; VNI; Complicações; Contraindicações.

Introdução divulgada, principalmente com a utilização para os


portadores de síndrome da apneia obstrutiva do sono.
A partir de meados da década de 2010, a VNI passou
Muitos pacientes se apresentam no
a ser utilizada no atendimento de vítimas em
Departamento de Emergência (DE) com desconforto
sofrimento respiratório nos cenários pré-hospitalar,
respiratório ou insuficiência respiratória, seja aguda
home care, sala de emergência, enfermaria e
ou crônica agudizada. Para auxílio desses doentes,
unidades de terapia intermediária e intensiva².
existem duas estratégias de suporte ventilatório,
Na sala de emergência, a VNI ainda
sendo que ambas, atualmente, utilizam pressão
é pouco empregada, porém o manejo adequado das
positiva nas vias aéreas. A diferença básica está na
vias aéreas e o conhecimento em terapia respiratória
invasibilidade ou não da traqueia, isto é, se é
são pilares do atendimento de médicos
colocada uma cânula com ou sem cuff além da
emergencistas. A prevalência de pacientes que
abertura da via aérea inferior do paciente1,2.
poderiam se beneficiar dessa técnica no DE é alta,
A Ventilação Não Invasiva (VNI)
entretanto, a falta de familiaridade, de treinamento, de
começou a ser utilizada na história da Medicina no
conhecimento e de equipamentos são os principais
século passado, entre os anos de 1930 a 1950,
fatores para a não utilização do método³.
mediante surto de poliomielite da época. Inicialmente
A VNI consiste em se pressurizar as
empregada como pressão negativa, os chamados
vias aéreas com o uso de uma interface paciente-
pulmões de aço, a técnica foi sendo aprimorada, até
ventilador externa, podendo-se aplicar um ou dois
que nos anos 1980, a VNI passou a ser mais

DOI: 10.54143/jbmede.v2i1.66
2763-776X © 2022 Associação Brasileira de Medicina de Emergencia (ABRAMEDE). This is an Open Acess
article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted
use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original article is properly cited (CC-BY).
Certain Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

níveis pressóricos. Quando se utiliza dois níveis de ventilação invasiva. Neste cenário, estão agrupadas a
pressão, temos um nível de suporte na inspiração asma, a síndrome do desconforto respiratório agudo,
(IPAP – inspiratory positive airways pressure) e outro a pneumonia adquirida na comunidade, a falência
ao final da expiração (EPAP ou PEEP – expiratory respiratória pós extubação, o desmame ventilatório,
positive airways pressure). Quando se utiliza apenas os doentes sem indicação de intubação (paliativos),
um nível de pressão, é fornecida apenas a EPAP ou as bronquiectasias, a fibrose cística, as doenças
PEEP. Além de suporte pressórico, variadas frações intersticiais e as restritivas pulmonares1,2,4,5,7.
inspiradas de oxigênio (FiO2) são oferecidas para se Compreendendo que a VNI é uma
adequar a saturação arterial de oxigênio acima de importante estratégia de suporte ventilatório que deve
92%1,2. ser aprendida e difundida entre os médicos que
A escolha da interface é primordial para o seu atendem pacientes críticos no Departamento de
funcionamento, sendo que devem ser considerados o Emergência, torna-se relevante identificar possíveis
formato do rosto, o conforto do paciente e o tempo de contraindicações e complicações dessa técnica, pois
utilização do dispositivo. As interfaces disponíveis são assim será possível, por meio de evidências
a nasal, a oronasal, a total, além de peças bucais e científicas, orientar de forma mais assertiva a prática
capacetes, sendo a máscara oronasal a primeira médica.
escolha e mais comumente utilizada1, 2, 5. Este estudo tem como objetivo realizar uma
As indicações para o uso da VNI são revisão da literatura especializada, buscando
baseadas em critérios clínicos e laboratoriais, como a selecionar trabalhos nacionais e internacionais que
deterioração das trocas gasosas com saturação de abordem as contraindicações e complicações da VNI
oxigênio menor que 92%, a falência da bomba no Departamento de Emergência
respiratória com hipercapnia e acidose respiratória, a
dispneia com uso de musculatura acessória ou Método
respiração paradoxal, e a taquipneia com frequências
acima de 24 incursões por minuto1, 2, 4.
Trata-se de uma revisão narrativa de
Uma série de trabalhos demonstrou
literatura incluindo publicações científicas em
os benefícios do uso da VNI. Em termos de
periódicos. Foram considerados os artigos científicos
vantagens fisiopatológicas, destacam-se a abertura
publicados nos últimos 10 anos, compreendendo o
das vias aéreas e de alvéolos com redução de
período de 2010 a 2020, nos idiomas português e
atelectasias, a diminuição do esforço respiratório, a
inglês, utilizando como fontes de pesquisa as bases
melhora das trocas gasosas com correção da
de dados: Medical Literature Analysis and Retrieval
hipoxemia e da hipercapnia, a redução do auto-
System Online (PUBMED / MEDLINE), Literatura
PEEP, a melhora da complacência pulmonar, e a
Latinoamericana e do Caribe em Ciências da Saúde
redução da pré e pós carga do ventrículo esquerdo.
(LILACS) e biblioteca digital Scientific Eletronic
Esses mecanismos proporcionam efeitos diretos na
Library Online (SciELO).
redução de internações e custos hospitalares,
As estratégias de busca utilizadas
menores índices de infecções nosocomias, de lesões
foram as seguintes: (NIV OR non-invasive OR
de estruturas da via aérea, de necessidade de
noninvasive OR artificial) AND (ventilation OR
intubação orotraqueal, e principalmente, redução de
respiration OR breathing) AND positive AND pressure
mortalidade1,2,4,5,6.
AND emergency AND (contraindication OR
Edema agudo de pulmão
complication), em inglês, e (não-invasiva OR “não
cardiogênico, doença pulmonar obstrutiva crônica
invasiva” OR artificial) AND (ventilação OR
(DPOC) exacerbada e pacientes imunossuprimidos
respiração) AND pressão AND positiva AND
que se apresentam com dispneia e hipoxemia são as
emergência AND (contra-indicação OR
situações que mais se beneficiam do uso da VNI.
contraindicação OR complicação). Vale ressaltar que
Essas etiologias demonstraram em estudos uma
estes termos foram testados a priori na plataforma
redução da necessidade de intubação orotraqueal
Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), para os
(46-56% no edema agudo de pulmão cardiogênico e
termos em português, e no Medical Subject Headings
60% no DPOC exacerbado) e de mortalidade (36%
(MeSH), para os termos em inglês.
no edema agudo de pulmão cardiogênico e 50% no
Após identificar os artigos científicos
DPOC exacerbado)1,2,4,5,6,7. Outras situações ainda
nas bases de dados mencionadas, foram avaliados
estão sendo pesquisadas, sendo que a VNI pode ter
os títulos e resumos dos trabalhos, de modo a
um papel desde que não postergue a indicação de

2 JBMEDE 2022;2(1):e22002
Certain Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

selecionar os artigos que farão parte da amostra. Em gástrica. A conclusão dos autores foi que, se uma
seguida, os artigos que atenderem ao objetivo do inspeção radiográfica prévia do tórax tivesse sido
estudo foram inseridos em biblioteca eletrônica e realizada, a VNI não teria sido iniciada.
resumidos, incluindo seus autores, objetivos, Segundo Bein, Francksen e Steinfath (2011) 9,
características metodológicas, resultados e os dispositivos supraglóticos utilizados em vias
conclusões. aéreas, em contraste com os dispositivos de primeira
geração, como o LMA “clássico” e o tubo de laringe,
Resultados ofereciam um tubo de drenagem esofágico e / ou uma
pressão de vazamento orofaríngea aprimorada
durante a ventilação com pressão positiva, incluindo
A busca pelos artigos ocorreu no dia 27 de
as versões descartáveis desses dispositivos. Porém,
fevereiro de 2020. Após a utilização da estratégia em
os autores ressaltaram que, embora a falta de
inglês na base de dados PUBMED / MEDLINE, foram
proteção contra a aspiração ainda fosse considerada
identificados 22 artigos que responderam à estratégia
uma grande limitação, o valor terapêutico dos
de busca. Destes, 13 foram eliminados por destoarem
dispositivos de vias aéreas com um tubo de
significativamente do foco central do trabalho, e não
drenagem esofágico permanecia, naquela época,
discutirem as complicações e contraindicações
como padrão-ouro na realização de VNI com pressão
associadas à VNI. Após a busca na Scielo e na
positiva.
Lilacs, apenas um mesmo artigo foi identificado em
Segundo Oto, Imanaka e Nishimura (2011)10,
ambas as bases. Porém, o trabalho não foi incluído
a falta de umidade na cavidade da boca se mostra
na amostra visto que sua versão em inglês já havia
como uma complicação comum durante a VNI. Sendo
sido recuperada na busca anterior. Sendo assim, esta
assim, os autores mensuraram o que chamaram de
revisão contou com 9 artigos, que são apresentados
“secura oral” dos pacientes, e realizaram um estudo
na seção a seguir em ordem cronológica de
experimental para investigar fatores relacionados à
publicação.
umidificação durante a VNI. No estudo, os pacientes
foram divididos aleatoriamente em 2 grupos:
Discussão configurações média (grupo Med) e máxima (grupo
Max) do umidificador aquecido (HH). A umidade oral
Siddiqui et al. (2010)8, descreveram o caso de foi avaliada com a utilização de um dispositivo de
uma mulher fumante de 70 anos de idade, com verificação de umidade oral, e a sensação de secura
doença pulmonar obstrutiva crônica conhecida, oral foi avaliada com uma escala de classificação
recebida no setor de emergência com dificuldades numérica de 0 a 10 (NRS) às 0, 12 e 24 horas desde
respiratórias. A gasometria arterial mostrou o início da VNI, e às 12 e 24 horas após a suspensão
insuficiência respiratória com prenunciada acidose. da VNI. Experimentos foram realizado para avaliar os
Foi iniciada Ventilação Não-Invasiva (VNI) e, após 2 efeitos da pressão expiratória final positiva (PEEP),
horas, a paciente sofreu parada cardíaca. Foram da fração de oxigênio inspirado (F (I) O (2)) e do
realizados quatro minutos de ressuscitação vazamento de ar na umidade absoluta. Foram
cardiopulmonar antes do retorno da circulação avaliadas três configurações de HH: sem HH, HH na
espontânea. A radiografia de tórax mostrou uma configuração média e HH na configuração máxima. A
massa grande e repleta de ar, ocupando a maior temperatura na câmara de saída foi de 31°C a 32°C
parte do hemitórax esquerdo. Imagens transversais para o ajuste médio de HH e 38°C a 41°C para o
posteriores confirmaram um grande defeito ajuste máximo de HH. No estudo clínico, 12 pacientes
diafragmático com hérnia de todo o estômago e cólon foram designados para o grupo Med e 11 para o
no tórax. A paciente foi ventilada durante a noite na grupo Max. Como resultados, no grupo Med, a
unidade de terapia intensiva, e o estômago foi umidade oral diminuiu e o NRS aumentou
descomprimido com uma sonda nasogástrica. A significativamente em 12 e 24 horas em comparação
hipótese dos autores sugeriu que a ventilação com com a avaliação basal. No grupo Max, nem a
pressão positiva hiperinflou o estômago, aumentou a umidade oral nem o NRS mudaram ao longo do
pressão intratorácica e reduziu o enchimento período do estudo, enquanto no estudo de bancada,
ventricular, levando ao colapso cardiorrespiratório. elevado F (I) O (2), elevado PEEP e escape de ar
Ainda, a ressuscitação cardiopulmonar pode ter diminuíram a umidade absoluta para as duas
comprimido o estômago, melhorando o débito configurações de HH. Porém, os autores afirmaram
cardíaco, mas aumentando o risco de ruptura que não está claro até que ponto esses fatores

