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SARAU – COLÉGIO LITTERATUS – 2000

a c h a m e n t o

gracias a la vida

luizroberto r s
itatiba-inverno-2000

1
Alô!!! Som ! Som ! Som!
Testando ... Testando ... Testando

(Em homenagem as nossas queridas:


Embratel, Telefônica, Intelig e outras):
Luiz Roberto
DDD ... DDD ... DDDTestando
Detestando... DDD ... Detestando
Detestando.
Testando

People!
God Night!
For all body!
For all
Body
Siiiiii!
Silence

Som
Só Som
Só Só Som
Som Só

Som

Som.

Ao Meu
Ao Seu
Ao Nosso
Ao vosso
Presidente
FFHHC

Quase crônica: IGNÁCIO

Foi pelas idas e vindas que Ignácio se apercebeu que algo lhe doía. Uma certa ausência. Verbalizar
não conseguia, mas doía. Uma dor muito próxima, vinha de dentro, bem do íntimo. Vó Inocência dizia:
 É dor na alma, fio!

Enquanto no trabalho, na praça e no boteco, dos colegas ouvia:


 Ignácio, leva isso pra fulano!
 Ignácio, não se esqueça disso, não se esqueça daquilo!
 Ignácio, não deixe de dá o recado pra sicrano
 Ignácio, ajuda aqui! Ajuda beltrano!
Ignácio, Ignácio e mais Ignácio.
Com ares de bons concidadãos, com misto de nobreza, os ditos colegas diziam:
 Grande sujeito esse Ignácio!
 O Ignácio é pau pra toda obra!
 Ignácio, bondade em pessoa, num tem boca pra nada!

E Ignácio foi levando e à dor se habituando.

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Nas últimas semanas Ignácio andava ansioso pelo novo salário mínimo. Não tirava o olho do
Jornal Supra-nacional da tv Gobo. Até que finalmente o Side Madeira anunciou em tom solene: cento e
cincoenta e um real.
Ignácio não compreendeu, mas percebeu que um dinheirinho a mais entraria.

O tempo veloz passando, a dor avolumando e Ignácio sempre trabalhando. Um dia desses ao
chegar em casa dá com a Vó Inocência que foi desta pra melhor – conforme a vizinhança penitente disse.

Ignácio na falta de conversa diz aos conhecidos: Por sorte que o novo salário chegou. Com ele e
com a ajuda do seu Tião da funerária, que parcelou as despesas com os preparativos do funeral, Vó
Inocência teve um enterro que foi uma lindeza. Inté parecia que tava sorrindo.

Um poema escrito em 1964 – por ocasião do golpe militar no Brasil, o


marco do início da Ditadura, pelo poeta Eduardo Alves da Costa.
NO CAMINHO, COM MAIAKÓVSKI.

Na primeira noite eles se aproximam


e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.

PRIMEIRA PESSOA DO PLURAL


pablo de luca

nem bonito ... nem feio ...


__ Estamos
paisagens e movimento
__ Somos
uma fagulha da bigorna do universo
__ Brilhamos
como quem quer brincar
__ Cantamos
sem saber ao certo, o errado
* __ Levamos
uma sensação de quem evolui
__ Caminhamos
na retidão de quem sabe
* __ Clamamos

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a luz que chega prenhe
__ Avivamos
o oxigênio e o hidrogênio que combinam
__ Combinamos
Ora menos, ora mais densos
* __ Lutamos
pelo juízo, pelo tino, pela ordenação
__ Rompemos
pois já não há sossego
__ Buscamos
o tinir da tina plasmática
__ Queremos
o saber que nos constitui fronteiriços
__ Queremos
o segredo dos segredos alardeados
__ Queremos
compreender a cantoria, a sinfonia que
__ Achamos
ora acaso, ora onisciência
__ Queremos
tocar-te, pois
__ Entendemos
que parte
__ Somos
que a sós não
__ Estamos
e a bigorna a parir
__ Vemos
o murmúrio das luzes
__ Sentimos
a lógica que nos seduz
__ Cedemos
à bigorna fagulhando
__ Embrenhamos
na estrutura do pensamento
__ Resistimos
pela senda, sedentos
__ Admoestamos
porque viver não basta
__ Desbastamos
AT & CG, tijolo por tijolo
__ Edificamos
com o amálgama lógico o que
__ Somos
porque
__ Estamos
a
querer
brilhar
cantar
levar
caminhar
clamar

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avivar
combinar
lutar
romper
buscar
querer
querer
querer
achar
querer
entender
ser
estar
ver
sentir
ceder
embrenhar
resistir
pôr
vir
porvir
polvilho.

CANÇÃO DA TORRE MAIS ALTA.


(Tradução: Ivo Barroso)
Arthur Rimbaud
(1854-francês-1891)
Poeta até os 20 anos de idade.

Mocidade presa
A tudo oprimida,
Por delicadeza
Eu perdi a vida.
Ah! que o tempo venha
Em que a alma se empenha.

Eu me disse: cessa
Que ninguém te veja,
E sem a promessa
De algum bem que seja,
A ti só aspiro,
Augusto retiro.

