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AF NCPI-WP n5 2019 Online v2
AF NCPI-WP n5 2019 Online v2
Impactos da
Estratégia Saúde
da Família e
Desafios para o
Desenvolvimento
Infantil
COMITÊ CIENTÍFICO ESTUDO
NÚCLEO CIÊNCIA PELA INFÂNCIA
ESTE DOCUMENTO
FOI PREPARADO POR
PESQUISADORES BRASILEIROS
DE DIVERSAS ÁREAS DO
CONHECIMENTO, MEMBROS DO
COMITÊ CIENTÍFICO DO NÚCLEO
CIÊNCIA PELA INFÂNCIA (NCPI).
TRATA-SE DO QUINTO ESTUDO
DE UMA SÉRIE QUE ABORDA
TEMAS RELEVANTES PARA
O DESENVOLVIMENTO
NA PRIMEIRA INFÂNCIA.
O NÚCLEO CIÊNCIA PELA INFÂNCIA (NCPI) é uma iniciativa colaborativa que
produz, traduz e dissemina o conhecimento científico sobre o desenvolvimento
na primeira infância, com o intuito de fortalecer e qualificar programas e políticas
públicas que impactem positivamente crianças brasileiras em situação de
vulnerabilidade social.
O NCPI é composto por seis organizações: Fundação Bernard van Leer, Center
on the Developing Child e David Rockefeller Center for Latin American Studies,
ambos da Universidade de Harvard, Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal,
Insper, e Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
O Comitê Científico do Núcleo Ciência Pela Infância é O conteúdo deste estudo é de responsabilidade dos
composto por pesquisadores brasileiros de diferentes autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões das
áreas, como medicina, enfermagem, neurociência, organizações membros do Núcleo Ciência Pela Infância.
psicologia, economia, políticas públicas e educação.
SUGESTÃO DE CITAÇÃO
O objetivo principal do trabalho desse grupo é Comitê Científico do Núcleo Ciência Pela Infância (2019).
identificar temas-chave que possuem maior impacto Estudo nº V: Impactos da Estratégia Saúde da Família
sobre o desenvolvimento infantil e, assim, sintetizar, e Desafios para o Desenvolvimento Infantil.
analisar e produzir conhecimento científico que http://www.ncpi.org.br
contribua com a formulação, o fomento e a melhoria
de programas e políticas a favor da criança. REDAÇÃO
ISBN: 978-85-61897-25-3
A ESF foi
planejada para
contribuir com
a ampliação do
primeiro acesso
aos serviços de
saúde no SUS
Suas equipes
estão em
98,4%
dos 5.570
MUNICÍPIOS
BRASILEIROS
*Renda mensal per capita média de R$ 250, que variou entre R$ 138 (áreas rurais dos estados
da região Norte) e R$ 516 (Região Metropolitana de São Paulo). Referência: 4º trimestre de 2017.
A redução
da taxa de
mortalidade
A REDUÇÃO DA TAXA DE MORTALIDADE NO BRASIL infantil no mundo
foi de 49,2% em
um intervalo
de 25 anos
No segundo ano de (de 1990 a 2015)
atuação da ESF em um
município, a taxa de Após
mortalidade infantil se No terceiro oito anos,
reduz em média entre ano, a redução a taxa
3% e 9% em relação à taxa fica entre cai entre
do período anterior à ESF 6,7% e 14% 20% e 34%
2º 3º 8º
ano ano ano
O SUS ATENDIMENTO
FONTES: http://www.saude.gov.br/sistema-unico-de-saude. *Cálculo com base na população brasileira em 2017 (207 milhões de pessoas): 57%.
http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-08/ja-somos-mais-de-207-milhoes-de-habitantes-segundo-o-ibge.
FONTE: http://www.saude.gov.br/acoes-e-programas/saude-da-familia.
EQUIPES à expansão territorial, nos primeiros dez anos, a ESF apresentou uma forte
da ESF atuam expansão pelos municípios brasileiros e em 2004 abrangia 88% deles,
no Brasil
como mostra a Figura 1.
100%
5.480
MUNICÍPIOS 80%
contam com
equipes da ESF
60%
DA POPULAÇÃO
atendida pelas 40%
equipes da ESF:
20%
0%
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
ENTRE POBRES,
cobertura chega a
73% FONTE: Datasus. Elaboração própria. Considerou-se um município coberto pela ESF quando possui ao menos uma
equipe da ESF. Para lidar com a variação no número de municípios ao longo do tempo, trabalhamos com Áreas
Mínimas Comparáveis (AMC), que totalizam 4.267 em cada ano.
