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Cultura de Consumo, Comunicação e Práticas de Branding: Aproximações Possíveis

Autoria: José Coelho de Andrade Albino, César Augusto Resende, Hélio Júnior Henrique de Siqueira,
Alexandre de Pádua Carrieri

Resumo

Este ensaio visa apresentar e analisar teorias contemporâneas sobre cultura de consumo,
comunicação e práticas de branding consideradas mais robustas do que as pós-modernas,
visando subsidiar pesquisas que tenham por objetivo compreender como os consumidores
produzem sentido e se apropriam de bens e discursos veiculados por marcas ícones. Abrange,
também, discussões acerca da forma como esses sujeitos-consumidores constituem sua
identidade e as representações sociais que lhe permitem atuar no mundo. Esta pesquisa se
justifica na medida em que são muitos os pesquisadores que confundem os níveis de análise
sociedade de consumo e cultura de consumo, assim como adotam posições moralistas,
deterministas ou individualistas, como, por exemplo, os autores considerados “pós-modernos”
(BAUDRILLARD, 1981 e 1991; LIPOVETSKY, 1989, 1992 e 2007; LASCH, 1983 e 1992;
MAFFESOLI, 1996 e 1997; FEATHERSTONE, 1995). Sendo assim, urge superar muitos
pressupostos filosóficos e epistemológicos que vêm dominando o meanstream das pesquisas
nos campos do Marketing, Consumo, Comunicação e Branding. Dentre eles, pode-se
ressaltar: (a) sujeitos concebidos como sendo indivíduos atomizados e racionais ou passivos e
determinados pelas estruturas sociais; (b) processos e práticas vistos como sendo iniciados
pelas e redutíveis às ações desses indivíduos, colocando-se em segundo plano relações e
processos; (c) necessidade de se assumir a existência de intenções deliberadas, assim como de
crenças, valores e princípios compartilhados, a fim de explicar comportamentos e práticas
sociais, o que impede a apreensão dessas práticas como disposições (habitus); (d) mudanças
percebidas como sendo iniciadas por situações externas, privilegiando-se estabilidade e
persistência no lugar da mudança em si, assim como conteúdos e não relações; (e) objetos de
análise construídos a partir da linguagem, categorias e lógica do pesquisador e não em termos
do mundo fenomenológico dos agentes; dentre outros. Para tanto, realizou-se revisão de
literatura de autores contemporâneos que abordam o tema cultura de consumo, enfatizando-se
as concepções de sujeito, comunicação e práticas de branding que eles adotam (HOLT, 1997,
2002 e 2003; ARNOULD, THOMPSON, 2005; THOMPSON, HAYTKO, 1997). Também
foram articulados temas como comunicação, subjetividade e cultura visando construir uma
abordagem dialógica e crítica que dê conta de apreender como sujeitos-consumidores
produzem sentido e se apropriam de bens e discursos em contextos institucionalizados de
interação e consumo, sendo isso feito sem recair em posturas determinista, individualistas ou
relativistas (GONZÁLES REY, 2004, 2005a e b; BAKHTIN, VOLOSHINOV, 1979; HALL,
2003 e 2007; ESCOSTEGUY, JACKS, 2005; MARTÍN-BARBERO, 2006; PEARCE, 1996;
PIEDRAS, 2006; PIEDRAS, JACKS, 2005). Nessa abordagem, os consumidores, são
considerados sujeitos históricos, desejantes, cidadãos e ativos no processo de constituição
tanto da sua identidade quanto da realidade social, sendo que essa autonomia se exerce dentro
dos limites e possibilidades colocados pelas instâncias sociais e pelo seu habitus
(BOURDIEU, 1996; FARACO, 2003, GOMES, 1996; MACHADO, 2005).

Palavras-chave: cultura de consumo, comunicação, branding, estilo de vida, identidade

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INTRODUÇÃO

Sociedade de consumo é uma terminologia utilizada tanto nos meios acadêmicos como
na imprensa comum para se referir à sociedade contemporânea, destacando-se, dessa forma, a
dimensão consumo como específica e definidora dessa sociedade. Barbosa (2004) enumera
como principais características dessa sociedade o fato dela ser uma sociedade capitalista e de
mercado, onde a cultura material é acumulada na forma de mercadorias. Refere-se, também, a
uma sociedade onde a produção e o consumo são de massa, havendo altas taxas de consumo
individual e de descarte de produtos, sendo a busca constante por novidades e a moda fatores
explicativos dessa forma de agir. Nessa abordagem, o consumo é visto como a principal
forma de reprodução e diferenciação social, sendo o consumidor considerado um importante
personagem social. Segundo Retondar (2007, p.18), os estudiosos que aderem a esta linha de
pesquisa se colocam questões como: “em que medida a sociedade de consumo e o
consumismo dela derivado se tornam forças civilizatórias da modernidade e do capitalismo
global?”; “quais as novas relações e processos sociais que se formam a partir da estreita
conexão que se estabelece entre comunicação e consumo no contexto das sociedades
contemporâneas globalizadas?”, dentre outras. Nessas pesquisas, o consumo emerge como
objeto heurístico para a compreensão do desenvolvimento da sociedade contemporânea.
Observa-se, portanto, que as teorias sobre a sociedade de consumo dizem respeito à
natureza da realidade social, assim como busca-se compreender quando e porque o consumo
assumiu papel tão importante nessa sociedade. Já as teorias sobre cultura de consumo
procuram respostas para questões, como, por exemplo, o impacto da cultura material sobre a
vida das pessoas; os processos sociais e subjetivos que fundamentam as escolhas de
mercadorias; os valores e as práticas que norteiam o consumo; os mecanismos de fruição e de
mediação social que influenciam o consumo, dentre outros. Segundo Barbosa (2004, p.11),
investiga-se como o “consumo se conecta com outras esferas da experiência humana e em que
medida ele funciona como uma ‘janela’ para o entendimento de múltiplos processos sociais e
culturais”. Trata-se, portanto, de níveis analíticos distintos, apesar da sua estreita ligação.
Apesar das ressalvas feitas por Barbosa (2004), são muitos os pesquisadores que
confundem esses níveis de análise, assim como adotam posições moralistas, deterministas ou
inidvidualistas, como, por exemplo, os autores considerados “pós-modernos”
(BAUDRILLARD, 1981 e 1991; LIPOVETSKY, 1989, 1992 e 2007; LASCH, 1983 e 1992;
MAFFESOLI, 1996 e 1997; FEATHERSTONE, 1995). Sendo assim, urge superar muitos
pressupostos filosóficos e epistemológicos que vêm dominando o meanstream das pesquisas
nos campos do Marketing, Consumo, Comunicação e Branding. Dentre eles, pode-se
ressaltar: (a) sujeitos concebidos como sendo indivíduos atomizados e racionais ou passivos e
determinados pelas estruturas sociais; (b) processos e práticas vistos como sendo iniciados
pelas e redutíveis às ações desses indivíduos, colocando-se em segundo plano relações,
processos e práticas; (c) necessidade de se assumir a existência de intenções deliberadas,
assim como de crenças, valores e princípios compartilhados, a fim de explicar
comportamentos e práticas sociais, o que impede a apreensão dessas práticas como
disposições (habitus); (d) mudanças percebidas como sendo iniciadas por situações externas,
privilegiando-se estabilidade e persistência no lugar da mudança em si, assim como conteúdos
e não relações; (e) objetos de análise construídos a partir da linguagem, categorias e lógica do
pesquisador e não em termos do mundo fenomenológico dos agentes.
Nesse contexto, este ensaio visa apresentar e analisar teorias contemporâneas sobre
cultura de consumo, comunicação e práticas de branding consideradas mais robustas do que
as pós-modernas, visando subsidiar pesquisas que tenham por objetivo compreender como os
consumidores produzem sentido e se apropriam de bens e discursos veiculados por marcas
ícones. Abrange, também, discussões acerca da forma sobre como esses sujeitos-

