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Ana Bruna, Eric Soares, Paola Giovana e Pedro Coelho

The L Word

Belo Horizonte
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2008
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Ana Bruna, Eric Soares, Paola Giovana e Pedro Coelho

The L Word

Trabalho Interdisciplinar Dirigido apresentado


como requisito de avaliação do curso de
Comunicação Social com habilitação em Cinema
e Vídeo do Centro universitário UNA para
aprovação nas disciplinas de Trabalho
Interdisciplinar Dirigido, Análise Crítica da
Mídia, Antropologia Cultural, História e Teoria do
Cinema Brasileiro, Teoria da Imagem e do Som e
Pesquisa em Comunicação.

Professora orientadora: Piedra Magnani

Belo Horizonte
2008
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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .........................................................................................................................6
2. SEXUALIDADES E IDENTIDADES FLUIDAS....................................................................9

2. 1 Gênero e identidade..............................................................................................................9

2.1.1 Cultura e diversidade


......................................................................................................................................................9

2.1.2 Identidade de gênero como ato performativo.....................................................................9

.....................................................................................................................................................9

2.1.3Identidade lésbica?
....................................................................................................................................................10

2. 2 Identidades culturalmente construídas e preconceito.........................................................12

2.2.1 História e representação da mulher...................................................................................13

2.2.2 Paradoxos das identidades culturais na contemporaneidade............................................15

2.2.3. Maternidade e paternidade gay


..................................................................................................................................................16

3. REPRESENTAÇÃO DAS LÉSBICAS EM "THE L WORD" ...........................................17

3.1 As lésbicas têm voz - o discurso lésbico e sua representação


....................................................................................................................................................18

3.2 Séries televisivas .................................................................................................................19

3.3 "The L Word".......................................................................................................................20

4 CONCLUSÃO ...........................................................................................................................23
5 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................26
6

........................................................................................................................................................27
6 ANEXOS ....................................................................................................................................28

Anexo I – Entrevista de “Malu” - estudante universitária.........................................................28

Anexo II: Entrevista de "Regina" - 24 anos – estudante universitária......................................34

Anexo III: Entrevista de Stéphanie Medeiros – estudante universitária....................................38

Anexo IV – Entrevista de “A.H.N.” - 20 anos – estudante universitária...................................42

Anexo V – Entrevista de “Bia” – 27 anos - jornalista...............................................................45

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho procura analisar como se dá a representação das lésbicas no seriado "The L
Word", demonstrando como este se destaca em relação a outras representações midiáticas deste
grupo identitário devido à influência que teve sobre as produções televisivas atuais ao abordar
com maior naturalidade e realismo o tema. Além disto, procuramos mostrar como o seriado, ao
aumentar a visibilidade e a aceitação das lésbicas e de seus discursos representativos pela
sociedade, também interfere positivamente na identificação e auto-aceitação das homossexuais
femininas. Consideramos que os reflexos sociais dessa mudança da representação midiática das
lésbicas não podem passar despercebidos, e outra maneira de dar visibilidade ao grupo lésbico e
suas representações é a produção de trabalhos acadêmicos sobre o assunto.

"The L Word" é o resultado do trabalho de três representantes do universo lésbico: Ilene Chaiken,
que criou o seriado; Guinevere Turner, que escreveu os roteiros e fez algumas pontas como a
personagem Gaby Deveaux; e Rose Torche, que dirige e também escreve os roteiros. O seriado
mostra a vida de um círculo de amigas lésbicas e bissexuais que vivem na cidade de Los Angeles,
na Califórnia, Estados Unidos, representando seu cotidiano, seus conflitos pessoais, suas alegrias
e suas dificuldades de relacionamento.

A primeira exibição de "The L Word" ocorreu em 18 de janeiro de 2004 pelo canal norte-
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americano Showtime. No Brasil, ele foi exibido pela primeira vez às 23hs de 10 de julho de 2005,
pelo canal de televisão fechada Warner Channel. Atualmente, a série está na quinta temporada,
cada temporada composta de doze ou treze episódios de duração aproximada de cinqüenta
minutos cada. A previsão é de que o seriado tenha seu fim na sexta temporada. Concentraremos
nossa análise na primeira temporada da série, devido às limitações de tamanho da pesquisa e de
tempo para a realização da mesma. Ainda assim, não deixaremos de fazer menção a algumas
questões presentes em outras temporadas.

São comuns as comparações do seriado com “Sex and the City”, como se fosse a versão lésbica
do mesmo. Inclusive em um teaser da própria série existe essa comparação. Uma das
características que diferencia “The L Word” de “Sex and the City” é a ênfase na temática da
homossexualidade feminina, agora não mais representada em apenas alguns episódios de
determinadas séries televisivas ou através de uma ou duas personagens de uma série. A
representação em “The L Word” é completamente centrada nas relações sócio-afetivas lésbicas.

A influência na exibição de outras séries gays e as outras possibilidades que sua exibição na
televisão trouxeram para o mercado de séries televisivas são bastante relevantes. Comparada a
outras séries, “The L Word” traz mais realismo em sua representação dos relacionamentos
homossexuais femininos e da convivência das lésbicas com outros grupos da sociedade. Nunca
na televisão norte-americama houve uma série que tivesse quase todas as suas protagonistas
lésbicas. Depois de "The L Word" outras séries que abordam a lesbiandade de forma mais
explícita surgiram, tais como "Sugar Rush" e "South of Nowhere".

O primeiro passo para a realização do trabalho foi a pesquisa de textos, artigos e trabalhos já
realizados sobre o seriado. Descobrimos que ainda existem poucos estudos sobre a representação
do universo lésbico em "The L Word", provavelmente devido ao tempo de existência da série não
foram encontradas também referências bibliográficas em livros sobre o produto midiático em
questão. Isto significa que o campo de estudo deste objeto empírico não está sendo tão explorado
quanto demanda a repercussão e os reflexos do mesmo na sociedade. Nossa pesquisa foi,
portanto, focada no material divulgado na internet e no único trabalho acadêmico em língua
portuguesa encontrado que trata simultaneamente das lésbicas e do seriado, o trabalho de
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conclusão de curso de Lílian Werneck Rodrigues, "O Móbile: A homossexualidade feminina em


'The L Word' adaptada a um roteiro original". Além disso, buscamos elucidações teóricas sobre a
identidade e suas representações em estudos de Mulvey, Butler, e outros.

Além da pesquisa teórica, foi realizado por nós um trabalho de campo através de entrevistas a
mulheres pertencentes ao grupo identitário para investigarmos como elas enxergam a
representação que é feita das lésbicas em "The L Word" e a própria identidade lésbica. Três
entrevistas foram feitas pela internet, através de email ou de programa de mensagens
instantâneas. Outras duas entrevistas presenciais foram registradas em áudio e transcritas.

Unindo pontos-de-vista diferentes sobre as questões da identidade lésbica e de suas


representações midiáticas e alternando entre os olhares dos integrantes do grupo já familiarizados
ao seriado e ao grupo identitário e os olhares que praticamente desconhecem como se dá a
vivência das lésbicas esperamos encontrar resultados mais neutros e ricos sobre os temas
propostos.
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2. SEXUALIDADES E IDENTIDADES FLUIDAS

2. 1 Gênero e identidade

Há até pouco tempo atrás, refletir sobre os gêneros nos remetia automaticamente à dicotomia
homem / mullher. Agora, na contemporaneidade, nos deparamos com várias possibilidades de
escolha do objeto de desejo e da não-vinculação necessária dessa sexualidade com o gênero e
com o corpo, como exemplificam as pessoas que se definem como heterossexuais, homossexuais,
bissexuais, etc., e escolhem seus relacionamentos conforme suas preferências e identificações.

2.1.1 Cultura e diversidade

As mudanças na cultura em que vivemos para adequar-se a essas "novas" realidades


comportamentais, em vista de alguns anos atrás, é considerável. Exemplos dessa mudança são a
legalização do casamento gay e as adoções homoparentais cada vez mais comuns em países de
primeiro mundo e a manifestação de transexuais e seus subtipos sendo, pouco a pouco, aceitas
com menos preconceito. Essas variedades identitárias necessitam de estudos mais sérios por parte
das áreas das ciências humanas e da saúde e menos preconceito por parte da sociedade. Apesar
das variações sexuais não serem novidade, a inovação constatada está justamente nas
transformações culturais, sociais, jurídicas e psíquicas que reconhecem a legitimidade dessas
sexualidades fluidas na sociedade.

Infelizmente, a diferenciação sexual ainda é vista por alguns médicos, psicólogos e outros
profissionais que estudam o tema como uma doença ou algum tipo de desvio. Mas há também a
contribuição de outros estudiosos na busca de um conhecimento esclarecedor que auxilie a
compreensão do comportamento sexual humano.

2.1.2 Identidade de gênero como ato performativo

De extrema importância nos estudos da sexualidade e na desvinculação entre identidade, gênero e


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sexualidade são os trabalhos da filósofa americana Judith Butler desde 1990, com a publicação do
livro "Problemas de Gênero". Ela questiona a estigmatização doentia que é empregada
aos homossexuais e transgêneros e ao desconstrói a imposição heteronormativa na qual o homem
deve ser sempre masculino e gostar de mulheres e a mulher deve ser sempre feminina e gostar de
homens.

Houve, assim, a criação de uma nova perspectiva com relação aos gêneros e as identidades. Para
Butler (2003), o gênero é entendido como uma encenação de significações sociais já pré-
moldadas em suas representações pela cultura vigente. Ela reconhece a necessidade da afirmação
da identidade através de comportamentos ou, melhor dizendo, “performances”. A partir da idéia
de que o sexo é natural e o gênero é socialmente construído as "identidades de gênero" são
consideradas performáticas, havendo uma possibilidade autêntica da existência de gêneros
autônomos, não-dependentes do sexo dos indivíduos, valorizando a manifestação do amor e do
desejo como forma de identificação em contraposição à vinculação hermética entre corpo e
gênero.

