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Edigao Especial PEE Filosofia e Ensino Teoria e pratica do ensino da Filosofia: metodologias e vivéncias filos6ficas na Educagao Basica CTT Een Cs Revista do Filosofia e Ensino Teoria e pratica do ensino da Filosofia: metodologias e vivéncias filosdficas na Educacao Basica ISSN 2317-1332 R. NESEF Fil. Ens., Curitiba, v.1, .1, p.1-82, Set. 2014 ‘A Revista do NESEF Filosofia e Ensino é uma publicagao semestral do Nucleo de Estudos e Pesquisas Sobre 0 Ensino de Filosofia da Universidade Federal do Parand, Coordenagao: Geraldo Balduino Horn e Valéria Arias Consetho editorial: Alejandro Cerlleti (UBA), Anita Helena Schlesener (UFPRIUTP), AntOnio Edmilson Paschoal (PUG PR), Anténio Joaquim Severino (UNINOVE), Carmen Lucia F. Diez (UNIPLAG), Celso Fernando Favaretto (FEUSP), Délcio Junkes (UFPR), Celso de Moraes Pinheiro (UFPR), Celso Luiz Luidwig (UFPR), Dalton José Alves (UNIRIO), Danilo Marcondes (PUCR4), Darcisio Muraro (UEL), Domenico Costella (\FIL), Elisete Tomazetti (UFSM), Emmanuel José Appel (UFPR), Euclides André Mance (IFIL), Felipe Ceppas (UFRJ), Gelson Jodo Tesser (UFPR), Giselle Moura Schnorr (UNESPAR), Gustavo Ruggiero (UNGS - ARG.), Jelson Roberto de Oliveira (PUCPR), José Antonio Martins (UEM), José Benedito de Almeida Junior (UFU), J. M. de Barros Dias (UE - PT), Jorge Luiz Viesenteiner (PUCPR), Lucrécio de Araujo de S4 Junior (UFRN), Junot Corélio Matos (UFPE), Marcelo Senna Guimaraes (Colégio Pedro Il - Ru), Marcos Lorieri (UNINOVE), Maria Cristina Theobaldo (UFMT), Mauricio Langén (IPES/ANEP - UY), Paulo Henrique Fernandes Silveira (EUSP), Ricardo Fabbrini (USP), Roberto de Barros Freire (UFMT), Rodrigo Pelloso Gelamo (UNIMEP), Tania Maria F. Braga Garcia (UFPR), Vanderlei de Oliveira Farias, (UFFS), Walter Omar Kohan (UFR4), Zita Ana Lago Rodrigues (U. LUSOFONA - PT). Comité de avaliagao da edigao: Alécio Donizete da Silva (UFMT), Ademir Aparecido Pinhelli Mendes (CPM/PR), Carmen Lucia Fornari Diez (UNIPLAC), Darcisio Muraro (UEL), Delcio Junkes (UFPR), Domenico Costella (IFIL), Giselle Moura Schnorr (FAFIUV), Golson Joao Tesser (UFPR), J. M. de Barros Dias (UE-PT), Lucrécio Araujo de Sa Junior (UFRN), Produgao grafica e artistica: Murilo Rocha Organizagao e revisao: Luciana Vieira Lima e Mayra Mugnaini ‘oletivo de pesquisadores do NESEF/UFPR. Colaboraca Apoios: Murilo Rocha - Tecnologia; Universidade Federal do Parana - PROGRAD; Instituto de Filosofia da Libertagao — IFIL; Sindicato dos Trabalhadores em Educagao Publica do Parand - APP ~ Sindicato Versao digital: http:/www.nesef.ufpr.brirevista Capa: Arte de Murilo Rocha a partir da imagem Stil Life with Books, tela de Vincent van Gogh. Dominio Publico; sem direitos de reserva para fins educacionais. Disponivel em: http:/www.dominiopublico.gov.br. Acesso em setembro de 2014 Como citar esta edigdo: REVISTA DO NESEF Filosofia e Ensino. Edi¢ao Especial. Teoria e pratica do ensino da Filosofia: metodologias e vivencias filoséficas na Educagao Basica. Curitiba, UFPR, vol.1, n°, p.1-82, set., 2014 Informagées sobre reprodugao: & permitida a reprodugao total ou parcial dos conteddos deste periédico desde que citada a fonte, conforme especificagao dos editores e legislagdo que regula a propriedade intelectual UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA, SISTEMA DE BIBLIOTECAS. BIBIBLIOTECA DE CIENCIAS HUMANAS E EDUCAGAO REVISTA do NESEF / Nacieo de Estudos e Pesquisas sobre 0 Ensino de Filosofia da UFPR; coordenagao: Geraldo Beduino Hor e Valéria Arias; producao gréfica e artistica: Murilo Rocha; conseiho editorial: Alejandro Cerllate .. etal, v.1,n.1 (2014) Curitiba, PR : UFPR, 2014, ‘Teoria e pratica do ensino da Filosofia: metodologias e vivencias filoséficas na Educagao Basica Edigdo Especial ISSN 2317-1332 1. Filosofia - Estudo e ensino - Periédicos. |. Universidade Federal do Parana. Il, Horn, Geraldo Balduino. 1 Arias, Valéria. Ill, Cerllete, Alejandro. COD 20.e4. 101 Sitlei do Rocio Gdulla CRB-9"/985 SUMARIO Apresentagio.... Artigos Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP: priticas colaborativas do ensino- aprendizagem filoséfico Patricia Del Nero Velasco... O ensino de Filosofia na modalidade EJA para alunos em privagio de liberdade Mauricio Fernando Bozatski..... 14 Regéncia de aulas de Filosofia no ensino médio de uma Rede Publica de Ensino: relato de experiéneia Thiago Ferreira dos Santos 20 Que é necessario para ser feliz? Uma reflexdo a partir do pensamento epicurista Daniel Donato Piasecki Ensinando adolescentes a ensinar filosofia: apontamentos reflexivos Daniel Soczek... © ensino de filosofia e a pratica “pictuliterdria”: pereebendo 0 que pode um texto ¢ a arte (Deleuze & Guattari & Kafka) Paulo Roberto Schneider... 47 Uma experiéncia metodolégica de estudos no ensino de filosofia no ensino médio David Velanes de Araijo e Angela Maria Costa. O didlogo nas aulas de filosofia do ensino médio Cleder Mariano Belicri... 259 Programa institucional de bolsa de iniciagio & docéneia — Filosofia/UFSM: dispositivo de praticas docentes Tatiana de Mello Ribeiro ¢ Elisete M. Tomazet..... 66 Café filosociolgico e a experiéneia do pensar Luciana da Silva Teixeira... Sac 1-82, Set. 2014 Reflexées sobre 0 conceito de felicidade mediadas pelo método cartesiano Rui Valese. 80 Instrugdes editoriais para autores... Pac APRESENTACAO Apresentamos aos leitores a primeira Edigdo Especial da Revista do NESEF Filosofia © Ensino. Distintamente dos mimeros de nossa demanda continua, este niimero privilegia as produgdes dos professores diretamente relacionadas ao ensino de filosofia na Educagdo Bésica, Os textos, portanto, intencionalmente fogem 4 rigidez imperante no atual contexto da produtividade académica, Acreditamos que 0 campo em construgdo da Educagdo Filos6fica, além de um quadro tedrico bem marcado, se expressa, também, na dimensio teérico-metodolégica. Nessa dimensio, a sistematizago, consoante aos referendos tebricos que a fundamentam, do “fazer” dos professores de filosofia adquire centralidade Muito além dos populares “relatos descritivos de experiéncias”, cuja validade filoséfica e politico-pedagégica questionamos devido a falta de vigor eritico que, em geral, esse tipo de produgio encerra, os contetidos aqui reunidos ~ embora diversos em seus objetos © argumentos~ tém em comum o fato de trazerem problematicas ligadas ao universo das aulas de filosofia realmente existentes. Com efeito, os autores ao debrugarem-se na andlise da realidade na qual eles proprios intervém como docentes ou pesquisadores, traduz perfeitamente 0 conceito de praxis que defendemos, assim como expressa as bases do projeto de consolidagao da educagao filoséfica que 0 conjunto de professores e estudantes, sobretudo da Educago Basica, vém construindo a partir da garantia legal do espago da disciplina de filosofia nos curriculos escolares, s6 recentemente conquistado pelos educadores. Iniciamos com o artigo de Patricia Del Nero Velasco, Olimpiadas de Filosofia no Estado de SP: priticas colaborativas do ensino-aprendizagem filoséfico. A autora discute as experineias das primeiras edigdes das Olimpiadas de Filosofia do Estado de S4o Paulo com foco no proceso de ensino-aprendizagem da Filosofia na Educagdo Basica, assim como avalia as potencialidades formativas dos contetidos filos6ficos. No artigo O ensino de Filosofia na modalidade EJA para alunos em privagio de liberdade, Mauricio Femado Bonzatski analisa alguns desafios do ensino de filosofia_ para estudantes de uma realidade geralmente sem visibilidade politica e institucional. Thiago Ferreira dos Santos, em seu artigo Regéncia de aulas de Filosofia no ensino médio de uma rede piblica de ensino: relato de experiéncia, apresenta suas consideragdes em relagdo ao estagio supervisionado, disciplina que integra a maioria dos cursos de licenciatura € reflete sobre a importincia da vivéncia que esta etapa da formagio para os futuros professores. Em Que é necessério para ser feliz? Uma reflexdo a partir do pensamento epicurista, Daniel Donato Piasecki, apresenta uma proposta de trabalho pedagdgico desenvolvida a partir da nogao de felicidade em Epicuro, Em Ensinando adolescentes a ensinar Filosofia: apontamentos reflexivos, Daniel Soczek, apresenta reflexdes sobre o ensino de filosofia com base em um minicurso que Sion art objetivava a qualificagao do tralho pedagégico na disciplina de filosofia. No artigo O ensino de Filosofia e a pritica “pictuliteréria”: percebendo 0 que pode um texto © a arte (Deleuze & Guattari & Kafka), Paulo Roberto Schneider apresenta uma proposigo sintética sobre a possibilidade de um agenciamento filoséfico-literirio para 0 ensino de Filosofia por meio de expresses da arte. Os autores David Verlanes de Araijo e Angela Maria Costa, descrevem em Uma experiéncia metodolégica de estudos no ensino de filosofia no ensino médio, uma pritica metodolégica em uma escola piblica na cidade de Belo Horizonte-MG. Os autores argumentam a favor do método socratico ¢ procuram demonstrar que o ensino de filosofia mediante didlogos e problematizagdes colaboram para que o estudante supere sua experiéneia imediata e reflita de modo mais totalizante sobre sua realidade. Em O didlogo nas aulas de filosofia do ensino médio, Cleder Mariano Belieri analisa ‘uma situagdo de aprendizagem em busca de evidéncias sobre 0 papel do didlogo como principio educativo nas aulas de Filosofia, 0 objetivo foi a localizagio de novos procedimentos didéticos para o ensino da disciplina, Nele, o autor defende que as situagdes dialégicas, quando mediadas pelo conceito filos6fico, permitem ao professor acompanhar 0 nivel de pensamento do aluno em relagdo ao contetido de ensino. No artigo Programa institucional de bolsa de iniciagao 4 docéncia — Filosofia/UFSM: dispositivo de priticas docente, Tatiana de Mello Ribeiro ¢ Elisete M. Tomazettti discorrem sobre os resultados de uma pesquisa de mestrado que investigou 0 movimento produzido pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciagao 4 Docéncia — PIBID por meio de entrevistas com bolsistas/formandos do curso de Licenciatura em Filosofia da UFSM. Luciana da Silva Teixeira descreve a trajetéria ¢ os resultados do Café Filosociologico, realizado em uma escola da rede ptiblica da cidade de Curitiba-PR. Finalizando, apresenta-se a produgio Reflexdes sobre 0 conceito de felicidade mediadas pelo método cartesiano, Resultado de uma proposta de trabalho do autor, Rui Valese, que objetivava problematizar 0 conceito de felicidade junto aos seus jovens estudantes, a partir da questdo: O Me Lanche feliz. produz felicidade? Com este conjunto de produgdes, esperamos estimular nossos leitores ao debate © & reflexdo acerca das feigdes teérico-metodolégicas que o ensino de filosofia vém assumindo no Brasil. Saudagées filoséficas Valéria Arias Geraldo Balduino Arias Sion art on impiadas de flosofia do o do de sp: praticas colaborativas do ee eed ARTIGOS Olimpiadas de filosofia do estado de sp: praticas colaborativas do ensino-aprendizagem filoséfico! Patricia Del Nero Velasco® Resumo © presente artigo tem como objetivo refletir sobre as primeiras edigdes das Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP, sediadas na Universidade Federal do ABC. Além de pretender-se um