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consumidores constituem sua identidade e as representações sociais que lhe permitem atuar
no mundo. Para tanto, realizou-se revisão de literatura de autores contemporâneos que
abordam o tema cultura de consumo, enfatizando-se as concepções de sujeito, comunicação e
práticas de branding que eles adotam (HOLT, 1997, 2002 e 2003; ARNOULD,
THOMPSON, 2005; THOMPSON, HAYTKO, 1997). Também foram articulados temas
como comunicação, subjetividade e cultura visando construir uma abordagem dialógica e
crítica que dê conta de apreender como sujeitos-consumidores produzem sentido e se
apropriam de bens e discursos em contextos institucionalizados de interação e consumo,
sendo isso feito sem recair em posturas determinista, individualistas ou relativistas
(GONZÁLES REY, 2004, 2005a e b; BAKHTIN, VOLOSHINOV, 1979; HALL, 2003 e
2007; ESCOSTEGUY, JACKS, 2005; MARTÍN-BARBERO, 2006; PEARCE, 1996;
PIEDRAS, 2006; PIEDRAS, JACKS, 2005). Nessa abordagem, os sujeitos-consumidores são
considerados sujeitos históricos, desejantes, cidadãos e ativos no processo de constituição
tanto da sua identidade quanto da realidade social, sendo que essa autonomia se exerce dentro
dos limites e possibilidades colocados pelas instâncias sociais e pelo seu habitus
(BOURDIEU, 1996; FARACO, 2003, GOMES, 1996; MACHADO, 2005).

REVISÃO DE LITERATURA

A – Cultura de Consumo – Crítica à Abordagem Pós-Moderna


Segundo Albino et. al. (2009), as principais categorias analíticas utilizadas por autores
como Baudrillard (1981 e 1991); Lipovetsky (1989, 1992 e 2007); Lasch (1983 e 1992);
Maffesoli (1996 e 1997) e Featherstone (1995), considerados “pós-modernos”, como sendo
definidoras da cultura de consumo na contemporaneidade são: individualismo e liberdade de
escolha; narcisismo e onipotência; simulacro e autonomia da ilusão; consumo de signos e
estilo de vida; hedonismo e experiência estética; moda e obsolescência; consumo como lazer e
ambiência. Tomando-se como referência esses autores, Albino et. al. afirma que ele
concebem a sociedade de consumo como sendo regida pelos ditames da economia
(produção/consumo) e da moda (inovação constante). Nela, consome-se o valor-signo
agregado ao objeto pela publicidade em detrimento de sua utilidade. O indivíduo se vê dentro
de um "mundo sígnico", dotado de vários objetos representados por inúmeras significações.
Na visão dos autores pós-modernos, é tempo de escolher, de "ser livre", de se buscar nos
objetos uma identidade. Objeto este personificado enquanto signo de distinção social ou
concebido como conquistas que expressam as liberdades individualistas alcançadas pelas
democracias ocidentais modernas. Simulacro de simulação que encontra sua melhor
manifestação na ambiência das lojas de varejo, espaço ao mesmo tempo de lazer e consumo.
Na sociedade descrita pelos autores pós-modernos, valoriza-se o individual, o privado,
aquilo que é "próprio eu". Busca-se, sobretudo, satisfação pessoal, prazeres intensos e
felicidade, vistos como finalidade última da existência. Acredita-se que todas as experiências
devem ser importantes, agradáveis, prazerosas, criativas e relevantes. Valoriza-se, portanto, a
experiência estética, na medida em que esta não possui a utilidade prática como a principal
função. Narcisistas e hedonistas, os indivíduos negam sua condição de "seres de falta",
preferindo acreditarem-se capazes de realizar todas as suas aspirações, ou seja, serem
onipotentes, completos, plenos, podendo ser tudo e obter prazer máximo. Ao se basear no
mito de que tudo que lhe falta pode ser encontrado nos objetos, os indivíduos passam a
consumir cada vez mais. Ressalta-se que, na visão dos autores estudados por Albino et. al.
(2009), a diferenciação que os indivíduos tanto procuram no ato de consumo acabam por
isolá-los, pois suas relações com os outros são muito mais significadas do que vivenciadas.
Da mesma forma, o consumo não representa uma expressão da originalidade dos indivíduos e
sim a uniformização de suas condutas e sua integração ao sistema.

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Segundo Albino et. al. (2009), os autores pós-modernos pecam, muitas vezes, em sua
fundamentação sociológica e empírica, sobressaindo-se o que Barbosa (2004) denomina
critica moralizante. Dessa forma, a sociedade que emerge da sua análise apresenta
caracteríticas que são tidas como dados indiscutíveis. Da mesma forma, o significado e o
papel do consumo na vida cotidiana das pessoas é generalizado, desconsiderando-se os
diferentes tipos de consumo, grupos sociais e os múltiplos significados que as práticas de
consumir assumem para diferentes indivíduos e sociedades. Com relação à liberdade de
escolha, por exemplo, pode-se dizer que esta não acontece em um vácuo cultural, pois
variáveis como, por exemplo, gênero, classe social, faixa etária, dentre outras, delimitam
parâmetros a partir dos quais os indivíduos realizam suas escolhas. Da mesma forma, para
com Albino et. al. (2009), o indivíduo não “constrói” sua identidade por meio do consumo,
mas, na maioria das vezes, se reconhece nos valores-signo projetados por determinadas
marcas, sendo que identidade e estilo de vida têm certa permanência no tempo, não sendo
trocados como se troca de roupa.
Ressalta-se, ainda, que, de acordo com Holt (2002), o significado dos objetos não pode
ser tido a priori da sua expressão no mundo, sendo construído pelas práticas de indivíduos
inseridos em determinados contextos sociais. Adicionalmente, esse autor argumenta que os
padrões de consumo são expressos por meio de regularidades nas práticas de consumo e não
no consumo regular de determinados objetos. Para o autor, “os estilos de vida são construções
sociais, pois estes são sempre um fenômeno ideográfico estruturado por uma configuração
particular de coletividades inseridas em um contexto sócio-histórico” (HOLT, 1997, p.341).
Em função disso, ele defende que a análise dos estilos de vida necessita ir além do estudo de
modelos de consumo para investigar as fronteiras simbólicas que são construídas e mantidas a
partir destes modelos.