Lembraremos, primeiramente, que, no sentido clássico, gênero é um termo que se refere


à rede de crenças, traços de personalidade, atitudes, sentimentos, valores, condutas e
atividades que diferenciam mulheres de homens. Freud já se ocupava desse assunto, na
medida em que procurava explicar o desenvolvimento da feminilidade e da
masculinidade. A psicanálise Freudiana podia ser interpretada como uma teoria sobre a
aquisição do gênero masculino ou do feminino.” (PORCHAT, 2008, p. 46)

Werneck (2007) também fala sobre essa questão da construção histórica das identidades de
gênero e sua contribuição para a existência do preconceito com as manifestações da sexualidade
diferentes da heteronormativa:

Temos como mostrar, baseado em literaturas e relatos, um parâmetro da forma como a


sociedade ocidental através dos tempos procurou transformar o amor gay em algo
errado, imoral e criminoso. E, da mesma maneira, levantar a questão de que a realidade
não é bem essa, de que na verdade, trata-se muito mais de uma questão de desejos.
(WERNECK, 2007, p. 21)

2.1.3 Identidade lésbica?


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Werneck (2007) afirma que "A diversidade sexual é uma característica humana, e os padrões e
categorias existem somente no sentido de classificação social.". Talvez não exista, portanto, uma
“identidade lésbica”.

Segundo Patrícia Lessa, em seu estudo do feminismo-lesbiano, uma mulher não é mulher desde
que nasce, e a lésbica também se enquadraria neste “construcionismo-existencialista de Beauvoir
[que] parte da premissa hegeliana que ‘ser é ter-se tornado'” Assim, tanto a identidade lésbica,
como a identidade feminina e todas as outras categorias sociais históricas são construções sociais.

A categoria "mulher" é questionada em Beauvoir ao sugerir que não se nasce mulher,


mas torna-se; ela propõe que ‘mulher' seja uma construção social e histórica e não
natural. A naturalização das mulheres implica acreditar em características inatas e
imutáveis que servem para reforçar argumentos em torno da fragilidade, vulnerabilidade,
docilidade, passividade dentre outras que as excluem de domínios que exigem força e
competitividade. (LESSA)

A partir da naturalização da história e da condição da mulher neste contexto institui-se um duplo


preconceito: A mulher como ser submisso ao homem e com funções e papéis sociais estritamente
ligados à reprodução, e a lésbica como a negação da feminilidade e usurpadora do lugar do
homem.

A opressão lésbica consiste em que as mulheres estão fora do alcance dos homens, não
pertencem a eles, têm de ser qualquer outra coisa, como um não-homem, um produto da
sociedade, não um produto da natureza como as mulheres, por isso acusadas de
antinaturais, aberração, desvio (WITTIG, 1992: 12-13). (LESSA)

Em Lessa, vemos a teoria de Wittig sobre a existência da lésbica como categoria autônoma não-
pertencente à categoria "mulher".

A lesbiana em Wittig é o self-deslocado ou desidentificado das suposições culturais e práticas


sociais construídas nas categorias ‘gênero e sexo', é o único conceito além das categorias de sexo,
por que a lésbica não é uma mulher (econômica, política ou ideologicamente). O que faz uma
mulher é a sua construção com relação aos homens, relação de subserviência (deveres conjugais,
produção de filhos), para Wittig, a consciência da opressão é uma prática subjetiva, cognitiva.
(LESSA)
12

2. 2 Identidades culturalmente construídas e preconceito

Patrícia Porchat (Revista Mente e Cérebro, p. 45) explica como Butler "recusa a idéia de que o
corpo, por si só, é determinante". Na opinião desta existem dois erros na ideologia evolucionista
de Charles Darwin. O primeiro erro é que biologicamente os papéis sexuais e, consequentemente,
sociais de macho e fêmea não são tão bem resolvidos como o evolucionismo prega. Em muitas
espécies, inclusive na humana, há variadas formas de expressar a sexualidade. O segundo erro
que autora afirma encontra exemplo em algumas espécies de pássaros e mamíferos nas quais o
contato sexual nada tem haver com a reprodução e o envio de esperma do macho para a fêmea. O
cruzamento, em várias espécies, está relacionado ao grau de interesse desses relacionamentos e,
por conseqüência, pode resultar em geração de descendentes, mas o principal objetivo desta
prática é manter a coesão e a cooperação do grupo:

Em muitos casos, a homossexualidade consolida as relações importantes para uma vida


de sucesso, funcionando como um traço de inclusão social: oferece aos animais (e talvez
aos humanos), a possibilidade de ingressar em determinados grupos. Essa cooperação
pode favorecer a sobrevivência, o encontro com outros parceiros e a proteção dos filhos
(ROUGHGARDEN, p. 50)

Todo discurso identitário se pretende único e generalizador, e é exatamente esta característica de


rigidez e enquadramento que os estudos de gênero contemporâneos vêm criticando. O que existe,
na realidade, não são identidades inflexíveis, mas identificações performáticas fluidas. Essa
noção de “performance” e conseqüente sexualidade fluida explicaria, inclusive, os choques
identitários internos ao próprio grupo das homossexuais, como o preconceito contra as lésbicas
masculinizadas (butches ou sapatões) pelas mais femininas.

A constatação de uma presença maior de lésbicas masculinizadas na sociedade brasileira e de


lésbicas femininas nas sociedades de Primeiro Mundo pode ser explicada pela necessidade de
afirmar a identidade homossexual de acordo com a caracterização e a representação que dela faz
a cultura de onde essas mulheres vivem. É a adequação à rigidez com a qual a sociedade trata as
identidades que obriga aos indivíduos uma manifestação ou performance mais radical de suas
identificações interiores.
13

"Muitas vezes a mulher lésbica usa a postura masculina para ser mais bem aceita na sociedade,
para que não sofra a dupla discriminação de ser mulher e de ser lésbica." (WERNECK, 2007, p.
47) Assim, na contrapartida de um duplo preconceito da sociedade, a lésbica assume uma
expressão masculinizada, o que a leva, muitas vezes, a trocar o preconceito da sociedade por um
preconceito existente no próprio grupo dos homossexuais, menos agressivo do que a
incompreensão geral do restante desta sociedade.

Apenas a re-historicização das categorias criadas pela sociedade burguesa pode livrar-nos
da inversão de causa e efeito contida na interpretação naturalizante de nossa sociedade. Os
anormais nada mais são do que construções sociais naturalizadas, as quais derivam de
relações de poder que atribuem a eles uma posição de inferioridade e submissão na ordem
social. Nossos corpos socializados trazem o passado ao presente e contribuem para a
manutenção das categorias sociais e da hierarquia imposta pelo padrão de normalidade
burguês. Assim, a desigualdade de poder chega aos indivíduos nos seus próprios corpos e
no uso destes, dos prazeres e capacidades reprodutivas. (MISKOLCI, 2002/2003, p.13)
(WERNECK, 2007, p.22)

2.2.1 História e representação da mulher

Podemos mostrar três momentos ao longo da história para entender a sexualidade pela
perspectiva social: o controle do sexo através do casamento, a incorporação do sexo como prática
de controle moral, nos séculos XII e XIII, e a definição da sexualidade tradicional exercida
somente entre um homem e uma mulher, nos séculos XVIII e XIX.

Nos séculos passados, a identidade referia-se a relacionamentos sociais, enquanto na atualidade


está, cada vez mais, vinculada a questões individuais. Neste contexto a sexualidade é incorporada
como aspecto definidor de um indivíduo, peça-chave para a fundamentação da subjetividade e
seu caráter. Não é mais possível, em nossa cultura múltipla e fragmentada, fechar os sentidos de
identidade, incluindo os indivíduos em categorias rígidas, principalmente sexistas. Como o
filósofo francês Michel Focault refletiu: “O importante não é uma história social ou uma
psicologia focada nas atitudes sexuais, mas uma história da problematização desses
comportamentos” (Revista Mente e Cérebro p. 60)

Até o século XVIII, o valor social era focado no homem. A concepção era a de que o grau
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máximo do significado estaria concentrado no homem, enquanto a mulher era vista como algo
inferior, colocada na uma posição subsidiária de ser o significante e o objeto do homem-sujeito.
O conceito masculino do século XIX era de que a mulher não possuía a perfeição que o homem
carregava inerentemente consigo, sendo ela, assim, um ser inferior desacreditado em sua psique.
No início do século XIX, a posição antagônica entre homem e mulher passou a ser focada no
gênero feminino através, principalmente, da luta feminista.

A mulher sempre ocupou papel secundário na história patriarcal ocidental. Foi após a
organização das sociedades em civilizações que as mulheres começaram a ser suporte do homem,
muitas vezes considerada até opositora e prejudicial às conquistas masculinas, sendo comparada
ou considerada a materialização do “diabo”.

A representação da origem da humanidade católica não poderia estar mais envolta em


preconceitos e sexismos. E foi principalmente a partir dela que a heterossexualidade se
tornou o caráter normativo da representação social do ocidente, com a reprodução como
único objetivo das relações sexuais. O desejo humano se tornara uma “culpa”, um
“pecado”. (WERNECK, 2007, p. 19)

Além de tornar-se a "costela de Adão", dependente do homem e portadora apenas da função


social da geração e maternidade, à mulher foi negado o direito ao prazer e ao desejo em todos os
seus níveis de realização individual.

Como o registro histórico sempre privilegiou os eventos acontecidos na esfera pública e


a mulher ficou reduzida ao espaço privado, ela nunca foi chamada a fazer parte da cena
histórica e teve de desenvolver estratégias de sobrevivência naquilo que lhe restou: o lar.
Por isso, a memória do privado coube à mulher. Era ela quem cultuava os mortos e suas
tumbas, sendo a forma de comunicação dominante a oralidade, passada, geralmente, de
mãe para filha. (SACRAMENTO).

O direito à ciência, ao pensamento racional e à produção e acesso ao conhecimento também lhes


foram negados, consolidando a dominação e o poder político e social masculinos. A Igreja teve
papel fundamental na reafirmação desta condição inferior da mulher:

É preciso destacar que o "exercício do poder" não ocorre em uma cartografia prévia, pois
tanto homens quanto mulheres "negociam" seus limites de ação. Inegavelmente, a Igreja
promoveu a mulher, através da figura da Virgem Maria, fortalecendo "uma forte
consciência de gênero" (p. 272). Se, por um lado, impõe uma resignação, uma renúncia à
mulher, por outro, lhe atribui poder, dignidade e a necessidade da fidelidade masculina
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às suas esposas. Constitui-se, dessa forma, uma exaltação da diferença feminina, mas, ao
mesmo tempo, a promoção de "guardiãs do patriarcalismo". (SACRAMENTO)

Abafadas na história da humanidade, as mulheres mal conhecem os registros apagados de sua


trajetória, como percebemos na fala de nossa entrevistada: “A história feminina e história das
lésbicas... Nossa, eu não conheço muito não, só de Lesbos, aquelas histórias que a gente ouve
contar.” (Anexo V)

2.2.2 Paradoxos das identidades culturais na contemporaneidade

A discussão em torno da situação política econômica e cultural da mulher traz a tona uma nova
concepção sobre os estudos sobre sexualidade e sobre a condição humana. É através desses
estudos que se inicia uma busca de respostas para os predicados de ambos os sexos e para as
desigualdades sociais originadas da carga de sentidos que a eles foram sendo anexados
historicamente. Esses predicados ganharam definições para o estudo do ser humano, dos gêneros
e das variantes sexuais, dentre as quais os homossexuais tornaram-se alvo de foco nos estudos da
ciência.