3 JBMEDE 2022;2(1):e22002
Certain Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

afetaram a secura oral dos pacientes porque as faixas VNI, como demonstrado por uma taxa de sobrevida
de F (I) O (2) e PEEP eram estreitas. Por fim, de 83%. Por fim, afirmaram que o resultado positivo
concluíram que a secura oral era um problema foi confirmado por uma observação subsequente de
comum nos pacientes avaliados, e que a três anos, que demonstrou uma taxa de sobrevida
configuração HH afetou significativamente a global de 54%, e que esses achados sugeriam
umidificação e a secura oral durante a VNI. claramente o tratamento com VNI de pacientes idosos
Passarini et al. (2012)11, conduziram um mesmo na presença de uma ordem de não intubar.
estudo que analisou a insuficiência respiratória aguda Suzuki e Takasaki (2014)13, iniciaram o artigo
causada por edema agudo de pulmão, bem como a afirmando que a atelectasia pós-operatória deve ser
exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica, evitada em pacientes cirúrgicos com função pulmonar
tratada com VNI, para identificar os fatores comprometida. Segundo os autores, a terapia de alto
associados ao sucesso ou falha desse procedimento fluxo nasal (NHF) é capaz de fornecer oxigênio
em urgência e emergência. No estudo foram incluídos aquecido e umidificado por uma cânula nasal. Com
pacientes de ambos os sexos, com idades maiores do base nestas informações, descreveram o caso de um
que 18 anos, que utilizavam VNI devido à homem de 67 anos de idade com perfuração do
insuficiência respiratória aguda secundária ao edema aparelho digestivo superior, que foi submetido a uma
pulmonar agudo ou exacerbação crônica da doença cirurgia laparoscópica de emergência. A cirurgia
pulmonar obstrutiva. Os autores utilizaram pressões proposta foi concluída sem intercorrências. Porém, no
expiratórias entre 5 e 8 cmH2O, e pressões pós-operatório, o paciente apresentou atelectasia
inspiratórias entre 10 e 12 cmH2O. Um total de 152 maciça do lobo inferior esquerdo com dessaturação
pacientes foram incluídos no estudo, e os resultados para níveis abaixo de 90%. Após a restauração da
demonstraram que o tempo médio de VNI foi de 6 oxigenação normal por sucção traqueal e drenagem
horas (intervalo de 1 a 32 horas) para pacientes com postural, foi realizada VNI com pressão positiva
doença pulmonar obstrutiva crônica (n = 60) e 5 horas contínua nas vias aéreas (CPAP) de 8 cm H2O, para
(intervalo de 2 a 32 horas) para pacientes com edema evitar atelectasias repetidas. Quinze horas após a
agudo de pulmão (n = 92). A maioria dos pacientes cessação da VNI, o paciente desenvolveu recorrência
progrediu com sucesso, no entanto, foram de atelectasias maciças. A sucção broncoscópica
observados escores reduzidos do APACHE II e removeu uma placa mucosa da árvore
menor saturação periférica de oxigênio. Com base traqueobrônquica e a terapia com NHF a 40 L / min
nestes e em outros resultados, os autores afirmaram foi realizada posteriormente, fornecendo um baixo
que a VNI pode ser utilizada em serviços de nível de CPAP, ao invés da VNI. A conclusão dos
emergência em casos de insuficiência respiratória autores foi que o suporte respiratório com a terapia
aguda causada por edema agudo de pulmão, e com NHF estabilizou melhor o paciente do que a VNI,
exacerbação de doença pulmonar obstrutiva crônica, fazendo com que a sua reabilitação respiratória
mas pacientes com variáveis relacionadas a uma continuasse sem intercorrências. Além disso, a
porcentagem maior de intubação endotraqueal devem terapia com NHF forneceu gás umidificado ideal, o
ser monitorados especialmente. que melhorou a qualidade da secreção brônquica, em
Em seu estudo, Riario-Sforza e comparação à VNI.
colaboradores (2012)12 afirmaram que a eficácia da Mosier et al. (2015)14, buscaram avaliar as
VNI no tratamento de pacientes com insuficiência chances de uma complicação após falha na VNI em
respiratória aguda (IRA) já havia sido demonstrada comparação com pacientes intubados principalmente
por sua capacidade de diminuir a recorrência à na UTI. Tratou-se de um estudo de centro único que
intubação endotraqueal (ETI), a ocorrência de incluiu 235 pacientes, sendo 125 pacientes intubados
infecções pulmonares associadas à ETI e a após falha na VNI, contra 110 pacientes intubados
mortalidade relacionada. Todavia, os autores citaram sem VNI. Os dados relacionados à intubação foram
uma questão específica relacionada ao resultado da coletados prospectivamente por meio de um
VNI em pacientes encaminhados ao Departamento de programa de melhoria contínua da qualidade (CQI), e
Emergência devido à IRA que recebem uma ordem extraídos retrospectivamente do prontuário médico de
de não intubar (DNI) devido a condições muito críticas todos os pacientes intubados. Foi utilizado um ajuste
ou idade avançada. Segundo os pesquisadores, de propensão para os fatores que afetariam a decisão
dados recentes à época haviam demonstrado que de usar inicialmente a VNI, e a análise de regressão
pacientes idosos (idade média de 81 anos) com IRA multivariada ajustada foi realizada para avaliar as
sob DNI poderiam ser tratados com sucesso pela chances de uma complicação composta

4 JBMEDE 2022;2(1):e22002
Certain Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

(dessaturação, hipotensão ou aspiração) com (alimentação artificial, se necessário) e


intubação após falha na VNI em comparação com a condicionamento de gás medicinal. Apesar desses
intubação primária. Como resultados, uma análise de problemas, o escape de ar representa a maior
regressão multivariada ajustada à propensão revelou ameaça durante o apoio à VNI. De fato, para que se
que as chances de uma complicação composta de possa obter um resultado positivo, o gerenciamento
intubação em pacientes que falham na VNI foram da “solução de problemas da VNI” parece ser crucial.
duas vezes maiores quando corrigidas pela presença Problemas comuns como o escape de ar, assincronia
de pneumonia ou síndrome do desconforto paciente-ventilador, úlceras por pressão relacionadas
respiratório agudo, e ajustadas para fatores à interface, desconforto e distensão gástrica devem
conhecidos por aumentar as complicações da ser prontamente detectados e solucionados. A análise
intubação (total de tentativas e experiência do desses problemas revela uma falta de prática
operador). Quando ocorreu uma complicação baseada em evidências, resultando em intervenções
composta, as chances de morte não ajustadas na UTI clínicas ao lado do leito baseadas apenas no
foram de quase duas vezes mais com a VNI. Em consenso de especialistas ou nas opiniões locais.
conclusão, após o controle de possíveis fatores de Dessa forma, para melhorar essa lacuna de
confusão, os autores afirmaram que a análise por conhecimento, os autores recomendam a realização
eles realizada, ajustada à propensão, demonstra uma de ensaios clínicos randomizados controlados e
chance maior de uma complicação composta com multicêntricos para que se possa obter conhecimento
intubação após falha na VNI. Além disso, a presença adequado para alcançar o melhor resultado do
de uma complicação composta durante a intubação paciente sob VNI.
está associada a um aumento da chance de morte na
UTI. Conclusão
Para Allison e Winters (2016)15, a VNI
melhora a oxigenação e a ventilação, evita a Foi possível identificar que a VNI com
intubação endotraqueal e diminui a taxa de pressão positiva pode insuflar o estômago, aumentar
mortalidade em pacientes selecionados com a pressão interna e reduzir o enchimento ventricular,
insuficiência respiratória aguda. Porém, embora a VNI que podem em conjunto levar a um colapso do
seja comumente utilizada para exacerbações agudas sistema cardiovascular. Sendo assim, uma inspeção
de doença pulmonar obstrutiva crônica e edema radiográfica prévia do tórax é importante para tomada
pulmonar cardiogênico agudo, existem da decisão de implantar ou não a VNI. A secura oral
contraindicações emergentes para seu uso no foi citada como um problema comum dos indivíduos
departamento de emergência. Por exemplo, o estado submetidos à VNI, que por sua vez pode ser resolvida
mental alterado é frequentemente mencionado como por meio da terapia de alto fluxo nasal, que fornece
uma contraindicação absoluta ou relativa à VNI. gás umidificado, e melhora a qualidade da secreção
Recomenda-se que a VNI não seja utilizada usada brônquica, quando comparada à VNI. Pacientes que
em pacientes com uma pontuação na Escala de apresentem variáveis que se relacionem a uma maior
Coma de Glasgow inferior a 10,34. chance de necessidade de intubação endotraqueal
Bambi e colaboradores (2017)16, relataram precisam de monitoração especial.
que a VNI se trata de uma técnica de suporte Comentou-se que a terapia de alto fluxo nasal
respiratório bem reconhecida para pacientes afetados é capaz de estabilizar os pacientes de forma mais
por insuficiência respiratória aguda (IRA). Porém, efetiva do que a VNI, permitindo reabilitar a função
deve-se manter uma forte adesão aos protocolos que respiratória sem maiores complicações, embora
definem os critérios de seleção dos pacientes, apresente maiores chances de complicação quando é
contraindicações relativas ou absolutas, além de realizada após uma falha da VNI, aumento a
operadores altamente qualificados e experientes, mortalidade dos pacientes em UTI.
visto que todos esses fatores podem afetar o Foi verificado que pacientes com estado
desempenho da VNI, incluindo as taxas de mental alterado são considerados contraindicação
mortalidade. Para os autores, o resultado positivo do absoluta ou relativa à VNI. Ainda, é recomendado que
suporte respiratório da VNI depende da condição esta não seja realizada em pacientes com Escala de
clínica do paciente, confiança dos funcionários com a Coma de Glasgow inferior a 10,34. Outros problemas
tecnologia NIV, escolha e gerenciamento da interface relacionados à VNI são o escape de ar, falta de
mais adequada disponível, prevenção de sincronia entre o paciente e o aparelho de ventilação
complicações nessa interface, avaliação nutricional artificial, formação de úlceras por pressão