registro das experiéncias com o movimento olimpico, este texto busca estabelecer relagdes entre os objetivos das Olimpiadas paulistas © os sentidos do ensino- aprendizagem da Filosofia na Educagdo Basica. Defender-se-4 a pritica filoséfica colaborativa como contribuigao formativa imprescindivel. Palavras-chave:Olimpiadas. Filosofia, Educagao Basica. Introdugao Hi exatos vinte anos ocorria a primeira edigo da Olimpiada Internacional de Filosofia (IPO), na Bulgaria, com a participagdo de apenas trés paises. A 21* IPO, sediada na Dinamarea, em 2013, envolveu estudantes de 44 paises (ef. http:/vww.philosophy- olympiad.org/). No Brasil, o pioneirismo em sediar o evento é atribuido ao Rio Grande do Sul, estado que em 2008 organizou a primeira Olimpfada regional e, em 2011, recebeu a I Olimpiada Latino-americana de Filosofia, As Olimpiadas regionais realizadas no Brasil diferem radicalmente das internacionais. Enquanto estas tém carter competitivo, aquelas visam prioritariamente eriar um espago de integragio, criagdo ¢ didilogo filos6ficos. Na Convocatéria da VI Olimpiada de Filosofia do Rio Grande do Sul (Disponivel em: http://www.olimpiadadefilosofia.org/1a- \VI-Olimp-de-Fil-do-RS-2013-Rev-I pdf. Acesso em 23 ago. 2013), Ié-se: Com um espirito de acolhimento das diferencas, as Olimpiadas de Filosofia pretendem convocar estudantes para um exercicio de investigagao solidéria, em um clima que pretende ser no de competi¢fo, mas de colaboragio ¢ de estimulo para 0 pensamento. Cultivando o espirito olimpico de superagio de si mesmo, em um 'Parte dos conteidos deste artigo foi apresentada no I Coléquio Nacional do Ensino de Filosofia: 0 que queremos do filosofar na Educagio Basica? (Salvador, dezembro de 2011) e posteriormente publicada no site da Associagdo Navional de P6s-Graduagdo em Filosofia com o titulo “Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP: encenando © filosofar na Educagao Bisica” (Disponivel em: ‘Acesso em: 25 ago. 2013) 2Professora da Universidade Federal do ABC - UFABC. E-mail: patricia velasco@ufabe.cdu.br pic on errr Co et ret ‘movimento de cooperagdo que pretend favorecer 0 crescimento de todos, as Olimpiadas de Filosofia consistem em atividades de didlogo filoséfico, apresentagdes artistco-flos6ficas e produgdes textuas[..} A ideia de trabalho colaborativo fundamenta as atividades das Olimpiadas do Estado de SP, as quais tém como objetivos: (1) a promogdo da integragdo entre as escolas, os estudantes e os professores participantes, bem como entre a Escola ¢ a Universidade; (2) a congregago dos interesses de alunos e professores de Filosofia do Estado de Sao Paulo (carentes de iniciativas deste género), criando um espago de troca de experiéncias ¢ perspectivas sobre 0 Ensino de Filosofia; (3) 0 estimulo do espirito critico, dialégico respeitoso entre os participantes, propiciando a estes vivenciar 0 questionamento, a investigagao e a criagdo de novas possibilidades de pensar através da pritica coletiva de fazer Filosofia; (4) 0 incentivo da participagao dos discentes da Educagdo Basica como agentes criadores ¢ responsaveis pelas atividades; (5) a colaboragdo com os objetivos do Ministério da Edueagdo ao introduzir a Filosofia como disciplina obrigatéria no Ensino Médio. O presente artigo tem como propésito apresentar as experiéncias com as Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP, bem como refletir sobre as contribuigdes destas com o que se vislumbra para a Filosofia na Educagio Basica, Desenvolvimento Sediadas na Universidade Federal do ABC, na Grande Sao Paulo, as Olimpiadas paulistas consistem em atividades que tém inicio nas escolas das redes piblica e privada terminam com uma confraternizago em evento estadual. Durante o ano letivo, os professores de Filosofia inserem a tematica geral do evento como parte dos contetidos programaticos da disciplina, investigando-a ¢ refletindo-a filosoficamente com seus alunos. As atividades didéticas devem incluir a eriagdo de uma apresentagdo em formato livre: teatro, comunicagao oral, poesia, poster, video, fotografia, desenho e misica foram alguns dos trabalhos criados nesta fase para as edigGes paulistas. “O mundo é admiravel? O que nos toma plenamente humanos?” foi o tema que norteou os trabalhos em 2011; no ano seguinte a temética que subsidiou as atividades foi “Qual o custo social do progresso?”. Na terceira edigdo, em 2013, discutir-se-4 “Que conhecimento é possivel na era das incertezas?”, Procurou-se nestas primeiras edigdes acompanhar o tema geral das Olimpiadas do Rio Grande do Sul e da América Latina, No dia do evento ocorre a segunda ¢ iiltima fase das Olimpiadas. Trata-se do momento de apresentagdo dos trabalhos produzidos em sala de aula no decorrer do ano. Nesta data, espera-se propiciar aos participantes (alunos, professores, coordenadores, diretores ¢ demais interessados) a oportunidade do didlogo investigativo, da reflexdo conjunta sobre a tematica abordada em cada edigdo. Neste sentido, apés o primeiro momento de exposi¢do dos pic on errr ieas colaborativas do ensino-aprendizagem filoséfico. trabalhos, promovem-se comunidades de investigagio: mediados por professores © tendo como base as produgdes textuais desenvolvidas nas escolas, os estudantes dos ensinos fundamental e médio aprofundam as reflexes iniciadas em sala de aula, trocam experiéncias, contrapdem realidades diferentes, problematizam, constroem conceitos ¢ argumentos, buscam fundamentar suas ideias e, nao raro, reveem seus pontos de vistas. AI Olimpiada do Estado de Sao Paulo, realizada em Santo André, reuniu um pouco mais de 400 pessoas: aproximadamente 350 alunos; 35 professores; alguns coordenadores € diretores; ¢ outros tantos pais € maes dos estudantes. Escolas de vinte municipios do Estado de SP se inscreveram: Amparo, Arapei, Artur Nogueira, Bananal, Bauru, Campinas, Cunha, Guarulhos, Irapua, Limeira, Mogi das Cruzes, Mogi Guacu, Paraisépolis, Pilar do Sul, Rio Claro, Santo Andi Santos, Sao Bernardo do Campo, Sao Paulo ¢ Ubatuba. Figura 1, Encenaco na I Olimpfada de Filosofia do Estado de Sao Paulo, A segunda edigdo, realizada em Sio Bernardo do Campo, contou com um mimero menor de participantes, reunindo 191 alunos ¢ 19 professores de 15 escolas diferentes, alm de professores ¢ alunos de Filosofia da propria UFABC e demais convidados, totalizando cerca de 230 pessoas, O mimero de escolas participantes sediadas na Grande Sao Paulo foi significativamente maior, fato atribuido em grande parte 4 dificuldade e ao custo do deslocamento de professores e alunos de cidades mais distantes (As Olimpiadas nfo contam com 0 auxilio da Secretaria de Educagao). r a ’ a a Figura 2. Comunidade de Investigagdo na II Olimpiada de Filosofia do Estado de Sao Paulo. Informagdes, fotos, videos e demais produgdes da III Olimpiada de Filosofia do Estado de SP (nao realizada até o fechamento deste texto) poderao ser obtidas no seguinte errr Olimpiadas de filosofia do estado de sp: priticas colaborativas do en een | enderego eletrOnico: http://olimpiadadefilosofiasp.wordpress.com/. Neste constam também materiais das duas primeiras edigdes paulistas. Resultados Um primeiro resultado notério das Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP diz respeito 4 valorizagio da disciplina Filosofia nas escolas participantes. Os professores envolvidos no movimento olimpico relataram que por conta das apresentagdes no evento regional, as atividades filos6ficas ao longo de todo o ano letivo gozaram de um interesse maior por parte dos alunos. Estes passaram a valorar a disciplina diferentemente de outros anos, quando a importincia atribuida as aulas de Filosofia era pouca. A seriedade e a estima demonstradas pelos alunos surpreenderam os professores inscritos no evento. O interesse pela Filosofia nas escolas foi demonstrado também por alunos de outras séries no participantes, bem como por coordenadores ¢ diretores das escolas. O fato do evento estadual de ter sido sediado por uma universidade parece ter contribuido para agugar as atengdes sobre esse: foi necessério que o Ensino Superior abrisse as portas & Educagdo Basica para que esta, em alguma medida, se sentisse prestigiada, Nesta perspectiva, a pretendida integragdo entre a Escola ¢ a Universidade deu sinais de ter sido alcangada, Criangas ¢ adolescentes mostravam-se orgulhosos por apresentarem. trabalhos em uma instituigdo de ensino superior, sendo observados por olhares perplexos de alunos, professores e dirigentes da UFABC. Igualmente visivel foi a integragdo entre escolas, estudantes e professores. Ao agregar escolas de diferentes regides de SP, as Olimpiadas criaram um espago de rica troca de experigncias. As metodologias foram as mais diversas; os formatos dos trabalhos compartilhados foram bastante diferentes; a percepgdo de que o mesmo tema geral poderia ser abordado sob iniimeras perspectivas incitou variadas reflexdes. © espago supramencionado propiciado pelo evento possibilitou a vivéncia do questionamento, do didlogo investigativo, da critica, da problematizagio, da conceituagdo, da argumentagio. Um filosofar sobre as questdes norteadoras das Olimpiadas e, igualmente, sobre o proprio ensinar Filosofia. Tal qual no relato de Mauricio Langon Cufiaro (2007, p. 158) acerca das Olimpiadas uruguaias, “tem-se em vista também uma transformago educativa que se responsabilize do pensar por si mesmo, da complexidade do real, da {filosofizagdo de toda a educagao, a comegar pela filosofizagao do ensino da propria filosofia”. Professores tiveram a oportunidade de pensar a sua propria pritica, foram, como diria Gelamo (2009, p. 29): “problematizado[s] pela contingéncia de seu proprio presente pelo fazer filoséfico em seu dever de oficio: ser professor”. Imprescindivel movimento, segundo Gallo e Kohan (2000, p. 182-183): O professor que ndo se assume como filésofo nao tem a menor chance de ensinar filosofia, assim como o professor que no se reconhece como pesquisador no Bicone Peery poderi fazer outra coisa do que reproduzir aquilo que outros pensaram, uma marca da antifilosofia, Alunos, por sua vez, ficaram entusiasmados por serem ouvidos. E por a eles ter sido atribuido 0 protagonismo da cena, A primazia dada aos estudantes transpareceu na condugao das apresentagdes, nas intervengdes nas comunidades de investigagio, na auséncia de palestras ou comunicagdes de professores-especialistas. Passaram de expectadores a atores € diretores da encenagio. Encenagiio de suas proprias criagGes filoséficas. As experincias vivenciadas nas (¢ com as) Olimpiadas paulistas permite-nos afirmar que estas dltimas oferecem valiosa contribuigo para os objetivos da Filosofia como disciplina escolar. Para além (¢ conjuntamente) das competéncias ¢ habilidades e da formagao para a cidadania a serem desenvolvidas pela Filosofia segundo os dispositivos legais, interessa ao presente artigo 0 valor formativo da Filosofia amplamente discutido em textos da rea. Dente os significados ¢ as diregdes para a Filosofia na escola, pode-se dizer que esta desenvolve as capacidades de anilise, de leitura e de abstragdo; aguga o sentido do questionamento e do problemitico; alarga as técnicas de argumentago e conduz ao desenvolvimento do raciocinio; abre para uma interrogag%o conceitual (clarificando os conceitos) ¢ uma reflexdo racional; instaura uma distincia critica e convida a um regresso reflexivo sobre si e sobre as condigdes de possibilidade de um pensamento; contribui para 0 processo de desnaturalizago de valores, ideias, fatos, teorias; tem a tarefa de elucidagaio da nossa relagdo com o mundo, recolocando as questdes de fundo® para serem discutidas; atenta a0 pensamento proprio e ao pensamento do outro, colaborando para a autonomia intelectual e, igualmente, para a alteridade. Embora nas Olimpiadas de Filosofia do Estado de SP no acompanhe o processo essencial de reflexdo e produgio filoséficas nas escolas participantes, as _criagdes apresentadas no evento estadual constituem um forte indicio de que o ensino-aprendizagem da Filosofia foi efetivamente filos6fico e coletivo. Esta dimensio piiblica do filosofar esta igualmente presente nas atividades desenvolvidas no encontro anual, norteando-o. Subjaz ds comunidades de investigagao propostas nas Olimpfadas a ideia de que: A filosofia no é uma questio privada, ela se constr6i no diélogo. Ensinar significa retirar a filosofia do mundo privado ¢ exclusive de uns poucos para colocé-Ia aos olhos de todos, na construgdo coletiva de um espago piblico. Por certo, em tltima instineia, cada um escolheré se flosofa ou nio, mas deve saber que pode fuzé-lo, que no & um mistério insondével que apenas alguns atesouram (CERLETTI, 2009, p.09; 87) A guisa de conclusao, pergunta-se: nao é esse o propésito geral que orienta nossos anseios com a Filosofia na Educagio Basica? Nas palavras de Gallo (2012, p. 83), “Dar a 3Segundo Lorieri (2002, p. 53-56), questBes de fundo so aquelas suscitadas por “teméticas essencialmente filosSficas, [como] O que é ser pessoa no mundo ¢ com o mundo? [...] © que ¢ real? [...] Como as ideias estio em nossa consciéneia?[..] Por que dizemos que algo é belo ou feio?”, entre inimeras outa. pic on errr Olimpiadas de filosofia do estado de sp: priticas colaborativas do en ae) oportunidade assim, a cada um, da experimentagdo do pensamento no seu registro filoséfico”? A proposta das Olimpiadas, desta forma, corrobora e alimenta a propria proposta educativa do filosofar na escola: Criangas € jovens, enquanto pessoas, pdem-se questdes proprias do ambito da investigagdo filosdfica; deparam-se e sao “envolvidos” culturalmente com “respostas” a tais questdes e tém o direito de ser iniciados no trato com elas ¢ no processo de avalinedo critica das respostas, [..] A proposta & a de aproveitar esse ieresse presente nas criangas © jovens, para envolvé-los em um provesso de investigagio que pode ser verdadeira iniciagdo filos6fica, educativa por si mesma (LORIERI, 2002, p. 41-42). SUBMETIDO EM AGOSTO DE 2013. APROVADO PARA PUBLICACAO EM MARCO DE 2014. REFERENCIAS CERLETTI, A. O ensino de filosofia como problema filoséfico. Tradugao de Ingrid Miller Xavier. Belo Horizonte: Auténtica Editora, 2009. (Ensino de Filosofia) CUNARO. M. L. Olimpfadas Filoséficas Uruguaias: Uma Experiéneia que Deve Ser Considerada. In: SARDI, S. A.; SOUZA, D. G.; CARBONARA, V. (Org.) Filosofia ¢ Sociedade: perspectivas para o ensino da filosofia. Ijui: Editora UNIJUI, 2007, p. 157- 166. GALLO, S. Metodologia do ensino de filosofia: uma didatica para o ensino médio. Campinas, SP: Papirus, 2012. GALLO, S.; KOHAN, W. Critica de alguns lugares comuns ao se pensar a Filosofia no ensino médio. In: KOHAN, Walter 0. (Org.). Filosofia no ensino médio. Petropolis, RU: Vozes, 2000, GELAMO, R. P. O ensino da filosofia no limiar da contemporaneidade: o que faz 0 filosofo quando seu oficio é ser professor de filosofia? So Paulo: Cultura Académica, 2009. LORIERI, M. A. Filosofia. fundamentos e métodos. Sio Paulo: Cortez, 2002. (Colegdo Docéneia em Formagao) Bicone Peery Peroni O ensino de filosofia na modalidade eja para alunos em privagio de liberdade Fernando Bozatski* Resumo presente texto apresenta o relato de algumas experiéncias ¢ reflexdes sobre 0 ensino da disciplina de Filosofia na modalidade de Educagdo de Jovens ¢ Adultos para alunos em privagdo de liberdade. Tal relato se baseia no trabalho efetuado entre os anos de 2007 e 2008, periodo em que 0 autor foi professor no Centro Estadual Educagdo Basica para Jovens e Adultos ~ CEEBIA — Professor Odair Pasqualini que opera no interior da Penitencifria Estadual de Ponta Grossa-PR. Além de apontar os limites ¢ desafios de tal atividade, sugerem-se algumas diretrizes e possibilidades para o ensino da filosofia em tais condigdes. Palavras-chave: Filosofia, EJA. Sistema Prisional. Introdugao Este texto aborda alguns relatos de experiéneia e também aponta algumas hipéteses para o ensino de filosofia no Ensino Médio, na modalidade de Educagio de Jovens e Adultos —EJA, para alunos em privagdo de liberdade, Tais experiéneias foram vivenciadas ao longo do trabalho desenvolvido nos anos de 2007 © 2008 no CEEBIA Professor Odair Pasqualini que opera no interior da Penitencifria Estadual de Ponta Grossa-PR ~ PEPG. A partir destas experiéncias priticas © reflexdes sobre o tema pode-se também estabelecer uma diretriz para o ensino de filosofia, definindo os temas a serem abordados ¢ os objetivos do curso em si Desenvolvimento 1.1 Contextualizagio Atualmente a Penitenciéria Estadual de Ponta Grossa ~ PEPG ~ conta com 425 detentos dos quais 34 possuem o Ensino Fundamental completo e 44 0 Ensino Médio incompleto (PARANA, 2012, p. 71). Estes estariam aptos, portanto, para se matricularem na disciplina de filosofia na modalidade de Educago de Jovens e Adultos ~ EJA. 0 CEEBIA Professor Odair Pasqualini possui atualmente 316 alunos matriculados, divididos entre a Alfabetizagdo, Ensino Fundamental e Ensino Médio. A possibilidade de oferta de vagas para ‘professor da Universidade Federal da Fronteira Sul. E-mail: bozatski@gmail.com Ses Set. 2014 pa none ees tt en) © Ensino Médio é de 34 vagas. Este quadro atual & muito préximo daquele encontrado no periodo de 2007 a 2008 (Censo Escolar/INEP 2011). Cabe destacar aqui, algumas particularidades desta modalidade de ensino para alunos em privagdo de liberdade. © sistema de funcionamento do CEEBJA Professor Odair Pasqualini & muito parecido com 0 que ocorre em ambientes extramuros, tendo, contudo, alguma diferenga em relagdo ao atendimento particularizado ao estudante. As salas so monitoradas por cameras de seguranga e vigiadas por agentes penitenciarios, contudo, depois de algum tempo © professor habitua-se ao contexto © consegue trabalhar com bastante tranquilidade, © material pedagégico utilizado é oferecido pelo estado ¢ a escola é equipada com recursos multimidias que ocasionalmente podem ser utilizados pelos professores. Uma novidade em relagdo ao ensino ofertado em um estabelecimento extramuros & que © material didético e paradidatico a serem utilizados, bem como os contetidos a serem ministrados, além de passarem por uma andlise da coordenagdo pedagégica da escola, também so verificados pela seguranga da penitencidria que procura por aspectos que podem interferir na seguranga ou no andamento da rotina prisional. Os docentes que atuam no ensino das disciplinas ofertadas sio provenientes do Quadro Préprio do Magistério da Secretaria de Estado da Educagio — SEED, que se candidatam para 0 cargo em edital especifico © passam por uma prova de conhecimentos especificos de sua area e por uma entrevista para demonstrar se possui o perfil adequado para a fungdo com agentes da Secretaria da Justiga, Cidadania e Direitos Humanos — SEJU. 1.2 Limites e Desafios Passado esta primeira particularidade de se lecionar em um ambiente que opera no interior de uma penitencidria de seguranga maxima, surge 0 desafio de se definir as diretrizes para o ensino da filosofia. Alguns limites se sobressaem previamente ao estabelecimento dos contetidos e métodos a serem empregados. Antes das perguntas sobre 0 que ensinar ¢ como ensinar que norteardo todo o plano de ensino, cabe estabelecer qual 0 perfil dos alunos aos quais este ensino sera ofertado. E possivel dizer que os alunos que compée a clientela da Educagao de Jovens ¢ Adultos “[...] desde que a EIA & EIA esses jovens © adultos so os mesmos: pobres, desempregados, na economia informal, negros, nos limites da sobrevivéncia. Sdo jovens ¢ adultos populares” (ARROYO, 2007, p. 29). A trajetéria educacional na vida destes estudantes que procuram 0 EJA em algum momento foi interrompida ou sequer iniciou, em alguns casos. No caso de presos apenados ¢ evidente que o limite da sobrevivéncia é mais acentuado ainda. Segundo dados do INFOPEN de abril de 2012 51,33% da populagdo carceriria do pais se encontra na faixa de 18 a 34 anos de idade, dos quais 62% nao possui o ensino fundamental completo (PARANA, 2012). Neste sentido, entende-se que a vida voltada a criminalidade substituiu a educagdo So ns., Curt vA arr) formal e que, portanto, além de uma educagdo formal que possibilite a estes estudantes do EJA retomarem um projeto de vida e de trabalho pautado pela educagio, no caso destes alunos em privagdo de liberdade, a educagdo também tem o caréter de ressocializagio dos individuos e sobre 0 qual a sociedade de modo geral e as autoridades competentes depositam muitas esperangas para o éxito do sistema prisional brasileiro. Ademais, as diretrizes para a EJA no estado do Parand preconizam que: A Educagao de Jovens e Adultos (EJA), como modalidade educacional que atende a educandos-trabathadores, tem como finalidades e objetivos o compromisso com a formag2o humana © com o acesso a cultura geral, de modo que os educandos aprimorem sua conseiéneia critica, e adotem atitudes éticas ¢ compromisso politico, para o desenvolvimento da sua autonomia intelectual (PARANA, 2006, p. 27) Pode-se observar, portanto, que ha um grande desafio para o ensino na modalidade EJA cuja amplitude aumenta indefinidamente para o caso de alunos em privagdo de liberdade. Apenas sera possivel criar uma expectativa para a adogdo de atitudes étieas na vida apés 0 cumprimento da pena, pois, ndo se pode pensar em estabelecer um parimetro de comportamento para a vida no carcere, entendendo-se tal estado como transitério © mesmo indesejavel; A consciéncia critica também, neste caso especifico, possui limites, até mesmo porque nio se pode questionar 0 proprio sistema prisional, entio, por definigao, nao é possivel promover uma consciéncia plena ¢ absolutamente critica sobre o estado presente; O acesso a cultura geral também é limitado, sendo que poucos livros esto & disposigdo e outros recursos mididticos inexistem; O compromisso politico & algo inefavel, pois até mesmo 0 direito ao voto é vetado aos alunos em privagao de liberdade. Logo, a tal autonomia intelectual que se supde a partir das premissas acima ser sempre incompleta. Portanto, especificamente no plano da disciplina de Filosofia, recaem muitas responsabilidades, sendo que, h grandes expectativas e esperangas dos varios atores envolvidos neste processo, Em um questionério inicial aplicado para se estabelecer 0 perfil da turma, percebe-se que grande parte dos alunos possuem uma espécie de visio mitica sobre a filosofia, acreditando que ela seré capaz de revelar segredos ocultos sobre questées antinémicas da vida e do universo. Posto isto, depois destas impressdes iniciais, comega-se por organizar as pegas € estabelecer os passos em