São numerosos os estudos a respeito da homossexualidade que debatem a ideologia e as


conseqüências do termo homossexual para caracterizar cerca de 15% da população mundial. Essa
palavra, conforme críticas e pesquisas refere-se ao desejo e à identidade, diferentemente da
palavra “homossexualismo”, que remete a patologias devido ao seu uso discriminatório e à
construção etmológica da própria palavra, cujo sufixo "ismo" indica doença.

A orientação sexual homoerótica ainda ocupa na religiosidade o lugar do pecaminoso; na lei, até
o século XIX, a definição de crime e, na medicina e na psiquiatria, o diagnóstico de doença. Mas
as práticas sociais cada vez mais evidentes afirmam a inegável existência das relações
homossexuais em uma direção contrária a esses pré-conceitos que estigmatizaram como negativo
o desejo pelo sexo oposto.

“Parece que o amor e o desejo que não se podia nomear estão ganhando identidade. Não haveria,
portanto, mulheres ou homens mais verdadeiros do que supostas cópias performáticas - travestis,
16

gays, lésbicas e transsexuais.” (Editorial, Revista Mente e Cérebro, p. 3)

2.2.3. Maternidade e paternidade gay

Atualmente, a sexualidade é concebida como um aspecto do "eu" que une corpo, identidade e
regras sociais, associada à importância social e política, além da relevância moral. A
identificação sexual é apenas mais uma das múltiplas identidades performatizadas socialmente
pelos indivíduos. Utilizar a identificação sexual de alguém para comprovar competência de uma
pessoa em ser bom pai ou mãe seria o mesmo que julgar sua capacidade profissional ou seu gosto
estético.

Entre as novas formas de família, as representadas por gays estão entre as mais complexas.
Apesar da educação de crianças por pais homossexuais não ser algo tão inédito na sociedade, ela
conseguiu mais atenção nas últimas décadas. Na França, por exemplo, a possibilidade de casais
homossexuais terem filhos tem sido bastante discutida e pesquisas revelam que, no ano de 2000,
50% das “famílias alternativas” viviam com o/a companheiro e metade dessa porcentagem
gostaria de ter filhos. Outros estudos realizados na Europa e nos Estados Unidos estendiam essa
estatística para 60%.

No Brasil, apesar de não existir uma investigação mais aprofundada do caso, as relações
homossexuais estão cada vez mais visíveis. Em Junho de 2000, o instituto Nacional do Seguro
Social (INSS) permitiu pensão por morte e outros benefícios para companheiros homossexuais
que provassem ter união estável com o/a parceiro(a). Em Janeiro de 2001 uma juíza declara que
as pessoas do mesmo sexo que exercem união estável, dividindo vínculos de cumplicidade e
afetividade, representam efetivas comunidades familiares que têm o mesmo direito das famílias
constituídas por casais heterossexuais. Tanto no caso homo como hétero encontra-se a
conjugalidade entre duas pessoas, o que deveria garantir os direitos civis para os dois lados.

Hoje em dia, encontram-se quatro alternativas para homossexuais serem pais e mães. A
existência de filhos de uma união hetero precedente, em que o Estado não tem autonomia para
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interferir; a forma mais comum, a adoção que, realizada individualmente, não expõe
obrigatoriamente a opção sexual; e a reprodução assistida, que no Brasil, por exemplo, é rasa,
pois não há uma legislação que a regule; ou a adoção simultânea de um filho por gays e lésbicas.
A respeito desses fatores, os casos que necessitam intervenção das leis e da medicina passam por
longas discussões, mais do que os casais heterossexuais. Nas situações de divórcio, e concessões
de direitos civis relativos à guarda e a visitação, também são criados empecilhos por parte desses
órgãos.

Infelizmente o Brasil ainda se enquadra em um nível social conservador e preconceituoso e, por


mais que os direitos patrimoniais venham sendo concedidos sem grandes complicações, qualquer
menção ao direito a família, em se tratando de pessoas do mesmo sexo, ainda encontra
resistências. A única forma de reformar a política nesse âmbito é o reconhecimento do casal
homossexual como família.

3. REPRESENTAÇÃO DAS LÉSBICAS EM "THE L WORD"

A questão da representação (audiovisual principalmente) da mulher na cultura ocidental ainda


carrega uma grande dívida com a subjetividade da própria mulher, considerada objeto na
sociedade patriarcal na qual o homem é sujeito e senhor. Se hoje reconhecemos que existe uma
dívida desta sociedade com relação à representação da mulher em geral, devemos também
reconhecer a existência de uma dívida ainda maior com relação à representação da mulher
homossexual, duplamente negligenciada (como mulher e, mais ainda, como lésbica) como sujeito
nos registros visuais e em todos os outros registros históricos e culturais.

A crítica de Wittig é dirigida aos discursos científicos modernos e às ciências sociais,


cujos poderes são exercidos através do silenciamento de vozes sociais. A voz dos
oprimidos é confrontada com o discurso científico, enquanto a primeira é relegada a um
discurso ingênuo, a voz da ciência é considerada a voz da verdade. Sua crítica é dirigida
aos discursos da verdade, que funcionam através de um aglomerado de conceitos,
disciplinas, teorias e idéias nomeadas pela autora de: ‘pensamento hetero'. Categoria
discursiva que remete ao pensamento de Levi-Strauss, em "o Pensamento Selvagem"
(WITTIG, 2002: 2-3): "o pensamento hetero desenvolve uma interpretação totalizante da
história, da realidade social, da cultura, da linguagem e simultaneamente de todos os
fenômenos subjetivos" (WITTIG, 2002: 3). O pensamento hetero é o produtor da
diferença entre os sexos e é tomado como dogma político e filosófico. Esse pensamento
totalizante fornece uma interpretação única para a história, a cultura, a realidade social e
para a linguagem. Como conseqüência, Wittig aponta que esse pensamento não concebe
18

como cultura ou aspecto social uma relação que não é ordenada pelo imperativo da
heterossexualidade, não concebe outras produções de conceitos que não as suas próprias,
e não concebe processos que escapam aos fenômenos da consciência (WITTIG, 2002:
3). (LESSA)

A série "The L Word" começa a quitar essa dívida social ao representar de forma menos
deturpada características mais próximas da realidade lésbica dando-lhes não somente voz, mas
também imagem e tridimensionalidade.

3.1 As lésbicas têm voz - o discurso lésbico e sua representação

O contra-cinema analisado e realizado pela cineasta e ensaísta Laura Mulvey (1983) em “Prazer
visual e cinema narrativo” colabora para a ruptura com a negação da visibilidade à mulher pelo
tradicionalismo patriarcal na mídia, principalmente no âmbito hollywoodiano de produção.

Mulvey (1983) produz uma crítica feminista ao cinema narrativo tradicional para desfazer com os
pesados valores do prazer visual, fortemente ligados às perspectivas masculinas, numa tentativa
de reformar a forma da recepção cinematográfica. A autora defende a idéia na qual a mulher
começaria a exercer a posição de voyeur, ou seja, passaria a ter controle e autonomia quanto sua
posição de espectadora, ao invés do papel subsidiário de mero objeto constantemente exibido ao
olhar masculino.

“O ponto de partida é o modo pelo qual o cinema reflete, revela e até mesmo joga com a
interpretação direta, socialmente estabelecida, da diferenciação sexual que controla imagens,
formas eróticas de olhar e o espetáculo”. (MULVEY, 1983, p. 437) A diferenciação sexual à qual
se refere representa a questão da imagem da mulher quanto ao exibicionismo. O homem assume a
posição de voyeur e a mulher da imagem a ser contemplada pelas perspectivas masculinas. A
análise psicanalítica de Freud, frisada por Mulvey em seu ensaio, analisa o cinema como uma
concepção patriarcal, na qual ressalta a figura feminina como vítima, como a própria imagem de
uma castração do falo simbólico.

Com este agravante, a mulher passa a ocupar um lugar secundário já que, na cultura patriarcal, o
19

homem pode exprimir livremente seus mais profundos desejos enquanto a mulher se encontra na
situação subsidiária de um significante masculino, presa por essa castração simbólica. Enquanto o
homem se encontra na posição de significado, a mulher fica incumbida a ser portadora do
significante, “o homem invertido”, dessa forma, alienada.

Para feministas, há um interesse óbvio nesta análise, uma beleza que consiste numa
tradução exata da frustração experimentada sob a ordem falocêntrica. Ela nos coloca
mais próxima das origens de nossa opressão, traz uma articulação mais direta do
problema e nos defronta com o máximo: como enfrentar o inconsciente estruturado
como linguagem (formado criticamente no momento de adoção da linguagem) ao
mesmo tempo em que ainda se está enredada na linguagem do patriarcalismo.”
(MULVEY, 1983, p. 438).

A produção e a recepção dos produtos midiáticos refletem a sociedade em que vivemos. Se,
socialmente, determinados hábitos e linguagens são aceitos, um produto midiático com as
mesmas características simbólicas vai ser bem aceito pelo público em geral. Mulvey (1983)
mostra a possibilidade de quebrar com preceitos machistas e ultrapassados na sociedade e na
mídia e abandonar a imagem distorcida da mulher, lésbica ou não.

A questão real é a colisão frontal entre os pressupostos patriarcais acerca do feminino e a


realidade existencial das vidas e o pensamento das mulheres, que o feminismo tem nos
ajudado a pensar. Esta discrepância pode ser vista como a tensão entre as imagens e as
representações da ‘mulher’ construídas pelo homem e as experiências das mulheres da
vida real em sua grande diversidade. (BRAIDOTTI, Rosi. A ética da diferença sexual: o
caso Foucault. Disponível em: <http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/art08.html>
Acesso em: 05 de maio de 2008)

3.2 Séries televisivas

Segundo Werneck (2007), o seriado é uma coleção de contos da ficção televisiva com
"personagens fixos e objetivo autoral único", de duração mais curta do que os filmes e com outras
características como a previsão de intervalos ou brakes para os comerciais, os quais impõem
cenas de clímax e tensão amarrando a narrativa e prendendo a atenção do espectador na trama.