B – Revendo a Concepção de Sujeito e Identidade


Tendo em vistas as críticas apresentadas no tópico anterior, Albino et. al. (2009)
sugerem que seja feita uma revisão das bases ontológicas que a sustentam as pesquisas sobre
cultura de consumo, especialmente as concepções de sujeito e identidade. Nesse sentido, os
autores recuperam as contribuições de Gonzáles Rey (2004; 2005 a e b), que, mesmo não
tendo estudado especificamente o consumo, estabece importante fundamentação para se
compreender o consumidor enquanto sujeito histórico, ativo e desejante. As principais
conclusões desses autores encontram-se no quadro abaixo:
Observa-se, portanto, que, na abordagem de Gonzáles Rey (2005a), a psique é
representada como um espaço ontológico ao mesmo tempo complexo, sistêmico, dialógico e
dialético, sendo que a constituição do sujeito dentro da subjetividade social não é um processo
que segue uma trajetória universal, definida de forma unilateral pelas características dos
espaços sociais dentro dos quais os indivíduos vivem. A concepção de sujeito defendida por
esse autor é a de um sujeito que luta permanentemente contra as formas de “sujeitamento”
social, tentando fazer valer suas opções individuais. Ressalta-se que a ação dos sujeitos
dentro do contexto social não deixa marcas imediatas nesse contexto, mas é correspondida por
inúmeras reações dos outros integrantes desse espaço social, podendo, no conjunto, atuar
tanto como momentos de crescimento social e individual ou como momentos de repressão.

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Quadro 1
Pressupostos – Gonzáles Rey (2004, 2005a e b)

SOBRE SUJEITO E IDENTIDADE


• o sujeito passa a ser compreendido como sujeito histórico, ativo, desejante e cidadão;
• a constituição do sujeito se dá por meio de configurações subjetivas que não lhe são conscientes,
assim como por projetos, reflexões e representações que ele produz de forma consciente e que têm
capacidade de subjetivação;
• a constituição do sujeito dentro da subjetividade social não é um processo que segue uma trajetória
universal, definida, de forma unilateral, pelas características dos espaços sociais dentro dos quais os
indivíduos vivem;
• o sujeito se exerce na legitimidade de seu pensamento, de sua reflexão e das decisões por ele
tomadas, não sendo transcendental, nem apenas racional;
• o sujeito representa o indivíduo subjetivado, produtor de sentidos por meio das configurações
subjetivas que caracterizam sua personalidade, imerso de forma permanente em contextos nos quais
atua e se expressa;
• propõe-se a unidade entre o social e o psicológico, rompendo-se com a divisão mecanicista da
externalidade de um em relação ao outro;
• a formação social da psique passa a ser vista como um processo de produção (de sentido de si) e não
de interiorização
• o Imaginário possui caráter fundante, sendo que o Simbólico depende das contínuas reconfigurações
do Imaginário, provocadas por condições histórico-culturais diferentes;
• como o Imaginário se reconfigura continuamente, defende-se sua capacidade generativa de novos
sentidos subjetivos diante de novas condições de vida;
• os sujeitos estão ativamente implicados e interpretam criativamente as formas simbólicas e culturais
em que estão inseridos à luz de sua atividade representacional;
• o campo social não exerce um impacto unificado sobre a psique, pois, mesmo a realidade atuando de
forma integral sobre o sujeito, o sentido dessa realidade depende das necessidades de cada sujeito, de
sua ideologia, de suas aspirações, conformadas em seu próprio desenvolvimento histórico;
• o sujeito capta os elementos da situação e constrói seus próprios tipos de referências práticas e
teóricas, sem adotar uma postura de total dependência de poderes no nível econômico, do saber ou
técnico;
• o sujeito representa a possibilidade de particularização dentro dos processos normativos de toda a
sociedade, sendo que é nesse processo de singularização que o indivíduo se converte em sujeito de
criação e ruptura, em agente intencional do desenvolvimento social, de mudanças sociais;
• a identidade pessoal é, ao mesmo tempo, um produto da sociedade e um produto da ação do próprio
indivíduo, devendo ser entendida como o sentido de reconhecimento que o sujeito experimenta no
curso irregular e contraditório de suas próprias ações;
• a identidade pessoal não é uma formação intrapsíquica, mas uma dimensão subjetivada do sujeito que
só aparece na confrontação com novas experiências que o ameaçam em sua possibilidade de
identificá-las como próprias;
• logo, a identidade se forma na confluência de uma série de forças sociais que operam sobre o
indivíduo e diante das quais ele atua e se faz a si mesmo, não sendo, portanto, uma entidade;
• a personalidade é compreendida como o sistema auto-regulador da experiência história de sujeitos
concretos;
• ao atuar sobre as forças sociais, o indivíduo gera uma realidade e a conhece como tal, porém a ação
só se torna possível pelas forças sociais que se renovam no indivíduo;
• a consciência não se constitui como instância da razão;
• consciente e inconsciente são dois momentos diferentes da experiência subjetiva que se constituem
dentro de uma nova unidade, que são os sentidos subjetivos;
• a consciência é a organização processual por meio da qual o sujeito participa intencionalmente dos
processos de sua vida, implicando na organização de sua própria linguagem, na reflexão, na
elaboração de projetos e na constituição de sua filosofia de vida, de suas crenças e representações;
• o sujeito é consciente dentro da própria processualidade da sua constituição subjetiva inconsciente.
Fonte: elaborado a partir de Albino et. al. (2009)

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C - Cultura do Consumidor na Abordagem da CCT
Arnould e Thompson (2005) conceituam cultura do consumidor como um sistema
interconectado de imagens, textos e objetos comercialmente produzidos para desenvolver um
senso coletivo de seus contextos e orientar a vida e as experiências dos indivíduos. Informam,
ainda, que o surgimento da Teoria da Cultura do Consumidor (CCT – Customer Culture
Theory), na década de 80, promoveu mudanças significativas nos estudos sobre cultura do
consumidor, antes baseados na investigação de aspectos contextuais, simbólicos e
experenciais do consumo de forma predominantemente racionalista. Essa perspectiva teórica
propõe modificações como a segmentação de mercado por estilo de vida e mudanças na
concepção de identidade de marca. Além disso, passa a conceber o consumidor como agente
ativo e participante, capaz de transformar os valores simbólicos difundidos pela comunicação,
sendo este compreendido como estando inserido em uma rede de contextos que influenciam
sua práticas de consumo. Visão muito próxima da apresenta no tópico anterior, baseada nas
contribuições do psicólogo social Gonzáles Rey (2004; 2005 a e b).
Arnould e Thompson (2005) propõem a análise do consumo a partir de quatro
programas de pesquisa. O primeiro deles, denominado “Projeto de Identidade do
Consumidor”, entende o consumidor como co-produtor do sentido das mensagens
promocionais a que são expostos, constituindo, simultaneamente, nesse processo sua própria
identidade e a identidade das marcas que consome. Neste contexto, os autores afirmam que “o
mercado se tornou uma fonte preeminente de recursos míticos e simbólicos (...)”, por meio
dos quais os consumidores constroem narrativas pessoais de identidade (ARNOULD,
THOMPSON, 2005). Por sua vez, o segundo programa de pesquisa, denominado “Culturas
de Mercado”, compreende o consumidor como “produtor de cultura” e não apenas como um
indivíduo passivo que absorve cultura, como se acreditava nas teorias anteriores. Assim,
“consumidores forjam sentimentos de solidariedade social e criam uma cultura mundial
distintiva, fragmentada, self-selected e, às vezes, transitória a partir da busca por interesses de
consumo em comum” (ARNOULD, THOMPSON, 2005, p.873). Segundo os autores, as
transformações decorrentes da industrialização mundial e da globalização, tiveram um papel
definitivo na busca dos consumidores por diferenciação e autonomia em suas escolhas de
“lifestyles”. Assim, cada vez mais os consumidores se identificam com outros que buscam o
mesmo estilo de vida, criando-se, assim, comunidades de marca.
O terceiro programa, denominado “Configuração Sócio-histórica do Consumo” por
Arnould e Thompson (2005), analisa as estruturas institucionais e sociais que influenciam o
consumo, como, por exemplo, classe social, sexo, etnia e comunidades às quais os
consumidores pertencem. Ou seja, busca-se compreender a relação entre experiências,
práticas, relacionamentos e crenças pessoais que interferem no comportamento dos sujeitos
vistos como consumidores. Por fim, o quarto programa, “Ideologias de Mercados de Massa e
Estratégias Interpretativas do Consumidor”, analisa o consumidor enquanto receptor e
produtor dos significados das mensagens emitidas pelos meios de comunicação de massa.
Ou seja, elas estudam as estratégias interpretativas dos consumidores, analisando-se tanto o
comportamento daqueles que aceitam tacitamente as representações dominantes, quanto
daqueles que se opõem de forma consciente às identidades e estilos de vida ideais projetados
pelas mídias de massa. Nesta abordagem teórica, argumenta-se que, por meio de narrativas,
layouts, designs, imagens e propagandas, os esforços comunicativos das organizações
acionam significados simbólicos e ideais culturais visando a conquista de seus públicos-alvo.
Porém, cabe ressaltar que os consumidores, vistos como agentes interpretativos ativos, são
capazes de re-inventar e re-interpretar as mensagens de forma a co-criá-las. A maneira como
levam a cabo esse processo será explicada no tópico “E” desse referencial teórico.
Desta forma, percebe-se que os pesquisadores que adotam a abordagem teórica da
CCT focam suas investigações nas formas como o mercado proporciona uma múltipla e