que elas serdo encaixadas para se formar este quadro que ao final apresente uma imagem mais realista e ao mesmo tempo satisfatéria deste processo de ensino © aprendizagem, sobretudo para o docente da disciplina e para os seus alunos. Assim, a primeira premissa que sobressaiu-se sobre todo este estado de coisa é que as aulas ndo poderiam seguir uma receita pronta presente em algum manual ¢ também ndo deveriam se basear numa historia linear da filosofia com cardter informativo, elas deveriam, em certo sentido, serem ferramentas para que os alunos refletissem sobre sua condigdo e projetassem mudangas concretas para o seu futuro. Logo, a figura moral de Immanuel Kant e paca urtiba Peery) ene enn seu imperativo categérico serviram como a inspiragio que nortearam a correlagio de contetidos ¢ 0 método préprio para o seu ensino. Lembrando sempre a propria premissa kantiana de que a educagdo é uma atividade capaz de moldar um futuro melhor ¢ ndo de redesenhar o pasado. Um prineipio de pedagogia, o qual mormente os homens que prope planos para a arte de educar deveriam ter ante os olhos, & ndo se devem educar as eriangas segundo © presente estado da espécie humano, mas segundo um estado melhor, possivel no futuro, isto & segundo a ideia de humanidade e de sua inteira destinagao (KANT, 1999, p. 22). Resultados Isto posto, foi hora de superar os desafios ¢ os limites impostos pela condigdo de se lecionar filosofia na modalidade EJA para alunos em privagio de liberdade. Era preciso criar meios para se refletir sobre a liberdade com aqueles que ndo a possuem. Dialogar sobre direitos e deveres politicos com aqueles que nao os exercem. E logo se pode perceber que a primeira dificuldade metodolégica para 0 ensino seria a baixa capacidade de leitura dos alunos. Como as aulas eram distribuidas a0 longo de um periodo inteiro, se lecionava ininterruptamente por toda uma manha ou por toda uma tarde uma vez por semana, era possivel tentar compensar isto com uma leitura orientada dos textos filos6ficos, esclarecendo diividas pontuais e oportunizando o enriquecimento do vocabulério dos estudantes. Os temas que mais interessavam os alunos eram correlatados a politica e a ética, Notadamente, todos os apenados sabiam que haviam cometidos crimes e tinham a nogdo de que era justo 0 fato de estarem cumprindo pena. E eles nao culpavam um sistema ou sociedade supostamente injustos, ou alguma condigao histérica e social de sua existéncia, mas responsabilizavam a si proprios inteiramente pelo que tinham feito. F claro que na condigao de docente nao era possivel nem desejavel tomar conhecimento dos crimes cometidos pelos alunos, mas se podia deduzir que o trifico de drogas era a causa majoritéria deles estarem cumprindo penas. Porém, ndo é possivel determinar precisamente se esta autoafirmagio de culpa era espontinea ou se tinha alguma relagdo com o temor de represalias ulteriores. Mas 0 fato subjacente a isto é que nenhum dos alunos sabia ou tinha ao menos uma vaga nogio de como funcionava o sistema politico participative tal como a divisio dos poderes do Estado ¢ a fungdo de cada um, Portanto, grande parte dos contetdos apresentados inicialmente giraram em tomo da diferenciagao ¢ da historia dos sistemas politicos e como os filosofos abordaram € ajudaram a desenvolver tal tema. Outro aspecto que se péde notar em todas as ocasides é que ndo seria possivel viver no mundo dos livros, por assim dizer, era preciso sempre contextualizar os conceitos filoséficos & realidade sociocultural dos alunos, era preciso trazer a filosofia 4 vida, tomando paca urtiba Peery) Te sempre por base exemplos concretos de suas experiéneias. Continuando as aulas com a temética sobre ética e politica naturalmente as discussdes € questionamentos chegavam até o tema da indole da natureza humana. O que se podia notar através das perguntas, respostas ¢ textos produzidos pelos alunos é que, via de regra, a mentalidade geral é a de que a humanidade perdeu em algum momento sua bondade inicial que a marcha da histéria conduziria inevitavelmente a espécie humana para sua destruigio e assim, geragdo apés geragdo, as pessoas seriam gradativamente piores. Entio, a partir disto, foi possivel introduzir os alunos ao estudo sobre a concepgdo de sociedade ¢ natureza humana presente nas obras de Hobbes e Rousseau. Foi possivel detectar que, uma mentalidade religiosa arraigada aos alunos, seja concebida anteriormente a sua passagem pela prisio ou como vélvula de escape jé em seu interior, a ideia de que o mundo caminha inevitavelmente para um juizo final e que é preciso um salvador sobrenatural para redimir a humanidade de seus pecados & amplamente presente no idedrio dos mesmos. A percepgio a partir desta constatagdo & a de que uma espécie de niilismo passivo, ja denuneiado por Nietzsche (ARALDI, 1998), estava instalada e que nenhum deles poderia fazer muito por si proprio com o intuito de mudar sua condigdo social, ¢ assim eles estariam destinados a uma vida de criminalidade. Talvez, ¢ isto é apenas uma suposigdo, que o indice de reincidéncia criminal tenha alguma relagdo com esta mentalidade. Ao tentar explorar ¢ clarificar este interesse espontineo dos estudantes foi possivel encontrar 0 texto Technology and the lifeworld: From Garden to Earth do filésofo norte~ americano Don Thde. Nesta obra o autor aborda de maneira muito interessante a questéo sobre uma suposta natureza original da humanidade, que ele denomina mito da autenticidade. Para Thde (1990) nunca existiu € nem existe atualmente em nenhuma sociedade humana um estilo de vida e coexisténcia com a natureza que possa ser considerado genuino, original ¢ que, portanto tenha sido maculado pela evolugdo cientifica, tecnolégica ou politica dos povos. Para ele, humanidade & sinénimo de inventividade, transformagio do mundo natural, progresso, por assim dizer. Além de poder observar uma mudanga no idedrio dos alunos, a de que & possivel mudar 0 destino no futuro a partir de escothas racionais ¢ agdes executadas no presente, 0 tema da natureza humana propiciou uma introdugdo a questdes de outras areas presentes no estudo da filosofia. Foi possivel adentrar em temas da Filosofia da Ciéncia, Epistemologia até mesmo Ontologia. Portanto, baseado em tais experiéncias & possivel afirmar que se a experiéncia da docéncia de filosofia na modalidade EJA tivesse que ser repetida atualmente, um bom comego e que poderia servir como fio condutor para todo o curso seria esta tema da natureza humana € todas as questdes subjacentes a ele. Seja partindo da realidade dos alunos & chegando até os textos filoséficos ou fazendo 0 caminho inverso, 0 conhece-te a ti mesmo parece ser ainda a questo que desperta 0 maior interesse aos iniciantes nos estudos de So arty arr) ere filosofia. SUBMETIDO EM AGOSTO DE 2013. APROVADO PARA PUBLICACAO EM FEVEREIRO DE 2014. REFERENCIAS ARALDI, C. L. Para uma caracterizagiio do niilismo na obra tardia de Nietzsche. Cadernos Nietzsche. n 5. Sio Paulo: USP, p. 75-94, 1998, ARROYO, M. G. Educagio de Jovens-adultos: um campo de direitos e de responsabilidade piiblica. IN: SOARES, L.; GIOVANETTI, M. A. e GOMES, N, (orgs.) Didlogos na educagdo de jovens ¢ adultos. 2 ed. Belo Horizonte: Autentica, 2007, CEEBJA Professor Odair Pasqualini. Portal quedu.org.br. Disponivel em: http://www.qedu.org,br/escola/237120-cefm-ceebja-professor-odair-pasqualini/sobre ‘Acesso em 13 ago. 2013. IDHE, D. Technology and the lifeworld: from Garden to Earth, Indianapolis: Indiana University Press, 1990. KANT, |. Sobre a pedagogia. 2 ed., Piracicaba: Editora Unimep, 1999. PARANA. Secretaria de Estado da Educagao. Diretrizes curriculares da educagao de jovens e adultos. Curitiba, 2006. PARANA, Secretaria de Estado da Educagdo; Secretaria de Estado da Justiga, Cidadania e Direitos Humanos. Plano estadual de educacio no sistema prisional do Parana, Curitiba, 2012. Ses LO inn tn Regéneia de aulas de filosofia no ensino de uma rede publica de ensino: relato de experiéneia Thiago Ferreira dos Santos’ Resumo Este trabalho apresenta um relato de experiéneia sobre 0 ensino de filosofia proposta pela disciplina da grade curricular de Licenciatura em Filosofia, Estégio Supervisionado IV, ministrada na Universidade Federal de Alagoas, que consistiu em reger aulas de filosofia para turmas de ensino médio em uma escola da rede estadual de ensino situada na cidade de Maceié-AL, com 0 intuito de uma vivéneia pratica do estagidrio com 0 exercicio da docéneia. Nesse sentido, puderam ser observadas as caracteristicas que constituem a pratica docente, experiéneia de fundamental importincia, uma vez que possibilitou reflexdo acerca das reais condigdes em que se situa o ensino piblico de filosofia, Toma-se como base teérica os autores: Cerletti (2009), Lorieri (2002), Minayo (1995), Ludke ¢ André (1986), Pimenta e Lima (2004), Palavras-chave: Ensino de Filosofia. Ensino Piblico. Estégio Supervisionado Introdugio Apés todo um processo de familiarizagdo com contetidos pedagégicos além de, um trabalho de campo anterior, que consistiu em observar o funcionamento do ensino médio no Centro Educacional de Pesquisas Aplicadas ~ CEPA, localizado na cidade de Maceié, onde foram observadas as caracteristicas do local, bem como o direcionamento dado a diseiplina de Filosofia (estigio observatirio). Teve-se a competéncia de realizar o estigio de regéncia de aulas em filosofia, que como parte da disciplina de Estigio Supervisionado IV, um dos componentes da grade curricular do curso de Filosofia da Universidade Federal de Alagoas ~ UFAL, que proporcionou o contato com a pritica docente, de modo a colocar o estagiério frente a realidade da regéncia em relagdo ao aparato teérico. F fato que existe uma separagdo entre os contetidos estudados na Universidade em relagdo ao que se encontra em campo, ao passo que o presente trabalho se estabelece como uma maneira de formalizar em um relato, as experiéncias construidas na pritica da regéncia, de modo que esse momento do estigio se propde a indicar a localizagdo da separagdo entre teoria € pritica, para que como futuros docentes seja possivel estabelecer métodos em que estas se relacionem dialeticamente, desta forma baseia-se na proposta de Pimenta ¢ Lima (2004, p. 46) do estigio como pesquisa, nesse sentido: A pesquisa no estagio, como método de formagao de futuros professores, se traduz, 5Graduando em Filosofia, Universidade Federal de Alagoas ~ UPAL. E-mail: ferl988@gmail.com cca Prreurnenyy er Pode es errr de um lado, na mobil ago de pesquisas que permitam a ampliagio ¢ andlise dos contextos onde os estigios se realizam; por outro, © em especial, se traduz na possibilidade de os estagifrios desenvolverem postura e habilidades de pesquisador @ partir das situages de estigio, elaborando projetos que thes permitam ao mesmo tempo compreender ¢ problematizar as situagdes que observam. © estigio como pesquisa possibilita a interagdo com a pratica docente, porém, na posi¢do de sujeitos reflexivos, hi a possibilidade do desenvolvimento de capacidades que norteiam © pesquisador no universo da docéncia, deste modo, “[...] 