Você está na página 1de 23

PERSPECTIVAS DE

DIREITOS HUMANOS
CONSELHO EDITORIAL SELO ÁGORA21

PRESIDÊNCIA

Felipe Dutra Asensi


Marcio Caldas de Oliveira
CONSELHEIROS

Adriano Rosa (USU,Rio de Janeiro)


Alfredo Freitas (AMBRA, Estados Unidos)
André Guasti (TJES, Viória)
Arthur Bezerra Junior (UNINOVE, São Paulo)
Bruno Zanotti (PCES, Vitória)
Camila Jacobs (AMBRA,Estados Unidos)
Camilo Zufelato (USP, São Paulo)
Carolina Cyrillo (UFRJ, Rio de Janeiro)
Claudia Pereira (UEA, Manaus)
Claudia Nunes (UVA, Rio de Janeiro)
Daniel Giotti de Paula (Intejur, Juiz de Fora)
Eduardo Val (UFF,Niterói)
Fernanda Fernandes (PCRJ, Rio de Janeiro)
Glaucia Ribeiro (UEA, Manaus)
Jeverson Quinteiro (TJMT, Cuiabá)
José Maria Gomes (UERJ, Rio de Janeiro)
Luiz Alberto Pereira Filho (FBT-INEJE, Porto Alegre)
Paula Arevalo Mutiz (FULL,Colômbia)
Paulo Ferreira da Cunha (UP,Portugal)
Pedro Ivo de Sousa (UFES, Vitória)
Raúl Gustavo Ferreyra (UBA,Argentina)
Ramiro Santanna (DPDFT, Brasília)
Raphael Carvalho de Vasconcelos (UERJ, Rio de Janeiro)
Rogério Borba (UCAM, Rio de Janeiro)
Santiago Polop (UNRC,Argentina)
Siddharta Legale (UFRJ, Rio de Janeiro)
Tatyane Oliveira (UFPB, João Pessoa)
Tereza Cristina Pinto (CGE, Manaus)
Thiago Pereira (UCP, Petrópolis)
Vanessa Velasco Brito Reis (PGM,Petrópolis)
Vania Marinho (UEA,Manaus)
Victor Bartres (Guatemala)
Yolanda Tito Puca (UNMSM, Peru)

REVISADO PELA COORDENAÇÃO DO SELO ÁGORA21


ORGANIZADORES
ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR
FELIPE DALENOGARE ALVES
FERNANDO AITH
SIDDHARTA LEGALE

PERSPECTIVAS DE
DIREITOS HUMANOS

ágora21

GRUPO MULTIFOCO
Rio de Janeiro,2018
Copyright ©2018 Arthur Bezerra de Souza Junior, Felipe Dalenogare Alves, Fernando
Aith e Siddharta Legale (org.).

DIREÇÃO EDITORIAL Felipe Dutra Asensi e Marcio Caldas de Oliveira


EDIÇÃO E PREPARAÇÃO Thiago França
REVISÃO Coordenação Selo Ágora 21
PROJETO GRÁFICO E CAPA Carolinne de Oliveira
IMPRESSÃO E ACABAMENTO Gráfica Multifoco

DIREITOS RESERVADOS A

GRUPO MULTIFOCO
Av. Mem de Sá,126-Centro
20230-152/Rio de Janeiro, RJ
Tel.:(21) 2222-3034
contato@editoramultifoco.com.br
www.editoramultifoco.com.br

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS.


Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer
meios existentes sem autorização por escrito dos editores e autores.

Perspectivas de direitos humanos


JUNIOR,Arthur Bezerra de Souza
ALVES,Felipe Dalenogare
AITH,Fernando
LEGALE,Siddharta

1a Edição
Setembro de 2018
ISBN:978-85-8273-536-7

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P467
Perspectivas de direitos humanos/Organizadores
Arthur Bezerra de Souza Junior et al. - Rio de Janeiro:
Multifoco,2018.
698p.;21cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-8273-536-7

1.Direito humanos. I. Souza Junior, Arthur


Bezerra de. II. Alves,Felipe Dalenogare.III.Aith,
Fernando.IV.Legale,Siddharta.

