Você está na página 1de 7

O caso de Robson

RELATO Nº 1 - A Coleguinha de Classe


O Robson fica mexendo comigo, pega meu lápis de cor, minha
borracha de cheiro de dentro do meu estojo do piu-piu,
tudo sem pedir. Eu conto para tia, mas ela só fala “Robson!”
e não faz nada. Outro dia eu estava pegando água no
bebedouro com o meu copinho da Xuxa e o Robson me deu
um empurrão. Eu me molhei toda! Aí eu fiquei lá chorando
e ele dando risada. Todo mundo rindo de mim... Contei pra
minha mãe. Ela falou que vai dizer pra Diretora tirar o
Robson da minha classe. “Eu arrumo minha filha tão
direitinho, e depois ela tem que se misturar com cada
criança! Esse Robson é um moleque de rua”, foi o que a
mamãe disse.
RELATO Nº 2 - A Professora
Peguei uma 1ª série este ano que é de lascar! Na reunião, bem que eu
orientei as mães sobre o material, uniforme, lição e estas coisas de
começo de ano. Tem umas mães que mandam os filhos em ordem.
Mas têm outras... Tem um menino que chama Robson, eu nem sei o
que fazer com ele. Vem pra escola todo amassado, empurra todo
mundo, pula por cima das carteiras, pega material dos outros sem
pedir. Na classe até que ele faz a lição, mas em casa, nem pensar. O
material que a Associação de Pais e Mestres deu, já perdeu quase
tudo. Quando eu pergunto, ele arruma uma desculpa esfarrapada:
que a irmã pegou, que o pai estava dormindo e não podia procurar
e coisas assim. Pra arrumar desculpas bem que ele é esperto. Outro
dia a turma estava na quadra e, imagine, até xixi ele fez no muro!
Porque não pediu para ir ao banheiro? Ontem no recreio, ele
conseguiu se molhar inteiro e a todo mundo que estava perto com
água do bebedouro. Aí eu não agüentei, fui falar com a
coordenadora. Assim não dá! Esse Robson é um menino sem
limites.
RELATO Nº 3 - A Coordenadora
A professora da 1ª série chegou aqui a ponto de estourar de
nervoso. Isto porque, na hora do recreio, o Robson mal
comeu o lanche e ficou correndo o tempo todo; quando
deu o sinal saiu desembestado para o bebedouro, enfiou a
cabeça embaixo da torneira, molhou toda camiseta e
também quem estava por perto. Ela já não agüenta mais
ouvir reclamações das outras mães e, para falar a verdade,
nem eu; como se a gente não tivesse mais nada para fazer
que ficar tomando conta dos estojinhos das filhas delas!
Pois bem, chamei o Robson para conversar. “Porque você
fez isso? Onde já se viu molhar tudo e todos desse jeito? Se
fosse na sua casa, sua mãe deixava você fazer desse jeito?”
Sabe o que ele respondeu?! “A minha mãe deixa, e daí?”
Vou chamar a mãe dele, esse Robson é um malcriado!
RELATO Nº 4 - A Inspetora de Alunos
Eu observo o Robson desde o primeiro dia de aula. Ele me lembra eu
mesma quando era criança e minha família quando veio para São
Paulo. Se está frio, vem com uma blusinha bem fininha. Outro dia
nós lhe arranjamos uma jaqueta; no dia seguinte já estava sem ela.
O material, traz numa malinha velha, acho que ganhou de alguém.
Mas eu nunca vi ele reclamar de nada. As outras crianças ficam
mexendo com ele, debochando... Eu sei que ele vem do lado de lá
da avenida, atravessa um monte de rua sozinho. Até fez amizade
com o dono da padaria, toda manhã é lá que ele toma café; em
troca, faz uns servicinhos e ainda ganha pão e leite para levar para
casa.
Outro dia, a diretora me mandou levar uma convocação para mãe
dele. Ele mora com a família num barraco que dá pena! A mãe me
atendeu pela janela, nem me mandou entrar. Não sei direito o que
ele fez de errado, mas, para mim, o Robson é bem espertinho para
idade que tem.
RELATO Nº 5 - A Mãe
Na hora de mandar o Robson para escola é um sufoco. Ele nunca quer
ir, diz que não gosta, sempre arrumando encrenca. Já não chega os
problemas que eu tenho? A casa é pequena e o que é de um é de
todos: comida, roupas, calçados, até coisas da escola. De dia ainda
passa; eu ponho os colchões um por cima do outro, as crianças
ficam pela rua e só vêm para casa quando dá fome; quando eu saio
para fazer faxina, comem pela rua mesmo. Mas de noite, não tem
jeito: esparramo os colchões pelo chão. O último que chega, que é
o meu marido que trabalha de guarda-noturno, fica perto da porta
e aí não dá para entrar, nem sair ninguém. Então, na hora da escola,
eu mando o Robson se lavar na bacia e sair pela janela. O banheiro
é fora, quando tem gente, o jeito é se aliviar na viela mesmo.
Hoje a diretora da escola do Robson mandou me chamar. Que será que
ele aprontou desta vez? Só sei que ele vai levar uma surra que é pra
não dizerem que eu não corrijo meus filhos. Esse menino não tem
sossego!
O Robson
Minha mãe me pôs na escola, mas eu nem sei pra quê. Diz que é pra eu virar
gente, mas eu não já sou gente? Já sei escrever meu nome, e também já
aprendi fazer conta com o português da padaria. Lá na escola nada que eu
faço está certo. Nada que eu sei, vale. Nada que eu gosto, eu posso fazer.
Às vezes eu faço uma coisa que eu nem imagino que não pode. E levo
bronca. Assim, sem nem saber porque. Como aquele dia do bebedouro.
Porque não pode correr no recreio? O que é que tem lavar a cara quando
a gente ta suado? Qual o problema de molhar um pouco a camiseta? Até
agora não entendi. Na escola não pode correr, não pode pular a carteira,
não pode se molhar. Uma quadra daquele tamanho e a gente só vai de vez
em quando. Eu tenho que ficar na sala sentadinho ou, então, andar um
atrás do outro, atrás daqueles bobinhos que parecem umas lesmas. Só
tenho uns amigos. As outras crianças me olham como se eu fosse um
bicho. Por qualquer coisinha já choram, contam pra tia... Ninguém que me
emprestar nada. Eles têm tanto lápis e borrachas, lápis de cor, canetinhas
e estojinhos disso e daquilo. Eu nunca tenho nada, eu sei, mas é minha
culpa? Custa me emprestar? Eu não vou roubar nada de ninguém não, a
minha mãe me ensinou.

Você também pode gostar