0 estégio curricular & atividade tedrica de conhecimento, fundamentagio, didlogo ¢ intervengao da realidade, esta, sim, objeto da prixis” (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 45). Por meio da experiéneia construida em sala de aula, seja na modalidade de observagao, seja na regéncia, & possivel um estigio caleado em uma atividade tedrica (pritica de conhecimento), pois esta posta a possibilidade de observagio, reflexdo, atuagao e intervengao através de estudos tedricos e praticos. Nesta etapa de vivéncia do estigio, os estagiérios encontram-se munidos de certa experiéneia com o funcionamento do universo escolar, uma vez que, no periodo de observagio, que antecedeu a regéncia foi possivel uma familiarizagdo com a Instituigio. Antes do processo de regéncia, houve todo um periodo de preparagao, deste modo a pesquisa observatéria se baseou no método qualitativo, visto que nesse periodo ocorreu uma coleta de dados (estatisticos e descritivos) configurados a partir do contexto social dos individuos envolvidos no proceso, isto gerou um cabedal tedrico, que além das bibliografias estudadas, nos deu suporte durante a docéncia Faz-se necessirio para uma abordagem mais completa deste relato, expor antes da experiéneia da regéncia, a abordagem da Instituigo de Ensino feita no perfodo observado no intuito de deixar visivel 0 contexto em que se deu o processo de ensino-aprendizagem, a proposta & que além de uma exposi¢ao acerca da experiéncia com a regéncia, sejam expostos aspectos relacionados a estrutura da escola, bem como a situagdo do ensino de filosofia na mesma, uma vez que esses dados interferem essencialmente nas respostas das turmas de filosofia na relagdo com o professor ¢ a disciplina, pois, dependendo da atengio dada a disciplina tanto por parte do sistema educacional, quanto pelo proprio professor como sujeito atuante no meio, isso pode interferir tanto positivamente quanto negativamente no rendimento dos estudantes. Com relagdo 4 regéncia, além da familiarizagdo com o campo de trabalho, foi necessirio todo um desenvolvimento teérico, que ocorre durante todas as fases do estigio supervisionado até culminar na pratica docente, pois, cada pesquisa feita no ambito da graduacdo, assim como, a produgdo de unidades tematicas, planos de aula, organizagio de contetidos de cariter filos6fico e nao filoséfico, foram determinantes para um exercicio mais pleno. Este ¢ um processo continuo, uma ponte de ligagdo entre a graduagio e a realidade docente, ora mais estreita ora mais larga. cca perry 2 LO nite Conforme afirmam Ludke ¢ André (1986, p. 25): Para que se torne um instrumento vilido fidedigno de investigagdo cientifiea, a observag2o precisa ser antes de tudo controlada e sistemética. Isso implica a existéncia de um planejamento cuidadoso do trabalho e uma preparagdo rigorosa do observador. Nesse sentido, antes de iniciar o estagio é fundamental tomar todos os cuidados para um bom funcionamento da atividade, ao passo que foi necessaria a construgdo de um plano de estigio que serviu como base do processo; nele esti contidas as unidades temiticas, os planos de aula, bem como os conteiidos e exercicios para a construgdo das aulas. Assim, foram necessérias trés c6pias do plano, uma para a regente da disciplina de Estagio Supervisionado, uma para o professor que cedeu suas aulas ¢ outra para o estagiario. E importante ressaltar que antes do encaminhamento ao professor da Instituigo, © plano de estigio passou por uma avaliagdo da regente da disciplina de Estigio Supervisionado. Dados referentes a escola que serviu de campo para a regéncia de aulas de filosofia A escola que serviu como campo de pesquisa tanto para o periodo de observacdo quanto para o period de regéncia do Estigio Supervisionado, esta situada no Centro Educacional de Pesquisas Aplicadas - CEPA, localizado em um bairro nobre da cidade de Maceié-AL. As informagdes a seguir, foram possiveis devido a uma pesquisa feita junto a coordenagio © diretoria no period de observagio, ressalta-se a importincia que estas possuem devido a ligagdo direta que se estabelece com a situagio do ensino, pois, ¢ perceptivel que a educagdo é uma teia de ages que culminam na aprendizagem, onde cada articulagdo dessa teia é fundamental para o bom funcionamento das aulas. As instalagdes da instituigo de ensino em questio, de forma geral, estio em boas condigdes de funcionamento, observou-se que ela ¢ razoavelmente equipada embora alguns equipamentos ndo estejam em boas condigdes, como os computadores da sala de informatica que, em geral, esto sucateados, dificultando a possibilidade de pesquisa via internet; outro fato detectado & que alguns ventiladores das salas de aula se encontram em mau funcionamento, o que gera um mal estar em certos hordrios do dia devido ao clima, No que diz. respeito aos funcionarios, devido ao grande porte da escola, afirma-se que o niimero é insuficiente para atender a demanda, Notou-se ainda, a falta dos seguintes profissionais: assistente social, ajudantes de disciplina e psicélogo, por esse motivo, algumas salas esto inutilizadas. A escola observada funciona nos trés tumos (manha, tarde ¢ noite) para atender a demanda de alunos que cursam o ensino fundamental, médio e modalidade BJA. O maior mimero de turmas se concentra na parte da manha, com predominancia do ensino médio, enquanto que a modalidade EIA tem turmas apenas no turno da noite. cca nA perry Pode es errr Quanto aos professores, de uma forma geral, existem tanto efetivos como monitores em atividade, A disciplina de Filosofia esté inserida nos trés turnos, atendendo as turmas de nivel médio, possuindo apenas dois professores, ambos efetivos: um deles possui graduagdo em Filosofia ¢ 0 outro em Psicologia. A ago do ensino de filosofia no contexto da regéncia A disciplina de Filosofia tornou-se obrigatéria no curriculo do ensino médio por meio da Lei 11.684/08, porém, nao existe uma maior preocupagdo por parte do sistema educacional com relagdo a formagio dos docentes. Dessa maneira, apesar de existirem leis que limitem 0 ensino de filosofia aos licenciados em filosofia, & fato que na pritica vivenciada isso ndo ocorre, para exemplificar tais colocagdes, 0 caso da escola em questio, onde conforme anteriormente mencionado, hd um professor de Filosofia que possui graduagdo em Psicologia. ‘No CEPA, a disciplina de Filosofia possui uma hora/aula semanal em cada turma do ensino médio, Alm desta carga horéria minima, as turmas possuem uma quantidade excessiva de alunos em espagos pequenos, fatos que prejudicam 0 processo de ensino ¢ aprendizagem. ou seja, cada turma de ensino médio assiste a uma hora semanal de aula de filosofia, Esta é a realidade na maioria das escolas piiblicas do Brasil. Segundo Lorieri (2002, p. 52) “no entendimento de conteiidos do ensino da Filosofia, incluimos certas temiticas, questdes ou perguntas, respostas diversas, exame, avaliagio, reelaboragdo ¢ substituigdo de respostas, métodos de investigagao filoséfica [...]”. Nessa perspectiva, pensando o ensino da Filosofia como possibilidade de reflexdo e criticidade, esse ensino deve ser produto de um trabalho continuo € rigoroso, mas com 0 pouco tempo e falta de equipamentos, o ensino de uma disciplina da qual se precisa abrangéncia ¢ profundidade, tomna-se um desafio a ser alcangado. Constatou-se que no hi livro didatico sendo utilizado na disciplina de Filosofia nesta Instituigdo atualmente, porém, jé foram encaminhados para a Instituigio exemplares para serem analisados ¢ escolhidos pelos professores de filosofia para o proximo ano letivo. Desse modo, a informagdo cedida pela coordenagdo da escola & que, a partir de 2012, o livro diditico de filosofia passara a ser utilizado regularmente pelos alunos nas salas de aula. A falta do livro de filosofia acarreta uma série de problemas, pois, sem 0 livro 0 aluno depende exclusivamente do professor para passar textos ou até mesmo indicar onde encontrar contetido filoséfico para pesquisa., nesse sentindo, o professor deve saber usar muito bem 0 curto tempo (sessenta minutos) para debater sobre contetidos tio abrangentes como so os filoséficos, pois, Lorieri (2002, p. 51) afirma, que “os contetdos da Filosofia sio tematicas que se apresentam na forma de certas perguntas e para as quais ha diversas respostas, algumas das quais presentes com mais forga no cultural de cada época histérica”. Ressalta-se que, é de extrema importincia 0 livro didatico em sala de aula, pois, dessa forma abre-se a possibilidade de uma maior apreensio dos conteiidos da filosofia pelos R.NESEF Fl. Ens. nA perry Ey Pe er ee alunos, desde que ele seja bem utilizado pelo professor. E evidente que este nao é 0 tnico problema que afeta o ensino, conforme anteriormente mencionado, observou-se que fatores como a estrutura fisica da escola, a posigdo social dos alunos, também influenciam no desenvolvimento da aprendizagem em relagdo ao ensino de Filosofia, Regéncia de aulas de Filosofia nesse universo escolar © objetivo de toda pesquisa, reflexio, ago que ocorre no campo do Estagio Supervisionado, preparar o graduando para os desafios da docéncia, ao passo que o estagio de regéncia & um momento de fundamental importancia no exercicio dessa preparagao. Poi nem todo o conteiido tedrico, nem mesmo o periodo de observagio e de regéncia (que ja nos aponta diregdes) tém a capacidade de gerar reflexio ¢ compreensio acerca desse universo chamado sala de aula. E preciso estar no comando de uma sala de aula, com todas as dificuldades em suas mios, para entender e sentir as questdes que nao foram possiveis em leituras, ou mesmo na observagao das aulas. Nesse sentido, Cerletti (2009, p. 10) foi muito feliz quando afirmou que quem “deve estabelecer quais so os problemas concretos de ensinar filosofia so os que enfrentam no dia a dia com a situagiio de ensinar, ja que s6 eles esto em condigdes de ponderar com justeza todos os elementos intervenientes de cada situagdo pontual”. Portanto, considera-se que ¢ a vivéncia na escola como um todo, mas, sobretudo em sala de aula, que confere ao professor a competéncia de estabelecer certos métodos que configurem um ensino de melhor qualidade. Cada situagio tem suas particularidades e, por isso, & preciso que haja um movimento dialético entre professor e realidade, 0 que ficou bem claro no processo de regéncia quando, para nos adequar a certas exigéncias e dificuldades dos estudantes em sala de aula, foi preciso fazer adaptagGes do plano de estagio que tomamos como guia ini almente. A escola tem uma boa estrutura, possui biblioteca e sala de video, que dé ainda mais possibilidades de desenvolvimento na educagio e permite aos estudantes a possibilidade de atividades extraclasse, seja no ambito da cultura, seja no ambito do esporte. Porém, a nao utilizagdo do livro, bem como o curto espaco destinado a disciplina, gera um distanciamento do aluno diante da disciplina, pois, o momento que o estudante tem para pensar a disciplina se restringe a uma hora semanal, depois o estudante se depara com uma semana inteira lidando com outras questées, muitas vezes supérfluas que os afasta daquele momento, Ressalta-se aqui as consequéncias que a ausén do livro didatico acarreta, pois, devido a isto, nao hd um acompanhamento ¢ uma vivéncia extra classe dos contetidos trabalhados na disciplina de Filosofia, fator este que influencia a apreensio destes. As aulas para a regéncia, como disposto no plano de