CDD 341.4809

Ficha catalográfica elaborada por Marília Gorito Silva (CRB-7/6931)


da assistência sexual para as pessoas
com deficiência: efetividade dos
direitos humanos ou legitimação da
prostituição?
Flávio Romero Guimarães e Paulla Christianne da Costa Newton

A título de introito: sexualidade e deficiência.

A pessoa com deficiência amargura múltiplas facetas da vulnerabilidade.


Se, por um lado, a deficiência, em qualquer uma de suas manifestações,
representa um fator inveterado de vulnerabilidade e discriminação, por outro
aspecto a de-ficiência induz à interação com outros elementos com idên-tica
conotação discriminatória. Ilustrativamente,observa-se de forma corriqueira a
associação da pessoa com deficiência à impotência, asco, incompetência,
comoção, entre tantas outras qualificações que majoram, sensivelmente, a
vulnera-

475
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

bilidade e o risco de exclusão. Desta forma,vislumbra-se a


possibilidade de hipóteses complexas de vulnerabilidade,as quais
podem aderir vários estigmas agressivos, tradicional-mente
perpetuados no convívio social. Entre os estereótipos mais
difundidos e diretamente relacionados às pessoas com deficiência,
destaca-se a questão da sexualidade.
Indubitavelmente, nesta seara, há uma tendência em se vincular a

deficiência, qualquer que seja o tipo ou grau,com incapacidade,

impotência, infertilidade, apatia, ausência de mente, as limitações

físicas, sensoriais, mentais ou intelec-tuais são idealizadas como

amputações sexuais.
Tais construções são absolutamente inaceitáveis e se tor-nam
campo fértil para a perpetuação da discriminação.
Negar a sexualidade, o desejo, os sentimentos e os im-pulsos
sexuais à pessoa com deficiência simboliza o esface-lamento de sua
condição humana, considerando-se que a sexualidade é reflexo natural
dos seres vivos, em qualquer forma de orientação pretendida.
Efetivamente,neste panorama, a múltipla vulnerabi-lidade das
pessoas com deficiência exterioriza uma dupla discriminação:

I-A discriminação histórica, social e cultural que


pade-ceu/padece em razão da deficiência e,
II - A discriminação que padece no cerne familiar,da
comunidade e do Estado, resultante da limitação ou recha-ço aos
seus direitos sexuais,
PERSPECTIVAS em uma
DE DIREITOS nítida expressão de violência social.
HUMANOS

Inclusive, cabe ressaltar que,historicamente, ao vislum-brar-se os


estudos e teorias sobre a deficiência, tratar de te-

476
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

mas como sexualidade e direitos sexuais não é recorrente. Paira um silêncio,


inclusive normativo, ao qual se pode ex-plicar “porque la sexualidad es
percibida como un deseo y no como una verdadera necesidad”
(CASADO,2014,s/p).
Este complexo discriminatório torna imprescindível que os Estados adotem
medidas que permitam a este coletivo o pleno gozo dos direitos e liberdades
essenciais, considerando--se que as normas jurídicas existentes são insuficientes
para eliminar todas as nuances da desigualdade de fato, se não se empreendem
ações para compensar os efeitos nocivos de atitu-des,comportamentos e estruturas
organizacionais profunda-mente arraigadas na sociedade (GORDILLO,2011).
A mobilização pela conquista do exercício efetivo dos di-reitos das
pessoas com deficiência clama pela ruptura com os padrões de
marginalização que vivenciam,tanto no espaço público quanto no privado.

1. Declaração universal dos direitos sexuais. Os direitos


sexuais como direitos humanos fundamentais e elementos
essenciais à consecução do pleno desenvolvimento humano

A Declaração universal dos Direitos Sexuais, aprovada pela Assembleia


Geral da Associação Mundial de Sexologia, em 26 de agosto de 1999, no 14°
Congresso Mundial de Se-xologia,em Hong Kong preconiza que, entre outros
aspec-tos, os direitos sexuais são direitos humanos fundamentais e
universais arraigados na liberdade, dignidade e igualdade.
Sendo assim, compreende-se que a sexualidade insere-se como elemento
intrínseco à personalidade do ser humano,con-siderando-se o pleno
desenvolvimento da sexualidade como fa-tor essencial para o "bem estar individual,
interpessoal e social”.

