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No início dos século XX a ideia de uma mulher ativa no campo público já não era
de todo novidade. As lutas que vinham sendo travadas desde o final do século XIX pelas
sufragistas em quase todos os países da Europa estavam se alastrando também pela
América e na África.
1
ALVES e PITANGUY, p. 44. Ver: Anexo 1: Mobilização de mulheres pró-sufrágio universal.
2
Anexo 2: Trabalhadoras em período de Guerra.
3
Ainda que um século de História separe os dias atuais daqueles vividos no início do século XX, a questão
“mulher e mundo do trabalho” permanece bastante semelhante no que diz respeito às conquistas das
mulheres (presentes em todos os campos da sociedade mas mal remuneradas, ocupando poucos postos
de chefia, responsáveis pelo mundo doméstico e subordinadas aos homens).
à ”vocação feminina para a maternidade”. Era por amor à pátria e amor à família que as
mulheres eram convocadas temporariamente, em uma situação de inversão de valores, a
assumir novas funções sociais. Enquanto que os homens giravam pelo imaginário social
como heróis nacionais que derramavam seu sangue pela defesa de suas mulheres e
crianças, elas eram vistas como os personagens secundários que atuavam na
“retaguarda da nação” enquanto esperavam o retorno destes viris heróis.
4
Ver Anexo 3: Propaganda estado-unidense durante a I Guerra Mundial.
5
Ver imagem n. 4 do Anexo 4.
6
THÉBAUD, p. 78.
elementar, eles querem voltar a encontrar as suas mulheres como as
tinham deixado, no lugar onde as tinham deixado. Os jornais franceses das
trincheiras revelam, a par de uma enorme necessidade de reconhecimento,
o receio de serem suplantados no regresso, o desconhecimento dos
esforços de retaguarda e a vontade de se erigirem em juízes e senhores do
país, e, principalmente, de reporem as mulheres no reto caminho.7
Uma onda de violência acompanhou o retorno dos heróis da nação para os seus
lares,8 violência esta sentida e canalizada por sobre as mulheres (principalmente aquelas
que se encontravam emancipadas) e ao feminismo em geral. De igual forma, passou-se a
supervalorizar a dona-de-casa, “mãe e esposa exemplar”, criando para ela novas leis de
proteção materna e infantil e prêmios de natalidade9.
Uma firme linha divisória entre os sexos voltara a ser delineada, ressuscitando os
antigos mitos viris: os homens são feitos para combater e conquistar, as mulheres para
dar à luz e cuidar dos filhos12. A imagem da mulher lutando pelo país acabou cedendo
lugar à “domesticidade feminina” que, por sua vez, ofuscava fortemente à imagem da
feminista que lutava pelos direitos de cidadania para as mulheres antes da guerra.
7
Op. Cit. p. 80.
8
Apesar de não haver ainda publicações a esse respeito, Françoise Thébaud deixa claro que o índice de
violência doméstica teria aumentado muito neste período nos países envolvidos com a Grande Guerra.
9
Ver Anexo 7: Mães prolíficas, um ideal a ser seguido.
10
SOHN, p. 119.
11
Citação de THÉBAUD, p.33.
12
Op. Cit. p. 85.
e consumidora, principalmente nos Estados Unidos onde havia uma crescente
prosperidade material decorrente dos acordos de guerra e dos avanços tecnológicos que
vinham sendo realizados.
Nunca antes o país havia produzido uma variedade tão grande de produtos e em
tamanha quantidade: máquinas de lavar roupa, ferros de passar, cosméticos, tecidos,
etc.. A grande maioria desses novos objetos destinava-se ao mundo doméstico: fogões a
gás, máquinas de lavar, máquinas de costurar, aspiradores, rádios, etc.. Além disso, a
possibilidade de um pagamento em prestações encorajava o aumento do consumo.
Assim sendo, era possível encontrar durante este período uma enorme gama de
anúncios voltados para o universo feminino e que apelavam ao novo estilo de vida da
“mulher moderna”. Exemplos como o da General Eletric associando o sufrágio ao
interruptor elétrico, ou os anúncios de revistas que sugeriam uma carreira bem sucedida
ligada ao número de eletrodomésticos existentes em casa não eram raridade. Como bem
o atesta o anúncio publicado no jornal estado-unidense Chicago Tribune, em 1930:
A mulher de hoje obtém tudo o que quer. O voto. Finos forros de seda para
substituir volumosos saiotes. Objectos de vidro em safira azul ou em âmbar
resplandecente. O direito a uma carreira. Sabonete a condizer com as
cores da sua casa de banho”.14
Novo retrocesso pode ser visto para as lutas feministas. Nenhum discurso feito de
palavras e textos conseguia se impor para além das imagens veiculadas pelo cinema e a
oposição que se fazia à divisão sexual do trabalho suportava a mensagem de que
“intimidade e proteção masculina” equivaliam à liberdade para a mulher. Além disso, a
própria liberdade passou a ser entendida para as mulheres como sendo a liberdade de
escolha ao consumismo individual.
20
Ver: COTT, p. 98-9.
21
PASSERINI, p. 388
Concluindo
Até que ponto o mesmo jogo continua sendo praticado na atualidade? Ainda que o
campo das conquistas femininas tenha se ampliado sensivelmente nos últimos cinquenta
anos, a utilização da imagem da mulher pela mídia continua associando a mesma à
velhos padrões de consumo e estética. Mudam-se os produtos, os cosméticos, o
comprimento da roupa, o corte de cabelo e até mesmo o conteúdo dos textos mas a
propaganda ainda parece ser a mesma: As mulheres existem para agradar aos homens,
assim sendo, é preciso estar sempre bonita e pronta para assumir “o que der e vier”.22
22
Leia-se aqui: asumir os postos de trabalho que os homens já não querem mais, produzir e cuidar dos
filhos, manter a casa em ordem, a refeição pronta e a cama feita.
Referências
ALVES, Branca Moreira; PITANGUY, Jaqueline. O que é feminismo. São Paulo: Abril
Cultural/Brasiliense, 1985 (Coleção Primeiros Passos;20).
COTT, Nancy F. A Mulher Moderna: o estilo americano dos anos vinte. Em: História das
Mulheres no Ocidente, vol. V: O Século XX, Porto/São Paulo: Edições
Afrontamento/EBRASIL, 2000, pp. 95-114.
PERROT, Michelle. Mulheres Públicas. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.
(Prismas).
THÉBAUD, Françoise. A Grande Guerra: o triunfo da divisão sexual. Em: História das
Mulheres no Ocidente. vol. V: O Século XX, Porto/São Paulo: Edições
Afrontamento/EBRASIL, 2000, pp. 31-93.