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Interpretação das Leis

Interpretação das Leis


A palavra interpretação pode ser tomada em sentido restrito ou em
sentido amplo.
Em sentido restrito a interpretação da lei é a determinação do
verdadeiro sentido das normas explicitadas.
Em sentido amplo, a interpretação da lei abrande isso e ainda a
descoberta das soluções aplicáveis nos casos omissos, isto é, naqueles
casos sobre que o legislador não se pronunciou. A lei nem sempre prevê
todas as situações possíveis, ela pode apresentar lacunas, há muitos
aspectos nela não contemplados, ou por incapacidade do legislador ou
por modificação das condições económicas e sociais e aparecimento de
novas necessidades.
Interpretação das Leis
A interpretação torna-se necessária em relação a todas as leis, sejam elas claras
ou obscuras, porque efectivamente, a lei não se reduz à sua letra, não se
confunde com ela. Portanto interpretar a lei não é apreender apenas o sentido
gramatical decorrente das palavras, é necessário ir mais longe, penetrar no seu
mais profundo sentido espiritualista, subindo da expressão verbal (elemento
literal) ao conceito mais íntimo por detrás dela (elemtos histórico e lógico).
Esta ideia de que a interpretação das leis é necessária independetemente de a
mesma se figurar clara ou obscura, contraria o brocardo latino “in claris non fit
interpretatio” (a lei clara não necessita de interpretação). Entretanto para
aplicar a lei é sempre necessário entendê-la e compreendê-la.
A técnica de interpretação chama-se hermenêutica.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
1. Interpretação quanto a sua fonte e valor
Atendendo a interpretação pela sua fonte, ela pode ser autêntica, oficial, judicial e doutrinária.
a) A interpretação autêntica é a que é feita por lei de valor igual ou superior à norma
interpretada; emana do próprio legislador (o legislador que que elaborou a lei duvidosa,
carecida de esclarecimento, dá esse esclarecimento através de uma outra lei. A esta lei chama-
se lei interpretativa (ver. Art. 13º do C.C.), é necessário porém que o legislador qualifique
expressamente como tal ou que, pelo menos, essa intenção resulte em termoa
suficientemente inequívocos. A lei interpretativa tem como principal característica o facto de
ser vinculativa (ainda que esteja errada).
b) A Interpretação oficial é aquela que é feita em lei de valor inferior ao da norma interpretada
(ex. Uma interpretação que um Ministro faz por despacho para valei dentro de um
determinado ministério). Pode ser vinculativa no domínio de uma relação de hierarquia
(relação Ministro/subordinados do respectivo ministério), mas essa vinculatividade
restringe-se a esse âmbito, ou seja, a interpretação oficial não vincula os tribunais.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
c) Interpretação doutrinal (ou particular) é a interpretação feita fora das
condições que caracterizam as outras hipóteses. Não tem qualquer força
vinculativa mas apenas o valor persuasivo que resulta do prestígio do
intérprete ou da coerência lógica de argumentação. A interpretação
doutrinal goza apenas de autoridade intrínseca das razões que a baseiam. Ver
art. 6.º do C.C. .

d) Interpretação judicial é a interpretação feita pelos tribunais num processo.


Só tem valor vinculativo no processo em si. Fora disso pode persuadir pela
força e exactidão dos argumentos, não mais.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
2. Interpretação quanto a finalidade
Consoante a finalidade a interpretação pode se distinguir em: interpretação subjectivistae
interpretação objectivista; interpretação histórica e interpretação actualista.
a) Interpretação subjectivista e interpretação objectivista
A interpretação subjectivista renconstrói o pensamento concreto do legislador, entendido
como a pessoa ou pessoas que fizeram a lei; a interpretação objectivista procura
determinar o sentido da lei em si, desligada da pessoa ou pessoa que a fizeram.
b) Interpretação histórica e interpretação actualista
A interpretação histórica tem por finalidade reconstruir o sentido que a lei tinha no
momento da sua elaboração e entrada em vigor; a interpretação actualista tem por
finalidade determinar o sentido que a lei tem no momento da sua aplicação.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
3. Interpretação quanto ao resultado
a) Interpretação declarativa
Interpretação declarativa é aquela que fixa à norma, como seu verdadeiro sentido. Limita-se a declarar (ou enunciar) o contido nas palvras
da lei. Uma modalidade que pode ocorrer dentro desta categoria é a que se dá quando texto legal contém uma palavra com pluralidade de
sentidos. O legislador serviu-se de um termo pluri-significativo e portanto em primeira linha duvidoso. Se a interpretação toma como exacto
o sentido mais lato do termo, chama-se interpretação declarativa lata; se toma o mais restrito, interpretação declarativa restrita.
Ex. Arts. 362º (sentido da palavra homem).