477
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

A Declaração Universal elenca uma plataforma de direi-tos sexuais


que devem ser reconhecidos, promovidos, respei-tados e defendidos,
como instrumentos imprescindíveis para a consolidação da saúde
sexual, nos seguintes moldes:

I - Direito à Liberdade Sexual: viabilizando a expressão das


potencialidades sexuais dos indivíduos,excluindo-se coerções,
explorações e abusos de qualquer natureza;
II - Direito à Autonomia Sexual, Integridade Sexual e Segurança do
Corpo Sexual: comporta o direito de decidir livremente sobre as
vertentes sexuais,considerando-se a éti-ca pessoal e social, incluindo-
se o domínio sobre o próprio corpo, livre de tortura, mutilação ou
violência;
III - Direito à Privacidade Sexual: envolvendo o direito à tomada de
decisões individuais sobre a intimidade, sempre que não perturbe os
direitos sexuais de outrem;
IV - Direito à Equidade Sexual: refere-se ao rechaço a todas
formas de discriminação, incluindo-se às limitações fisicas ou
emocionais;
V-Direito ao Przer Sexual: incluído como instrumen-to para o bem
estar pleno do indivíduo;
VI - Direito à Expressão Sexual Emocional: direito do indivíduo
expressar a sua sexualidade através da comunica-ção, o contato, a
expressão emocional e o amor;
VII-Direito à Livre Associação Sexual: Significa a ampla
possibilidade de estabelecer variados tipos de associações se-xuais ou
não, conforme o livre entendimento do indivíduo;
VIII-Direito a fazer opções reprodutivas, Livres e Res-
ponsáveis: direito a decidir sobre ter ou não filhos e o acesso aos
mecanismos de regulação da fertilidade;

478
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

IX - Direito à Informação baseada no Conhecimento Científico: processos


científicos e éticos devem gerar a in-formação sexual, com adequadas
formas de divulgação,atin-gindo às variadas camadas da sociedade;
X- Direito à Educação Sexual Compreensiva: processo duradouro que
deve nortear o indivíduo desde o nascimento e envolvendo às instituições
sociais diversas;
XI - Direito ao Cuidado da Saúde Sexual: os mecanis-mos e instrumentos
para atenção à saúde sexual devem en-contrar-se disponíveis para
prevenção e tratamento dos pro-blemas, aflições e desordens sexuais.

Do exame analítico das linhas supra, percebe-se que o alcan-ce efetivo e


integral dos direitos sexuais sedimenta-se mediante a consolidação das facetas
acima descritas, compreendendo-se que, os direitos sexuais enquanto direitos
universais deverão vincular-se à liberdade, autonomia, segurança, integridade,
privacidade,equidade, prazer, informação, educação e atenção à saúde, como
reflexo de sua conotação integral. De forma que, a abordagem de tais direitos deve
alcançar a todos,incluindo-se, evidentemente,as pessoas que possuam algum tipo
de limitação física,sensorial,funcional, mental ou intelectual.
Neste panorama, torna-se imprescindível edificarmos uma concepção universal dos
direitos humanos para abranger o res-peito, o fomento e a tutela dos direitos sexuais em
uma ampla abordagem baseada nos pilares da autonomia, liberdade,infor-mação, saúde e
segurança, considerando-se à seara da sexualida-de como fator crucial ao pleno
desenvolvimento humano.