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heterogênea gama de recursos para que os consumidores construam identidades individuais e
coletivas. Ele se contrapõe, portanto, aos primeiros estudiosos da cultura do consumidor que a
avaliavam como “um sistema homogêneo e coletivamente compartilhado de significados,
modos de vida e valores unificadores compartilhados por um membro da sociedade”,
concentrando suas pesquisas nos aspectos contextuais, simbólicos e experienciais envolvidos
no processo de aquisição de produtos (ARNOULD E THOMPSON, 2005, p.869). os teóricas
dessa corrente acreditam que a CCT permite explorar a heterogeneidade da distribuição de
significados e a multiplicidade de agrupamentos culturais sobrepostos que existem dentro do
amplo contexto sócio-histórico da globalização e do capitalismo de mercado.
Nesse contexto, pode-se afirmar que a CCT enfatiza a fragmentação, pluralidade,
fluidez e hibridismo dos padrões de consumo e estilos de vida. Entretanto, não deixa de
considerar aspectos históricos e sociais influenciadores dos modos de vida dos consumidores,
entendendo a experiência dos consumidores como construída a partir de diferentes realidades
e compreendendo o consumo como uma forma de diferenciarem cada uma delas.

D – Cultura de Consumo e Práticasi de Branding


Segundo Holt (2002, p.80), de tempos em tempos, novos “paradigmas do branding”,
ou seja, novos conjuntos de princípios estruturadores das praticas de branding, orientam as
firmas em seus processos de construção de marcas. Por sua vez, os consumidores, ao se
acostumarem a esses “paradigmas”, acabam por desenvolver um maior poder de reflexão e
análise acerca dos mecanismos empregados regularmente pelo mercado, o que acaba por
desencadear um sentimento de repulsa pelas organizações que os utilizam. Dessa maneira,
quando os consumidores conseguem se desvencilhar e se distanciar das práticas vigentes em
uma época, o antibranding começa a crescer. Pode-se dizer, portanto, que sempre está
emergindo um processo de experimentação cultural fruto da dialética entre os “paradigmas do
branding” e a cultura do consumidor. Por cultura do consumidor, o autor entre “a infra-
estrutura ideológica que sustenta o que e como as pessoas consomem e determina as regras
básicas para as atividades de branding dos profissionais de marketing”.
Holt (2002) identifica três “paradigmas do branding”. O primeiro, denominado por ele
“paradigma moderno”, considera os profissionais de marketing como os responsáveis por
definirem e produzirem a identidade da organização, assim como os significados simbólicos
dos objetos de consumo. O autor afirma que os esforços da organização é que são vistos como
sendo responsáveis pela produção de sentido sobre a organização e suas marcas, ignorando-se
a relação da mesma com os consumidores. Estes são privados da capacidade de interpretação
autônoma dos objetos de consumo e das marcas, assim como da sua livre utilização. Esse
paradigma é visto como paternalista, uma vez que coloca as marcas em uma posição de
autoridade em relação aos consumidores. Na perspectiva teórica de Hatch e Schultz (1997,
2002 e 2003), os autores que se enquadram nessa abordagem são denominados primeira
corrente dos estudos de branding.
O segundo “paradigma do branding”, nascido em meados da década de 60 e
denominado “pós-moderno”, tem como principal alicerce o ponto de vista de que as marcas
são mais valiosas quando oferecidas aos consumidores não como projetos culturais
inflexíveis, mas sim como recursos culturais autênticos. Nessa abordagem, acredita-se que a
autenticidade das marcas só pode ser alcançada quando elas se mostram desinteressadas em
vender, não agindo agressivamente em termos comerciais. Porém, este paradigma vem
apresentando, segundo Holt (2002), contradições que ameaçam sua eficácia. As organizações,
ao competirem para construir suas marcas com técnicas “pós-modernas”, acabam perseguindo
agressivamente a busca pela autenticidade, o que faz com que essas técnicas se tornem
vulgares, afastando, assim, cada vez mais consumidores. Essa competição acirrada faz com
que a apregoada autenticidade perca seu valor, uma vez que todos a perseguem e procuram

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alcançá-la da mesma forma, por exemplo, por meio de patrocínios culturais, esportivos e
ações proclamadas como sendo de responsabilidade social.
No terceiro paradigma, o “Pós-Pós-moderno”, que, segundo Holt (2002, p.87), está
emergindo na contemporaneidade, as motivações comerciais das firmas não poderão mais ser
escondidas. Sendo assim, o autor afirma que a questão da autenticidade se redirecionará para
a concepção de “artista-cidadã”, ou seja, as marcas passarão a se constituir como produtoras
culturais, contribuindo diretamente para os projetos de identidade dos seus clientes por meio
da criação e veiculação de materiais culturais relevantes e originais. Assim, elas se tornarão
“outra forma de cultura expressiva, não diferente em princípio de filmes ou programas de
televisão ou bandas de rock”.