b) Interpretação extensiva
A interpretação extensiva verifica-se na hipótese em que o legislador introduz nas suas palavras um elemto específico que devia omitir,
valendo o seu comando para uma vasta de hipóteses. Ou seja, aquando da interpretação, o intérprete chega a conclusão de que a letra da
lei é mais restrita que o seu espírito: o legislador disse menos do que pretendia. Entretanto, não se deve confundir a interpretação extensiva
com o alargamento do campo de aplicação de uma norma efectuada por outras normas como sucede com o art.º 939º do C.C. que manda
aplicar as normas da compra e venda aos contratos onerosos pelos quais se alienam bens ou se estabelecem encargos sobre eles enquanto
conformes com a sua natureza e não contraditórios com as respectivas normas legais.

É exemplo de interpretação extensiva aquela segundo a qual a proibição de venda de avós ou pais a filhos ou netos sem consentimento dos
demais prevista no art.º 877º do C.C. se deve aplicar extensivamente aos bisavós, pois deve alargar-se tal proibição a todos os ascendentes.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
c) Interpretação restritiva
A interpretação restritiva verifica-se quando o legislador, tendo-se expressado muito genericamente, todavia só quis referir
determinada categoria de casos. Assim sendo, o intérprete limita a norma aparente, por entender que o texto vai além do
sentido: o legislador disse mais do que queria.
Ex. O termo menores.
Por exemplo, diz a lei que os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos (art.º 123º do C.C.). Quando a lei
refere-se a menores, devemos entender que se refere a menores não emancipados. Donde que, temos que interpretar
restritivamente o conceito de menor, e ler menor não emancipado onde no art.º 123º se fala em menor, dado que os
menores emancipados, em princípio, adquirem plena capacidade de exercício de direitos (art.º 133º do C.C.).
d) Interpretação enunciativa
Para além de procurar determinar o sentido das normas jurídicas, o processo de interpretação pode ir ainda mais longe;
determinando ou desenvolvendo o conteúdo das disposições legais de modo a obter todas as possíveis direcções
quedeterminada norma pode tomar. Geralmente, o intérprete pode concluir que a lei que permite o mais, também vai
permitir o menos; a lei que perminir um fim, vai também autorizar os meios que permitem que se chegue a esse
determinado fim. Estes argumentos seguem porém, um pensamento lógico, devendo sempre partir de uma norma válida.
A interpretação enunciativa, é aquela que a partir de uma norma, deduz outras normas periféricas; deduz na norma
interpretada normas periféricas.
Interpretação das Leis: Espécies de
Interpretação
d) Interpretação abrogante ou ab-rogatória
O resultado mais extremo da interpretação, é o que conduz à conclusão que nega o valor de uma
norma jurídica, determinando a sua absoluta incompatibilidade com outra norma jurídica ou
mesmo com prórprio espírito do sistema jurídico.
Sendo os códigos documentos extensos, e erros são inevitáveis. Vezes há em se encontram dois
ou mais preceitos que são entre si inconciliáveis. Essa incompatibilidade pode ser meramente
literal, caso em que o intérprete pode por meio de uma interpretação lógica, restringir ou
extender o sentido de um dos preceitos e vencer a incompatibilidade. Entretanto, em casos
extremos, onde mesmo a interpretação lógica não é capaz de vencer essa inconciliabilidade, por
ela ir para além da letra da lei ou seja, a incompatibilidade atinge também o espírito, o intérprete
conclui então que os dois preceitos não podem subsistir cumulativamente, pois é impossível
obedecer as duas ordens. Terá de se sacrificar um dos preceitos, dando-o como inexistente.
Não se trata porém de uma revogação pelo intérprete, este apenas certifica que o preceito
nasceu sem vida e que portanto não pode viver dentro do sistema em que se encontra inserido.
Interpretação das Leis: Elementos da
Interpretação
Elementos da interpretação, são elementos de que o intérprete se serve
para determinar o sentido da lei. Pode ainda se dizer de maneira imprópria
(ou não), que é o uso destes elementos que faz com que a maioria das
interpretações não tenham resultados que se disntigam tanto uns dos
outros.
São quatro os elementos geralmente apontados, nomeadamente:
• Elemento literal;