3. Tutela à afetividade na perspectiva da convenção da


Organização das Nações

479
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

Unidas sobre os direitos das pessoas com


deficiência e seu protocolo facultativo
A Convenção da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, aprovada em 13 de dezembro de 2006,
estabelece,em seu artigo 23, a adoção de medidas efetivas e
adequadas para eliminar a discriminação contra as pessoas com
deficiência no que concerne ao casa-mento,família,paternidade e
relacionamentos.
Neste aspecto especial, prioriza o reconhecimento do di-reito das
pessoas com deficiência, em idade de contrair ma-trimônio, de casar-se
e estabelecer família, com base no livre e pleno consentimento dos
pretendentes, como também o direito de decidirem livre e
responsavelmente sobre o núme-ro de filhos e o espaçamento entre
esses filhos e de ter acesso às informações adequadas à idade e a
educação em matéria de reprodução e de planejamento familiar,bem
como os meios necessários para exercer esses direitos.
Neste patamar, torna-se importante observar que o texto
consolidado resguarda o direito das pessoas com deficiência
constituírem famílias,casamentos e relaciona-mentos, sem nenhum tipo
de discriminação.Aspecto que rompe com alguns tabus, quando se
trata de discutir a se-xualidade e a possibilidade de manutenção de
relações afe-tivas por parte das pessoas com deficiência.
Em sentido complementar, no mesmo artigo 23, o tex-to normativo
assegura que as pessoas com deficiência, in-clusive as crianças,
conservem sua fertilidade,em igualdade de condições com as demais
pessoas. Importante ressaltar que este aspecto normativo preserva o
entendimento de que mulheres, adolescentes e meninas com
deficiência não devem ser compelidas à esterilização forçada.

480
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

Por óbvio, este artigo da Convenção deve, necessaria-mente, ser


interpretado em consonância com o artigo 25, a, do mesmo corpo normativo,
que estabelece que os Esta-dos deverão oferecer àspessoas com deficiência
programas e atenção à saúde gratuitos ou a custos acessíveis da mesma
variedade,qualidade e padrão que são oferecidos às demais pessoas,
inclusive na área de saúde sexual e reprodutiva e de programas de saúde
pública destinados à população em geral.
Por outro lado, a Convenção, ainda em seu art.23, especi-fica uma gama
de medidas pertinentes aos direitos e respon-sabilidades das pessoas com
deficiência relativas aos cuida-dos, criação, guarda, custódia, curatela e
adoção de crianças, prevalecendo sempre o interesse destas (NEWTON,
2012).
As diretrizes pactuadas também asseguram a consecução do pleno
direito à vida familiar em relação às crianças com deficiência, através da
prestação de informações abrangentes sobre serviços e apoio a crianças
com deficiência e suas famí-lias, evitando com isto a ocultação, abandono,
negligência e segregação destas crianças.
E ademais, nos termos da Convenção,os Estados Partes assegurarão que uma
criança não será separada de seus geni-tores contra a vontade destes, exceto
quando as autoridades competentes, sujeitas a controle jurisdicional, determinarem,
em conformidade com as leis e procedimentos aplicáveis, que a separação é
necessária,no superior interesse da criança. Em nenhum caso, uma criança será
separada dos pais sob alegação de deficiência da criança ou de um ou ambos os
genitores.

4. Aspectos essenciais da assistência sexual:


fundamentos, objetivos e especificidades.

4.1 Projeção no espaço europeu

481
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

No contexto da tutela à sexualidade e fomento à pluralida-de,difunde-se


na Europa a figura da assistência sexual para as pessoas com deficiência,
desenvolvida em países como Alema-nha, Dinamarca, Suíça, entre outros
(CASADO, 2014).
Neste particular, advoga-se que as atividades se desenvolvam por
consenso mútuo entre os sujeitos, pessoas adultas e capazes. Neste
panorama, difundem-se associações e empresas como in-termediadoras das
atividades em diversos países europeus.
A Suíça regulamentou a criação de empresas para o ofere-cimento
de atividades de assistência sexual. Neste modelo in-tervencionista,
torna-se imprescindível que o assistente possua um certificado de
capacitação, sendo a atividade remunerada.
Na Bélgica, apesar de não regulamentada, a atividade vis-lumbra-
se como tolerada pelo Estado. Em condição similar ao que é exercida
na Suécia e na Alemanha.
Nos Países Baixos e na Dinamarca, o Estado subsidia os
trabalhadores sexuais habilitados e os assistentes sexuais.
Na França, há uma tendência a não legalização, posto que o
Comitê Nacional de Ética a equipara com a prostituição.

4.2 Elementos caracterizadores

A assistência sexual apresenta-se como a prestação de serviços


íntimos por profissionais com habilitação específica, podendo ser
gratuita ou remunerada. Ou seja, constitui-se como um espaço de
intersecção entre os feixes de cuidados pessoais e atividades sexuais
prestadas por pessoas previa-mente habilitadas (CASADO, 2014).
Em termos de sistemas comparados, observando-se os mo-delos
europeus, os condicionantes e requisitos variam depen-dendo do tipo
de interação existente entre a assistência sexual e o ordenamento
jurídico do país, podendo ser regulamentada ou apenas tolerada, nos
moldes examinados no tópico anterior.