5 JBMEDE 2022;2(1):e22002
Certain Contraindicações e complicações do uso da ventilação não invasiva no Departamento de Emergência: Revisão da Literatura

relacionadas à própria interface respiratória, além de 10. OTO, J.; IMANAKA, H.; NISHIMURA, M.
distensão e desconforto gástrico. Clinical factors affecting inspired gas
Por fim, buscando preencher algumas falhas humidification and oral dryness during
em relação à VNI, sugere-se a realização de novos noninvasive ventilation. Journal of Critical
estudos, multicêntricos e controlados, no intuito de se Care, v. 26, n. 5, p. 535.e9-535.e15, 2011.
obter conhecimento adequado sobre a terapia VNI, 11. PASSARINI, J. N. DE S. et al. Use of non-
suas indicações e contraindicações, no sentido de se invasive ventilation in acute pulmonary edema
obter os melhores resultados para o paciente. and chronic obstructive pulmonary disease
exacerbation in emergency medicine:
Referências predictors of failure. Revista Brasileira De
Terapia Intensiva, v. 24, n. 3, p. 278–283,
2012.
1. CARVALHO, C. R. R. DE; TOUFEN JUNIOR,
12. RIARIO-SFORZA, G. G. et al. Role of
C.; FRANCA, S. A. Ventilação mecânica:
noninvasive ventilation in elderly patients with
princípios, análise gráfica e modalidades
hypercapnic respiratory failure. La Clinica
ventilatórias. Jornal Brasileiro de
Terapeutica, v. 163, n. 1, p. e47-52, 2012.
Pneumologia, v. 33, n. suppl 2, p. 54–70,
13. SUZUKI, Y.; TAKASAKI, Y. Respiratory
2007.
support with nasal high-flow therapy helps to
2. FERREIRA, S. et al. Ventilação não invasiva.
prevent recurrence of postoperative
Revista Portuguesa de Pneumologia, v. 15, n.
atelectasis: a case report. Journal of Intensive
4, p. 655–667, 2009.
Care, v. 2, n. 1, p. 3, 2014.
3. MORTARI, D. M. et al. Prevalência de
14. MOSIER, J. M. et al. Failed noninvasive
pacientes com indicação para uso de
positive-pressure ventilation is associated
ventilação mecânica não-invasiva em uma
with an increased risk of intubation-related
unidade de emergência. Revista da
complications. Annals of Intensive Care, v. 5,
Faculdade de Ciências Médicas de Sorocaba,
p. 4, 2015.
v. 12, n. 1, p. 13–16, 2010.
15. ALLISON, M. G.; WINTERS, M. E.
4. CRUZ, M. R.; ZAMORA, V. E. C. Ventilação
Noninvasive Ventilation for the Emergency
mecânica não invasiva. Brazilian Journal of
Physician. Emergency Medicine Clinics of
Health and Biomedical Sciences, v. 12, n. 76,
North America, v. 34, n. 1, p. 51–62, 2016.
p. 92–101, 2013.
16. BAMBI, S. et al. Noninvasive ventilation: open
5. SCHETTINO, G. P. P. et al. Ventilação
issues for nursing research. Acta Bio-Medica:
mecânica não invasiva com pressão positiva.
Atenei Parmensis, v. 88, n. 1S, p. 32–39,
Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 33, n. 2,
2017.
p. 92–105, 2007.
6. RAHAL, L.; GARRIDO, A. G.; CRUZ JR, R. J.
Ventilação não-invasiva: quando utilizar? Informações sobre o Artigo
Revista da Associação Médica Brasileira, v.
51, n. 5, p. 245–246, 2005. Recebido: 21/02/2022
7. BARBAS, C. S. V. et al. Recomendações Aceito: 29/03/2022
brasileiras de ventilação mecânica 2013. Conflitos de interesse: nenhum.
Parte I. Revista Brasileira de Terapia Agências financiadoras: nenhuma.
Intensiva, v. 26, n. 2, p. 89–121, 2014.
8. SIDDIQUI, F. M. et al. An unusual
contraindication to the use of non-invasive
ventilation in A&E. Emergency medicine
journal: EMJ, v. 27, n. 8, p. 615, 2010.
9. BEIN, B.; FRANCKSEN, H.; STEINFATH, M.
Supraglottic airway devices. Anasthesiologie,
Intensivmedizin, Notfallmedizin,
Schmerztherapie: AINS, v. 46, n. 9, p. 598–
607, 2011.

6 JBMEDE 2022;2(1):e22002
JBMEDE 2022;2(1):e22003

Artigo Original

Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto


agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

Mariana Cosmo Marques1*, Helena Caetano Gonçalves e Silva2


1 Acadêmica do curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Tubarão, Santa Catarina, Brasil.
2 Docente do curso de Medicina, Doutora em Ciências da Saúde, Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL),
Tubarão, Santa Catarina, Brasil.
*Autor correspondente. Endereço de e-mail: mariana_cosmo@hotmail.com

RESUMO
Introdução: A hiperglicemia no infarto agudo do miocárdio (IAM) está relacionada a maiores taxas de
mortalidade e complicações intra-hospitalares. Ocorre em pacientes com diagnóstico de diabetes mellitus
(DM) e em pacientes com hiperglicemia de estresse (HE), que é a elevação transitória da glicemia em
situações agudas em indivíduos não diabéticos. Objetivo: Determinar a prevalência de DM e HE no IAM e
suas características em um serviço de emergência no sul de Santa Catariana. Metodologia: Estudo de
delineamento transversal. Dados coletados de prontuários eletrônicos de pacientes admitidos pelo Sistema
Único de Saúde por primeiro episódio de IAM no Hospital Nossa Senhora da Conceição, de 2018 a 2020.
Foram excluídos prontuários que não apresentavam registro de glicemia na admissão hospitalar.
Resultados: Foram analisados 132 prontuários. As comorbidades mais frequentes foram: HAS (62,9%),
tabagismo (36,4%) e DM (30,3%). A prevalência da hiperglicemia hospitalar foi de 40,1% e a da HE 19,7%.
A mortalidade de pacientes com hiperglicemia hospitalar foi de 20,8% e com HE de 23,1%. A associação
entre mortalidade intra-hospitalar e hiperglicemia hospitalar (p=0,021) foi estatisticamente significativo. A
prevalência de complicações foi estatisticamente maior entre indivíduos com DM, HE e hiperglicemia.
Conclusão: A hiperglicemia atinge grande parte dos indivíduos com IAM tanto em pacientes diabéticos,
como em pacientes não diabéticos. Ela se apresenta como importante preditor de morbimortalidade em
pacientes.

Palavras-chave: Hiperglicemia. Estresse Fisiológico. Diabetes Mellitus.

Introdução principal diagnóstico diferencial de DM em pacientes


internados, sendo recomendada a dosagem da
hemoglobina glicada (A1C) durante a internação
O diabetes mellitus é um distúrbio metabólico
hospitalar para a investigação4,5.
determinado por hiperglicemia persistente, devido a
O infarto agudo do miocárdio (IAM) é definido
defeitos na secreção ou na ação do hormônio insulina,
como um evento isquêmico abrupto, gerado por uma
ou esses mecanismos de modo concomitante 1. A
desproporção entre a oferta e a demanda de nutrientes
hiperglicemia persistente está relacionada com
ao tecido cardíaco, decorrente da obstrução do fluxo
complicações microvasculares, que agregam
coronariano, podendo ser total ou parcial. Essa
retinopatia, neuropatia e nefropatia, e com
obstrução é causada por trombose e/ou vasoespasmo
complicações macrovasculares, que incluem doenças
sobre uma placa aterosclerótica. Os processos
cardiovasculares e cerebrovasculares2. A
desencadeantes do processo de aterosclerose que
hiperglicemia de estresse (HE) consiste na elevação
provocam o surgimento e a evolução do IAM estão
de caráter transitório da glicemia em situações agudas,
relacionados ao estilo de vida, a dieta, aos hábitos
sendo atribuída ao estímulo adrenérgico gerado pelo
diários, ao biotipo e aos fatores crônicos dos
estresse1,3,4. A HE é estabelecida como glicemia ≥ 140
indivíduos. Deste modo, essa coronariopatia pode
mg/dL sem evidência prévia de diabetes mellitus;

DOI: 10.54143/jbmede.v2i1.31
2763-776X © 2022 Associação Brasileira de Medicina de Emergencia (ABRAMEDE). This is an Open Acess
article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted
use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original article is properly cited (CC-BY).
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

trazer como consequência a emergência de outros cenário da saúde, quanto a incidência e