• Elemento lógico;
• Elemento sistemático; e
• Elemento histórico.
Interpretação das Leis: Elementos da
Interpretação
A) Elemento literal
O primeiro elemento a considerar aquando da interpretação é a própria letra da
lei, o elemento gramatical portanto, por vezes também chamado por filológico. O
primeiro exercício que o intérprete deve fazer é determinar o sentido das palavras
que compõem a norma, a sua conjugação sintáctica indicada pela colocação e
pelos termos de ligação.
A interpretação baseada fundamentalmente no elenco literal diz-se interpretação
literal ou gramatical, ou exegese. A exegese da lei é a primeira tarefa do
intérprete: “lê-la, atendendo ao sentido dos termos e à sua correlação.”
O elemento literal é cessário porém não é suficiente, tal como prevê o artigo 9º,
nº 1.
Interpretação das Leis: Elementos da
Interpretação
B) Elemento lógico/Teleológico/Racional
Para além da letra da lei deve atender-se a todas as potencialidades de transmissão de pensamento que
a frase legal encerra, potencialidades que são postas em destaque pela análise jurídica.
“O legislador não legisla pelo prazer de legislat, mas em vista de certo fim: a satisfação de determinada
necessidade que ele sente como justificativa do preceito e que constitui, pois, a sua razão de ser – ratio
legis ou ratio iuris”.
O elemento lógico segue o elemento gramatical, através da lógica, procura-se lançar mão à alma da
norma, atendendo-se simultaneamente aos factores racional, à génese histórica da norma bem como
ao seu enquadramento histórico.
No dizer da lei, deve “reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo” (art.º 9º, n.º 1 do C.C.),
constituindo o elemento lógico os meios de que o intérprete se deve servir para o efeito.
Assim sucede porque as normas legais contêm, muitas vezes, expressões com significados diversos,
consoante são empregues na linguagem comum ou na terminologia jurídica. É necessário que a norma
seja compreendida no sentido que melhor corresponde às finalidade que com ela se pretendem atingir.
No domínio da lógica, existem já processos de dedução jurídica tipificados para determinar o sentido e o
alcance da lei, nomeadamente: as regras relativas às relações entre mais e menos – justificam-se pela
justificação lógica da sua solução para casos que não o previsto legalmente – são os chamados argumentos
por maioria da razão ou a fortiori; as regras referentes às relações entre meios e fins;
1) Relações entre Mais e Menos:
A lei que permite o mais permite o menos – é o argumento a maiori ad minus – se por exemplo é lícito
alienar, será lícito hipotecar; se a lei permite que se venda a totalidade da propriedade de um imóvel,
igualmente permite que se venda uma sua quota parte em compropriedade ou o usufruto do mesmo;
A lei que proíbe o menos, proíbe o mais – é o argumento a minori ad maius – se por exemplo for proibido
hipotecar, por maioria de razão será proibido vender; a norma que proíbe o depositário usar a coisa, só por
si proíbe que ele a pudesse consumir ou alienar;
A lei que permite os meios, permite o fim a que eles necessariamente conduzem – se a lei consente a
construção de uma estrada entre duas povoações, permitirá que as pessoas circulem nela;
A lei que proíbe os meios, proíbe o fim a que eles necessariamente conduziriam – se a lei proíbe a produção
de certos componentes químicos, será proibido o fabrico das coisas que os integrem;
2) Relações entre Meios e Fins:
A lei que permite o fim, permite os meios necessários à consecução desse fim – se a lei atribui a
alguém um direito, é suposto existir algum meio de o exercer; se a lei que autorizar a captação de
água em certo prédio permite obviamente a entrada no prédio e que nele se façam as obras
necessárias para captar a água;
A lei que proíbe o fim, proíbe necessariamente os meios que a ele conduzem – se for proibido o
consumo de heroína por tóxico-dependentes, deverá considerar-se proibida a sua venda aos
mesmos;
A lei que permite os meios, permite o fim a que eles necessariamente conduzem – se a lei
consente a construção de uma estrada entre duas povoações, permitirá que as pessoas circulem
nela;
A lei que proíbe os meios, proíbe o fim a que eles necessariamente conduziriam – se a lei proíbe
a produção de certos componentes químicos, será proibido o fabrico das coisas que os integrem;