As séries de TV, como também são chamados os seriados, são estruturadas em episódios
independentes que têm, cada um em si, uma unidade relativa. O episódio de seriado é
construído de tal forma que permite a possibilidade de assisti-lo com fruição, já que, na
maioria das vezes, ele tem começo, meio e fim. (...) A unidade total, ou temporada, é
inerente ao conjunto dos episódios, mas não seguem necessariamente uma seqüência
20

obrigatória, como as minisséries ou as telenovelas. Apesar disso, muitas vezes uma


temporada, com duração que varia de 12 a 22 episódios, encerra em si uma parte da
trama e aponta os indícios do que vai acontecer no ano seguinte. As séries também são
características por não haver um tempo determinado de exibição." (WERNECK, p. 52 e
53)

O espectador de uma série acompanha a evolução pessoal dos personagens, o seu


amadurecimento ao longo das temporadas, o que possibilita um processo de identificação mais
constante e, consequentemente, mais forte do que o percebido em filmes.

"A unidade total do seriado pode ser dada pelos protagonistas, pelo tema, ou pela época,
ligada, às vezes, ao local de ação. Mas, fundamentalmente, ela se dá por um objetivo
autoral, uma visão de mundo que pretende-se transmitir (PALOTTINI, 1998). Com força
comercial expressiva, as séries de televisão estão cada vez mais assumindo o papel que,
nos anos 50, era do cinema: o de ditar regras de conduta e comportamento para a
sociedade. (...) O fato é que [as séries] refletem, muitas vezes, a sociedade em que estão
inseridas, recortando um trecho da realidade e representando-a de forma verossímil."
(WERNECK, p. 54)

Por isso, as séries, em sua maioria, são criadas a partir da verossimilhança. Se a


identificação com as personagens não puder acontecer, não há o interesse por parte do
espectador. As roteiristas e os roteiristas de séries, a todo momento acompanham a vida
virtual que suas personagens adquirem. E pensam, em contrapartida à realidade, no que,
dentro da forma que lhe foi dada, pode acontecer, e de fato aconteceria, àquele individuo
de ficção. Ou de que maneira ele se relacionaria com os demais? A rigor, seriado não
tem sinopse. Faz-se uma relação muito bem feita dos personagens e suas características,
seu desenho pessoal, seu retrato. (WERNECK, 2007, p. 55)

Sobre a audiência das séries de TV terem aumentado em relação aos filmes no cinema: "Primeiro
por serem mais curtas e por passarem na TV, na comodidade do lar. Segundo por manterem o
cuidado de produção e interpretação recorrente nos grandes filmes." (WERNECK, 2007, p. 50)

3.3 "The L Word"

A série, iniciada em 2004, teve uma recepção calorosa por parte do público gay e, por incrível
que pareça, também por parte do público hétero. Veio com características de um contra-cinema,
no sentido de ajudar a modificar a condição da representação da mulher como objeto. Houve
algumas formas de censura na exibição. No Brasil, por exemplo, algumas cenas tiveram cortes e
o horário de exibição, ainda que em um canal de TV fechado, é muito tarde: às 23h.
21

As personagens principais de um seriado são apresentadas no primeiro episódio, o piloto da série,


aquele que servirá de guia e relação para todos os episódios subseqüentes em cada temporada.
Em “The L Word” esses personagens são: Bette (Jeniffer Beals), Tina (Laurel Holloman), Shane
(Kate Moennig), Jenny (Mia Kirshner), Marina (Karina Lombard), Kit (Pam Grier), Alice
(Leisha Hailey), Dana (Erin Daniels) e Tim (Eric Mabius).

Bette é uma "workaholic" que trabalha como curadora de um museu de arte contemporânea de
Los Angeles, e Tina é a sua parceira que deixou de lado a própria carreira para tentar gerar um
filho através de inseminação artificial. As duas mantém um relacionamento estável há sete anos,
mas passam por uma crise conjugal neste momento em que procuram criar sua própria família.

Shane é a lésbica masculinizada que não quer ou não consegue ter um relacionamento estável,
representando o estereótipo da sedutora avessa a compromissos. Jenny é uma escritora que chega
à cidade para morar com o seu noivo Tim, vizinho de Bette e Tina. É através da vizinhança de
Tim que Jenny entra em contato com esse universo de amigas lésbicas. Tim é técnico de um time
de natação e é o único personagem masculino de relevância no início do seriado, representando o
homem heterossexual que, a princípio, tem um fetiche por suas vizinhas lésbicas.

Marina é a dona do bar/café "The Planet", onde as personagens costumam se reunir para
socializar, conversar e paquerar. É ela quem desperta o interesse de Jenny por mulheres depois de
a beijar no banheiro de uma festa. Kit é a meia-irmã heterossexual de Bette, ex-cantora que tem
problemas com o alcoolismo. Ambas são de origem afrodescendente e têm problemas com o pai.
Alice identifica-se como bissexual. É a fofoqueira da turma, jornalista comunicativa e engraçada
que dá o toque de humor à série juntamente com Dana, a tenista profissional que representa tanto
a mulher saudável quanto a lésbica não-assumida, ou "no armário".

A terceira temporada trata de temas mais delicados e mais presentes no cotidiano lésbico, como o
rompimento de uma relação estável homossexual, incluindo disputa pela guarda da filha; as
dúvidas de uma personagem sobre sua orientação sexual, depois de anos em uma relação
homoafetiva; a dependência química causada por antidepressivos, devido a um relacionamento
rompido; uma doença grave que poderia ser curada se diagnosticada no início; transexualidade,
22

entre outros assuntos.

No seriado são apresentadas características do relacionamento homo, como a cumplicidade, a


harmonia e a ausência da hierarquia dos papéis que identificam e separam os gêneros. Na série, a
representação dos papéis de cada um no casal é vista como formando um par igualitário no qual,
como, por exemplo, no casal Bette e Tina, mostrando que os estereótipos devem ser quebrados
quando se trata da vida real de mulheres que amam mulheres.

"No século XXI, a mídia começou a mostrar ao mundo as novas configurações de


família, com a homoparentalidade sendo cada dia mais aceita, e com personagens
lésbicas mais verdadeiras sendo inseridas em novelas, filmes, programas de TV e séries
norteamericanas." (WERNECK, 2007, p. 44)
23

4 CONCLUSÃO

Os meios de comunicação tendem a embutir em suas mensagens e produtos de mídias


valores morais, comportamentos e gostos que precisam ser padronizados de forma a
atingir o maior número de pessoas. Por conta disso, tanto a forma quanto o conteúdo da
produção cultural desses meios acaba sendo reduzida a clichês de todos os
tipos."(Cartilha FNDC, p. 27)

“O seriado abocanhou um milhão de telespectadores nos Estados Unidos e vendeu 650 mil cópias
em DVD na Inglaterra, França e Alemanha, apenas no primeiro mês de lançamento do box.”
(ANGRISINI). A visibilidade do grupo identitário homossexual nas mídias audiovisuais
aumentou como conseqüência, também, do interesse capitalista neste mercado consumidor ao
perceber seu tamanho expressivo. Ainda que inserido neste contexto capitalista de produção, com
todas as formatações de um produto a ser comercializado, a série “The L Word” contribui
significativamente para acabar com o silêncio do “amor que não ousa dizer o nome”, ao retratar
com naturalidade e sensibilidade vários conflitos e situações cotidianas da vida dessas mulheres
lésbicas, trazendo uma visão menos estereotipada das mesmas.

A série representou uma grande conquista para a visibilidade e aceitação lésbica nas mídias
televisivas e, também, para a identificação das mulheres desse grupo social com representações
não exageradas ou distorcidas de suas vidas, diferentemente das representações mais comuns
(quando essas existem) sobre as lésbicas. Sendo a representação uma forma de relacionamento
dos homens entre si, entre suas idéias e identidades e suas percepções de mundo, cada alteração
imagética que implicar em uma diferente representação implicará também em novas
possibilidades de valores para o que aquela, ou aquelas imagens representam.

"Ao longo de sua criação, e através dos episódios, os seriados adquirem seus
significados totais. Os autores elaboram os casos, os enredos, as tramas que podem
envolver aquele grupo específico e que tenham a ver com a filosofia geral da série, seu
tema principal. Por sua vez, cada uma das personagens, criada e construída no começo
de tudo, amadurece e se modifica ao longo das temporadas. De igual forma, com o
passar do tempo, o público que a acompanha também se modifica, cresce. A relação que
acaba se estabelecendo é de cumplicidade, de amizade, já que uma pessoa acaba
“vivendo” ao lado da outra por muito tempo, conhecendo seus problemas e suas
conquistas, torcendo por suas empreitadas, chorando quando devem partir."
(WERNECK, p. 54-55)

As séries têm, portanto, papel importantíssimo na identificação das espectadoras com os


24

conflitos, dilemas, amadurecimento das personagens, inclusive porque o tempo de duração das
temporadas é suficiente para que os processos de vida das espectadoras também se modifique,
possibilitando que algumas pessoas que assistem à série vejam situações semelhantes às suas
vidas e com resultados e conclusões muitas vezes parecidos. As realidades formais podem ser
diferentes, porém os conflitos, as dores, amores e prazeres são retratados como são vivenciados
por homossexuais femininas de quaisquer classes econômicas.

Por ser uma mídia que reconquista o público semanalmente, e por ficarem no ar por anos,
os seriados acabam por criar uma legião de fãs que acompanham todas as temporadas, não
perdem as estréias, antecipam-nas através de donwloads na internet, revêem as reprises,
compram as coleções que são lançadas em DVD e continuam a discussão sobre os
capítulos exibidos em sites de relacionamento, de trocas de arquivo, fóruns de debates e
salas de bate-papo. Já por outro lado, percebe-se que é na série de TV que a
homossexualidade encontra hoje o seu retrato mais verossímil, com personagens que
fogem dos estereótipos negativos. (WERNECK, p. 50)

Apesar de ser uma série direcionada a determinado público-alvo, “The L Word” trata de questões
universais da humanidade. Daí também a importância que o produto tem em ajustar a
representação das lésbicas na sociedade atual a uma realidade, vivida por elas, que apenas se
distancia da realidade heterossexual por uma questão de atração e desejo. É importante ressaltar
que não é apenas o público homossexual que acompanha a série. O público heterossexual
também manifesta o interesse e a aprovação por este produto midiático, participando inclusive de
listas de discussão na internet sobre o seriado. Afinal, se as questões tratadas neste objeto de
estudo são universais, as mulheres hétero também podem se identificar com emoções e situações
vivenciadas pelas personagens, como um casal que deseja ter filhos.