estagio, eram parte de duas unidades tematicas selecionadas para dois 3°s anos, cada unidade foi construida para cinco aulas, totalizando dez aulas nas duas turmas. O professor da disciplina nessa escola deixou, a critério do estagidrio, a escolha dos contetidos a serem trabalhados, dessa forma, a primeira os poe! arr ar 8 de filo oo en ne ee eer) unidade “Filosofia na Antiguidade” se desdobrou em cinco planos de aula que foram do “Mito” 4 “Filosofia de Platio”; a segunda unidade “Tépicos Filoséficos”, se ateve a problemas filoséficos durante a histéria, como a amizade em Aristételes, a questio do inatismo e do empirismo, bem como o renascimento com Giordano Bruno, ou a modernidade com Hume e Kant — todos os contetidos foram trabathados por meio de exercicios ¢ textos xerocados para serem entregues aos estudantes, além desses contetidos essencialmente filoséficos, ficou a nosso critério o uso de recursos nao filoséficos (complementares). Importa ressaltar que nossa intengdo inicial foi a de ndo utilizar recursos nao filos6ficos, mas 0 exercicio da regéncia nos impeliu a utilizagdo de tais recursos complementares, ¢ o resultado foi um aproveitamento melhor, que rendeu inclusive elogios da turma, © modelo de aula que o professor da disciplina utilizava se baseiva em eseritos no quadro (pela auséncia do livro didético © a ndo disponibilidade suficiente de cépias dos contetidos) © a explanagdo destes, nesse sentido, procurou-se no periodo de regéncia uma diminuigdo do tempo utilizado para a escrita no quadro (sendo utilizado apenas para tépicos), fazendo com que acarretasse um avango na aprendizagem. O que mais dificultou foi a inicial falta de desenvoltura por parte dos estagidrios, que na verdade se desenvolveu durante 0 decorrer das aulas. Sobre essa questo, em conversa com o professor da disciplina, este afirmou ser apenas uma questio de pritica e experiéncia em sala de aula. Ainda vale ressaltar que, a0 fim de cada aula, houve extensas conversas com 0 professor responsavel pelas turmas, onde este fez criticas construtivas, fazendo com que os estagiarios percebessem que além do contetido, deve haver ainda todo um “jogo de cintura” no relacionamento com os estudantes, fatores que foram perceptiveis no decorrer da pratica docente. Cada aula regida foi uma descoberta, uma linha ténue entre o relacionamento professor-aluno e aluno-disciplina se estabelece, ao passo que para que 0 aluno construa um desejo de saber sobre o que é transmitido & necesséria uma boa relagdo, que vem unida a imposigdo da voz e aos limites estabelecidos entre formalidade ¢ informalidade. Essa é uma questio dificil, até que ponto deve se estabelecer uma relagdo informal com o aluno? Cada caso reflete uma ago, € © maior desafio & perceber 0 momento de agir para construir uma motivago no aluno para a aprendizagem. Outro ponto interessante é a necessidade de articulagdo dos conteiidos filosdficos com a realidade dos estudantes, realidade que pode ter certa familiaridade devido a pesquisas relacionadas 4 escola e ao nivel social dos alunos. Construir aulas dialogadas foi interessante, nesse sentido, eles foram muito questionados, pois havia uma necessidade por parte dos estagidrios para saber o que eles pensavam, 0 que acarretou um resultado positivo, onde foi perceptivel a participagdo. Outra estratégia (conselho do professor) foi de tornar as aulas 0 mais agradavel possivel, traduzindo para eles conceitos dificeis como, por exemplo, pegar um fragmento de Heraclito ¢ articular com 0 movimento da vida dos estudantes. Nesse sentido, tomamos a devida nogdo da importincia dos complementos nio filoséficos, pois sto esses contetidos que podem fazer a articulagao da filosofia com 0 universo do estudante embora os poe! arr ee oe er ee no tenhamos usado em todas as aulas, esses complementos foram importantes nas aulas em que utilizamos. Como exemplo, na aula sobre Heréclito, utilizou-se a musica “Como uma onda no mar” de Lulu Santos, que foi tocada ¢ acompanhada em coro pelos estudantes que ja estavam com a letra em mios. Depois de uma reflexio e, em seguida, frases como “agora pude entender”, 0 que foi reconfortante para os estagidrios e futuros professores, Outro recurso foi o video “Mythof cave” para explicar 0 Mito da Caverna de Plato, uma critica a sociedade moderna e ao proprio modo de vida dos alunos. Acreditamos que essa aula, em especial, foi momento impar, visto que as discussdes fluiram naturalmente © mesmo as perguntas mais absurdas fez. com que eu, como estagiario, pudesse perceber que os alunos queriam aprender. Foi um periodo intenso que possibilitou uma reflexdo impar em relagdo 4 questio da educagio, que trazia o sentimento ora de frustragdo, ora de esperanga. Frustragdo por enxergar a potencialidade daqueles estudantes, enxergar neles possiveis pensadores criticos, ‘mas que ndo eram polidos da melhor maneira, devido justamente a falta de seriedade para com 0 ensino de filosofia por parte do sistema educacional. Por outro lado a esperanga, esta que se manifesta devido a percepgdo de que mesmo na adversidade, existem professores € estudantes prontos para lutar, professor na luta didria para construir boas aulas ¢ estudantes aprendendo, so os que Iutam e que impulsionam os novos profissionais a lutar também. Consideragées finais O periodo de regéncia na disciplina de Filosofia em uma escola da rede publica de ensino foi uma experiéneia sem igual para o desenvolvimento como futuros docentes, uma vez. que foi possivel vivenciar as dificuldades do professor no exercicio de sua fungdo, tendo consciéncia de que a regéncia se deu como um estudo de caso, visto que se passou em uma linica instituigdo, refletiu-se ainda sobre a possibilidade de existirem situagdes muito mais dificeis. Tendo em mente sempre a necessidade de superagdo ¢ transformagdo, a regéncia foi uum periodo transformador, em que se atravessou da posigdo de estudantes para a posigio de professor atuante, percebeu-se que a docéncia é um complement do estudo, compreendeu-se que 0 professor é um estudante que ensina, ele deve estudar ndo apenas 0 contetido, mas deve estudar a si e a0 outro para entdo poder ensinar. Esse foi um periodo chave para o desenvolvimento nao apenas como graduandos e futuros docentes, mas como pessoas que almejam por possibilidades de transformagao e, ‘mesmo que minima essa pode ser sim uma possibilidade. Ficou clara a distingdo entre teoria e pratica, durante o estagio constatou-se que a teoria guiou ao momento da pritica e se renovou como novas possibilidades tedricas a serem realizadas depois da pritica. Dessa forma, pode- se afirmar que, aquilo que tinha sido discutido durante a graduagdo de forma te6riea, pode ser vivenciado através do estagio na escola, principalmente a questio da préxis no contexto da vivéncia escolar (PIMENTA; LIMA, 2004). Sco arr Pode es errr Afirma-se ainda que havia em nosso entendimento uma certa resisténcia em relagio a docéncia no periodo que antecedeu a pritica, porém esse momento do estagio serviu como ‘um catalisador que reconfigurou a percepgdo € nos emocionou. Foi uma quebra de certos paradigmas que foram se constituindo durante a graduagdo, como por exemplo, 0 pensamento de que nesse contexto em que nos inserimos sé é possivel uma educagdo de qualidade no Ensino Superior, porém acredita-se que na Educagio Bésica é também possivel, mas ndo se pode apenas esperar por politicas educacionais que estabelegam novos sistemas de educagio, a luta 6 didria ¢ tomou-se a consciéneia de que ¢ possivel um ensino com qualidade mesmo em situagdes adversas. Com essa afirmagdo, ndo atribui ao professor todas as responsabilidades referentes & educagio, ha uma clareza sobre a teia de articulagdes que se estabelecem como fontes da problematica do ensino, mas o professor é figura importante, uma vez que esté a frente no processo, em contato com os principais interessados: os estudantes. Em suma, objetiva-se deixar registrado 0 agradecimento especial ao professor que cedeu suas turmas, pega fundamental neste aprendizado, jé que se disponibilizou a tirar diividas e fez criticas prudentes baseado em suas observagdes, além da forga que ofereceu, dando esperanga para continuar. Gratifica-se ainda a diregao e, especialmente, a coordenagao pedagégica, que atendeu com prontidao e gentileza. Enfim, agradecer a todos os funcionérios €.a todos os sujeitos da escola, de uma forma geral, por ter aberto as portas para esta pesquisa de campo. Aproveita-se também para agradecer a orientadora da disciplina de Estagio Supervisionado em Filosofia pelo suporte dado durante todo 0 processo de trabalho em campo. Além de toda a paciéneia e atengo que nos ofereceu, dando forga quando pensavamos em desistir. Por fim, a experiéncia do estigio de regéncia proporcionou muita reflexdo acerca dessa profissdo incrivel, mas ao mesmo tempo pouco reconhecida, fez com que a admiragao fosse ainda maior para com os professores, entendé-los e querer construir um caminho semelhante ao deles. Considera-se esse momento um marco nesta trajetéria académica, uma disposigdo real de que somos capazes de construir um trabalho bom, muito melhor do que o que foi feito agora nesse primeiro contato. SUBMETIDO EM ABRIL DE 2013. APROVADO PARA PUBLICACAO EM FEVEREIRO DE 2014. REFERENCIAS CERLETTI, Alejandro. O ensino da filosofia como problema filoséfico. Trad. Ingrid Miiller Xavier. Belo Horizonte: Auténtica Editora, 2009. (Colegio Ensino de Filosofia), cca perry 27 er enor Soe ces Sere LORIERI, Marcos Antonio. Filosofia: fundamentos © métodos. So Paulo: Cortez, 2002. (Colegdo Docéneia em Formagiio). LUDKE, Menga; ANDRE, Marli E. D. A. Pesquisa em educagao: abordagens qualitativas, Sao Paulo: EPU, 1986, MINAYO, Maria Cecilia de Souza, Ciéneia, técnica ¢ arte: 0 desafio da pesquisa social. In: Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 4 ed. Petropolis: Editora Vozes, 1995. p. 9-29. PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena, Estigio: diferentes concepgées. In: Estagio e docéncia. Sdo Paulo: Cortez, 2004. p. 33-57. (Colegao Docéncia em Formagao; Série Saberes Pedagdgicos). cca us rd necessério par rer nto epicuri Que é necessirio para ser feliz? Uma reflexio a partir do pensamento epicurista Daniel Donato Piasecki® Resumo Esse relato de experiéneia tem como tema central a felicidade, a partir do pensamento do filésofo grego Epicuro, promovendo uma reflexio relacionada ao consumismo da sociedade contemporinea, com 0 objetivo de refletir sobre 0 que realmente pode nos tornar felizes, 0 que realmente queremos quando adquirimos um objeto, compreender a ética epicurista e como ela pode contribuir nas nossas reflexdes e agdes cotidianas., Palayras-chave: Consumismo, Epicuro, Felicidade. Introdugio Esse relato de experiéncia foi um dos selecionados a participarem da Associagao Nacional de Pés-Graduago em Filosofia ~ ANPOF Ensino Médio, no ano de 2013 em Curitiba-PR e baseia-se no pensamento do filésofo Epicuro, tratando do tema felicidade ¢ relacionando suas ideias no combate ao consumismo, com 0 objetivo de refletir sobre © que realmente pode nos tomar felizes ¢ o que realmente queremos quando adquirimos um objeto, compreender a ética epicurista € como ela pode contribuir nas nossas reflexdes © agdes cotidianas, A experiéneia