O TRABALHO DA ESF
era a taxa de
pobreza entre
crianças em 2018* FIGURA 2 – Proporção de Pobres na População
60%
*IBGE
https://g1.globo. Com a recessão
com/economia/ econômica entre
noticia/2018/12/09/ 50% 2014 e 2016, as
brasil-tem-52-milhoes- taxas de pobreza
de-criancas-na-extrema- voltam a aumentar
pobreza-e-182-milhoes-na-
pobreza.ghtml 40%
30%
0%
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
Crianças Total
FONTES: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE); Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua (PNADC/IBGE). Elaboração própria. Proporção de pobres calculada com base em dados da
PNAD e da PNADC e em linhas de pobreza estabelecidas a partir de cestas de consumo regionalizadas por ROCHA
e FRANCO19 A área cinza representa o período de recessão econômica, conforme datado por CODACE23.
Em 2017
havia um
17%
29%
total de 18,5 (5,4 milhões) viviam
milhões de 29%
em domicílios pobres*
crianças de
0 a 6 anos
das quais:
41%
(7,6 milhões)
em domicílios com
alguma restrição de
acesso a saneamento
61%
37%
41%
*Renda mensal per capita média de R$ 250, que variou entre R$ 138 (áreas rurais dos estados da região Norte)
e R$ 516 (Região Metropolitana de São Paulo). Referência: 4º trimestre de 2017.
Outro dado relevante é de que entre as crianças pobres, 38% (3,3 milhões)
viviam em domicílios que não recebiam nenhum tipo de benefício ou
transferência de programas sociais e que estavam, portanto, sem nenhum
tipo de proteção do Estado. Para muitas das crianças e famílias em situação
de alta vulnerabilidade, o SUS é um dos poucos serviços públicos disponíveis,
já que dificilmente elas teriam acesso a serviços privados. Nesse sentido, o
SUS cumpre o papel vital de fornecer acesso a serviços de saúde para crianças
vivendo em situações de vulnerabilidade que podem provocar problemas de
desenvolvimento infantil e afetar todo o seu futuro.
Pobreza
Criança
Saneamento
Moradia
FONTE: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC/IBGE). Elaboração própria. Diagrama
de Venn, construído a partir de dados da Contínua 2017, com a aplicação de LARSSON28.
Outro aspecto relevante da ESF é que ela foi desenhada para funcionar
como uma porta de entrada para o sistema de saúde pública local, com a
expansão da atenção primária, exigindo a integração dos outros níveis de
atenção à saúde, como os hospitais especializados5,8,33. Dessa forma, a ESF foi
planejada para contribuir com a ampliação do primeiro acesso aos serviços
de saúde no SUS e ao redirecionamento da demanda por atendimento
em hospitais, que poderiam usar seus recursos para atender os casos de
maior complexidade e densidade tecnológica. Temos, assim, um primeiro
acesso ao sistema de saúde, ancorado em uma rede sólida e fortalecida de
atendimento básico, que tende a apresentar melhores resultados34.
Os impactos da Estratégia Saúde da Família para o desenvolvimento infantil e os desafios para a sua manutenção 23
A FIGURA 4 MOSTRA ESQUEMATICAMENTE a metodologia, geralmente,
utilizada para avaliar o impacto da ESF. O grupo de controle serve para
mostrar o que teria acontecido ao grupo de tratamento, caso ele não
tivesse tido acesso à ESF, ou seja, no cenário contrafactual. Dessa maneira,
a comparação entre os indicadores desses dois grupos mostra o efeito
causal da ESF. Essa concepção de medição de impacto é semelhante àquela
utilizada em avaliações de experimentos que têm como objetivo o alívio à
pobreza, como as avaliações dos ganhadores do prêmio Nobel de Economia
de 2019, Esther Duflo, Michael Kreme e Abhijit Banerjee. Medidas como
essas permitem que se quantifiquem os efeitos de programas e políticas
sociais, de modo a diferenciar quais têm os efeitos desejados e quais não
têm, quais são custo-efetivos e quais têm o melhor custo-benefício.