agravos à saúde, como a insuficiência cardíaca morbimortalidade, e da considerável prevalência de
congestiva, ou até mesmo levar ao óbito, pela redução hiperglicemia na admissão hospitalar. O presente
prolongada na perfusão do músculo cardíaco6. estudo visa determinar a prevalência do diabetes e da
O diabetes mellitus pode trazer complicações hiperglicemia de estresse no IAM em pacientes
macrovasculares ateroscleróticas aos indivíduos. A atendidos em um hospital do sul de Santa Catarina e
aterosclerose é uma doença progressiva marcada pelo analisar sua relação com mortalidade e suas
depósito de colesterol e lipídios na parede íntima das características através da seguinte pergunta de
artérias. Esse depósito pode ser induzido e/ou pesquisa: Qual a prevalência do diabetes e da
potencializado pelo DM. A hiperglicemia favorece, hiperglicemia de estresse no IAM em pacientes
coadjuvante a outros fatores de risco cardiovascular, a atendidos em um hospital do sul de Santa Catarina e
inflamação na camada íntima da artéria coronariana quais as suas implicações prognósticas destes
que sucede em espessamento dessa camada e um achados na evolução clínica desses pacientes?
ciclo de inflamação local e apoptose, resultando em
lesão endotelial progressiva e formação de placas Métodos
ateromatosas. Esse processo associado à reatividade
plaquetária anormal e deposição de fibrina, presentes
A presente pesquisa tem delineamento
no indivíduo diabético, predispõe ao estreitamento
transversal. Foram estudados prontuários eletrônicos
luminal e ruptura da placa com trombose, evento que
de pacientes admitidos pelo Sistema Único de Saúde
pode obstruir o fluxo sanguíneo coronariano,
(SUS) por primeiro episódio de infarto agudo do
característico do IAM. A resistência à insulina,
miocárdio no Hospital Nossa Senhora da Conceição
presente na DM, acelera ainda mais esse processo, ao
(HNSC), localizado na cidade de Tubarão-SC, no
contribuir para o desenvolvimento e progressão da
período de 2018 a 2020.
hipertensão arterial sistêmica7.
O estudo teve como critério de inclusão
De acordo com o relatório do “World Health
prontuários eletrônicos de pacientes que deram
Statistics 2019”, as doenças não transmissíveis, entre
entrada no HNSC pelo SUS com primeiro episódio de
elas doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e
IAM, confirmado por meio de eletrocardiograma e/ou
doenças respiratórias, foram responsáveis por 41
dosagem de marcadores bioquímicos de necrose
milhões de mortes em todo o mundo em 2016, o
miocárdica, de 2018 a 2020. Foi realizado o
equivalente a 71% de todas as mortes globais 8.
levantamento de atendimentos com o CID 10-I21,
Segundo o Departamento de Informática do Sistema
correspondente ao IAM, no Sistema Philips TASY® no
Único de Saúde (DATASUS), em 2018 ocorreram
período em questão. Foi considerado como critério de
356.178 óbitos por doenças do sistema circulatório e
exclusão prontuários eletrônicos de pacientes que não
deste número, 92.896 foram por infarto agudo do
apresentavam registro de glicemia na internação.
miocárdio no Brasil. Já no período de 2019, foram
O presente estudo caracterizou hiperglicemia
constatadas 130.959 internações por infarto agudo do
de estresse como elevação transitória e reversível de
miocárdio no país, sendo 3.618 no estado de Santa
glicemia em pacientes internados em situações
Catarina9. Os dados da 9a edição do Atlas de Diabetes
agudas, no caso em questão o IAM, com valores de
da International Diabetes Federation divulgou que
glicemia ≥ 140 mg/dL, excluindo pacientes já
existem 463 milhões de indivíduos com a doença no
sabidamente diabéticos e aqueles que receberem
mundo, tendo uma prevalência global de 9,3%, e o
diagnóstico de diabetes na internação4,5. Foi
Brasil com um número de 16,8 milhões de diabéticos10.
considerado hiperglicemia hospitalar valores de
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes,
glicemia superiores 140 mg/dL na admissão hospitalar
a hiperglicemia atinge cerca de 38% de pacientes
em indivíduos diabéticos e não diabéticos1,12. Os
hospitalizados e ela ocorre em três situações:
valores de glicemia avaliados no presente estudo
diagnóstico prévio conhecido de diabetes, diagnóstico
foram obtidos por dosagem laboratorial da glicemia
prévio desconhecido de diabetes e hiperglicemia de
plasmática venosa.
estresse1. Níveis elevados de glicemia no infarto
Na descrição dos dados foram utilizadas
agudo do miocárdio estão relacionados a maiores
medidas de tendência central e de dispersão, para
taxas de mortalidade e complicações intra-
variáveis quantitativas e porcentagens para variáveis
hospitalares3,11.
qualitativas. A existência de associação entre a
Diante desses fatos, o presente estudo
presença do desfecho de interesse segundo as
justifica-se pela crescente importância do IAM no

2 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

exposições foi avaliada por meio do teste de qui- estado civil as prevalências foram de, em ordem
quadrado. O nível de significância usado foi de 5% decrescente: casado/união estável (59,1%), viúvo
(p<0,05) e intervalo de confiança de 95%. As análises (15,2%), divorciado (12,9%), solteiro (8,3%) e não
foram realizadas no software SPSS 21.0. O programa informado (4,5%).
Excel foi utilizado para elaboração e organização do A ocupação mais identificada no estudo foi
banco de dados. aposentado/pensionista com percentual de 48,5%. No
A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê que diz respeito a escolaridade da população
de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade do Sul estudada, 6,1% eram analfabetos, 58,3% cursaram o
de Santa Catarina (UNISUL) sob o parecer 4.173.112, ensino fundamental (incompleto ou completo), 18,2%
em 25 de julho de 2020. cursaram o ensino médio (incompleto ou completo) e
apenas 4,5% chegaram ao ensino superior
Resultados (incompleto ou completo). Observou-se que 91,7% dos
pacientes estudados residiam na Associação de
Municípios Região de Laguna (AMUREL). A Tabela 1
O presente estudo inclui prontuários
mostra as características da população estudada e a
eletrônicos de indivíduos com primeiro episódio de IAM
prevalência das comorbidades com destaque para:
admitidos no Hospital Nossa Senhora da Conceição
hipertensão arterial sistêmica (62,9%), tabagismo
pelo Sistema Único de Saúde entre 2018 e 2020. A
(36,4%) e diabetes mellitus (30,3%).
consulta resultou em 193 prontuários com CID 10-I21,
nos quais, após análise destes, 21 apresentavam
Variáveis n %
episódio de IAM prévio, os quais foram excluídos,
Sexo
totalizando 172 indivíduos. Destes, 40 prontuários
Masculino 92 69,7
foram excluídos do estudo, por não apresentarem
Feminino 40 30,3
nenhum registro de glicemia durante toda a internação. Faixa etária
Deste modo, foram estudados 132 prontuários 30-39 anos 4 3,0
eletrônicos levando em considerações os critérios de 40-49 anos 14 10,6
inclusão e exclusão. O fluxograma 1 ilustra a 50-59 anos 41 31,1
caracterização da amostra estudada. 60-69 anos 45 34,1
≥ 70 anos 28 21,2
Raça/cor
Branca 117 88,6
Parda 3 2,3
Preta 8 6,1
Não informada 4 3,0
Estado Civil
Solteiro 11 8,3
Casado/união estável 78 59,1
Viúvo 20 15,2
Divorciado 17 12,9
Não informada 6 4,5
Ocupação
Aposentados e pensionistas 64 48,5
Setor da saúde 1 0,8
Setor da construção 14 10,6
Comércio 3 2,3
Setor do transporte 5 3,8
Fluxograma 1. Caracterização da amostra estudada conforme os Setor alimentício 8 6,1
critérios de inclusão e de exclusão.
Outros 22 16,7
Não informado 15 11,4
Destes, 69,7% foram do sexo masculino. A Escolaridade
idade média da população estudada foi de 61,8 anos, Analfabeto 8 6,1
a idade mínima encontrada foi de 35 anos e a máxima Ensino fundamental incompleto 21 15,9
foi de 89 anos. As faixas etárias mais prevalentes Ensino fundamental completo 56 42,4
foram de 50-59 anos (31,1%) e 60-69 anos (34,1%). Ensino médio incompleto 5 3,8
Ensino médio completo 19 14,4
Em relação a raça/cor da população estudada,
Ensino superior incompleto 2 1,5
houve predomínio da branca (88,6%). Na variável Ensino superior completo 4 3,0

3 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

Não informado 17 12,9 da associação mortalidade intra-hospitalar e


Município de residência hiperglicemia de hospitalar foi 2,1 (IC95% 1,36-3,56).
Amurel 121 91,7 Quanto à classificação do IAM em relação da
Outros 11 8,3
presença ou não de supradesnivelamento do
Comorbidades
segmento ST, no presente estudo 46 pacientes
DM 40 30,3
Dislipidemias 31 23,5 (36,8%) apresentaram IAM sem supra ST, enquanto
HAS 83 62,9 86 indivíduos (63,2%) manifestaram IAM com supra
Sobrepeso/obesidade 16 12,1 ST. A distribuição dos percentuais de IAM com supra
Depressão 5 3,8 ST são 88,5% na HE, 55,0% no DM e 77,4% na
TAG 1 0,8
hiperglicemia hospitalar. A associação entre as
Etilismo 9 6,8
variáveis classificação do infarto versus HE se
DPOC 8 6,1
ICC 9 6,8 apresentou estatisticamente significativas (p = 0,013,
Arritmia cardíaca 7 5,3 respetivamente).
Angina estável 3 2,3 No estudo prevaleceu o tratamento com
Angina instável prévia 3 2,3 intervenção coronária percutânea (ICP) em relação a
Alterações hormonais 7 5,3
cirurgia de revascularização miocárdica (CRM), sendo
Fibromialgia 3 2,3
que apenas 14 pacientes foram tratados com a CRM,
Tabagismo 48 36,4
Outras comorbidades 22 16,7 enquanto 118 foram submetidos a ICP Os percentuais
Tabela 1. Características sociodemográficas de pacientes com de ICP foram: 96,2% na HE, 87,5% na DM e 90,6% na
primeiro episódio de IAM que deram entrada pelo SUS no HNSC hiperglicemia hospitalar. Apenas a associação HE
entre os anos 2018 e 2020 (N = 132/IC95%). Legenda: DM: diabetes versus tratamento instruído foi significante (p = 0,019).
mellitus; HAS: hipertensão arterial sistêmica; TAG: transtorno de
ansiedade generalizada; DPOC: doença pulmonar obstrutiva
Observou-se ainda, na população estudada, a
crônica; ICC: insuficiência cardíaca congestiva. associação estatisticamente significante entre
complicações na internação por IAM em pacientes com
Dentre os 132 pacientes avaliados, a HE, com DM e com hiperglicemia hospitalar.
prevalência de hiperglicemia hospitalar foi de 40,1%, Cerca de 69,2% dos indivíduos com HE
sendo que destes 20,4% eram sabidamente diabéticos apresentaram alguma complicação na internação, RR:
e 19,7% apresentaram hiperglicemia de estresse 1,6 (IC95% 1,18-2,34), p = 0,010. As complicações
(Figura 1). mais prevalentes nos pacientes com HE foram as
cardiovasculares com percentual de 61,5%, RR: 2,9
(IC95% 1,83-4,70) e p ≤ 0,000, e as pulmonares com
42,3%, RR: 2,1 (IC95% 1,18-3,85) e p = 0,019. Entre
as complicações cardiovasculares, teve destaque a
19,70% Normoglicêmicos parada cardiorrespiratória (PCR) com relação
estatística significativa, sendo que dos 12 pacientes
Hiperglicemia em que apresentaram PCR, 8 tinham HE, prevalência de
DM
20,40% 59,90% 30,8%, RR: 8,1 (IC95% 2,65-25,01) e p ≤ 0,000.
Hiperglicemia de
estresse Entre os pacientes diabéticos a prevalência de
complicações pós-infarto foi de 60,0%, RR: 1,4 (IC95%
1,02-2,06) e p = 0,037. Verificou-se, no presente
estudo, relação entre diabetes e complicações
Figura 1. Prevalência de hiperglicemia hospitalar em pacientes com
neurológicas na internação por IAM. Na pesquisa 12
primeiro episódio de IAM que deram entrada pelo SUS no HNSC, pacientes apresentaram desordens neurológicas,
entre os anos 2018 e 2020, e sua divisão entre hiperglicemia de destes 7 eram diabéticos, o que equivale uma
estresse e diabetes mellitus. percentagem de 17,5%, RR: 3,2 (IC95% 1,08-9,53) e
p = 0,034.
A mortalidade intra-hospitalar foi registrada em O estudo constatou que cerca de 67,9% dos
22 pacientes no presente estudo, sendo que, destes, pacientes com hiperglicemia hospitalar desenvolveram
23,1% tinham hiperglicemia de estresse, 20,8% alguma complicação na internação, RR: 2,6 (IC95%
apresentaram hiperglicemia hospitalar e 12,5% eram 1,40-2,90) e p ≤ 0,000. As complicações mais
diabéticos. A associação mortalidade intra-hospitalar frequentes nesses pacientes e suas respectivas
com hiperglicemia hospitalar foi estatisticamente prevalências foram: cardiovasculares com 47,2%, RR:
significativas (p = 0,021). Diante disso, o risco relativo 2,8 (IC95% 1,60-5,08) e p ≤ 0,000;

4 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

Hiperglicemia de estresse Diabetes mellitus Hiperglicemia hospitalar

RR IC p RR IC p RR IC p

Mortalidade intra-hospitalar 1,44 0,24-8,56 0,687 3,77 0,73-19,38 0,095 9,33 1,03-84,08 0,021

Diagnóstico de diabetes
0,76 0,63-0,88 0,158 0 0 0 1,76 0,29-10,55 0,532
mellitus na internação

Classificação do infarto 1,4 1,17-1,81 0,013 1,86 0,52-6,58 0,328 0,32 0,088-1,21 0,087

Tratamento instituído 0 0 0 0,84 0,13-5,17 0,859 0 0 0

Tabela 2. Avaliação do risco de características da internação e seus desfechos apresentadas durante a internação hospitalar segundo
presença de hiperglicemia e diabetes, em pacientes com primeiro episódio de IAM que deram entrada pelo SUS no HNSC entre os anos
2018 e 2020 (IC 95%).