Paradigma Moderno Cultura Moderna


de Gestão de Marca dos Consumidores

Princípio: Engenharia Cultural


Odebiência à autoridade
Técnicas: Branding Científico cultural das marcas
Branding Freudiano Contradições
Autoridade = coerção
Nega a liberdade de escolha

Paradigma Pós-Moderno Cultura Pós-Moderna


de Gestão de Marca dos Consumidores

Princípio: Recursos Culturais Autênticos


Técnicas:Ironia “mascarada” Contradições Soberania pessoal
Proximidade aos epicentros culturais através das marcas
Posição desinteressada Compressão ao distanciamento
Branding furtivo, discreto irônico
A Sociedade Patrocinadora
Extinção da Autoridade
Desprendimento do verniz da marca
Inflação da soberania

Paradigma Pós Pós-Moderno Cultura Pós Pós-Moderna


de Gestão de Marca dos Consumidores

Princípio: Artista-Cidadão Cultivando o “eu”


através das marcas

Figura 01 – Modelo Dialético que articula Branding e Cultura de Consumo


Fonte: traduzido e adaptado de HOLT (2002, p.81)

Holt (1997) também afirma que o marketing tem dado muita atenção ao estudo de
padrões de consumo porque, geralmente, estes são utilizados como base para identificação e
análise de segmentos de mercado. Informa, ainda, que, desde os anos 60, as estratégias de
segmentação passaram a ser efetuadas por meio de novas técnicas, de forma mais flexível e
capaz de capturar as complexas e fragmentadas práticas de consumo que estavam emergindo
nas sociedades industriais daquela época.
Nesse contexto, o autor afirma que emergiram duas importantes correntes teóricas que
estudavam o consumo a partir da análise dos estilos de vida. Na primeira delas, denominada
por Holt (1997) “Pesquisa de Estilo de Vida baseadas em Valores/Personalidade”, os estilos
de vida são vistos como expressões de traços de personalidade, reflexos de estados
psicológicos internos que estruturam os comportamentos do indivíduo acerca das inúmeras
categorias de consumo. Acredita-se, também, que eles eram estruturados pelas diferenças
existentes entre diversos grupos sociais, no que diz respeito a valores universais. Por sua vez,
na segunda linha de pesquisa, denominada “Pesquisa sobre Significação do Objeto”, afirma-se
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que, ao consumir um objeto (mercadorias, atividades e eventos), o consumidor absorve
também um conjunto de significados associados a ele. Ressalta-se que uma importante classe
de significados que os objetos expressam socialmente são aqueles que representam as
categorias sociais (sexo, classe e raça).
Segundo Holt (1997), a análise a partir da “Pesquisa de Estilo de Vida baseadas em
Valores/Personalidade” descrevem as estruturas cognitivas de toda a população humana que
se relacionam com os padrões de consumo, sem se atentar à importância do contexto nas
compreensões culturais. Da mesma forma, a “Pesquisa sobre Significação do Objeto” sugere
uma visão de consumo fechada em que o significado se encontra no objeto, não sendo
constituindo na relação deste com os sujeitos-consumidores. O autor afirma, então, que essas
duas correntes apresentadas estão superadas e sugere uma nova teoria sobre padrões de
consumo, a qual denomina de “Análise Pós-estruturalista dos Estilos de Vida”.
Nesta perspectiva teórica, mantém-se a visão estruturalista das diferenças relacionais,
mas defende-se que os significados são principalmente constituídos a partir da maneira como
as pessoas agem em contextos sociais distintos. Os significados de um determinado objeto ou
ação são sempre construídos por meio da intertextualidade, de narrações metafóricas,
imagéticas e narrativas associadas a outros objetos e práticas culturais que fazem parte da
cultura da sociedade, acumulada historicamente. Ou seja, os significados de quaisquer objetos
ou atividades em particular são instáveis e contingenciais, uma vez que dependem de
associações feitas em diferentes contextos sócio-culturais.
Na abordagem proposta por Holt (1997), os padrões de consumo são expressos por
meio de regularidades nas práticas de consumo e não nos objetos consumidos. Essa teoria
compreende que objetos podem ser comprados por diferentes motivos e de diferentes
maneiras, possibilitando diversas interpretações e usos. Sendo assim, o autor afirma que
descrever padrões de consumo requer um foco nos modelos de práticas (que incluem
como os consumidores compreendem, avaliam, apreciam e usam os objetos de
consumo em contextos particulares), ao invés de simplesmente analisar padrões de
comportamento. (...) o fato de consumidores compartilharem padrões de consumo
não necessariamente envolve consumir os mesmos objetos (HOLT, 1997, p.334).
Segundo Holt (1997), as diferenças nos significados inerentes às praticas de consumo
servem como base para que certas pessoas se identifiquem com certas marcas ao mesmo
tempo em que se distanciam de outras, o que reforça as posições sociais. Ressalta-se que esses
padrões de consumo são variáveis conforme o contexto social em que estão inseridos, se
tornando alguns deles essenciais para a manutenção da organização das classes sociais,
enquanto outros apresentam menor importância no que diz respeito a essa função. Na sua
visão, os estilos de vidas são construídos coletivamente e não pelos sujeitos individualmente.
Estes se identificam com algum estilo de vida que emergiu em sua época e lhe confere uma
performance particular, coerente com sua trajetória pessoal e estrutura de personalidade.
Nesse contexto, Holt (1997) discorre sobre marcas que obtiveram sucesso com suas
práticas de branding e se tornam ícones, garantindo posição privilegiada no mercado por
muitos anos e fidelidade de seus clientes. Na sua visão, as marcas ícones são construídas a
partir de princípios completamente opostos daqueles utilizados pelo marketing tradicional.
Estas marcas não são vencedoras pelo fato de oferecerem benefícios distintos, serviços
confiáveis, tecnologias avançadas e inovadoras – apesar de ser possível que elas ofereçam
todos esses atributos –, mas sim por conseguirem alcançar uma conexão profunda com a
cultura de uma sociedade em uma dada época.
A competição entre marcas ícones ocorre, segundo Holt (1997), principalmente nas
categorias referentes a estilos de vida – como comida, roupas, álcool e automóveis – e se dá a
partir dos valores simbólicos estabelecidos junto a seus consumidores, e não por sua
performance técnica. De acordo com o autor, as marcas ícones se tornam poderosas ao

9
possibilitar que seus consumidores experienciem seus mitos, sendo que estes foram
construídos ao longo do tempo pela cultura social. Mitos, segundo Holt (2003, p.44), são
histórias simples com personagens e enredos ressonantes, que nos ajudam a dar um
sentido para o mundo. [As marcas ícones] provêem ideais para ditar nosso modo de
viver e trabalham com o objetivo de resolver as questões mais complicadas da vida.
Elas são poderosas porque nos transmitem mitos de uma forma tangível, fazendo
com que eles, assim, se tornem mais acessíveis.
Os mitos pretendem resolver tensões às quais as pessoas estão freqüentemente
expostas em função do confronto entre seus sentimentos, suas próprias vidas e a ideologia
dominante da sociedade em que estão inseridas. A ideologia, por natureza, apresenta
imperativos morais desafiadores, se baseando naquilo que a sociedade busca. Mas muitas
pessoas não vivem sobre este parâmetro social. As contradições decorrentes desta ideologia
social e suas experiências individuais geram ansiedade, fazendo emergir maior demanda por
mitos. Nesse contexto, Holt (2003) argumenta que as marcas ícones não objetivam
determinados segmentos de consumidores ou tipos psicográficos, mas focam os desejos e
ansiedades que estão presentes na sociedade e as conseqüências psicológicas dessa ideologia.
Enquanto a segmentação do mercado é crucial em muitos setores econômicos, as marcas
ícones têm como alvo, necessariamente, as massas. O autor afirma, ainda, que as marcas
ícones não imitam a cultura pop, mas sim a lideram. Eles criam visões carismáticas do mundo
para que as mudanças sociais deixem de ser confusas para os indivíduos e passem a fazer
sentido para eles.
Quando a ideologia se transforma e se reinventa, novas contradições são formadas,
gerando oportunidades para novas marcas que desejam se tornar ícones, podendo, também,
gerar dificuldades para aquelas que já o eram. Neste contexto, Holt (2003) argumenta que o
principal desafio para os publicitários é descobrir como re-inventar o mito já existente de uma
marca quando a mudança cultural ocorre. Os gerentes devem, portanto, aprender a antecipar a
formação de novas contradições na sociedade e selecionar aquela que melhor se alinha com a
autoridade política de sua marca.
O autor conclui que as abordagens tanto da “Pesquisa de Estilo de Vida baseadas em
Valores/Personalidade” quanto a da “Pesquisa sobre Significação do Objeto” falharam por
não levar em conta os ambientes sociais, culturais, econômicos, políticos e tecnológicos nos
quais os consumidores estão inseridos. Dessa forma, não permitiram analisar e conceituar
como ocorre a variação dos estilos de vida ao longo de diferentes épocas e sociedades, como
fazem as bem-sucedidas marcas icônicas.