Segundo Gilberto Velho (1978), "O estudo do rompimento e rejeição do cotidiano por parte de
grupos ou indivíduos desviantes ajuda-nos a iluminar, como casos limites, a rotina e os
mecanismos de conservação e dominação existentes." A mídia, juntamente com o poder político,
a religião e as leis, é um desses mecanismos de dominação. Assim, a grande aceitação da série
também pelo público heterossexual reflete, entre outras instâncias, a mudança da visão da
sociedade sobre o próprio grupo identitário, nos sinalizando que os mecanismos de conservação e
dominação estão se adequando à realidade inegável que mostra que os seres humanos são muito
25

mais do que suas escolhas sexuais.


26

5 REFERÊNCIAS

ANGRISINI, Bruna. Boom dyke na telinha. Disponível em:


<http://mixbrasil.uol.com.br/mp/upload/noticia/2_105_61044.shtml> Acesso em: 04 abr. 2008.

BRAIDOTTI, Rosi. A ética da diferença sexual: o caso Foucault. Disponível em:


<http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/art08.html> Acesso em: 05 de maio de 2008

BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. Rio de


Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

GÖRGEN, James. FNDC - Cartilha n° 1 - Fórum Nacional pela Democratização da


Comunicação - Democratização da Comunicação - Como Domar essa tal de Mídia?

LEONEL, VANGE. Quem é Quem em “The L Word”? Disponível em :


<http://mixbrasil.uol.com.br/cio2000/grrrls/quem_e_quem/quem_e_Quem.asp> Acesso em: 23
mar. 2008

LESSA, Patrícia. O feminismo-lesbiano e a desconstrução dos corpos naturais em Wittig e


Rich. Disponível em: <http://www.comuniles.org.br/index.php?
option=com_content&task=view&id=58&Itemid=39>. Acesso em: 28 mar 2008.

LUX, André. Viva a Diversidade! Disponível em: <http://tudo-em-


cima.blogspot.com/2007/06/srie-l-word.html> Acesso em: 23 mar. 2008

MULVEY, Laura. Prazer visual e cinema narrativo. In: XAVIER, Ismail (org.). A experiência
do cinema. Rio de Janeiro, Edições Graal: Embrafilme, 1983.

PORCHAT, Patrícia. A dança dos gêneros. Revista Mente e Cérebro. São Paulo, nº 185, jun
2008.
RODRIGUES, Joelma. The L Word - O Sabor. Disponível em:
27

<http://www.umoutroolhar.com.br/enfoque_tlwordsabor.htm> Acesso em: 04 de maio de 2008

ROUGHGARDEN, Joan. Homossexualidade como traço adaptativo. Revista Mente e Cérebro.


São Paulo, nº 185, jun 2008.

SACRAMENTO, Sandra. Mulheres emparedadas e seus espaços de memória. Rev. Estud.


Fem. , Florianópolis, v. 14, n. 2, 2006 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S0104-026X2006000200022&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 05 Maio
2008.

THE L Word (Season 1). Direção: Ilene Chaiken, Rose Troche e outras. Produção Executiva:
Ilene Chaiken. Elenco: Jennifer Beals, Erin Daniels, Laurel Holloman, Leisha Hailey, Katherine
Moening, Karina Lombard, Mia Kirshner, Pam Grier. Brasil: Metro-Goldwyn-Mayer, 2004. 4
DVDs, (14 episódios de aprox. 45 min), color, widescreen, legendado, drama.

VELHO, Gilberto. Observando o familiar. In: NUNES, Edson de Oliveira (Org.). A aventura
sociológica: afetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1978.
28

6 ANEXOS

Anexo I – Entrevista de “Malu” - estudante universitária

O que você acha da maternidade gay? Você concorda que duas mulheres podem desempenhar
esse papel em uma família homossexual?

Absolutamente. Existem tantas famílias com arquétipos de pais heterossexuais desestruturadas


que, em minha opinião, é um absurdo considerar que as crianças seriam prejudicadas por viverem
em um lar com mães homossexuais. Quando um casal tem respeito um pelo outro e
responsabilidade não existem razões para não terem o direito de criarem seus filhos. O que quero
dizer é que o fato de ter um pai, uma mãe, dois pais ou duas mães não é fator determinante para
qualificar a criação dos filhos como boa ou ruim.

Outra questão crucial é o caso da adoção, principalmente de crianças mais velhas (não recém-
nascidas). Nos orfanatos brasileiros chega-se a dividir um colchão de solteiro para três crianças
pequenas. Crianças que vieram de mães e pais, em sua maioria, heterossexuais. Agora quando um
casal gay, seja ele masculino ou feminino, expressa o desejo de adotar uma dessas crianças na
maioria dos casos o pedido é negado. Os argumentos são tão mesquinhos que me enjoam. Dizem
que uma criança não iria se sentir confortável, que seria alvo de chacota das pessoas e que ainda
um casal gay não teria a estrutura familiar necessária para criar PLENAMENTE uma criança tida
como “normal”. Aí é hora de se perguntar o que é normal. Normal no Brasil deve mesmo ser a
existência de crianças abandonadas pelos pais biológicos dividindo colchões e passando
necessidades enquanto as autoridades esperam que casais heterossexuais (os mesmos que se
acotovelam nas filas de espera por crianças recém-nascidas e brancas) decidam adotá-las, nisso a
“criança” faz dezoito anos e nunca conheceu um lar que pudesse chamar de “seu”.

Você acha que, contanto que se ofereça uma estrutura para a criança, tanto faz se é um casal
homo ou hétero?
29

Com certeza. Como disse na questão acima, acho que a orientação sexual do casal não influi na
vida da criança. Se fosse assim crianças criadas por pais heterossexuais não seriam gays.

O que você acha necessário para diminuir a homofobia?

Eu acho necessária uma maior abertura dos homossexuais. Não adianta esperar que os
heterossexuais acordem um dia e resolvam aceitar completamente os gays. Quando um gay
esconde sua sexualidade ele dá o direito das pessoas cobrarem que ele faça isso. Quando um gay
se esconde no armário ele está se colocando no lugar que o mundo homofóbico espera que ele se
encontre.

Acho que o respeito pelos homossexuais depende de imposição, não de negociação. E quando eu
digo isso, eu digo que os gays não têm mas querem ter os mesmos direitos que os heterossexuais.
Logo, devem se portar livremente como eles. Os heterossexuais têm direitos civis, têm uniões
reconhecidas, têm herança, e acima de tudo não são importunados se estiverem se beijando em
um local público, não são perseguidos na rua pela sua sexualidade, não são marginalizados. Pelo
menos os homens heterossexuais. Já as mulheres heterossexuais encontram formas sim, de serem
marginalizadas pelo que diz respeito à sexualidade, principalmente em meio a nossa sociedade
machista (mas isso já é outro tema). O que quero dizer é que os gays têm que se aceitar e se dar
valor se quiserem esperar que os heterossexuais façam o mesmo um dia.

Eu respeito um gay que quiser ficar no armário, pelo menos em alguns setores da nossa vida isso
ainda é aceitável, mas não deixo de considerar um atraso para a comunidade.

Qual a sua posição em relação à censura na representação de casais gays na mídia


(principalmente em telenovelas)?

Me dá até raiva tocar nesse assunto. É a questão da negociação. Pelo menos no que diz respeito à
TV aberta. As novelas da TV Globo, por exemplo, elas falam tipo: “Sim, seja gay, mas bem
escondido, no escuro, trancado no quarto, de preferência na Sibéria.” As pessoas falam sobre
30

iniciativa, e tantos blábáblás. Mas na verdade eu vejo isso como uma indulgência muito mal feita
pela TV aberta. Eles não mostram a coisa como é. Os poucos casais gays até hoje mostrados não
têm libido, não têm competição, são praticamente duas ovelhas negras que encontraram a única
pessoa do mundo que poderiam amar na trama. Eles não têm a complexidade dos casais
heterossexuais e, muitas vezes, a personalidade dos personagens gays é construída de modo
simplório. E quando as pesquisas de opinião acusam um descontentamento do público
heterossexual, as personagens morrem em explosões ridículas e por aí vai....

Agora, se for tratar de produções como o próprio produto do trabalho, a série The L Word, aí a
coisa muda totalmente. Aí sim está a complexidade esperada. Mas é preciso enxergar que a série
não atinge a massa que precisa enxergar a vida lésbica sobre outra perspectiva, assim, quem sabe,
diminuindo um pouco a homofobia geral no Brasil.

Você acha a união gay semelhante à união hétero?

Depende do sentido. Eu acho a união gay semelhante à união hétero no sentido de merecer os
direitos legais, civis, e de merecer a integridade e do respeito das pessoas. Agora em termos
práticos não é assim que acontece. Em grande parte das vezes, no âmbito familiar, por exemplo,
quando um casal hétero se une recebe festa, parabéns, votos de felicidade. Agora um casal gay
recebe insultos, lágrimas, ódio. E esse é apenas um exemplo. Agora eu estaria mentindo se
dissesse que considero a mesma coisa. Apenas uma pessoa assexuada poderia considerar a
mesma coisa.

Você concorda que a mídia influencia a opinião das pessoas?

Com certeza. A mídia é talvez o instrumento da atualidade que mais tem o poder de mediar a
opinião das pessoas.

Como lésbica, diga o que mais te atrai em uma mulher.

Depende. Assim de cara diria que é a atitude. Mas a gente não escolhe por quem se apaixona.
31

Cada caso é um caso e às vezes agente encontra qualidades nas pessoas que passam por cima de
muitas coisas que você tinha como verdade. Posso dizer que atualmente gosto de mulheres
inteligentes, criativas e principalmente mulheres que respeitam os meus sentimentos.

Do que você mais gosta e do que mais desgosta na sua condição de homossexual?

O que eu mais gosto é a autonomia de saber o que eu quero da minha vida e também de saber que
eu estou em uma posição de lutar, e que ser como eu sou iluminou muitas coisas na minha vida e
na minha mente. Talvez se eu fosse hétero nunca lutaria por nada na minha vida. Nunca
aprenderia a me impor, e a olhar por pessoas, consideradas minorias, e saber que eu tenho algo
em comum com elas, e saber que a nossa situação precisa mudar.

Realmente o que me desgosta é sempre encontrar fortes barreiras na minha vida amorosa. Às
vezes você luta batalhas com pessoas que nem conhece, mas que não gostam de você pelo seu
gênero. A família jogando na cara que você é uma decepção também me entristece
profundamente.