Hiperglicemia de estresse Diabetes mellitus Hiperglicemia hospitalar

RR IC p RR IC p RR IC p

Complicações 1,6 1,18-2,34 0,011 1,4 1,02-2,06 0,049 2,6 1,40-2,90 0,000

Cardiovasculares 2,9 1,83-4,70 0,000 0,9 0,51-1,69 0,830 2,8 1,60-5,08 0,000

Parada cardiorrespiratória 8,1 2,65-25,01 0,000 0,5 0,10-2,00 0,283 7,4 1,70-32,6 0,001

Choque cardiogênico 4,0 0,60-27,59 0,123 2,3 0,33-15,75 0,380 - - -

Pulmonares 2,1 1,18-3,85 0,017 1,6 0,86-2,86 0,146 2,4 1,32-4,64 0,003

Pneumonia 2,0 0,76-5,45 0,160 2,0 0,78-5,17 0,145 4,0 1,37-12,19 0,006

Edema agudo de pulmão 2,4 0,62-9,50 0,193 2,3 0,60-8,74 0,213 2,4 0,62-9,95 0,185

Renais 1,0 0,31-3,35 0,975 2,0 0,78-5,17 0,145 1,3 0,50-3,38 0,586

Neurológicas 0,8 0,19-3,49 0,783 3,2 1,08-9,53 0,027 4,4 1,26-15,75 0,010

Distúrbios hidroeletrolíticos 1,2 0,36-4,13 0,748 1,9 0,70-5,49 0,192 3,4 1,08-10,33 0,025

Anemia 0,6 0,08-5,40 0,712 1,7 0,40-7,36 0,459 1,1 0,26-4,79 0,881

Sepse 6,1 1,07-34,73 0,021 0,5 0,66-4,98 0,611 5,9 0,68-51,88 0,065

Úlcera de pressão 2,0 1,19-21,62 0,550 4,6 0,42-49,28 0,167 - - -

Tabela 3. Avaliação do risco de complicações apresentadas durante a internação hospitalar segundo presença de hiperglicemia e diabetes,
em pacientes com primeiro episódio de IAM que deram entrada pelo SUS no HNSC entre os anos 2018 e 2020 (IC 95%).

pulmonares com 37,7%, RR: 2,4 (IC%1,32-4,64) e p = Discussão


0,003, neurológicas com 17,0%, RR: 4,4 (IC95% 1,26-
15,75) e p = 0,012 e distúrbios hidroeletrolíticos com
Foram estudados 132 prontuários eletrônicos
17,0%, RR: 3,4 (IC95% 1,08-10,33) e p = 0,026. Dentro
de pacientes com primeiro episódio de IAM admitidos
das complicações cardiovasculares, tiveram
pelo SUS no HNSC, localizado na cidade de Tubarão-
significância a PCR com percentual de 18,9%, RR: 7,4
SC, entre os anos de 2018 e 2020. Destes, observou-
(IC95%N1,70-32,6) e p = 0,020, e choque cardiogênico
se uma prevalência de 69,7% no sexo masculino. A
com percentual de 7,5% (p = 0,024). 12 pacientes no
maior prevalência de IAM no sexo masculino é
presente estudo evoluíram para PCR, destes 10
corroborada pela pesquisa de internações por IAM no
apresentaram hiperglicemia. Também, apenas 4
país por sexo, no período de 2018 a 2020, no
indivíduos manifestaram choque cardiogênico, os 4
DATASUS. Essa consulta resultou em um percentual
eram hiperglicêmicos. Nas complicações pulmonares,
de 63,7% das internações por IAM no sexo masculino,
teve destaque a pneumonia com prevalência de
enquanto 36,3% no sexo feminino9. Tal fato pode ser
20,8%, RR: 4,0 (IC95% 1,37-12,19) e p = 0,006.
justificado pela maior ocorrência de alguns fatores de
Demais complicações estão representadas na Tabela
risco cardiovasculares no sexo masculino, como
3.

5 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

tabagismo e etilismo, e pela hipótese do efeito protetor mostraram prevalências similares16,19. O DM


cardiovascular do estradiol em mulheres, assim, caracteriza-se como fator de risco cardiovascular por
reduzindo a incidência de IAM no sexo feminino antes contribuir e potencializar o processo da aterosclerose,
da menopausa13. assim, o diabetes denota importante comorbidade
As faixas etárias mais prevalentes na entre os pacientes com IAM.
população estudada foram entre 50-59 anos e 60-69 A prevalência da hiperglicemia hospitalar por
anos. Dados que vão ao encontro com a distribuição primeiro episódio de IAM no estudo foi de 40,1%. A
de idade encontrada no mesmo período estudado, Sociedade Brasileira de Diabetes aponta que a
2018 a 2020, na população brasileira segundo dados hiperglicemia atinge cerca de 38% dos pacientes em
de internações por IAM registrados no DATASUS. Tal internação hospitalar1. Ademais, Janeri et al.18 em sua
banco de dados, mostrou a maior prevalência das pesquisa encontrou uma prevalência de 38,9% de
mesmas faixas etárias, com 24,6% entre 50-59 anos e pacientes hiperglicêmicos internados por síndrome
31,1% entre 60-69 anos9. A idade caracteriza-se como coronariana aguda. A hiperglicemia hospitalar associa-
fator de risco não modificável para a ocorrência do se a maior tempo de internação, aumento de demanda
IAM, onde o aumento da mesma está relacionado a de recursos humanos e custo hospitalar e é importante
alterações hemodinâmicas e anatômicas do sistema fator de morbimortalidade1. Assim, observa-se a
cardiovascular. significância da pesquisa de hiperglicemia no ambiente
Observou-se que 91,7% dos pacientes hospitalar, visto que a prevalência encontrada foi
estudados residiam na Associação de Municípios expressiva, e corroborada por outros estudos, e de seu
Região de Laguna (AMUREL), fato que pode ser importante significado clínico na evolução do paciente.
explicado por a cidade onde se localiza a instituição Foi encontrada na presente pesquisa uma
pesquisada fazer parte desta região de abrangência. prevalência de 19,7% de hiperglicemia de estresse. O
Verificando as comorbidades mais prevalentes valor da prevalência de HE varia na literatura. A SBD
na população estudada, a hipertensão arterial traz um percentual de 10%4. Já em estudos
sistêmica liderou como morbidade mais frequente com envolvendo o IAM, temos percentual de 7,9% na
mais da metade da população atingida, com percentual pesquisa de Janeri et al.18, 13,6% no estudo de Lerario
de 62,9%. A Sociedade Brasileira de Cardiologia indica et al.19 e 26,4% na coorte de Mondenesi et al.3. A HE é
que essa patologia estava presente em 69% dos desencadeada pela resposta hormonal (adrenalina,
pacientes com primeiro episódio de IAM e que 25% glucacon, GH e cortisol) e inflamatória (TNF e
dos infartos podem ser atribuídos à HAS14,15. Diversos interleucinas) em situações de estresse, ocasionando
estudos mostraram semelhante prevalência de HAS, o aumento da produção de glicose pelo fígado e da
corroborando o fato que tal comorbidade caracteriza- resistência insulínica, condição com importante
se como importante fator de risco para a ocorrência do repercussão na morbimortalidade do paciente4.
IAM16,17. Desse modo, a hipertensão configura-se Dos 132 prontuários estudados, 22 pacientes
como fator de risco por contribuir para a disfunção foram a óbito durante a internação. Destes, 23,1%
endotelial e aterosclerose, fatores comuns a apresentaram hiperglicemia de estresse, 12,5% eram
fisiopatologia do IAM. diabéticos e 20,8% manifestaram hiperglicemia
O tabagismo estava presente em 36,4% dos hospital. A associação mortalidade intra-hospitalar
pacientes estudados. A prevalência de tal hábito varia com hiperglicemia hospitalar foi estatisticamente
na literatura, mas apresenta-se como fator de risco significativa. Modenesi et al.3, em sua pesquisa que
cardiovascular importante. Silva et al.17 encontrou em avaliou a mortalidade entre pacientes com e sem HE
sua pesquisa uma prevalência de 28,4%, enquanto no IAM, constatou que a presença de HE se associou
Teixeira et al.16 obteve 38,5% de tabagistas em com a evolução para o óbito, sendo que 21% dos
pacientes que infartaram. A nicotina contida no cigarro pacientes com HE vieram a óbito. Também, a análise
provoca disfunção endotelial e possui efeito pró- retrospectiva realizada por Lerario et al.19 obteve
coagulante, contribuindo para a gênese e evolução do prevalência de mortalidade na internação de 2.262
IAM. pacientes com IAM de 13,4% com HE e 20,9% com
O presente estudo encontrou uma prevalência DM. Apenas a relação DM versus mortalidade intra-
de 30,3% de diabetes mellitus. Pesquisa semelhante hospitalar foi estatisticamente significante. Embora os
realizada no Instituto de Cardiologia de Santa Catarina mecanismos fisiopatológicos pelo qual a hiperglicemia,
(ICSC), localizado em São José – SC, no período de hospitalar e de estresse, aumente a mortalidade em
2016 e 2017 obteve prevalência de DM bastante pacientes pós infarto ainda não serem totalmente
similar (31,0%)18. Do mesmo modo, outros estudos compreendidos, há numerosas explicações. Entre