relatada jé foi desenvolvida com alunos de 8° ano do ensino fundamental ¢ do 2° ano do ensino médio, em escolas particulares e colégios estaduais no Parand, onde lecionei. Para 0 filésofo Epicuro, a felicidade e a auséncia de dor so o que todos aspiram, mas na busca desses objetivos podemos nos enganar ¢ acabar seguindo caminhos que nos afastam deles, sendo seduzidos por objetos supérfluos que exigem poder aquisitive para sua obtengao € escondem a nossa real necessidade, E 0 conhecimento seguro dos desejos leva a direeionar toda escolha ¢ toda recusa para a satide do corpo e para a serenidade do espirito, visto que esta & a finalidade da vida feliz: em raziio desse fim praticamos todas as nossas agdes, para nos afastarmos da dor e do medo (EPICURO, 2002 p. 35). ‘A sua tese gira em tomo da ideia de que a amizade, a liberdade ¢ a reflexao sio os itens essenciais para a obtengdo da felicidade, e ndo a busca incansivel em correr atrés de dinheiro © poder consumir qualquer produto, Dessa maneira, através do pensamento epicurista & possivel fazer a andlise de nossos desejos ¢ avaliar se nossas agdes tendem & ‘SProfessor da Rede Estadual de Educago do Parana. E-mail: dadosecki@seed pr-gov.br Sac Perr) eres EE} ees 7 felicidade ou é necessério tomar outra rota, segundo a sua concepgio. Assim como 0 filésofo Botton (2001, p. 73) afirma: ‘Sem davida, ¢ improvavel que a riqueza sempre traga a infelicidade. Mas o ponto: crucial da tese de Epicuro é que, se temos dinheiro e ndo temos amigos, liberdade & uma vida baseada na reflexdo, jamais seremos verdadeiramente felizes. E, se temos tudo, com excegao do dinheito, jamais seremos infelizes, Portanto, a reflexdo nao pretende uma negagdo as facilidades que o desenvolvimento humano possibilita, mas sim interrogar quanto aos desejos, se forem realizados ou ndo, o que nos acontecerd? Libertando-nos ou até mesmo, possibilitando que a reflexio anterior a qualquer consumo, possa combater 0 consumismo que sempre é impulsivo e néo refletido. Desenvolvimento Primeiramente deve ser discutido com os alunos 0 que é a felicidade ou o que os toma felizes. Partindo de suas concepgdes, 0 professor pode refletir com eles ¢ analisar cada definigdo. Por exemplo: pode ser que algum aluno diga que o que Ihe torna feliz é ter muito dinheiro, dessa forma ele conseguiria comprar 0 que quisesse e as pessoas andariam com ele. Pode-se entio refletir com os alunos 0 que & necessirio para que tenha uma vida confortavel longe da dor; por que consumimos tanto ¢ trocamos rapidamente de produtos que ainda funcionam como computadores, celulares e, se por tras dessa “necessidade” de ter dinheiro e comprar 0 que quiser, ndo esta escondido apenas a necessidade de ter companhia. Dessa forma, os alunos partem da concepgio que eles tém de felicidade e o que & realmente necessario para uma vida feliz. Partindo disso, pode ser utilizado 0 texto de apoio que consta no livro As consolagdes da Filosofia de Alain de Botton e solicitar uma pesquisa dos alunos para que seja discutido em sala de aula 0 contexto do periodo em que Epicuro vivia, Levantar questdes e aprofundar aquelas ideias iniciais: 0 que ¢ necessirio por que consumimos tanto? Baseados agora no texto. Apés a discussio do texto, definidos conceitos ¢ contextualizado o periodo vivido pelo fildsofo, pode ser solicitado que em grupos, os alunos elaborem um quadro composto pelos conceitos que Epicuro define para analisar nossas necessidades, que so: 1) natural ¢ necessirio (alimentagdo, reflexdo, amigos, vestuério); 2) natural, mas desnecessério (palacete, banquetes) e; 3) nem natural, nem necessirio (fama, poder). A partir disso, os alunos podem criar 0 seu proprio quadro, ¢ apresentar aos seus colegas. Posterior a isso, pode ser assistido o programa apresentado pelo filésofo Alain de Boton intitulado Um guia para a felicidade (que esta disponivel em varios canais do YouTube) cujo video é inspirado no texto, mas que foca mais na nossa necessidade de consumir ¢ como as propagandas influenciam nas nossas escolhas. Apés assistir e debater, solicitar que os alunos observem propagandas nos meios de 22, arr) Cerner ernn rs partir do comunicagdo ¢ que tragam algumas para que possam ser analisadas pela turma, como por exemplo: comerciais de bebida alcodlica, que frequentemente transmitem a imagem de reunitio com os amigos, alegria, evidenciando que ao consumir aquela bebida ele sempre teré amigos ao seu redor para momentos alegres e descontraidos, para tanto é necessério que se consuma. Ou, entdo, os classicos comerciais de margarina que transmitem a ideia de familia feliz, que levantam animadas © tomam café em conjunto, Lojas de méveis, refrigerantes, chocolates, shoppings ¢ até consultérios odontologicos associam o seu produto a felicidade, possibilitando que os alunos percebam que, ironicamente, ser feliz ¢ muito ficil nessa perspectiva, necessitando apenas consumir. A proxima etapa é propor que sejam feitas “propagandas reflexivas” pelos alunos no colégio (em cartazes ou em video), que estimulem as pessoas a pensar nas suas necessidades € ampliando para o espago fora da escola, Uma proposta pode ser estimular os alunos a escrever frases reflexivas no vidro traseiro dos carros de seus pais ou dos professores, como: Consumir para viver ou viver para consumir? Apés essas ages, problematizar com os alunos: Como seria uma sociedade baseada no pensamento epicurista? Sem 0 desenvolvimento tecnolégico que temos hoje, mas feliz? Como titima proposta de avaliagio, pode ser solicitada um texto em que os alunos expressem sua reflexio a respeito da felicidade, ja com essas discussdes realizadas em grupo, possibilitando mais um momento para que ele pense sobre esses assuntos € visualize, se ele se mantém 0 mesmo que antes ou se houve mudangas relacionados aos assuntos tratados: felicidade e consumo. © tempo de desenvolvimento dessas atividades depende da condugdo que ¢ dada para cada parte, mas ela pode ser realizada entre seis a oito aulas. Resultados Dos resultados obtidos, péde ser observado que os alunos em grande parte mudaram seu olhar sobre a vida ¢ relataram que comegaram a fazer andlises antes de suas compras, verificando se a aquisigao desses produtos era necesséria para a sua felicidade. Nos relatos ¢ conversas que tivemos, afirmaram que muitas vezes correm em busca de um objeto para ser incluido em algum grupo, mas que na verdade 0 que realmente estavam querendo era a companhia das pessoas. Mas que na sociedade em que vivemos realmente conta se uma pessoa possui bens materiais, mas que isso no deve ser visto como o principal, e nem sempre isso é motivo de felicidade para quem possui. Submetido em janeiro de 2014. Aprovado para publicagdo em marco de 2014. arr) IRL REFERENCIAS DE BOTTON, Alain. As consolagées da filosofia. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. SAMOS, Epicuro de. Carta Sobre a felicidade a Meneceu. Sio Paulo: UNESP, 2002. Scar Perr) pee ee et eT) Ensinando adolescentes a ensinar filosofia: apontamentos reflexivos’ Daniel Soczek* Resumo 0 objetivo deste artigo & apresentar algumas reflexdes sobre o ensino de filosofia a partir de um minicurso ofertado a 20 estudantes de ensino médio, adolescentes, matriculadas no curso de formago de docentes de uma escola piblica do Estado do Parand, Este minicurso foi proposto ¢ desenvolvido como uma das atividades integrantes do programa de formagdo continuada dos professores do Estado do Parand (PDE) compreendendo o biénio 2012-2013. O texto traz uma discussio sobre o ensino de filosofia a partir das atividades desenvolvidas neste minicurso. Destaca aspectos que podem contribuir para a melhoria da_prixis profissional docente do professor de filosofia com reflexos positives nas priticas de ensino- aprendizagem. Conclui pela defesa da centralidade da pesquisa como elemento fundante ¢ principal da praxis profissional educativa e aponta alguns de seus desafios contempordneos. Palavras-chave: Metodologia do Ensino de Filosofia, PDE, Pesquisa. Introdugio Resultado de um intenso proceso histérico de lutas, a conquista recente da obrigatoriedade da presenga da disciplina de Filosofia no curriculo do ensino médio por forga de lei (HORN, 2013) demanda andlises ¢ posicionamentos sobre o seu ensino que envolve enfoques diversos e complementares. E possivel destacar, por exemplo, a importincia e significado da formagio dos estudantes (SEVERINO, 2010), aspectos metodolégicos voltados & praxis docente (TESSER, HORN e JUNKES, 2012; KOHAN, 2012) ow ainda os fundamentos normativos e seus desdobramentos para 0 ensino de filosofia (RODRIGUES, 2012) dentre muitos outros olhares possivei Neste artigo, o ensino de filosofia & tomado sob duas perspectivas pensadas de forma conjunta, integradas e interdependentes. A primeira, voltada para o professor que ministra a disciplina de Filosofia na especificidade de um curso de formagdo de docentes em nivel médio ¢ a segunda voltada para 0 estudante do curso de formagio de docentes que iré trabalhar (ou jé trabalha como estagidrio) na educagdo infantil, Nesse sentido, o desafio desta reflexdo abrange uma dupla dimensGo do ensino de filosofia a partir do tratamento dialético da relagdo professor-estudante. A primeira dimensdo esté no incentivo ¢ construgdo do Este texto € uma versio com poucas modificagdes de um trabalho apresentado para conclusio das atividades desenvolvidas no ambito do PDE — Programa de Desenvolvimento Educacional do Estedo do Parané, concluido em 2013, *Professor da Rede Estadual de Educago do Parana e do Grupo UNINTER. E-mail: danielsoczek@terra.com.br pas .33-46, Set. 2014 he ae losofia: ap pensamento filoséfico com os estudantes. A segunda dimensdo est no incentive aos estudantes para construirem um pensamento filosdfico em sua préxis profissional, no contexto da educagdo infantil, considerando ser possivel o despertar do pensamento filos6fico em criangas, como apontam os estudos teéricos de Lipman (TELLES, 1999) ou Benjamin (SCHLESENER, 2011), dentre outros. ‘Um dos elementos que une estas duas dimensdes da préxis docente esta na centralidade da pesquisa nos processos pedagégicos (DEMO, 1991). Ainda que as condigdes materiais e ideolégicas ndo sejam favoriveis a0 incentive e manutengdo das pesquisas no Brasil, pereebem-se avangos nas politicas piblicas nesse sentido como, por exemplo, 0 Decreto n. 6.755/2009 que: [...] institui_ a Politica Nacional de Formagao de Profissionais do Magistério da Educagio Basica, disciplina a atuagdo da Coordenagdo de Aperfeigoamento de Pessoal de Nivel Superior — CAPES no fomento a programas de formagao inicial e continuada, dé outras providéncias Tais politicas sdo imprescindiveis, visto que, o distanciamento entre formagdo e atuagdo profissional (TREVISAN, 2011) precisa ser superado ¢ a pesquisa, como fundamento da condigdo de ser professor, é uma instigante hipétese de resposta a esta demanda, Frente a este quadro, a realizagio de uma formagdo continuada, sistemitica ¢ de qualidade, pautada pela pesquisa, ¢ condi¢ao necesséria e urgente, E preciso, constantemente, retomar a discussio sobre 0 ensino para que o professor ndo se transforme em simples “tarefeiro” (TARDIF, 2012). E preciso que, no cotidiano do exercicio de suas atividades, o professor ndo se deixe