Você tem ou gostaria de ter filhos? Qual a forma que escolheria para ter filhos: gerando o
próprio filho, adotando...?

Há... Isso é muito delicado. Agora eu não teria filhos de forma alguma. Mas estaria mentindo se
dissesse que futuramente não gostaria. Gostaria sim de ter filhos e, além disso, teria das duas
formas: geraria um e adotaria os outros.

Você conhece a série "The L Word"? O que acha?

Como já disse acho espetacular. Nenhuma série no mundo conseguiria retratar tão bem o
cotidiano lésbico. Lógico que ela tem algumas limitações, como mostrar apenas lésbicas
financeiramente bem, independentes, bem arrumadas. Nós sabemos que não é bem assim que
acontece mas eu, particularmente, acho que é assim que deve acontecer. Então acho super válido,
principalmente se servir como espelho para as lésbicas da atualidade.
32

Como você definiria a representação das lésbicas feita no seriado?

Então... Elas são bonitas, realizadas, algumas às vezes um pouco confusas, mas principalmente
independentes. E o mais válido para mim, é como o seriado mostra que a orientação sexual gay,
faz parte de praticamente todos os setores da vida do indivíduo.

Qual sua opinião sobre o estilo masculinizado de uma lésbica ao se vestir e portar?

Não tenho nada contra lésbicas masculinizadas. Acho que as pessoas devem se sentir e portar da
forma que se sintam mais á vontade. Só acho equivocado quando uma mulher pensa que para ser
lésbica precisa se masculinizar. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Se você quer mudar
de gênero, você é transexual, e sua orientação sexual não depende disso. Sei que as pessoas mais
preconceituosas pensam que uma mulher lésbica necessariamente quer ser um homem. E isso não
acontece. Existem sim lésbicas femininas que adoram sua condição de mulher.

Na condição de homossexual, você já sofreu algum tipo de descriminação?

Claro que sim. O homo que disser que nunca sofreu está mentindo.

Você assume sua orientação sexual? Como você afirma a sua sexualidade? Como as
pessoas costumam reagir?

Eu assumo quando acho importante. E isso acontece com freqüência. Mas tenho que admitir que
questões de emprego, principalmente para uma universitária, são complicadas. Não sou de sair
anunciando, se estou tendo um relacionamento, ou do que eu gosto. Mas se alguém perguntar, por
exemplo, eu não nego. Eu, assim, como a maioria das pessoas tenho a minha vida pessoal.

As pessoas reagem de acordo com quem são elas. Os héteros costumam tentar de converter (rio
horrores dessa), já os gays ou bissexuais, obviamente, levam numa boa.
33

O seriado retrata o universo lésbico de uma forma glamourizada? Você acha que condiz com a
realidade do universo lésbico, ou muita coisa é fantasia?

Olha, reproduz de forma glamourizada sim. Se for analisar na perspectiva da realidade brasileira
aquilo ali é um conto de fadas. Mas como disse, acho importante as lésbicas daqui enxergarem
que poderia existir essa opção.

Você acha que uma criança filha de pais gays tem propensão a ter uma referência negativa
deles?

Tem. Porque o preconceito está aí estampado. Mas se pais gays não começarem a criar crianças
e sofrer preconceito por isso, a situação nunca poderá evoluir para um fato comum.

Qual o termo pelo qual você prefere ser identificada? Lésbica, homossexual, gay, bissexual ou
outro?

Gay, ou lésbica, tanto faz.

Você já teve experiências sexuais com homens?

Sim.

Mesmo estando em pleno século XXI, algumas pessoas não consideram a relação sexual entre
mulheres pela ausência do pênis. O que você acha disso?

Eu acho uma balela de última categoria. Uma última tentativa ridícula de desmerecer mais ainda
as relações gays femininas. E por falta da vagina? Não deveria ser desconsiderado também,
seguindo essa lógica? A única palavra na qual eu consigo pensar para me expressar sobre isso é:
MACHISMO.
34

Anexo II: Entrevista de "Regina" - 24 anos – estudante universitária

O que é, para você, ser lésbica?

É o interesse sexual e sentimental de uma mulher por outra.

Quais são as características que marcam/definem a condição lésbica?

Justamente o interesse sentimental e sexual de uma mulher por outra.

Você se define como gay?

Sim.

Qual o termo pelo qual você prefere ser identificada? Lésbica, homossexual, gay, bissexual ou
outro?

Homossexual. Me parece menos pejorativo.

Como você reconhece uma pessoa que também é homossexual? Existem características físicas
ou comportamentais que facilitam/possibilitam essa identificação?

Não reconheço. Acredito que não existam regras. As lésbicas, assim como os gays, estão
inseridos também em subgrupos e muitas saem do contexto projetado de mulher masculinizada.

Quais as diferenças entre os gays do sexo feminino e os gays do sexo masculino em termos de
postura, afetividade, formas de relacionamento?

As mulheres são naturalmente mais sensíveis, mais ligadas à sentimentalidade, essencialmente.


Os homens, mesmo gays, no geral adotam uma postura menos sentimental, são mais sexualmente
afetivos, por assim dizer.
35

Quais as mesmas diferenças acima com relação aos gays e aos heterossexuais (também em
termos de comportamento, amigos, trabalho)?

Os grupos, sejam quais forem, tendem a se aproximar mais de seus semelhantes. Não acredito
que existam diferenças no trabalho, com amigos ou comportamento. No fim das contas todo
mundo sente e ama do mesmo jeito.

Qual a sua abordagem para paquerar, demonstrar seu interesse por alguém do mesmo sexo?
Como você se prepara ou se preserva de uma provável reação negativa?

Através de olhares demonstro o interesse. É difícil se preparar para uma reação negativa, mas
tento apenas não criar muitas expectativas, deixar acontecer primeiro antes de gerá-las.

Você assume sua orientação sexual? Como você afirma a sua sexualidade? Como as pessoas
costumam reagir?

Não assumo. Afirmo apenas para meus amigos ou pessoas de confiança, porque infelizmente
ainda é um tabu enorme para a sociedade perceber que existem pessoas que amam diferente, que
não buscam o sofrimento de ninguém, apenas desejam sua felicidade, como qualquer outra.

Do que você mais gosta e do que mais desgosta na sua condição de homossexual?

Gosto de saber que existem pessoas como eu, que não sou nenhuma aberração do mundo. Não
gosto da libertinagem, e isso acontece quando percebo a falta de limites de algumas pessoas, que
confundem a aparente "liberdade da escolha sexual" com a falta de limites e respeito pelo outro.

Você já teve relações sexuais com homens? Quais são, para você, as diferenças?

Sim. As mulheres, de modo geral, são semelhantes a mim, talvez por isso mais fáceis de lidar,
entendem com mais facilidade suas expectativas e vontades. Os homens, por adotarem muitas
36

vezes a velha postura machista, acabam ignorando que somos diferentes deles e vêem isso como
um problema, algo que não pode ser alcançado, o que não é verdade.

O que você acha da maternidade lésbica?

Sou a favor. Tendo amor na relação, na hipótese de um filho entre ambas não vejo mal nenhum.

Você acha que a orientação sexual dos pais/mães interfere negativamente na criação dos
filhos?

Sim, infelizmente.

Você tem ou gostaria de ter filhos? Qual a forma que escolheria para ter filhos: gerando o
próprio filho, adotando...?

Tanto faz.

Como a mídia mostra/caracteriza os homossexuais?

Tratam mais abertamente do que antigamente, afinal a mídia tende a retratar a vida como ela é. E
não dá pra ignorar a existência de homossexuais no mundo.

Como você definiria a representação das lésbicas feita no seriado "The L Word"?

Acho interessante pelo fato de mostrar abertamente várias questões que se passam entre as
lésbicas, muitas dúvidas e assuntos que nós muitas vezes debatemos.

Você acha que a série traz uma abordagem mais próxima da realidade lésbica do que outros
produtos audiovisuais (filmes, outras séries, curtas, novelas) que você já assistiu?

Sim, é próxima, mas ainda sim fica claro que é um produto.


37

Você se identifica com o que/quem na série?

Com as personagens que sofrem conflito por não poderem se assumir.


38

Anexo III: Entrevista de Stéphanie Medeiros – estudante universitária

O que você acha da maternidade gay? Você concorda que duas mulheres podem desempenhar
esse papel em uma família homossexual?

Claro! Afinal, o que é preciso para se criar uma criança? Ter pais hetero é o fundamental? Ou
carinho, atenção e várias outras coisas que são necessárias para se criar um ser humano?

Então você acha que contanto que se ofereça uma estrutura para a criança, tanto faz se é um
casal homo ou hétero?

Com certeza! Pessoas bem instruídas para se criar uma criança é o que precisamos. Tudo que é
bem orientado vai fazer bem para tal, sendo hetero ou homo. daí poderemos criar uma sociedade
menos hipócrita.

O que você acha necessário para diminuir a homofobia?

É uma questão muito complexa, afinal uma pessoa homofóbica, na minha concepção, é uma
pessoa com medo de conhecer algo normal que a maioria da sociedade nega ser normal por
motivos variados. Vivemos em um país em que o cristianismo é dominante, o que é totalmente
contra os gays. Pessoas homofóbicas são pessoas que constroem estereótipos que a sociedade
impõe. Para diminuir tais ações homofóbicas é necessário leis mais firmes e esclarecimentos
sobre o mundo gay. Devemos começar com as crianças, explicando corretamente que o certo não
é somente homem com mulher e que é incorreto achar que “homem com homem vira lobisomem
e mulher com mulher vira jacaré”

Qual a sua posição em relação à censura na representação de casais gays na mídia


(principalmente em telenovelas)?

Parece que todas as telenovelas tentam abordar algo sem preconceito algum, dando “a pose" de
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que é totalmente sem preconceitos e democrata. Porém, mostram uma coisa totalmente
superficial, que até para decidir se vai ter um beijo é uma polêmica e acabam mostrando algo só
na dedução do público, "é gay ou não é?". A mídia não mostra o que o casal gay é na realidade.
Não mostra que são casais comuns como os hétero, que beijam, trepam, sofrem por amor, que
amam, que vão trabalhar. Enfim, ou a mídia exibe essa parte superficial ou mostra a parte
cômica, pois colocam um gay para a novela ter mais graça com o jeito irreverente de ser, porque
é isso que brasileiro gosta, humor...

Você acha a união gay semelhante à união hétero?

Sim. Em todas as questões são uniões iguais, afinal têm tudo que um relacionamento pode, deve,
necessita...

Você concorda que a mídia influencia a opinião das pessoas?