482
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

Em termos práticos, a atividade de assistência sexual con-siste na oferta de


serviços de ordem sexual, íntimo e emocio-nal às pessoas com deficiência, com ou
sem remuneração. O receptor dos serviços prestados será,
necessariamente,pessoa com deficiência, física ou intelectual. Com relação ao
profis-sional habilitado à execução dos serviços, o assistente pode ser homem ou
mulher.
Ademais, os serviços podem ser prestados por heteros-sexuais ou
homossexuais,assegurando-se e respeitando-se, portanto, a pluralidade de
orientações sexuais aos contratan-tes. Evitando-se, desta forma, qualquer
tipo de prática discri-minatória na oferta dos serviços em comento.
É essencial que o agente que se disponibiliza ao exercício do labor como
assistente sexual possua uma habilitação espe-cífica para o exercício de tais
atividades. Assim, a prestação dos serviços qualifica-se pela especialização
e habilitação de profissionais, como médicos, fisioterapeutas, enfermeiros,
as-sistentes sociais, psicólogos e inclusive profissionais do sexo.
As atividades realizadas pelo assistente sexual são desen-volvidas tomando-se
como essência as necessidades da pessoa com deficiência e o que foi previamente
pactuado entre as par-tes,considerando-se os limites de respeito, segurança e a
auto-nomia dos sujeitos envolvidos. Neste cenário, a assistência im-plica em
comportamentos sexuais moderados, passando por carícias,toques,
estímulos,podendo chegar até a penetração.
O pacto pode ser firmado diretamente entre o profissio-nal e a pessoa
com deficiência ou entre o assistente e o res-ponsável legal. Por sua vez, o
acordo poderá ser consolidado após uma triagem previamente realizada por
uma entidade de apoio, com a mediação de encontros entre o profissional
cadastrado e o usuário dos serviços.
Advoga-se, nesta última hipótese a absoluta necessidade de a entidade,
instituição ou associação que auxilia / apoia à

483
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

assistência sexual inserir-se no processo sem o ânimo lucrati-


vo,eliminando-se, de esta forma,a nuance de favorecimento à
prostituição.

4.3 Protocolo de serviços íntimos para pessoas com


deficiência aprovado na Catalunha/ Espanha

Na Europa há doutas opiniões divergentes sobre a prática da


assistência sexual. Os debates, congressos e investigações acirram-se,
para defender ou rechaçar ditas atividades. A Suíça ofertou o
reconhecimento e a legalização da assistência sexual, como
instrumento para a melhoria naqualidade de vida dos deficientes.
Outros países europeus também inseriram instru-mentos legais de
amparo a esta prática, enquanto outros opta-ram por não tratar o
assunto em normativa determinada.
Com efeito, a associação sem finalidade lucrativa Tan-dem Team
Barcelona consolidou o primeiro Protocolo para a promoção e
facilitação da assistência sexual para pessoas com diversidade
funcional119.
O Protocolo é cognominado como Tandem Intimity e possui como
objetivo à interação entre as pessoas com defi-ciência e os assistentes
sexuais, tomando como parâmetros os modelos esculpidos pela Bélgica
e pela Holanda, mediante uma prévia seleção com entrevistas
personalizadas e a pro-moção do contato entre os sujeitos envolvidos
no processo. Sem embargo, os acordos serão desenvolvidos livremente
entre o assistente e o contratante dos serviços, podendo ter finalidade
lucrativa ou meramente voluntária.
Nos padrões estabelecidos pelo protocolo, a análise dos potenciais
assistentes considera a experiência profissional em

119. http://www.tandemteambcn.com.