aquebrantar pela reduedo fenomenologica e epistémica de suas agdes pedagégicas com reflexos por dbvio negativos quanto ao seu alcance e significado em toda sua prxis educacional. Assim, considerando a importincia das discussdes sobre 0 ensino de Filosofia com vistas 4 (re)construgdo de referencias tedricos que reforcem sua consisténcia e profundidade € de metodologias que melhorem a praxis docente, programas de formagdo docente continuados so sempre bem-vindos porque so necessérios € quase sempre urgentes, No Parand, dentre os varios programas de formago continuada para professores, cabe destaque para o Programa de Desenvolvimento Educacional ~ PDE no qual foi gestada e implementada a experiéncia pedagdgica neste texto analisada. A atividade foi desenvolvida, dentro da disciplina de Filosofia, na linha de estudo “o ensino de filosofia: concepgdes, metodologias e © uso de textos classicos”, A proposta de intervengao pedagégica na escola se deu em forma de um minicurso de metodologia do ensino de Filosofia para os estudantes do curso de formagdo de professores de uma escola da rede piiblica de ensino e a implementagdo desta atividade foi precedida de reflexes desenvolvidas a0 longo do primeiro ano do afastamento das atividades de sala de aula como preconizado por este programa, Esta reflexio foi adensada pela participagdo viabilizada pelo programa, em eventos cientificos e oficinas ofertadas pela Universidade Federal do Parané e outras IES (InstituigGes de Ensino Superior) pas aa eee eee Ty Eon en en nr) €, posteriormente, discutida com 15 professores da rede publica que ministram aulas de filosofia a partir do Grupo de Trabalho em Rede ~ GTR®. Estes professores, participantes do GTR, Ieram 0 texto que expie as bases tedricas © as explicagdes referentes ao desenvolvimento da implementago do minicurso proposto, construido sob 0 nome de Produgdo Diditico Pedagégica. Em seguida, opinaram sobre 0 mesmo em termos de fundamentagdo teérica, desenvolvimento ¢ avaliagdo. Alguns deles aproveitaram para aplicar parte da atividade proposta no minicurso de forma adaptada em suas aulas de filosofia, comentando os resultados que obtiveram e contribuindo para a melhoria do desenvolvimento da proposta de trabalho. © objetivo deste texto, portanto, ¢ relatar de forma breve a experiéncia do desenvolvimento e aplicagdo deste minicurso na escola, apontando elementos reflexivos sob 0s fundamentos epistemol6gicos que orientaram a formulagdo ¢ implementagdo desta pritica educativa. Assim, em um primeiro momento serio apresentadas algumas reflexdes sobre a relagdo entre professor ¢ os estudantes nos processos de ensino e aprendizagem. No segundo momento, sera feita a apresentagio da experiéneia pedagégica realizada seguida de uma reflexdo critica sobre a atividade desenvolvida. Espera-se, com os apontamentos deste artigo, compreender os reflexos, limites © possibilidades do minicurso oferecido no sentido de divulgar a experiéncia realizada, Seu intuito é contribuir para a discussdo do ensino de filosofia além reafirmar a importancia da oferta de formago continuada para os professores. Pressupostos do minicurso De acordo com o site institucional do governo do Estado do Parané, © PDE é uma politica piblica de Estado regulamentado pela Lei Complementar n* 130, de 14 de julho de 2010 que estabelece o didlogo entre os professores do ensino superior e 0s da educagdo basica, através de atividades tebrico-priticas orientadas, tendo como resultado a produgdo de conhecimento © mudangas qualitativas na pritica escolar da escola piblica paranaense (PARANA, SEED, 2013). Fruto da luta pela methoria na qualidade da educagao ofertada no Parané este Programa, inédito no Brasil em termos de proposta teérica oferta de condigdes para sua realizado (GABARDO; HAGEMEYER 2010), & disponibilizado a todos os anos aos professores concursados da rede piiblica de ensino com a oferta de 2,000 bolsas/ano, cuja selegdo é feita por edital especifico. As atividades deste programa desdobram-se por dois anos sendo que, no "De acordo com o site da SEED/PR, os Grupos de Trabalho em Rede ~ GTR se caracterizam pela interagio virtual entre os Professores PDE e demais professores da Rede Publica Estadual, Tal atividade tem como objetivos: “..] possbilitar novas altemativas de formago continuada para os professores da Rede Piblica Estadual; viabilizar mais um espago de estudo © discussio sobre as especificidades da realidade escolar; incentivar 0 aprofundamento teérico-metodoldgico nas areas de conhecimento, através da troca de ideias € experigncias sobre as éreas curriculares; socializar 0 Projeto de Intervengio Pedagégica na Escola elaborado pelo professor PDE com os demais professores da Rede” (SEED, 2013). pas aa eee eee Ty EG Serr famentos reflexivos losofia: ape terceiro semestre de atividades, ¢ exigido ao professor que desenvolva uma “intervengao pedagégica” na escola. A opgdo de intervengdo em andlise neste texto & a proposi¢ao de um minicurso sobre o ensino de filosofia direcionado aos estudantes do curso de formagio de docentes. A proposigiio de um minicurso dessa natureza requer, para sua justificativa ¢ fundamentagdo tedrica, a meméria de algumas reflexdes sobre o ensino de filosofia ¢ a centralidade da pesquisa na préxis educacional. As questdes atinentes ao que ensinar, como, quando e porque, cuja natureza filos6fica Ihes é inerente, possuem uma trajetdria histérica critico-discursiva que remonta ha milénios. Proposigdes que, por exemplo, remontam a Grécia Classica, como a de Sécrates, Plato ou Aristételes registradas em textos como A Reptiblica (PLATAQ, 1973) ou Politica (ARISTOTELES, 1997) j4 apontavam elementos/altemativas para pensar os significados do proceso educacional. Em cada pais © momento histérico subsequentes, que apresentam demandas especificas, propostas diversas foram sendo construfdas e sustentadas por um caleidoscépio de ideologias ndo necessariamente convergentes. Hoje temos 0 desafio de pensar, no contexto de uma realidade hegemonicamente neoliberal, pautada pelas consequéncias do desdobramento daquilo que Adorno e Horkheimer (1985) denominaram de indGstria cultural, os significados do ensino em uma sociedade que, tudo naturalizando, analiza ¢ destréi as relagdes humanas em dimensdes diversas (BAUMAN, 2007). O desafio platOnico-aristotélico de sair da caverna e construir uma sociedade melhor nunca foi tio premente e, uma reflexdo sobre o ensino que aponte altemativas a este momento ¢ movimento histérico, nunca se fez tio necessério. Considerando 0 contexto histérico contemporaneo e as demandas a ele associadas, um dos pressupostos elementares das atividades desenvolvidas esti em destacar a importéncia da pesquisa enquanto uma ago que viabiliza a emancipagio dos sujeitos frente aos desafios do contexto contempordneo. Parte-se do pressuposto de que, se a pesquisa no é incentivada, desenvolvida € construida como fundamento e objetivo do processo educacional, entdo este se torna indesejavel ja que se limitaria ao que Paulo Freire (1994) designou como “educagao bancéria”. A importincia da associagdo entre pesquisa ¢ reflexdo permite 0 acesso a varias alternativas ¢ possibilidades de visio de mundo e, consequente, a solugdo de problemas desenvolvendo um perfil cada vez menos dogmético ¢ mais criativo pelo exame, comparagao © questionamento (FREIRE, 1996). Esse movimento coloca a verdade na perspectiva da relagio entre os sujeitos ¢ o mundo ¢ permite, por isso, aquilo que Deleuze ¢ Guatarri (2000) consideram como fundamento da filosofia: a criagdo de conceitos. ‘Nao podemos escapar ao fato de que, em principio, se o professor e o estudante no se instituem/constituem como pesquisadores, adotando uma postura critica reflexiva, a escola torna-se mera reprodugdo, podendo ser tomado este conceito em diversas perspectivas, como em Bourdieu (2004) ou Mézsaros (2008). E preciso que a pesquisa deixe de ser, seja no Ensino Superior e principalmente na Educagdo Basica, um apéndice metodolégico ¢ seja construida como fundamento de uma educagdo de qualidade. Considerando as perspectivas pas .33-46, Set. 2014 7 acima que apontam alguns elementos que ajudam a pensar a realidade dos alunos ¢ professores, a proposigdo de um minicurso que abordasse 0 ensino de filosofia, ainda que voltado aos estudantes secundaristas, requereu aos professores participes do GTR seu envolvimento com esta problemética de pesquisa. E preciso considerar os mais diversos entraves ao processo formativo que compreende ‘um arco que se estende dos limites burocriticos da légica de organizagdo das escolas até a auséncia de condigio financeira necesséria para o desenvolvimento da formagdo continuada e da pritica da pesquisa. A construgo deste minicurso e sua implementagdo supde a possibilidade de ajudar a pensar esta problemética no intuito de colaborar para o desenvolvimento de um processo pedagégico centrado na pesquisa ¢ na reflexdo critica, considerando © uso das tecnologias nos processos de ensino-aprendizagem e outras metodologias sem olvidar questées relativas a inclusio social. Esta reflexio, foco deste minicurso, permeada pelo destaque de experiéncias nos processos de docéneia, toma possivel a anélise de elementos que contribuam para a compreensio das tensdes do cotidiano profissional ¢ apontem para possiveis altemativas a médio e longo prazo para algumas das muitas dificuldades destes processos. A filosofia, a0 admitir a incompletude da condigdo humana bem como a mutabilidade dos valores sociais (MACINTYRE, 2001), propicia reflexdes ¢ aponta para a construgdo coletiva de altemativas aos dilemas da condigao do professor baseada na indagagao filos6fica. Se admitida como correta esta tese da multiplicidade de valores ¢ da incompletude da condigéo humana, a necessidade de uma formagdo continuada ¢ uma demanda ébvia ¢ “urgente. Se o fundamento ¢ a necessidade de uma formagao continuada nos parecem claros, os critérios de sua realizagio merecem questionamento constante visto que & necessario considerar os fundamentos materiais e simbélicos nos quais os humanos se inserem ¢ reproduzem sua condigdo de existéncia em sociedade. Nunca podemos nos esquecer, nos passos de Gadotti (2005), que a formagdo continuada do professor deve ser concebida como reflexdo, pesquisa ¢ agio, E fundamental, portanto, incentivar a descoberta, organizagao, fundamentagao, revisio e construgao de conhecimentos, lembrando sempre das necessérias condigdes prévias ¢ consequéncias de uma atividade desta natureza. Nesse sentido, fazemos coro com algumas ideias de Espinosa, apresentadas por Chaui, quando afirma que esse filésofo, L..] dizia que a razdo sé inicia o trabalho do pensamento quando sentimos que pensar € um bem ou uma alegria, € ignorar, um mal ou uma tristeza. Somente quando o desejo de pensar é vivido ¢ sentido como um afeto que aumento nosso ser «nosso agir € que podemos avaliar todo mal que nos ver de no saber. Pensa ait, ser livre e feliz constituem uma forma unitiria de viver, individual e politicamente. Ignorar, padecer, ser escravo e infeliz também constituem um modo unitirio de existir. Por isso, escrevia Espinosa, nao hé instrumento mais poderoso para manter a pas Cor nnee er) Ln ae losofia: ap

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