Em parte sim. Afinal, hoje em dia o mundo fica cada vez mais fútil. Vivemos onde o que passa
na TV é quase lei por exemplo, as regras de beleza imposta por ela. A mídia influencia aquele
que não sabe tratar a mensagem como o que presta e o que não presta. Às vezes, por falta de um
entendimento mais amplo, as pessoas encaram a tv como um ser divino.

Como lésbica, diga o que mais te atrai em uma mulher?

Pode parecer clichê, na verdade é clichê! Mas o que mais me atrai é o jeito de ser, a maneira
como vive, acompanhada de um sorriso e uma boca bonita.

Do que você mais gosta e do que mais desgosta na sua condição de homossexual?

Menos gosto: hipocrisia da humanidade com relação a tal assunto. Mais gosto: não tenho o fator
que mais gosto, eu sou e pronto. Fazer o quê?

Você tem ou gostaria de ter filhos? Qual a forma que escolheria para ter filhos: gerando o
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próprio filho, adotando...?

Adotando, afinal tem tanta criança precisando, necessitando de uma família de verdade!

Você conhece a série "The L Word"? O que acha?

Conheço sim, através de amigas que veneram tal série. Apesar não de ter assistido nem um
episodio inteiro gostei do que vi. Parece ser bacana, até pedi para minha amiga copiar as
temporadas.

Como você definiria a representação das lésbicas feita no seriado?

Pelo que vi não tem como definir, pois cada uma representa um determinado estilo de vida
lésbico. Acho que aborda mais normalmente, como se fosse no "mundo hétero".

Qual sua opinião sobre o estilo masculinizado de uma lésbica ao se vestir e portar?

Se ela se sente bem assim... O que temos a ver com isso? O caso é se sentir bem com ela mesma.
Na minha opinião, se é se vestindo de uma forma masculina, vai lá, uai!

Na condição de homossexual, você já sofreu algum tipo de descriminação?

Que eu me lembre, não.

Você assume sua orientação sexual? Como você afirma a sua sexualidade? Como as pessoas
costumam reagir?

As pessoas ficam em dúvida, pois eu não saio gritando "sou gay". Se alguém perguntar, eu falo
que sim. Quando afirmo elas não reagem tão mal, apenas perguntam como é. A maioria que
pergunta tem, na verdade, curiosidade de saber como é...
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O seriado retrata o universo lésbico de uma forma glamourizada? Você acha que condiz com a
realidade do universo lésbico, ou muita coisa é fantasia?

Prefiro não responder porque só vi um trecho.

Você já teve ou tem vontade de ter experiências sexuais com homens?

Já tive, obrigada. Não quero ter mais.

Você acha que uma criança filha de pais gays tem propensão a ter uma referência negativa
deles?

Sendo bem orientada e tendo todo aquele apoio conjunto que é necessário para se criar uma
criança não.

Qual o termo pelo qual você prefere ser identificada? Lésbica, homossexual, gay, bissexual ou
outro?

Stéphanie.

Mesmo estando em pleno século XXI algumas pessoas não consideram a relação sexual entre
mulheres pela falta do pênis, o que você acha disso?

O importante é gozar no final. Gozou? Foi bom? É isso ai... Já está mais que comprovado que
não é preciso de penetração de um pênis para chegar a prazeres maiores... Como o orgasmo...
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Anexo IV – Entrevista de “A.H.N.” - 20 anos – estudante universitária

Você se identifica como lésbica? Por quê? Em que consiste a sua identificação?

Sim. Porque desde pequena eu tive uma educação liberal então eu nunca tive esse medo que a
maioria das meninas que se descobre homossexual tem de encarar essa experiência como um
pesadelo. Apesar de eu não ser assumida, porque eu acho que isso é muito íntimo e é algo que só
pessoas de confiança devem saber. Como eu tive essa educação liberal, pra mim foi muito
natural, e o desejo que eu sentia e que eu sinto por pessoas do mesmo sexo não é um bicho-de-
sete-cabeças, na verdade só aflora mais ainda minha curiosidade pelo ser humano.

O que você acha que caracteriza o grupo das lésbicas além do desejo sexual por outras
mulheres?

Eu dispenso qualquer tipo de estereótipo. Eu acho que você pode ser cem por cento feminina e
gostar de mulheres, como você pode ter estilo andrógeno e ser hétero. A questão é que eu tenho
uma certa fascinação por mulheres, mais do que por homens, apesar de ter amigos homens,
porque mulheres, na minha opinião, são muito mais complexas. É uma questão tão profunda que
entra também a parte da maternidade, pois eu fico muito intrigada de uma mulher, de um ser
humano, ter a capacidade de dar a luz a outro. E não é são essas questões, eu acho que a
consciência feminina me atrai, mais do que a consciência masculina. Os modos, as peripécias que
essas mulheres passam e, por eu ser um pouco feminista, e lutar pela emancipação feminina dou
mais ênfase ao universo feminino.

Quais são as características pelas quais você reconheceria uma lésbica? Quais as coisas que
você vê em comum que toda lésbica gosta, por exemplo?

Sinceramente, eu acho que um relacionamento hétero não é muito diferente dum relacionamento
homo, porque ambas as situações têm propensões tão fortes de dar certo como de dar errado, e os
dois universos, tanto hétero como homo, têm as mesmas peripécias, os mesmos problemas:
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ciúme, conflitos, amor, paixão, interesses em comum. Agora, particularmente falando do


universo lésbico, eu acho que as mulheres são mais cúmplices e acho que não é uma relação
muito embasada no sexo como a relação hétero. Às vezes a relação hétero esfria porque o sexo
está ruim, pelo menos nessa cultura patriarcal em que a gente vive a gente vê o reflexo de que, se
a relação está ruim, é o sexo. E o que eu vejo na relação homo, pelo menos com referência
própria, é que a gente dá muito mais valor à consciência e às nossas opiniões nas experiências,
independente de ser sexual ou não. Há um interesse tão forte em sexo, mas há um interesse maior
ainda na convivência da pessoa, na cumplicidade, nessa questão de você estar de igual pra igual,
dos direitos serem os mesmos na sociedade. Então é uma luta igual, você não tem aquele
problema de que o homem ganha mais ou a mulher ganha menos e isso, às vezes, nas famílias
hétero ocorre uma divergência, porque o homem às vezes fica ofendido de ganhar menos que a
mulher. Eu acho que no casal homo não tem nada disso. Eu acho que a gente tá de igual pra igual.

Então você acha que mesmo sendo um grupo ainda, na sociedade, separado, classificado como
lésbico, as experiências como ser humano são as mesmas. Como você acha que deveria ser a
integração do grupo lésbico pela sociedade já que, na verdade, somos todos humanos e essa é
apenas mais uma diferenciação de preferências, de gostos. Você vê uma possibilidade da
sociedade integrar as homossexuais femininas de uma forma natural? Você vê isso num
futuro próximo, distante... Como você vê essa possibilidade?

Eu já enxergo isso nas sociedades de primeiro mundo. Na Europa, por exemplo, já é praxe
casamentos homossexuais. Apesar de ainda não ser uma coisa comum na sociedade, na Europa,
por exemplo, mulheres já se casam com mulheres e são aceitas normalmente pela sociedade.
Agora, já que eu sou uma latino-americana e eu vivo num país subdesenvolvido no qual a
economia é tão atrasada quanto o pensamento brasileiro eu acho que aqui é só uma questão de
tempo, porque eu acho que tudo tem tendência a evoluir, as coisas sempre evoluem. Eu acho que
se você comparar nossa vida há trinta anos atrás a gente ia ser muito mais prejudicada, a gente ia
estar vivendo um conflito interno muito maior do que uma menina que se descobrisse lésbica
agora, e acho que isso também é muito questão de veiculação na mídia. O brasileiro é muito
ligado à televisão, muito mais do que nos outros países, o entretenimento e até a forma de
conhecimento pela pouca verba que ele dispõe de investir em livros, em materiais enriquecedores
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intelectualmente falando. O brasileiro depende muito da televisão e eu acho que se a


homossexualidade fosse veiculada na televisão de um modo que representasse esse grupo
identitário de uma forma normal, não afetada e não deturpada eu acho que já seria uma excelente
oportunidade de a gente evoluir mais ainda e abrir mais a cabeça das pessoas pra isso.

Então você acha que preconceito é uma questão cultural?

Sim.

Você falou sobre as representações midiáticas brasileiras. Você conhece o seriado "The L
Word"?

Sim, sou fã! Ainda pago de tiete...

Você acha que o seriado "The L Word" está mais próximo duma representação mais realista e
natural do universo lésbico do que as representações midiáticas que você viu, nos últimos
tempos, na mídia brasileira?

Sem dúvida nenhuma! O "The L Word" é o seriado, ou então o dispositivo midiático que trabalha
com mais veracidade esse universo, apesar de eu perceber muitas vezes, na produção muito
glamour, muita coisa que não tem a ver. Eu acho que eles glamourizam muita coisa que é muito
simples e eles fazem escândalo às vezes nos episódios por causa de coisas corriqueiras, mas eu
acho que é um excelente representante nesse assunto. Tanto até porque abrange não só a questão
física do relacionamento mas como os conflitos e as interações humanas que elas fazem entre si.
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Anexo V – Entrevista de “Bia” – 27 anos - jornalista

Ser lésbica, pra mim, é sentir atração afetiva e sexual por mulher. Não precisa de manter a
relação, ter a relação. Pra mim, só o fato de sentir atração já é ser lésbica.

As características que marcam ou definem a condição lésbica pra mim é... é só gostar de mulher.
Eu acho que visualmente não tem nenhum fato, nenhum acessório, nenhum comportamento que
defina isso. Tem grupos, sim, que gostam de se caracterizar, que gostam de se vestir de uma
maneira menos feminina, que gostam de usar acessórios... Mas isso não é uma condição pra ser
lésbica, a lésbica pode ser uma mulher como outra qualquer.

Uma das características é, por exemplo, ter a unha curta, o que é uma necessidade pra mulher
lésbica. Mas tem várias mulheres heterossexuais que usam, também, a unha curta, porque
gostam, esteticamente, ou porque precisam de ter, no caso de da profissão que ela tem como
chefe de cozinha, por exemplo, que precisa ter a unha curta.