484
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE(ORG.).

assistência pessoal, as práticas que estarão dispostos a seguir,a idade e a


espécie de deficiência do usuário e o motivo para a realização das atividades
de assistência sexual.
Desde este último aspecto, torna-se relevante ressaltar que, a
justificativa concedida pelo profissional não pode limi-tar-se ao aspecto
financeiro. Obviamente, há que se resguar-dar a existência de motivos
sociais e valores éticos e morais para a efetiva realização da atividade de
assistência.
O quantum pactuado não pode simbolizar a mola propul-sora para o
exercício de tais atividades, caso exista a previsão de contraprestação, posto
que a prática de atividades sexuais exclusivamente em troca de dinheiro
concentra-se nos com-portamentos habituais de prostituição. De forma
alguma, a assistência sexual pode fundamentar-se em ideais meramente
lucrativos.Por isto,a necessidade imperiosa de a atividade ser desenvolvida
por profissionais, entre enfermeiros,assistentes sociais,fisioterapeutas, entre
outros, devidamente habilita-dos e especializados na prestação de tais
serviços.
A Tandem Team Barcelona aduz que não recebe nenhum tipo de lucro
pela intermediação dos serviços,apartando-se de qualquer aspecto que
possa confundir à prestação de um servi-ço social com o favorecimento à
prostituição. De esta forma, os pactos são ajustados entre os contratantes,
espontaneamente.
Outro ponto a ser considerado é que, nos moldes do Pro-tocolo
espanhol, a assistência é ofertada tanto com natureza heterossexual como
também em caráter homossexual,con-siderando à diversidade dos
indivíduos.

5. Aspectos controvertidos e reflexos positivos decorrentes da


assistência sexual

A assistência sexual aporta uma série de reflexos positivos para os deficientes,


ao mesmo tempo em que desperta uma série

485
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

de obscuridades e problemátcas responsáveis pela fragmentação de


opiniões, entre defensores e opositores do reconhecimento e inserção
de tal atividade no cerne dos ordenamentos jurídicos.
Neste patamar, os contornos benéficos consubstanciam--se na
associação do desenvolvimento sexual como direito
humano,observando-se as seguintes perspectivas:

a) As práticas sexuais adotadas viabilizam à melhoria em relação


aos procedimentos de reabilitação e desenvolvimen-to das atividades
funcionais, ao considerar-se à sexualidade como fator crucial para o
pleno desenvolvimento humano. Incluindo-se, por
suposto,heterossexuais, homossexuais, bissexuais, não binários e
assexuados ao exercerem livremen-
b) A assistência sexual resplandece um perfil humanitá-rio e
solidário. Os atos e carícias sexuais acabam substituindo uma
sequência de comportamentos e hábitos adotados pe-los progenitores
dos deficientes que, não raras vezes,acabam tentando suprir as
necessidades sexuais dos filhos, através de mecanismos alternativos
de satisfação;
c) A inclusão de temáticas pertinentes à sexualidade das pessoas
com deficiência contribui para a ruptura de tabus, este-reótipos e
rótulos. O exame da figura da assistência sexual,en-tre lamentos,
murmúrios e aplausos, representa,acima de tudo, um passo magno
para a ênfase aos direitos sexuais fundamentais dos deficientes,
incluindo-se os debates
PERSPECTIVAS e reflexões
DE DIREITOS HUMANOS sobre novos perfis e perspectivas

para a plena efetividade de tais direitos;


d) E por ende, os contornos da atividade de assistência sexual
permite uma abordagem múltipla de uma temática complexa que deve
ser investigada e analisada em várias pers-pectivas, sob a coordenação
de esforços interdisciplinares,

486
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES,FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

inclusive com o treinamento e a qualificação de profissionais para a


atuação habilitada nas atividades em comento.

Por outro lado, permanece uma variedade de obscurida-des e interrogantes


como entraves à consecução do reconhe-cimento de tal atividade, ilustrativamente:

a) A similitude com o objeto da prostituição conduz a uma carga nebulosa de


interrogantes e vazios, derivando uma série de argumentos opositores e lamúrias
contundentes.As dificuldades cruciais para a legitimação deste tipo de ativida-de
em face aos ordenamentos jurídicos, principalmente no tocante as normativas que
regulam às atividades laborais, fun-damentalmente, pela existência de uma linha
tênue entre as atividades profissionais de assistência sexual e a prostituição;
b) As relações desenvolvidas no cerne das atividades de assistência sexual
podem ocasionar ruínas e lacunas emocio-nais.Com efeito, não existe a
possibilidade de conhecermos os resultados emocionais, afetivos, sentimentais da
assistência sexual para a vida da pessoa com deficiência como se fosse uma
singela operação aritmética. Por certo,não se trata de uma ciência exata, os
sentimentos preponderam e os resulta-dos podem ser diferenciados do
previamente pretendido. As-sim sendo, há que se pensar nas relações afetivas que
podem surgir no curso das atividades de assistência sexual, ocasio-nando uma
espécie de dependência do deficiente em relação ao profissional ou vice-versa;
c) Um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento de ações, medidas e
aparatos relacionados aos direitos sexuais são as questões religiosas, culturais e
históricas,porquanto, tais preceitos concentram tabus e limites ao exercício das
concepções sexuais;

487
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

d) E, não podemos esquecer o trato sobre as questões sani-tárias e


de proteção à saude da pessoa com deficiência. Sob este ângulo,ao
comparar-se às atividades desenvolvidas na seara da assistência
sexual com as atividades de prostituição, poder-se-ia perceber a
segurança sexual e a proteção à saúde como óbices à aceitação de tais
atividades. Ao considerar-se que a assistên-cia sexual implica na
potencial existência de uma pluralidade de parceiros, tanto para o
profissional como para o deficiente, majorando os riscos de transmissão
de enfermidades sexuais.

5.1 Assistência sexual versus prostituição


Nos moldes expostos na presente investigação, torna-se evidente a
existência de traços similares entre a assistência se-xual prestada aos
deficientes e as práticas de prostituição. No entanto, cabe sublinhar que
ambos institutos são diferentes em seus limites conceituais, nuances e
delimitações.
Sem embargo, na prostituição há uma troca de serviços sexuais em
favor, direta e imediatamente de uma contrapres-tação; na assistência sexual
existe uma disposição de serviços de cuidados sexuais às pessoas com
deficiência. Neste cenário, cabe ponderar, ainda que de forma singela, alguns
pontos di-ferenciadores entre ambos os perfis, nos seguintes contornos:

a) Receptores dos serviços: os sujeitos receptores da assis-tência


sexual são, exclusivamente, as pessoas com deficiên-cia,restringindo-
se,portanto, a sua esfera de atuação;
b) Habilitação:Ademais, para o exercício das atividades de assistência
sexual é imprescindível uma habilitação espe-cífica com treinamento
adequado para atender às necessida-des das pessoas com deficiência, com
respeito, ética,respon-sabilidade e profissionalismo.

488
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

c) Objetivo: a recepção da contraprestação não pode ser o único objetivo


do profissional que presta este tipo de ati-vidade. Há que existir um caráter
humanitário vocacionado para a efetivação dos serviços.

Torna-se expresso, pois, o caráter solidário e humanitá-rio da atividade


em exame, apartando-se do viés meramente econômico. Com efeito, se de
um lado temos um coletivo que necessita exercer plenamente e com
dignidade os seus direitos sexuais, no outro pólo teremos um grupo de
pessoas habilitadas ao exercício responsável, seguro e especializado da
assistência íntima.

6. À guisa de conclusão

Parece-nos que a assistência sexual ofertada por profissio-nais devidamente


qualificados apresenta-se como um instru-mento para o efetivo usufruto da
sexualidade pelas pessoas com deficiência, principalmente, para aquelas situações
nas quais as limitações afloram em maior profundidade. Isso é indubitável.
Sem embargo, não podemos descartar a existência de vários questionamentos
e emblemas que restam ainda não esclarecidos com relação à figura da assistência
íntima especializada.
Duas reflexões,indubitavelmente, merecem maior desta-que. A primeira
diz respeito aos sentimentos, emoções, afei-ções e vínculos que, porventura,
poderão ser consolidados entre o profissional assistente e o deficiente
receptor dos ser-viços. Há que se ponderar sobre a delicada relação
existente entre os sujeitos contratantes, posto tratar-se de uma ativi-dade
que, se por um lado, envolve o fundamental direito de todo ser humano ao
exercício de sua sexualidade. Por outro lado, insere-se em um panorama
que abarca um turbilhão de emoções, sentimentos e afetos. Lidar com tais
aspectos mais