Impacto
da ESF
ESF
TEMPO
0 -14
39 MORTES
POR 1.000 Essa taxa de mortalidade foi atingida após uma trajetória de forte redução
nascidos vivos foi nesse indicador. A Figura 5 mostra que a taxa de mortalidade infantil (de
a taxa de mortalidade
entre menores de 5 anos crianças com menos de 1 ano de idade) era de 43 mortos por 1.000 nascidos
NO MUNDO
vivos, sendo relativamente elevada entre os países da América Latina, em
1994. Essa taxa apresentou decréscimo acelerado desde então, chegando
em 2017 a um nível próximo ao da Colômbia e do México, de cerca de 12,4
mortes por 1.000 nascidos vivos, segundo o Datasus. Em 2011, o Brasil já
havia atingido a meta do Objetivo de Desenvolvimento do Milênio 4, de
redução da taxa de mortalidade infantil para 15,3 por 1.00045.
45
40
35 No período, a taxa de
mortalidade infantil no
30 Brasil diminuiu de 43 por
1.000 nascidos vivos, para
12,4 por 1.000 nascidos vivos
25
20
15
10
0
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
FONTE: World Development Indicators/World Bank. Estimativas calculadas pelo grupo interagências (UNICEF,
WHO, World Bank, UM DESA Population Division), Group for Child Mortality Estimation.
Esses estudos mostram que, após um município aderir à ESF, sua taxa de
mortalidade infantil não se reduz imediatamente, pois o programa leva um
certo tempo para começar a afetar o indicador. No segundo ano, porém,
a taxa de mortalidade infantil cai, em média, entre 3% e 9% com relação à
A melhora na saúde das mães pode ser medida pelas taxas de mortalidade
materna, que são reduzidas pela ESF em 53,1% após oito anos de programa,
enquanto a mortalidade entre mulheres na idade reprodutiva (de 10 a 49
anos) diminui em 41,2%32. A magnitude desses efeitos é muito expressiva,
considerando que a taxa de mortalidade materna no mundo diminuiu 44%
em 25 anos (de 1990 a 2015)32.
Nesse sentido, estudos mostram que o Bolsa Família possui efeito sobre
indicadores de saúde57, independentemente da presença da ESF, mas
que, quando a cobertura da ESF é levada em conta, os efeitos do PBF
parecem ser ainda maiores7. Além disso, uma pesquisa mostra que
os efeitos complementares dos dois programas podem ocorrer pela
combinação de aumento da demanda por serviços de saúde pelas
famílias atendidas pelo Bolsa Família e pelo aumento da oferta daqueles
serviços pela cobertura da ESF58.
Uma comparação entre irmãos mostra que os que foram expostos à ESF
no nascimento (especialmente aqueles que nasceram quando a ESF já
estava há pelo menos seis meses no município) possuem saúde melhor
do que aqueles que nasceram quando ainda não havia o programa59.
Essa comparação permite que se separe de forma clara os efeitos devidos
ao programa das influências que a própria família pode exercer sobre os
resultados de saúde dos filhos.
Efeitos de longo prazo como esse, em que a exposição à ESF nos primeiros
anos de vida se manifestam após os indivíduos crescerem, também são
verificados sobre a frequência escolar. Quando se comparam gerações de
indivíduos que foram ou não expostos à ESF desde o nascimento e até a idade
escolar, verificam-se efeitos positivos da ESF sobre o número de matrículas
das gerações com maior tempo de exposição60. A presença da ESF nos
primeiros anos de vida de uma geração está associada a uma diminuição no
atraso escolar aos 7 anos e aos 10 anos de idade. Também está atrelada a um
aumento na probabilidade de as crianças continuarem na escola entre os 7 e
os 9 anos e também aos 12 anos de idade61. Esses efeitos são mais presentes à
medida que o tempo de exposição ao programa aumenta.
1. Redigido por Bruno Komatsu 7. BASTOS, M. L. et al. The Impact 13. CHIESA, A. M.; MELLO, D. F.;
(Insper), sob orientação de Naercio of the Brazilian Family Health on FRACOLLI, L. A.; VERÍSSIMO, M. L.
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CoberturaAB.xhtml).
/nucleocienciapelainfancia
/nucleocienciapelainfancia
ISBN 978-85-61897-25-3
9 788561 897253
www.ncpi.org.br