E – Articulando Comunicação, Subjetividade e Cultura


Segundo Wolf (2002), por muito tempo a comunicação foi pensada como um processo
linear de transmissão de informação, assentada na unidirecionalidade de um código único
comum a emissor e receptor. Esse pensamento de viés matemático, cuja preocupação
fundamental era a engenharia de transmissão eficiente de sinais, não levava em conta o caráter
sócio-histórico da comunicação social, não contemplando, portanto, em sua análise o contexto
no qual o acontecimento emerge tampouco a compreensão dos sujeitos envolvidos neste
processo e seus papéis. Entretanto, na atualidade, o aparato teórico desenvolvido por Bakhtin
vem sendo muito explorado no sentido de compreender a comunicação em sua eventicidade e
unicidade. Faraco (2003) acredita, inclusive, que a preocupação desse autor em conceber a
linguagem em referência a e orientada pelo mundo da vidaii afasta a possibilidade de qualquer
razão teórica (ou modelo estruturante) dar conta de compreender as relações humanas,
sobretudo as que se referem às práticas comunicativas.
Na concepção bakhtiniana, de acordo com Faraco (2003), a abordagem da lingüística é
também considerada insuficiente para compreender os aspectos sócio-históricos da
comunicação, por enfocar o enunciado como um fenômeno exclusivo da língua, algo

10
puramente verbal, desvinculado do ato de sua materialização. Nas palavras de Kraemer (2003,
p.58), que também se apropriou do pensamento bakhtiniano, “a linguagem tem dimensões
dialógicas e ideológicas, que são historicamente determinadas. Toda palavra tem intenções,
significados; para entender o discurso (...) o contexto precisa ser entendido”. Acrescentando,
Machado (2005) informa que coube à lingüística legitimar o modelo de transmissão da
informação, consolidado pela matemática, para a compreensão do processo de transmissão de
mensagens na esfera sócio-cultural, consagrando, assim, um diagrama espacial unidirecional
em que emissor e receptor compartilham o mesmo código e estão posicionados em papéis
distintos e invariáveis. Apesar de este modelo ter sido amplamente utilizado pelas teorias da
comunicação (teorias dos meios e mediações; análise do discurso; estudos de recepção,
planejamento e marketing; branding e linguagem publicitária, entre outras), ele
indelevelmente reduz as noções de código, de recepção e, sobretudo, sua dimensão semiótica
– aquela da produtividade sígnica capaz de construir códigos em ambientes culturais.
Na visão de Bakhtin e Voloshinov (1979), a comunicação social, para ser
compreendida enquanto fenômeno humano, necessita de um pensamento reflexivo sobre as
práticas vividas nos âmbitos sociais de interação e produção de sentidos possibilitados por ela.
Nesse sentido, Escosteguy e Jacks (2005), assim como Piedras (2006), destacam a
contribuição dos Estudos Culturais para o campo da Comunicação, pois, para elas, essa linha
de pesquisa trouxe o maior entendimento ao relacionar comunicação e cultura, texto e
contexto, ponderando tanto as práticas como as estruturas e os aspectos micro e macro.
Dentro perspectiva dos Estudos Culturais, Hall (2003) propõe pensar a comunicação
como um processo de criação de conexões, de articulação, estando inserida em contextos
sociais únicos de interação. Essa noção contribui para contextualizar as práticas
comunicativas e pensá-las no âmbito de suas distintas práticas, explorando a vinculação delas
com a estrutura social. Esse autor também propõe uma forma de pensar a relação entre as
práticas e a estrutura em termos de uma dupla articulação, ou seja,
(...) a estrutura – as condições dadas de existência, a estrutura das determinações em
qualquer situação – pode também ser compreendida, de outra perspectiva, como
simples resultado de práticas anteriores (...) anteriormente estruturadas. (...) A
prática é a forma como uma estrutura é ativamente reproduzida (HALL, 2003,
p.167).
Assim, o autor infere que a estrutura, além de ser resultado de práticas sociais,
constitui o início necessário para concebê-las. Dessa maneira, não se pode pensar a prática
sem a existência de uma estrutura que a delimita, sendo que, para se realizar alguma coisa,
baseia-se em algo anteriormente estruturado. As estruturas, segundo o autor, exibem
tendências que representam linhas de força, aberturas ou fechamentos que moldam as práticas
com a intenção de determinar. Entretanto, elas não podem definir as práticas, por não
possuírem o poder de fixar o que pretendem inferir. Essa forma de conceber a articulação
entre prática e estrutura exige que se contextualize a comunicação no âmbito de suas diversas
práticas, estudando a conexão delas com a estrutura social.
Nesse contexto, Piedras e Jacks (2005) apontam os Estudos Culturais como uma
perspectiva que viabiliza a construção de uma abordagem teórica sobre o processo e a cultura
da comunicação capaz de envolver as estruturas da produção, da recepção e de seus discursos
em um único cenário, permitindo explorar suas inter-relações. Possibilita, ainda, compreender
a comunicação sem determinismos econômicos ou idealismos culturais, permitindo explorar,
sem ambigüidades, as relações correspondentes e contraditórias que envolvem a articulação
das práticas de produção, e de recepção e a sua forma cultural. Na visão de Ecosteguy e Jacks
(2005), na abordagem dos Estudos Culturais, os sujeitos-receptores se engajam com os meios
de comunicação dentro de determinados contextos e hábitos cotidianos e elaboram e
vivenciam sentidos, tanto em relação aos meios em si, quanto às suas mensagens.

11
Bakhtin e Voloshinov (1979), ao tratarem da relação dialógica estabelecida no ato
discursivo, afirmam que ela está condicionada a relações entre índices sociais de valor. Em
outras palavras, o ato comunicativo é de natureza conflitante e dialética, acontecendo entre
sujeitos que assumem posições valorativas diante da mensagem. Segundo Faraco (2003, p.
48-49), “(...) como a significação dos signos envolve sempre uma dimensão axiológica, nossa
relação com o mundo é sempre atravessada por valores”. Ressalta-se que esta tomada de
posição axiológica diante do texto, segundo o autor, é o que permite a atitude ativamente
responsiva, o confronto, a acolhida, a confirmação ou a rejeição à palavra do outro,
instaurando relações de sentido que geram significações a partir deste encontro de posições
avaliativas. As relações dialógicas – relações entre índices sociais de valor – são, portanto,
“parte inerente de todo enunciado, entendido este não como unidade da língua, mas como
unidade da interação social; não como um complexo de relações entre palavras, mas como um
complexo de relações entre pessoas socialmente organizadas” (FARACO, 2003, p.64).
Nessa perspectiva, “compreender não é um ato passivo (um mero reconhecimento),
mas uma réplica ativa, uma resposta, uma tomada de posição diante do texto” (FARACO,
2003, p.71). O processo compreensivo não é, portanto, uma mera decodificação de uma
mensagem, mas uma resposta a um signo por meio de outros signos, o que evidencia a
dimensão semiótica da comunicação. Dessa forma, enquanto o pensamento de Hall (2003 e
2007) contextualiza as práticas comunicativas dentro do âmbito de suas distintas práticas,
explorando a vinculação delas com a estrutura social, o pensamento de Bakhtin e Voloshinov
(1979) estabelece a correlação estreita entre o enunciado e a situação concreta da sua
enunciação, bem como entre o significado do enunciado e uma atitude avaliativa.