489
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

íntimos do ser humano, principalmente, em relação à pessoa em


condição de vulnerabilidade pode originar situações pe-riclitantes tanto
para o assistente como para o assistido.
E a segunda questão paira em como se distinguir os li-mites
econômicos, éticos, morais e funcionais para apartar a assistência
íntima especializada dos trabalhos de prostitui-ção. Na tentativa de
afastar as duas figuras,alguns elementos já foram esmiuçados em
linhas anteriores no presente texto, no entanto, sobejam dúvidas e
interrogantes a respeito da li-nha tênue que as separa. Como inserir a
assistência íntima, pois, satisfatoriamente, nos ordenamentos jurídicos?
Como difundir, debater e promover os serviços de assistência ínti-ma
respeitando-se as diferenças e peculiaridades dos diver-sos grupos de
pessoas com deficiência como podemos situar, ilustrativamente, o
coletivo de mulheres com deficiência?
Eis, pois, dilemas e sombras que a temática nos impõe, entre
outros tantos que, paulatinamente, irão se consolidan-do em face ao
desenvolvimento e popularização da prática da assistência íntima
especializada entre as diversas culturas, sociedades e modelos
jurídicos.

Referências

BÉLGICA. Observatoire ASPH de la Personne Handica-


pee. Etude 2011. Vie affective,relationnelle et sexuelle in
institution.Solidaris Mutualité. 52 páginas. Disponível
em: http://www.asph.be/ASPH/Analyses-et-etudes/
ASPH-etudes-2011.htm.

BRASIL. VI Relatório Nacional Brasileiro. Convenção


para a Eliminação de todas as formas de Discrimina-
ção contra as Mulheres (CEDAW) - Organizações das
Nações Unidas. Secretaria Especial de Políticas para as

490
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

ARTHUR BEZERRA DE SOUZA JUNIOR, FELIPE DALENOGARE


ALVES, FERNANDO AITH E SIDDHARTA LEGALE (ORG.).

Mulheres. Brasília, 2008, página 173. Disponível em:


http://www.sepm.gov.br/publicacoes-teste/publica-coes/2008/livro
cedawweb.pdf.
BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Ges-
tão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IB-
GE. Diretoria de Pesquisas. Coordenação de Popula-
ção e Indicadores Sociais. Pesquisa de Informações Básicas
Municipais. Perfil dos Municípios Brasileiros 2009. Rio de
Janeiro, 2010.Relatório MUNIC 2009.

BRASIL. Programa Nacional de Direitos Humanos


(PNDH-3)/Secretaria de Direitos Humanos da Presi-
dência da República. Brasília: SDH/PR, 2010.

BRASIL. Decreto n° 7.612, de 17 de novembro de 2011.


Institui o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com
Deficiência- Plano Viver sem Limite.

CASADO, Sílvia Navarro. El asistente sexual para personas so


Internacional Virtual sobre Discapacidad y De-rechos Humanos,
dezembro 2014. Disponível em:
http://repositoriocdpd.net:8080/bitstream/hand-le/123456789/735/Pon_N
avarroCasadoS_Asistente-SexualPersonas_2014.pdf?
sequence=1.Acesso em:3 de maio de 2018.

GORDILLO,Vanessa Cordero. Igualdad y No Discriminación de


las Personas con Discapacidad en el Mercado de Trabajo. "Co-
lección Laboral” 194. Valencia: Tirant Lo Blanch,2011.

NEWTON, Paulla Christianne da Costa. As questões de gê-


nero e a pessoa com deficiência. Em: LEITE, Glauber Sa-
lomão; FERRAZ, Carolina Valença e outros (Orga-

491
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

nizadores). Manual dos Direitos da Pessoa com Deficiência. São


Paulo: Saraiva,2012.

ONU. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Defi-


ciência e seu Protocolo Facultativo, homologados pela
Assembleia das Nações Unidas em 13 de dezembro de
2006, na Sede das Nações Unidas em Nova York(A/
RES/61/106).

492
PERSPECTIVAS DE DIREITOS HUMANOS

492

Você também pode gostar