Tamanha paciência
Não me hei de esquecer.
Temor e dolência
Aos céus fiz erguer.
E esta sede estranha
A ofuscar-me a entranha.

Qual o Prado imenso


Condenado a olvido,
Que cresce florido

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De joio e de incenso
Ao feroz zunzum das
Moscas imundas.

Ah! viuvez selvagem


Desta alma que chora
Tendo só a imagem
De Nossa Senhora!
Mas quem rezaria
À Virgem Maria?

Mocidade presa
A tudo oprimida,
Por delicadeza
Eu perdi a vida.
Ah! que o tempo venha
Em que a alma se empenha.

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


(Mineiro)
Dispensa comentários.

NO MEIO DO CAMINHO.

No meio do caminho tinha uma pedra


tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse


acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do
caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

FERNANDO PESSOA
(Álvaro de Campos)
Dispensa comentários.
Fragmentos de
TABACARIA.
(1928)

Não sou nada.


Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

...

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.


Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,

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E não tivesse mais irmandade com as coisas
...

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
...

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?


Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
...

Vivi, estudei, amei, e até cri,


E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
...

Fiz de mim o que não soube,


E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

...
31465 Freecell
pablo de luca

Há um jardim
de flores, muitas flores
a m a r e l a s

Há uma colméia
com abelhas colhendo
o n e c t a r

Há um riacho
de águas claras roçando
a mata c iliar

Abelhas que chegam


Abelhas que vão
No alto o Olimpo

Os raios do sol
inseminando
a Terra
a Terra
gaia que é
prenhe
exala
seus filhos

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Abelhas que chegam
Abelhas que vão
Flores e Pólen

Amarelas são
as flores
de Van Gogh

As águas claras
e as batatas
tubérculas que são
e lá estão
As abelhas
que vêm
que vão

Na ópera de gaia
O sol se espraia
na distância
em raios paralelos

As sombras e os cumes
acolhem o escuro e o claro
a mercê da luz
que nas águas claras reluz,
seduz.
Velozes e simétricos aros
transpassados
por abelhas que vêm, que vão,
nectar e pólen que se dão
No alto do Olimpo
e bem perto Dalí
os supra-realistas
a conviver
coa dança das abelhas
que entram e saem
na ópera de gaia

segue um poema prosaico que brinda


os momentos recentes, talvez de
um dia,
uma semana,
um mês,
um ano,
uma década,
um século,
talvez não mais que
500 anos.

OS MESMOS QUINHENTOS
luizroberto r s

No meio do caminho
Havia um Pedro.
Havia um Pedro
No meio de Caminha.
Ave Maria!!!

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No meio do caminho
Um achamento
Duma terra quase sem fim
no Cio
lêncio
sem
vergonha
De seres sem alma.
Jesus!!!

El Rei tinha que saber


Que no meio de Caminha
Havia um caminho ...
 De terra farta
E gente Sadia ...
Pero no mucho!!!
Pero Vaz caminha
E caminhando intuía e quase dizia:
 I don’t believe !!!
 Wonderful!!!
 Uau! All! Uau! All!
Isso vai dar é carnaval!
My God!

No meio da calmaria
Um índio, outro índio,
Índio, in dio, Dios!
Já era a primeira romaria,
... Que tamanha fé
Já era coisa de Maria.

No meio da romaria
Unsíndio carne humana comia
Assim a coisa se escapulia.
Mamamia!!!

Despues,
Numa certa tarde
Um tar de Vieira viria.
Mais um!
Pois otro poraqui estivera:
Anchieta.
Poliglota luso-hispano-tupiniquim
Descobridor de almas,
Poeta das praias, salve, salve!
... E mais poesia ...
... Heresia ...
Água benta e muita magia.
Que folia!
E a indiada já se almava.
Amava José,
Enquanto pela praia caminhava,

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O tupi-guarani
Ave Camus!

Havia no caminho
Um tipo de ancinho.
A indiada vadia,
Evadia, fugia.
A portuguesada se agitava
E da Mãe-África trazia
O povo negro que pelo caminho morria.
O que não morria por aqui se escafedia.
E corria e corria.
Palmo a palmo
Palmares se erigia.
Carambola!
No meio do caminho
Havia um Quilombo.
Que Colombo nem sonharia.
Santa Maria!

Que gente meliante.


Que marasmo irritante.

E assim, como uma torta


Tordesilhas,
Foram os primeiros passos,
Junto coa Sesmarias,
Da nossa in©sipiente democracia.
Talvez daí a regalia
Que por aqui se edificaria:
Lindas e Belas, Grandes Pizzarias.
Foi-se o tempo do pastel do chinês,
Agora do 1,99 somos fregueis
Ó! Grande Sidharta!

No meio do caminho
Havia um rubro pau,
Um Pau-Brasil.
De Vera para Santa,
Finalmente varonil.
Um polvo heróico,
De tentáculos protéicos.
Se esparramando por
Promessas mil.
As aves que aqui
Gaguejam
Nem por sonho lá
Gaguejariam.
Salve, salve-se
Quem puder.
Pinta, Niña e
Santa Maria!!!

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