F - Apropriação Dialógica de Sentidos pelos Consumidores


No bojo da discussão acima apresentada, percebe-se a necessidade da pesquisa em
ciências humanas pensar a comunicação em uma perspectiva interativa e construtiva,
concebendo-a como um processo que emerge do conflito entre posições valorativas. Trata-se,
portanto, de sujeitos históricos e ativos, envolvidos em relações dialógicas únicas de
significação, sempre articuladas a contextos culturais de recepção, sendo a comunicação
capaz de criar mundos humanos. Nesse contexto, cabe resgatar o framework proposto por
Thompson e Haytko (1997), denominado, “Modelo Dialógico de Apropriação de Sentidos”.
Com base na linha de pesquisa da CCT denominada “Ideologias do Mercado de Massa
e Estratégias Interpretativas do Consumidor”, Thompson e Haytko (1997) realizam estudo
com o objetivo de analisar como os consumidores se apropriam dos discursos da moda e os
reproduzem transformando sua própria cultura e concepção de identidade dentro de um
determinado grupo social. Como resultado, os autores apontam que
um uso proeminente do discurso da moda pelos consumidores é o desenvolvimento
de um senso de identidade pessoal por meio do contraste entre sua orientação
percebida sobre moda e aquela dos outros do seu grupo social. Por meio dessa lógica
de construção da auto-identidade, o senso de ‘quem eu sou’ é constantemente
definido e redefinido através do contraste percebido com os outros (THOMPSON,
HAYTKO, 1997, p.21).
Além dessa constatação mais genérica, Thompson e Haytko (1997) fizeram menção a
duas formas de apropriação da identidade por meio da moda. A primeira delas é o uso
metonímico, no qual a pessoa não vê a moda apenas como símbolos que a definem com uma
identidade em particular, mas que lhe permite fazer parte de um grupo social delimitado por
meio daqueles símbolos. Contrariando o uso metonímico, onde o indivíduo usa a moda e seus
símbolos para fazer parte de um determinado grupo, tem-se outro uso que é o da aceitação
social. Nesse tipo de uso, as pessoas esperam ver o que está nas ruas para que possam usar
também, pois querem ser aceitas pela sociedade. Ou seja, o desejo dessas pessoas não é o de
associar sua identidade com o pertencimento a um grupo, mas sim o de ser aceita por não

12
contrariar as regras. Existem, ainda, segundo os autores, aqueles que se “vestem para a
ocasião”, ou seja, acreditam que devem se portar e se vestir de acordo com o evento social
que irão participar. Esses usam a moda como uma metáfora que transmite, por meio de seus
símbolos, tudo aquilo que acreditam ser necessário para estar ali e fazer parte daquele grupo,
naquele momento. Esses resultados reforçam as perspectivas de Fooley (1893) sobre a
demanda intersubjetiva; as de Simmel (1957) sobre a dualidade entre as forças socializantes e
as individualizantes, assim como as de Blumer (1969) sobre o desejo de “estar na moda”.
Outro importante aspecto ressaltado pela pesquisa de Thompson e Haytko (1997) foi
como os discursos da moda repercutem de forma diferente entre homens e mulheres.
Enquanto as mulheres se envolvem muito mais com o mundo da moda, revistas, modelos,
passarelas etc., os homens estabelecem uma relação muito mais superficial com ela. Assim,
indivíduos do sexo masculino tendem a avaliar o vestuário a partir de critérios eminentemente
funcionais, ligados, principalmente, às práticas sociais relacionadas ao trabalho e sua posição
dentro da organização enquanto as mulheres priorizam aspectos estéticos.
No modelo apresentado na figura 02, fruto da pesquisa de Thompson e Haytko (1997),
percebe-se duas influências agindo sobre o indivíduo dentro da estrutura macro-social: o
discurso da moda e os outros discursos culturais. Esses discursos são recebidos pelo
consumidor, que os interpreta, gerando um sentido particular. Sentido este constituído a partir
das suas preferências em termos de estilo de vida, história pessoal, objetivos de vida, suas
referências pessoais, seu cotidiano, enfim, do seu habitus. Esse sentido, assim produzido, irá
constituir sua identidade social e pessoal.

Figura 02 – Modelo Dialógico de Apropriação de Sentidos pelos Consumidores


Fonte: Traduzido de THOMPSON e HAYTKO (1997, p.37).

Com base nessa pesquisa de Thompson e Haytko (1997), pode-se afirmar que a
formação da identidade do consumidor, em especial o de moda, se dá dentro de contextos
socioeconômicos específicos e vai sendo construída ao longo das interações sociais que o
indivíduo estabelece dentro dos grupos que participa. Algumas pessoas procuram modelar sua
identidade a partir das referências do grupo, outras simplesmente querem ser aceitas na

13
sociedade e ainda existem aquelas que pretendem mostrar uma identidade de rejeição à moda.
Os indivíduos se apropriam de valores e símbolos da vida cotidiana, como estilos de vida,
preferências, objetivos e os transferem para sua forma de vestir.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este ensaio apresentou e discutiu teorias contemporâneas sobre cultura de consumo,
comunicação e práticas de branding, demonstrando sua maior robustez, principalmente
quando comparadas com as abordagens de autores tanto positivistas quanto pós-modernos.
Seu objetivo foi contribuir para a superação das bases filosóficas geralmente adotadas por
autores pertencentes ao mainstream dos campos do Marketing, Consumo, Comunicação e
Branding. Visou, também, propor novas bases ontológicas para subsidiar pesquisas que
tenham por objetivo compreender como os consumidores produzem sentido e se apropriam de
bens e discursos veiculados, principalmente, por marcas ícones.
Nesse sentido, foi proposto, em consonância com a CCT, que o construto “cultura de
consumo” seja compreendido “a infra-estrutura ideológica que sustenta o que e como as
pessoas consomem e determina as regras básicas para as atividades de branding dos
profissionais de marketing’ (HOLT, 2002, p.80). Já o consumidor passa a ser concebido como
um sujeito desejante, histórico, ativo e participante, capaz de transformar os valores
simbólicos difundidos pela comunicação. Inserido em uma rede de contextos e relações nem
sempre coerentes entre si e que influenciam suas práticas de consumo, ele se torna co-
produtor do sentido das mensagens promocionais a que está exposto, constituindo,
simultaneamente, nesse processo sua própria identidade e a identidade das marcas que
consome. Logo, ele é “produtor de cultura” e não um indivíduo passivo que absorve cultura.
Os sujeitos não “constroem” sua identidade por meio do consumo, mas, na maioria das
vezes, se reconhecem nos valores-signo projetados por determinadas marcas. Além disso,
identidade e estilo de vida têm certa permanência no tempo, não sendo trocados como se troca
de roupa. Ressalta-se que os significados de um objeto particular são sempre construídos pela
associação narrativa, imagética e metafórica com outros objetos e práticas culturais de uma
coletividade e não isoladamente. Logo, seu significado não pode ser tido a priori da sua
expressão no mundo, sendo construído pelas práticas de sujeitos inseridos em determinados
contextos sociais. Logo, ele é instáveis e contingente, uma vez que dependem de associações
feitas em diferentes contextos sócio-culturais e épocas.
Os consumidores forjam sentimentos de solidariedade social e criam uma cultura de
consumo distintiva, fragmentada, self-selected e, às vezes, transitória a partir da busca por
interesses de consumo em comum. Por sua vez, o mercado fornece recursos míticos e
simbólicos, por meio dos quais os consumidores constroem narrativas tanto pessoais quanto
coletivas de identidade. Ressalta-se que as estruturas institucionais e sociais, como, por
exemplo, classe social, sexo, etnia e comunidades às quais os consumidores pertencem ou
almejam ingressar, certamente, influenciam o consumo, mas não o determinam.
Os esforços comunicativos das organizações acionam significados simbólicos e ideais
culturais visando conquistar seus públicos-alvo, utilizando, para tanto, narrativas, layouts,
designs, imagens e propagandas. Entretanto, os consumidores são agentes interpretativos
ativos e capazes de re-inventar e re-interpretar essas mensagens, podendo-se, portanto,
afirmar que eles são co-autores do sentido das mensagens.
Nesse contexto, ressalta-se que os padrões de consumo são expressos por meio de
regularidades nas práticas de consumo e não nos objetos consumidos, sendo que os objetos
podem ser comprados por diferentes motivos e de diferentes maneiras, possibilitando várias
interpretações e usos. Logo, descrever e analisar padrões de consumo requer um foco nos
modelos de práticas (que incluem como os consumidores compreendem, avaliam, apreciam e