Outro processo de dedução lógica é o argumento a contrario sensu ou argumento a contrário:
Considerando certa norma como excepcional, a regra geral será contrária, pelo que todos os casos
não abrangidos pela norma excepcional estão sujeitos ao regime contrário;
Quando uma norma limita a sua previsão a certas hipóteses, além dessas hipóteses não se aplica
tal estatuição
Por exemplo, o art.º 947º, n.º 1 do C.C. determina que a doação de imóveis só é válida se constar
de escritura pública; logo se for doado um móvel aplica-se a regra inversa, e a validade formal da
respectiva não depende da sua formalização por escritura pública.
Todavia, o argumento a contrario sensu padece de deficiências, nomeadamente nos casos em que
as normas particulares contêm linhas de princípios gerais, cujo intuito do legislador não é regular
casos próximos do caso regulado de modo diverso. Assim, a utilização do argumento a contrario
sensu só é lícita quando o espírito que está na base do preceito tem um carácter excepcional e,
portanto, se é levado a concluir que todos os outro casos estão sujeitos à regra inversa.
Interpretação das Leis: Elementos da
Interpretação
C) Elemento sistemático
O elemento sistemático, decorre da integração num sistema coordenado do preceito a
interpretar. A ordem jurídica forma um sistema de elementos coordenados e
homogéneos entre si, não podendo comportar contradições. Daqui resulta que as leis se
interpretam umas pelas outras.
O preceito (a interpretar) não é uma ilha isolada, não vive por si, eneuadra-se num
conjunto com princípio meio e fim. A relacionação do preceito com o conjunto, vai
contribuir para melhor esclarecer a norma. Por isso que, um código será melhor tanto
quanto mais ordenado for o encandeamento dos preceitos que o compõem.
Legalmente o legislador consagrou este elemento da interpretação da lei no art.º 9º, n.º 1
do C. Civil, ao estatuir que “A interpretação (...), mas deve reconstituir a partir dos textos
o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico (...)”.
Interpretação das Leis: Elementos da
Interpretação
D) Elemento histórico
O Direito que hoje nos rege tem atrás de si um longuíssimo passado; a maior parte
dos preceitos em vigor radicam noutros maos ou menos antigos; frequentemente
o que o legislador faz é reproduzir preceitos anteriores ou aperfeiçoá-los em si ou
na sua coordenação. Assim, o sentido de uma lei pode ser esclarecido se
atendermos também a sua génese e evolução histórica.
O elemento histórico constitui assim o factor que determina o sentido da lei
atendendo à sua evolução, à tudo aquilo que está na sua origem, ou seja a sua
história. Este aspecto pode muitas vezes ser encontrado nos trabalhos
preparatórios assim como nos Preâmbulos dos decretos. A título de exemplo, o
Preâmbulo da CRM. (art.º 9º, n.º 1, parte final, do C.C. “as circunstâncias em que a
lei foi elaborada”).
Interpretação das Leis: Artigo 9.º do
Código Civil
O preceito se ocupa da interpretação, tal como a epígrafe diz “Interpretação da lei”.
Legalmente, o Código Civil não pretendeu tomar parte exclusiva por alguma das posições
quanto ao método de interpretação a seguir, limitando-se a consagrar no seu artigo 9º que:
“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas antes reconstruir a partir dos
textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico,
as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que a
lei é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não
tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente
expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou
as soluções mais aceitadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
Interpretação das Leis: Artigo 9.º do
Código Civil
O legislador afastou-se do subjectivismo porque prescinde da letra da
lei para atender à vontade do legislador (art.º 9º, n.º 1 do C.C.), e
afasta-se do objectivismo porque estabelece que a interpretação não
deve cingir-se à letra da lei, mas que a sua finalidade é reconstituir o
pensamento legislativo, atendendo às circunstâncias em que a lei foi
elaborada (art.º 9º, n.º 1, 1ª parte do C.C.). Consagra, ainda, a
interpretação actualista pois determina que se deve ter em conta “as
condições específicas do tempo em que é aplicada” (art.º 9º, n.º 1, in
fine do C.C.).

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