6 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

elas, sabe-se que a hiperglicemia eleva ácidos graxos neurológicas (17,0%) e distúrbios hidroeletrolíticos
livres, o que aumenta o consumo de oxigênio e, assim, (17,0%).
piora a isquemia do músculo cardíaco. Ademais, a Um estudo de coorte intra-hospitalar
glicemia elevada está ligada a disfunção constituído por 152 pacientes com diagnóstico de IAM
microvascular, estado pró-trombótico, inflamação verificou que 35,5% dos pacientes hiperglicêmicos
vascular, disfunção endotelial, aumento da pressão desenvolveram alguma complicação na internação,
arterial e prolongamento do intervalo QT20. enquanto no grupo controle 12,9% tiveram alguma
Na presente pesquisa nenhum diagnóstico de complicação (p = 0001). Dentro do grupo dos
DM foi feito durante a internação. A SBD recomenda o hiperglicêmicos, as complicações mais prevalentes
exame de hemoglobina glicada em todos os pacientes foram a PCR (11,9% vs 2,4%, p 0,018) e processo
com DM ou com hiperglicemia detectada no ambiente infeccioso (17,9% vs 2,4%, p 0,001)23.
hospitalar1. No entanto, tal recomendação não é Também, outro estudo de coorte retrospectivo
adotada na instituição em estudo. No estudo de Lerario com 307 pacientes com diagnóstico de IAM com
et al.19, dos 2.262 pacientes infartados, 287 (12,1%) supradesnível do segmento ST constatou que a
tiveram diagnóstico de DM na internação, mostrando a hiperglicemia se mostrou como fator preditor
importância da pesquisa de diabetes, pois, como já independente de complicações pós infarto24. A SBD
visto nesse estudo, há relação entre essa patologia traz em sua diretriz que a hiperglicemia hospitalar está
com mortalidade e complicações intra-hospitalares. relacionada ao aumento de complicações
Quanto à classificação do IAM em relação da cardiovasculares, de distúrbios hidroeletrolíticos,
presença ou não de supradesnivelamento do distúrbios hemodinâmicos, processos infecciosos e
segmento ST, nos três grupos, HE, DM e hiperglicemia fenômenos trombóticos1,25.
hospitalar, houve predomínio de IAM com supra ST em Deste modo, a hiperglicemia, tanto em
relação ao IAM sem supra ST. Estudo que utilizou a diabéticos quanto não diabéticos, mostra-se como
ressonância magnética para determinar a extensão do importante preditor de morbimortalidade. Tal fato
IAM exibiu correlação significativa entre a glicemia de justifica-se por ela estar relacionada ao aumento de
admissão e o tamanho do infarto, independentemente ácidos graxos livres, que causam arritmias cardíacas e
da hemoglobina glicada ou marcadores de necrose do resistência insulínica, e por gerar estresse oxidativo,
paciente21. O mecanismo fisiopatológico preciso que uma vez que provoca a inativação química do oxido
justifique a relação entre hiperglicemia e extensão nítrico e aumenta a produção de espécies reativas de
ainda não foi completamente elucidado22. oxigênio. O estresse oxidativo induz a disfunção
Em relação ao tipo de tratamento instituído microvascular e endotelial, estado pró-trombótico e
prevaleceu a intervenção coronária percutânea em inflamação vascular23.
relação a cirurgia de revascularização miocárdica. O O presente estudo apresentou como limitação,
estudo de Pinheiro et al.23 relata que a presença de por se tratar de um estudo com delineamento
hiperglicemia na admissão hospitalar por IAM não transversal retrospectivo com análise de dados
interferiu no tipo de tratamento realizado. Em secundários, a falta de alguns dados importantes,
contrapartida, Lerario et al.19 encontrou em sua como a falta de glicemia nos prontuários eletrônicos de
pesquisa que o tratamento cirúrgico foi mais frequente pacientes admitidos por primeiro episódio de IAM
em pacientes não diabéticos normoglicêmicos quando assim sendo necessário excluir tais indivíduos e, deste
comparados aos diabéticos e com HE. modo, reduzindo a população estudada. Ademais, a
A prevalência de complicações na internação inexistência de um protocolo para avaliação da
foi estatisticamente maior entre indivíduos com glicemia na fase aguda do IAM na instituição não
diagnóstico de diabetes mellitus (60,0%), com permitiu a padronização dos pacientes avaliados.
hiperglicemia de estresse (69,2%) e com hiperglicemia Outra limitação da presente pesquisa é a não
hospitalar (67,9%) em comparação aos que não realização da hemoglobina glicada na internação para
apresentaram tais condições. Em pacientes que diagnóstico de DM prévia não conhecida, uma vez que
apresentam hiperglicemia de estresse as sem diagnóstico o paciente pode ser classificado como
complicações mais relevantes foram as: hiperglicemia de estresse erroneamente, ao invés de
cardiovasculares (61,5%) e pulmonares (42,3%). Em hiperglicemia hospitalar. Também, pelo delineamento
pacientes sabidamente com diabetes as complicações do estudo, não se pode estabelecer uma associação
neurológicas ocorreram em 17,5%. Indivíduos com definitiva entre a hiperglicemia e a ocorrência de
hiperglicemia hospitalar apresentaram as seguintes: complicações pós-IAM.
cardiovascular (47,2%), pulmonares (37,7%),

7 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

Conclusão 15/pdf/posicionamentos-acesso-
livre/posicionamento-3.pdf.
5. Handelsman Y, Grunberger G, Zimmerman RS,
O DM estava presente em 30,3% dos
Blonde L, Cohen AJ, Davidson JA, et al.
pacientes na amostra estudada, deste 20,4%
American Association of Clinical
apresentaram hiperglicemia na admissão. A
Endocrinologists and American College of
prevalência da HE foi de 19,7% e da hiperglicemia
Endocrinology - Clinical Practice Guidelines for
hospitalar de 40,1%.
Developing a Diabetes Mellitus Comprehensive
Em relação a associação mortalidade intra-
Care Plan-2015. Endocr Pract. 2015; 21
hospitalar versus HE, DM e hiperglicemia hospitalar, as
Suppl.1:1–87.
prevalências encontradas foram: 23,1% em HE,
6. Santos da Costa FA, Lima Parente F, Sinara
12,5% em DM e 20,8% em hiperglicemia hospitalar.
Farias M, Lima Parente F, Custódio Francelino
Tiveram associação significativa a HE e hiperglicemia
P, Linhares Bezerra LT. Perfil demográfico de
hospitalar.
pacientes com infarto agudo do miocárdio no
A prevalência de complicações na internação
Brasil: Revisão Integrativa. SANARE - Rev
foi maior entre indivíduos com diagnóstico de DM, com
Políticas Públicas. 2018; 17(2):66–73.
HE e com hiperglicemia hospitalar. As complicações
7. Haas A V., McDonnell ME. Pathogenesis of
ocorreram em 60,0% dos pacientes com diabetes,
Cardiovascular Disease in Diabetes. Endocrinol
69,2% dos indivíduos com HE e 67,9% dos pacientes
Metab Clin North Am [Internet]. 2018;47(1):51–
com hiperglicemia hospitalar.
63 [acesso em 2021 Abr 27]. Disponível em:
Deste modo, conclui-se que a alteração
https://doi.org/10.1016/j.ecl.2017.10.010.
glicêmica atinge significativa parte dos pacientes com
8. World Health Organization. World health
primeiro episódio de IAM e apresenta como importante
statistics 2019: monitoring health for the SDGs,
preditor de morbimortalidade tanto em pacientes com
sustainable development goals [Internet]. 2019
ou sem diagnóstico de diabetes. Ademais, os
[acesso em: 2020 Mar 25]. Disponível em:
pacientes com diagnóstico de DM apresentaram
https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/1066
maiores complicações em relação a população geral,
5/324835/9789241565707-eng.pdf.
mesmo que normoglicêmicos na admissão por IAM.
9. Ministério da Saúde. Departamento de
Informática do Sistema Único de Saúde
Referências
(DATASUS) [Internet]. [acesso em: 2020 Mar
25]. Disponível em: http:// www.datasus.gov.br.
1. Lyra R, Oliveira M, Lins D, Cavalcanti N, Gross Acesso em: em 30 de mar. de 2021.
JL, Maia FFR, et al. Diretrizes da Sociedade 10. Internation Diabetes Federation. IDF Diabetes
Brasileira de Diabetes 2019-2020. São Paulo: Atlas Ninth [Internet]. Bruxelas, Bélgica; 2019
Clannad; 2019. 491 p. [acesso 2020 Mar 25]. Disponível em:
2. Silveira AOSM, Aires RSP, Fernandes EG V., https://diabetesatlas.org/en/sections/worldwide
Gomides MDA, Alves M de M, Sadoyama G. -toll-of-diabetes.html.
Complicações crônicas em diabetes, 11. Kosiborod M, Rathore SS, Inzucchi SE,
estratégias e qualidade dos serviços. Blucher Masoudi FA, Wang Y, Havranek EP,et al.
Educ Proc. 2017;2(1):1–15. Admission glucose and mortality in elderly
3. Modenesi R de F, Pena FM, Faria CAC de, patients hospitalized with acute myocardial
Carvalho RV, Souza NRM de, Soares J da S, et infarction: implications for patients with and
al. Prevalência e influência da hiperglicemia de without recognized diabetes. Circulation. 2005;
estresse no prognóstico em uma coorte de 111(23):3078-86.
pacientes com síndrome coronariana aguda. 12. American Diabetes Association. Standards of
Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(4):352–6. medical care in diabetes - 2020. Diabetes Care.
4. Sociedade Brasileira de Diabetes. 2020; 43 Suppl.1:S1–212.
Posicionamento Oficial SBD n° 03/2015: 13. Troncoso LT, Oliveira NCC, Laranjeira NRF,
Controle da glicemia no paciente hospitalizado Leporaes RCA, Eira TL, Pinheiro VP. Estudo
[Internet]. 2015. [acesso 2020 Abr 9]. Epidemiológico Da Incidência Do Infarto Agudo
Disponível em: Do Miocárdio Na População Brasileira. Rev
https://www.diabetes.org.br/publico/images/20 Cad Med N°1 [Internet]. 2018;1:91–101 [acesso
2021 Abr 29]. Disponível em:

8 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Cosmo Marques et al Prevalência do diabetes e da hiperglicemia de estresse no infarto agudo do miocárdio: análise em um serviço de emergência

http://unifeso.edu.br/revista/index.php/caderno disease. Arq Bras Cardiol. 2013;100(2):127–


sdemedicinaunifeso/article/viewFile/957/450. 33.
14. Malachias MVB, Souza WKSB, Plavnik FL, 24. Martínez García G. Hiperglucemia como factor
Rodrigues CIS, Brandão AA, Neves MFT B LA, pronóstico de complicaciones intrahospitalarias
et al. 7a Diretriz Brasileira de Hipertensão en el infarto agudo de miocardio con
Arterial. Arq Bras Cardiol. 2016;107(3). supradesnivel del segmento ST. CorSalud.
15. Barroso WKS, Rodrigues CIS, Bortolotto LA, 2019;11(2):120–8.
Gomes MAM, Brandão AA, Feitosa ADM, et al. 25. Krinsley JS. Association between
Diretrizes Diretrizes Brasileiras de Hipertensão hyperglycemia and increased hospital mortality
Arterial – 2020. Arq Bras Cardiol. in a heterogeneous population of critically ill
2021;116(3):516–658. patients. Mayo Clin Proc. 2003;78(12):1471-8.
16. Teixeira CS, Sanches SB. Prevalência de
fatores de risco em pacientes pós-infarto. Informações sobre o Artigo
Unisanta Heal Sci. 2017;1(1):1–18.
17. Silva KSC, Duprat IP, Dórea S de A, Melo GC
Recebido: 05/08/2021
de, Macêdo AC de. Emergência cardiológica:
Aceito: 17/02/2022
principais fatores de risco para infarto agudo do
Conflitos de interesse: nenhum.
miocárdio / Cardiologic emergency: main risk
Agências financiadoras: nenhuma.
factors for acute myocardial infarction. Brazilian
J Heal Rev. 2020;3(4):11252–63.
18. Janeri CG, Vietta GG, Balthazar APS.
Hiperglicemia em pacientes admitidos com
Síndrome Coronariana Aguda: um estudo
observacional. [Trabalho de conclusão de
curso]. Palhoça (SC): Universidade do Sul de
Santa Catarina, Curso de Medicina; 2017.
19. Lerario AC, Coretti FMLM, Oliveira SF de, Betti
RTB, Bastos M do SCB, Ferri L de AF, et al.
Avaliação da prevalência do diabetes e da
hiperglicemia de estresse no infarto agudo do
miocárdio. Arq Bras Endocrinol Metabol.
2008;52(3):465–72.
20. Góis AFT de. Glicemia no prognóstico da
síndrome coronariana aguda. Arq Bras
Endocrinol Metabol. 2008;52(3):429–30.
21. Cochet A, Zeller M, Lalande A, L'huillier I,
Walker PM, Touzery C, et al. Utility of cardiac
magnetic resonance to assess association
between admission hyperglycemia and
myocardial damage in patients with reperfused
ST-segment elevation myocardial infarction. J
Cardiovasc Magn Reson. 2008:10:2.
22. Ladeira RT, Baracioli LM, Faulin TES, Abdalla
DSP, Seydell TM, Maranhão RC, et al.
Unrecognized diabetes and myocardial
necrosis: Predictors of hyperglycemia in
myocardial infarction. Arq Bras Cardiol.
2013;100(5):404–11.
23. Pinheiro CP, Oliveira MDP, Faro GB de A, Silva
EC, da Rocha EAA, Barreto-Filho JAS, et al.
Prognostic value of stress hyperglycemia for in-
hospital outcome in acute coronary artery

9 JBMEDE 2022;2(1):e22003
Pearls from the Cochrane Library
for Emergency Physicians

Ocitocina profilática intravenosa versus intramuscular para reduzir o


sangramento no terceiro período do trabalho de parto:
uma Revisão Cochrane

Olufemi T Oladapo1*, Babasola O Okusanya2, Edgardo Abalos3, Ioannis D Gallos4,


Argyro Papadopoulou4
1 UNDP/UNFPA/UNICEF/WHO/World Bank Special Programme of Research, Development and Research Training in Human
Reproduction (HRP), Department of Sexual and Reproductive Health and Research, World Health Organization, Geneva,
Switzerland
2 Experimental and Maternal Medicine Unit, Department of Obstetrics and Gynaecology, Faculty of Clinical Sciences, College

of Medicine, University of Lagos, Idi-Araba, Lagos, Nigeria


3 Centro Rosarino de Estudios Perinatales (CREP), Rosario, Argentina
4 Tommy’s National Centre for Miscarriage Research, Institute of Metabolism and Systems Research (IMSR), WHO

Collaborating Centre for Global Women’s Health Research, University of Birmingham, Birmingham, UK
* Autor correspondente. Endereço de e-mail: oladapoo@who.int

Introdução Coleta dos dados e análises

Há consenso geral de que a ocitocina Dois autores, trabalhando de forma


administrada por via intravenosa ou intramuscular é independente, selecionaram os estudos para
eficaz na redução da perda sanguínea pós‐parto. inclusão, avaliaram o risco de viés, extraíram os
Contudo, não está claro se as diferenças sutis entre o dados e verificaram a exatidão dos mesmos.
modo de ação destas vias têm algum efeito sobre os Avaliamos a qualidade das evidências usando a
desfechos maternos e neonatais. Esta revisão foi GRADE.
publicada pela primeira vez em 2012 e atualizada pela
última vez em 2018. Principais resultados

Objetivos Sete ECRs, envolvendo 7817 mulheres,


preencheram nossos critérios de inclusão. Os estudos
Comparar a efetividade e segurança da compararam a administração intravenosa versus
ocitocina profilática administrada por via intravenosa intramuscular de ocitocina logo após a saída do
ou intramuscular no terceiro período do parto vaginal. ombro anterior do bebê ou logo após o nascimento da
criança. Todos os estudos foram feitos em hospitais e
Métodos de busca incluíram mulheres com gestação a termo e parto
vaginal. A maioria dos estudos ocorreu em países de
Em 19 de dezembro de 2019 fizemos buscas alta ou média renda. No geral, os estudos incluídos
nas seguintes bases de dados: Cochrane Pregnancy tinham risco de viés moderado ou baixo. Dois estudos
and Childbirth's Trials Register, ClinicalTrials.gov, tinham informações claras sobre sigilo de alocação e
WHO International Clinical Trials Registry Platform cegamento.
(ICTRP). Também avaliamos as listas de referências Existe evidência de alta qualidade que a
dos estudos recuperados. administração intravenosa de ocitocina no terceiro
período, comparada com a administração
intramuscular, reduz o risco de hemorragia pós‐parto
Critérios de seleção
(HPP) ≥ 500 mL (risco relativo médio (RR) 0,78,
Incluímos ensaios clínicos randomizados intervalo de confiança (IC) 95% 0,66 a 0,92; seis
(ECRs) que compararam ocitocina profilática ECRs; 7731 mulheres) e de transfusão de sangue
intravenosa versus intramuscular no terceiro período (RR 0,44, IC 95% 0,26 a 0,77; quatro ECRs; 6684
do parto vaginal. Excluímos os ensaios clínicos quasi‐ mulheres). A administração intravenosa de ocitocina
randomizados. provavelmente reduz o risco de HPP ≥ 1000 mL,
embora o IC 95% cruze a linha da nulidade (RR 0,65,

JBMEDE 2022;2(1):e22004

Esta revisão é uma versão abreviada de uma Revisão Cochrane publicada anteriormente no Banco de Dados Cochrane de Revisões
Sistemáticas 2020, número 11. Art. No.: CD009332. DOI: 10.1002/14651858.CD009332.pub4. (ver www.cochranelibrary.com para
obter informações). As Revisões Cochrane são atualizadas regularmente à medida que novas evidências surgem e em resposta ao
feedback, e o Banco de Dados Cochrane de Avaliações Sistemáticas deve ser consultado para a versão mais recente da revisão.
Oladapo et al Ocitocina profilática intravenosa versus intramuscular para reduzir o sangramento no terceiro período do trabalho de parto: uma Revisão Cochrane

IC 95% 0,39 a 1,08; quatro ECRs; 6681 mulheres; Conclusão dos autores
evidência de qualidade moderada). Em todos os
estudos, exceto num, houve uma redução do risco de A administração intravenosa de ocitocina é
HPP ≥ 1000 mL com ocitocina intravenosa. O estudo mais eficaz que a administração intramuscular na
que encontrou um grande aumento (da HPP) com a prevenção da HPP no parto vaginal. A administração
administração intravenosa foi pequeno (apenas 256 de ocitocina intravenosa não está associada a
mulheres), e contribuiu com apenas 3% do total de preocupações adicionais de segurança e tem um
eventos. A exclusão deste pequeno estudo da perfil de efeitos secundários comparável com a
metanálise eliminou a heterogeneidade e o efeito do administração intramuscular. Estudos futuros devem
tratamento favoreceu a ocitocina intravenosa (RR avaliar a aceitabilidade, viabilidade e utilização de
0,61, IC 95% 0,42 a 0,88; três ECRs; 6425 mulheres; recursos do uso da ocitocina endovenosa
evidência de alta qualidade). Além disso, fizemos uma especialmente em locais com poucos recursos.
análise de sensibilidade para avaliar o efeito do risco
de viés restringindo a análise aos estudos com "baixo Informações da seção
risco de viés" para geração de sequência de
randomização e sigilo de alocação. Nessa Esta seção reproduz artigos publicados anteriormente
metanálise, a administração profilática de ocitocina pela Cochrane Database of Systematic Reviews e é
intravenosa versus intramuscular reduziu o risco de realizada em coordenação com Patricia Jabre,
HPP≥ 1000 mL(RR 0,64, IC 95% 0,43 a 0,94; dois Yannick Auffret, Sebastien Beroud, Julie Dumouchel,
ECRs; 1512 mulheres). Parece haver pouca ou Virginie-Eve Lvovschi, Kirk Magee, Daniel Meyran,
nenhuma diferença entre as duas vias de Patrick Miroux, Nordine Nekhili e Youri Yourdanov do
administração de ocitocina quanto à necessidade de grupo Cochrane Pre-hospital and Emergency Care.
usar outros uterotônicos (RR 0,78, IC 95% 0,49 a
1,25; seis ECRs; 7327 mulheres; evidência de baixa
qualidade). A injeção intravenosa de ocitocina,
comparada à intramuscular, provavelmente reduz o
risco de morbidade materna grave (como
histerectomia, falência de órgãos, coma, internação
em unidade de terapia intensiva). Porém o tamanho
do efeito é incerto pois o intervalo de confiança sugere
uma redução substancial, mas também toca a linha
de nulidade (RR 0,47, IC 95% 0,22 a 1,00, quatro
ECRs, 7028 mulheres, evidência de qualidade
moderada). A maioria dos eventos ocorreu em um
estudo da Irlanda que avaliou internação em unidade
de alta dependência. Nos outros três estudos houve
apenas um caso de edema uvular. Não foram
relatadas mortes maternas em nenhum dos estudos
incluídos (evidência de qualidade muito baixa).
Provavelmente há pouca ou nenhuma
diferença no risco de hipotensão com o uso
intravenoso versus intramuscular de ocitocina (RR
1,01, IC 95% 0,88 a 1,15; quatro ECRs; 6468
mulheres; evidência de qualidade moderada).
As análises de subgrupos baseadas no modo
de administração de ocitocina intravenosa (injeção ou
infusão de bolus) versus a ocitocina intramuscular não
mostraram evidência de diferenças substanciais nos
desfechos primários. Do mesmo modo, análises
adicionais de subgrupos baseadas na utilização da
ocitocina isoladamente ou como parte do manejo
ativo do terceiro período do trabalho (AMTSL) não
mostraram evidência de diferenças substanciais entre
as duas vias.