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usam os objetos de consumo em contextos particulares), ao invés de simplesmente analisar
padrões de comportamento.
Os consumidores se identificam com outros que buscam estilos de vida semelhantes
aos seus, criando-se, assim, comunidades de marca. Entretanto, o fato dos consumidores
compartilharem padrões de consumo não necessariamente envolve consumir os mesmos
objetos. Logo, a análise dos estilos de vida necessita ir além do estudo dos comportamentos
de consumo para investigar as fronteiras simbólicas que são construídas e mantidas a partir
destes comportamentos. Ressalta-se que os estilos de vida são construções sociais, pois estes
são sempre fenômenos ideográficos estruturados por uma configuração particular de
coletividades inseridas em um contexto sócio-histórico.
Ao compreender os consumidores e seus padrões de consumo dentro desta
perspectiva, as marcas passarão a se constituir como produtoras culturais, contribuindo
diretamente para os projetos de identidade dos seus clientes por meio da criação e veiculação
de materiais culturais relevantes e originais. Elas não imitarão a cultura pop, outrossim criarão
visões carismáticas do mundo para que as mudanças sociais deixem de ser vistas como sendo
confusas e passem a fazer sentido para seus clientes. Serão vencedoras aquelas que não
apenas oferecerem benefícios distintos, serviços confiáveis, tecnologias avançadas e
inovadoras, mas sim aquelas que conseguirem alcançar uma conexão profunda com a época e
a cultura da sociedade em que atuam. Em função disso, os gerentes devem aprender a
antecipar a formação de novas contradições na sociedade e selecionar aquela que melhor se
alinha com a autoridade política de sua marca Portanto, relegam-se à história as práticas de
branding baseadas na abordagem da “engenharia cultural”.
Nesse contexto, pode-se dizer, também, que o paradigma clássico da comunicação,
que supunha que a linguagem se referisse ao mundo, tendo uma dimensão apenas
representacional, assumindo apenas a função de transmitir mensagens “daqui” para “ali”, não
se aplica mais. Esta concepção foi superada pelas noções construtivas da linguagem e da
comunicação. Segundo Pearce (1996, p.176), “dizer como algo se chama não é simplesmente
nomeá-lo ou falar sobre isso: é, num sentido muito real, convocá-lo a ser como foi nomeado”.
Logo, a função da comunicação, nesta perspectiva, é a de construir mundos humanos, não
simplesmente transmitir mensagens de um lugar a outro. Ela assume, portanto, a
potencialidade não só de refletir (um decalque do mundo), mas também, e principalmente, a
de refratar o mundo.
Ao se compreender a comunicação como um processo de criação de conexões, de
articulação, ocorrendo em contextos sociais únicos e institucionalizados de interação,
percebe-se não ser possível desvincular os enunciados dos atos de sua materialização, pois
estes não são atos puramente lingüísticos. Ressalta-se que as estruturas exibem tendências que
representam linhas de força, aberturas ou fechamentos que moldam as práticas
comunicacionais com a intenção de determinar. Entretanto, elas não podem definir as práticas,
por não possuírem o poder de fixar o sentido.
Assim, pode-se dizer que os sujeitos-receptores se engajam com os meios de
comunicação dentro de determinados contextos histórico-culturais e hábitos cotidianos e,
neles, elaboram e vivenciam sentidos, tanto em relação aos meios em si, quanto às suas
mensagens. Como o ato comunicativo é de natureza conflitante e dialética, acontecendo entre
sujeitos que assumem posições valorativas diante da mensagem, a produção de sentido
envolve sempre uma dimensão axiológica. E é esta tomada de posição axiológica diante do
texto que permite a atitude ativamente responsiva, confronto ou confirmação, à palavra do
outro, instaurando relações de sentido que geram significações a partir deste encontro de
posições avaliativas.
Pode-se afirmar, portanto, que a comunicação, na sua eventicidade e unicidade,
viabiliza o diálogo, agenciando a troca interativa e não a mera transmissão de mensagens,

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sendo que os participantes da cena interativa – emissor e receptor – não estão posicionados
em função de papéis definidos, mas são agentes, sujeitos de linguagem, cuja ação primordial é
a produção de signos graças à circulação da linguagem. Ressalta-se que as relações dialógicas
– relações entre índices sociais de valor – são parte inerente de todo enunciado, entendido este
não como unidade da língua, mas como unidade da interação social; não como um complexo
de relações entre palavras, mas como um complexo de relações entre pessoas socialmente
organizadas Concluindo, pode-se afirmar que o processo compreensivo, assim como o
processo de compra, não resulta de uma mera decodificação de mensagem comerciais, mas
constitui-se como uma resposta a um signo por meio de outros signos, o que evidencia a
dimensão semiótica da comunicação. Logo, compreender (ou consumir) não é um ato passivo
(um mero reconhecimento), mas uma réplica ativa, uma resposta, uma tomada de posição
diante do texto (ou do mundo).

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WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença, 2002.

i
Acreditamos ser mais adequado uso do termo “práticas de branding” e não o de paradigmas do branding”,
expressão utilizada por Holt (2002). Entretanto, ao longo desse tópico mantivemos a nomenclatura por ele
utilizada, usando aspas para assinalar nossa discordância.
ii
Por mundo da vida, entende-se “o mundo da historicidade viva, o todo real da existência de seres históricos
únicos que realizam atos únicos e irrepetíveis, o mundo da unicidade irrepetível da vida realmente vivida e
experimentada” (FARACO, 2003, p.19).

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