2 JBMEDE 2022;2(1):e22004
Pearls from the Cochrane Library
for Emergency Physicians

Cloroquina ou hidroxicloroquina para prevenção e


tratamento da COVID‐19: uma Revisão Cochrane

Bhagteshwar Singh1,2*, Hannah Ryan3, Tamara Kredo4, Tamara Kredo4, Marty Chaplin5, Tom Fletcher5
1 Tropicaland Infectious Diseases Unit, Royal Liverpool University Hospital, Liverpool, UK
2 Department of Infectious Diseases, Christian Medical College, Vellore, India
3 Department of Clinical Pharmacology, Royal Liverpool University Hospital, Liverpool, UK
4 Cochrane South Africa, South African Medical Research Council, Cape Town, South Africa
5 Department of Clinical Sciences, Liverpool School of Tropical Medicine, Liverpool, UK

* Autor correspondente. Endereço de e-mail: bsingh@liverpool.ac.uk

Introdução pessoas em risco de exposição à COVID‐19, e


pessoas expostas à COVID‐19.
A pandemia do COVID‐19 causou uma Também colhemos dados sobre eventos
mortalidade substancial. Alguns especialistas adversos (qualquer evento adverso, evento adverso
propuseram o uso da cloroquina (CQ) e da grave, e prolongamento de intervalo QT no
hidroxicloroquina (HCQ) para tratar ou prevenir a eletrocardiograma).
doença. A eficácia e a segurança desses
medicamentos foram avaliadas em ensaios clínicos Coleta dos dados e análises
controlados randomizados (ECRs).
Dois autores de revisão, trabalhando de
Objetivos forma independente, avaliaram a elegibilidade das
citações identificadas, extraíram os dados dos
Avaliar os efeitos da cloroquina (CQ) ou da estudos incluídos, e avaliaram seu risco de viés
hidroxicloroquina (HCQ) para 1) tratar pessoas com usando a ferramenta 'Risco de viés' da Cochrane.
COVID‐19 sobre a mortalidade e o tempo de Contatamos os autores dos estudos primários para
eliminação do vírus; 2) prevenir a infecção em esclarecimentos e dados adicionais, em alguns
pessoas com risco de exposição ao SARS‐COV‐2; 3) estudos. Calculamos o risco relativo (RR) para os
prevenir a infecção em pessoas expostas ao SARS‐ desfechos dicotômicos e a diferença de médias (MD)
CoV‐2. para os desfechos contínuos, com seus respectivos
intervalos de confiança (IC) de 95%. Fizemos
metanálises usando o modelo de efeitos aleatórios
Métodos de busca
para os desfechos em que era adequado agrupar as
Fizemos buscas nas seguintes bases de estimativas de efeitos.
dados: Cochrane Central Register of Controlled Trials
(CENTRAL), MEDLINE, Embase, e Current Principais resultados
Controlled Trials (www.controlled‐trials.com).
Também fizemos buscas nas bases específicas de 1. Tratamento de pacientes com COVID‐19
COVID‐19 www.covid‐nma.com e covid‐ Incluímos 12 ECRs envolvendo 8569
19.cochrane.org. Incluímos estudos publicados ou participantes, todos adultos. Os estudos foram feitos
não, em qualquer idioma. A data da última busca foi na China (4); Brasil, Egito, Irã, Espanha, Taiwan,
15 de setembro de 2020. Entramos em contato com Reino Unido e América do Norte (1 estudo cada); e
pesquisadores para identificar estudos não um estudo global em 30 países (1 estudo). Nove
publicados e em andamento. estudos envolveram apenas pacientes
hospitalizados, e três envolveram apenas pacientes
ambulatoriais. Houve bastante heterogeneidade entre
Critérios de seleção
os estudos quanto à gravidade da doença, a
Incluímos ECRs que testaram cloroquina ou prevalência de comorbidades e o uso de co‐
hidroxicloroquina em pessoas com COVID‐19,

JBMEDE 2022;2(1):e22005
Esta revisão é uma versão abreviada de uma Revisão Cochrane publicada anteriormente no Banco de Dados Cochrane de Revisões
Sistemáticas 2021, número 2. Art. No.: CD013587. DOI: 10.1002/14651858.CD013587.pub2. (ver www.cochranelibrary.com para obter
informações). As Revisões Cochrane são atualizadas regularmente à medida que novas evidências surgem e em resposta ao
feedback, e o Banco de Dados Cochrane de Avaliações Sistemáticas deve ser consultado para a versão mais recente da revisão.
Singh et al Cloroquina ou hidroxicloroquina para prevenção e tratamento da COVID‐19: uma Revisão Cochrane

intervenções. Em vários ECRs, havia risco de viés em 2. Prevenção da COVID‐19 em pessoas


todos os domínios. com risco de exposição ao SARS‐COV‐2
Nove ECRs compararam HCQ versus Os estudos em andamento ainda não
cuidados habituais (7779 participantes), e um apresentaram resultados para este objetivo.
comparou HCQ versus placebo (491 participantes).
Houve variação quanto às doses e regimes de uso 3. Prevenção da COVID‐19 em pessoas
entre os estudos. O uso da HCQ faz pouca ou que foram expostas ao SARS‐CoV‐2
nenhuma diferença sobre o risco de morte por Um estudo (821 participantes) comparou
qualquer causa (RR 1,09, IC 95% 0,99 a 1,19; 8208 HCQ versus placebo como agente profilático nos EUA
participantes; 9 ECRs; evidência de alta qualidade). (cerca de 90% dos participantes) e no Canadá. Foram
Não houve diferença na estimativa de efeito em uma recrutados adultos assintomáticos (66% profissionais
análise de sensibilidade com três estudos utilizando da saúde; idade média de 40 anos; 73% sem co‐
intenção de tratar modificada. morbidade) com um histórico de exposição a pessoas
A HCQ pode fazer pouca ou nenhuma com COVID‐19 confirmada. Estamos muito incertos
diferença sobre a proporção de pessoas com exame sobre o efeito da HCQ sobre os desfechos primários
de PCR negativo para SARS‐CoV‐2 em amostras pois o número de eventos foi muito pequeno: 20/821
respiratórias colhidas no 14º dia após sua entrada no (2,4%) desenvolveram COVID‐19 confirmada até o
estudo (RR 1,00, IC 95% 0,91 a 1,10; 213 14o dia após a entrada no estudo, e 2/821 (0,2%)
participantes; 3 ECRs; evidência de baixa qualidade). foram hospitalizados devido à COVID‐19 (evidência
A HCQ provavelmente faz pouca ou nenhuma de qualidade muito baixa). A HCQ, comparada ao
diferença na progressão do paciente para a ventilação placebo, provavelmente aumenta o risco de eventos
mecânica (RR 1,11, IC 95% 0,91 a 1,37; 4521 adversos (RR 2,39, IC 95% 1,83 a 3,11; 700
participantes; 3 ECRs; evidência de qualidade participantes; 1 ECR; evidência de qualidade
moderada). A HCQ provavelmente aumenta em cerca moderada). O HCQ pode fazer pouca ou nenhuma
de três vezes o risco de eventos adversos (RR 2,90, diferença sobre eventos adversos graves (sem RR:
IC 95% 1,49 a 5,64; 1394 participantes; 6 ECRs; nenhum participante teve eventos adversos graves;
evidência de qualidade moderada), mas pode fazer evidência de baixa qualidade).
pouca ou nenhuma diferença no risco de eventos Um ensaio clínico randomizado tipo cluster
adversos graves (RR 0,82, IC 95% 0,37 a 1,79; 1004 (2525 participantes) comparou HCQ versus cuidados
participantes; 6 ECRs; evidência de baixa qualidade). habituais para a prevenção da COVID‐19 em pessoas
Estamos muito incertos sobre o efeito da HCQ sobre com histórico de exposição à SARS‐CoV‐2 na
o tempo até a melhoria clínica ou sobre o risco de Espanha. A maioria dos participantes trabalhava ou
prolongamento do intervalo QT no eletrocardiograma residia em lares de idosos; a idade média era de 49
(evidência de qualidade muito baixa). anos. Não houve diferença no risco de COVID‐19
Um estudo (22 participantes) randomizou confirmada sintomática ou na produção de anticorpos
pacientes para CQ versus lopinavir/ritonavir, um contra SARS‐CoV‐2 entre os dois braços do estudo.
medicamento com eficácia desconhecida contra o
SARS‐CoV‐2, e não encontrou nenhuma diferença na Conclusão dos autores
recuperação clínica ou na taxa de eventos adversos.
Um ECR comparou HCQ combinada com Para pessoas infectadas com COVID‐19, a
azitromicina versus tratamento habitual (444 HCQ tem pouco ou nenhum efeito sobre o risco de
participantes). Este estudo não detectou nenhuma morte, e provavelmente nenhum efeito sobre a
diferença entre os grupos para os seguintes progressão para ventilação mecânica. O uso da HCQ,
desfechos: morte, necessidade de ventilação comparado ao placebo, triplica o risco de eventos
mecânica, duração da internação hospitalar ou adversos, porém houve poucos eventos adversos
eventos adversos graves. Um risco maior de eventos graves. Não devem ser realizados mais ensaios
adversos foi relatado no braço HCQ‐azitromicina; isto clínicos com hidroxicloroquina ou cloroquina para o
incluiu o prolongamento do intervalo QT, quando tratamento da COVID‐19.
medido. Os resultados desta revisão sistemática
Um ECR comparou HCQ versus febuxostat, tornam menos provável que esses medicamentos
outro medicamento com eficácia desconhecida contra sejam eficazes na proteção das pessoas contra a
o SARS‐CoV‐2 (60 participantes). Não foi detectada COVID‐19, porém isto não está totalmente excluído.
diferença no risco de hospitalização ou mudança no É provavelmente sensato concluir os estudos sobre o
aspecto de tomografia computadorizada (TC) dos efeito destes medicamentos para prevenir a infecção,
pulmões; não foram relatadas mortes. e assegurar que estes estudos sejam de alto padrão
para que forneçam resultados inequívocos.

2 JBMEDE 2022;2(1):e22005
Singh et al Cloroquina ou hidroxicloroquina para prevenção e tratamento da COVID‐19: uma Revisão Cochrane

Informações da seção

Esta seção reproduz artigos publicados anteriormente


pela Cochrane Database of Systematic Reviews e é
realizada em coordenação com Patricia Jabre,
Yannick Auffret, Sebastien Beroud, Julie Dumouchel,
Virginie-Eve Lvovschi, Kirk Magee, Daniel Meyran,
Patrick Miroux, Nordine Nekhili e Youri Yourdanov do
grupo Cochrane Pre-hospital and Emergency Care.

3 JBMEDE 2022;2(1):e22005
Conheça nossos PodCasts:

Disponíveis no Spotify!

Filie-se à ABRAMEDE e fortaleça


a Medicina de Emergência
Brasileira.

Saiba mais: www.abramede.com.br

Você também pode gostar