Eu me defino como gay. Eu prefiro falar que eu sou gay do que falar que eu sou lésbica. Primeiro
porque une todo mundo, todo mundo é gay, o homossexual masculino, feminino, é gay. Lésbica
eu acho que virou... é uma palavra feia, esteticamente feia mesmo, parece nome daquelas doenças
antigas, epilético e afins, então eu acho que ficou uma coisa feia. Por isso que eu prefiro ser
chamada de gay. É a maneira que eu prefiro ser identificada. Ou então homossexual, mas fica
muito grande, seria um termo muito mais técnico. Só que eu abomino palavras, por exemplo,
como "entendida". Acho horrível, não gosto de jeito nenhum. Tem muitas meninas que brincam
entre si de chamar uma à outra de sapatão, de sapa, sapata e tal, mas eu acho super pejorativo, eu
acho que um grupo fora não pode chamar nenhuma lésbica assim, considero. Mas entre si existe
essa brincadeira de se chamar assim, agora uma coisa é dentro do grupo outra coisa é fora do
grupo.

Eu reconheço uma pessoa que também é gay pela história de vida se eu conhecer ou, de repente,
se responder algum apelo meu, seja qual apelo for. Se eu cantar uma pessoa sutilmente e essa
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pessoa responder, ela vai entender o recado e ela vai mostrar que é ou não. Por isso que eu acho
que a melhor maneira de você conhecer outras meninas assim, que também são gays, é através de
amigos, ou através de internet, que você vai lá diretamente, você já sabe que essa pessoa é. Ou
mesmo a pessoa que você vai conhecendo, vai se tornando amiga e aí vocês trocam idéias de vida
e fica sabendo que é. Eu acho muito arriscado você já ir direto numa pessoa que você não sabe o
que é porque aí pode te gerar mil problemas. Agora, algumas pessoas têm características físicas,
algumas pessoas querem deixar isso bem claro, e aí se vestem como homens, na maioria das
vezes se tornam masculinas pra reforçar, porque a identidade que a gente tem hoje é isso, é
homem e mulher, então quem gosta de mulher é homem, e aí as meninas ficam mais masculinas.

Mas e o tal do "gaydar", o que você acha disso? Porque você falou só de identificar por
situações ou por alguma forma de se vestir... E o gaydar, você acha que existe isso, essa
intuição de que alguém é gay, e como que você percebe isso?

Eu acho que existe, mas eu acho que algumas pessoas, se elas não se mostrarem fisicamente, que
é o caso de ficarem masculinizadas as meninas ou afeminados os meninos é convivendo. Tem
uma coisa que eu acho super legal que é falar "Nossa, essa é gay até na foto!" mas, pra pessoa ser
“gay até na foto” ela tem que se demonstrar, ter características físicas que deixem isso claro.
Então se for uma menina super feminina ela pode ser gay, pode ser muito gay, totalmente
resolvida, que na foto você não vai achar que ela é.

As diferenças entre os gays do sexo feminino e os gays do sexo masculino são uma só: um é
homem, outro é mulher. Culturalmente é a mesma coisa, um é homem, outro é mulher. Em nossa
sociedade machista os homens gays também são machistas. De uma maneira diferente, porque a
referência muda um pouco. Mas quando você fala assim "Ah, os gays (ou os gays homens) são
promíscuos.", eu acredito que seja porque a nossa sociedade cria aquele homem pra ser o sedutor,
pra ser o pegador, os pais se orgulham dos meninos que são pegadores, que tão saindo com a
filha da vizinha... E a menina não, é a quietinha, ela foi feita pra casar, ela foi feita pra ter uma
primeira vez linda, perfeita e maravilhosa e depois ela vai casar. Isso se reflete nas relações
homossexuais também. O homem, ele foi feito pra agarrar, pegar. Juntou dois, cabô! Eles vão se
agarrar e vão se pegar. A mulher, ela vai fazer o quê? Ela vai querer namorar, e aí, no segundo
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encontro ela vai querer casar. Então isso está o tempo inteiro está nas relações homossexuais. É
claro que existem as exceções. Existe o homem, que também tem muito homem por aí, senão a
gente não estaria aqui, que quer casar, quer constituir a família e tal. Então tem, claro, os
homossexuais (são muitos) que estão aí casados há muitos anos, alguns adotando filhos ou
gerando numa barriga de aluguel. Tem um monte. E a mulher do mesmo jeito já pode ser mais
saidinha, querer mais farra, porque ao longo do tempo também as referências foram mudando.
Mas continua o que a gente ainda aprendeu desde criança né, a menina tem que fechar as pernas
porque está de saia e o menino vai embora. Entre os gays e os heterossexuais pra mim também a
diferença é mínima, acho que a diferença é só gostar do sexo oposto e do mesmo sexo porque os
homens heterossexuais como eu acabei de falar também são mais pra frente, expressão antiga né,
do que as mulheres e do mesmo jeito isso reflete nas relações homossexuais.

A minha abordagem pra paquerar e demonstrar o interesse por alguém do mesmo sexo é sutil. Eu
vou sempre pelo lado da sutileza. Se tiver uma resposta você avança mais um pouco, dá mais um
passo. A resposta tá dando você parte pra cima. Agora é muito difícil, são poucas relações que eu
já tive na minha vida que aconteceram dessa maneira, uma pessoa tá ali, de chegar e me
aproximar sem saber, ou às vezes é heterossexual, você sabe que é heterossexual e você se
interessa e vai em cima ver, se quer experimentar pelo menos. Ou a pessoa chega até você sem
saber. Foram pouquíssimos acontecimentos na minha vida. Geralmente você conhece as pessoas
através de amigos em comum, ou então você seduz, a pessoa nem era e aí vira e cai na sua. Ou
internet, que as pessoas da nossa geração, da minha geração pra baixo, já começaram a ter essas
relações todas começando pela internet, conhecendo pela internet, e aí fica tudo muito mais fácil.

Eu assumo que minha orientação sexual pra mim mesma e pra algumas pessoas. Já sofri
preconceito em um estabelecimento comercial. Não do próprio estabelecimento, mas das pessoas
que estavam freqüentando. E preconceito em casa, preconceito da minha família. Então eu acho,
depois disso, que nem todo mundo deve saber, porque tem gente que não tem a cabeça e não tem
inteligência e não tem instrução nem clareza das coisas o suficiente pra entender que uma pessoa
é diferente. Então eu resolvi que algumas pessoas merecem que a gente se abra, merecem que a
gente seja verdadeira com elas e outras pessoas merecem a mentira, porque elas não aceitam nem
respeitam a verdade.
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Eu gosto de ser gay porque eu sou uma pessoa muito mais tolerante, mais solidária, menos
preconceituosa com tudo porque eu sou gay. Eu vim de uma família que é totalmente
conservadora, tradicional família mineira, conservadora e preconceituosa, e o preconceito deles
passa por um monte de coisa, não só contra homossexual. Eu acho que eu sou uma pessoa muito
melhor, eu sou um ser humano muito melhor por ser gay, do que eu seria se eu não fosse e tendo
a influência que eu tive em toda a minha vida. Eu sou uma pessoa diferente, então eu comecei a
respeitar as diferenças também. Talvez se eu não fosse diferente eu teria esse distanciamento das
pessoas que são diferentes, de religião, de raça, de outras orientações sexuais até. Então eu me
considero uma pessoa melhor, não do que outras pessoas que são heterossexuais, mas uma pessoa
melhor do que eu acho que eu seria se eu não fosse homossexual.

Eu nunca tive relações sexuais com homens. Eu já beijei na boca de homem, só, nada mais. Então
eu não sei, minha vida sexual toda foi com mulheres. Não tive vontade, tive muitas oportunidades
de transar com homens e tentei, só que eu já não gostei, já tive um falar "isso não é pra mim"
desde cara, então eu acho que não é isso. "Ah, gosta de mulher porque não achou um homem
ainda!" Gente, eu num quis nem começar, porque eu não gosto! Não dou conta, não gosto nem de
beijar na boca! Não me agrada, não me atrai, então muito menos chegar a ir pra cama. Tem um
episódio de "The L Word" que eles falam "você é a 'estrela de ouro'". Então, eu sou a "estrela de
ouro".

A maternidade lésbica... Eu acho super legal. Eu acho que as pessoas terem coragem de agora
encarar a família alternativa é fantástico, eu acho que o futuro é esse mesmo. Já tem muitas
famílias não-convencionais, que são famílias de pais separados, que tem irmãos do segundo
casamento. Isso se a gente olha numa grande cidade, assim, da minha geração, por exemplo
também, que eu já tenho 27 anos, tenho muitos amigos que já têm pais separados. Eu tenho uma
irmã de cinco anos, do segundo casamento do meu pai, que já tem outra família, então já mistura
todo mundo. Já tem sobrinhos emprestados que não são filhos do meu irmão mas filhos do
primeiro casamento da mulher dele, e por aí vai. E tem muita gente que eu conheço que é assim,
e são relacionamentos heterossexuais e famílias diferentes. Eu acho muito legal que duas
mulheres possam ter e criar crianças, como eu acho também muito legal ter dois homens que
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possam fazer esse papel, até porque tem tanta gente que é criado com a mãe e a tia, ou só com pai
por algum motivo, um drama familiar aí, e essas pessoas são hoje pessoas totalmente tranqüilas,
totalmente centradas que você não fala que elas tiveram problemas por terem duas mães ou um
pai ou dois pais. São pessoas totalmente normais.

Eu não acho que a orientação sexual dos pais e mães interfere negativamente na criação dos
filhos. Isso é meio complexo, porque eles falam que tem que ter a separação entre pais e mães, a
hora que o pai entra, a interferência da mãe pra marcar posição e tal. Sei lá, mas acredito que se
isso existe realmente, se ninguém sabe o que é, se é só um fato psicológico, se é uma
predisposição genética ninguém pode falar sobre isso. Mas outras pessoas fazem esse papel,
inclusive outra mulher ou outro homem, mesmo que não seja o pai. Tanto é que quando se os
filhos adotivos que não sabem que o pai não é o pai biológico, têm o mesmo processo, ele passa
pela mesma coisa. Então acho que não tem essa interferência não. Apesar de eu ser leiga no
assunto, deixar isso pros psicólogos responderem.

Se eu gostaria de ter filhos? Eu gostaria de ter filhos. Não sei se eu vou ter porque, isso é
independente de eu ser hétero ou homossexual, porque eu tenho planos de vida que eu acho que
de repente podem se chocar com a idéia de ser mãe ou com a idéia de ter, super racionalmente
falando, com a idéia de ter que sustentar ou criar mais um ser humano nesse mundo. Eu fico
pensando "nossa, imagina quanto de lixo que essa pessoa que eu vou ter vai gerar a vida inteira,
quantos milhões meus ela vai gastar e quantos milhões eu vou deixar de torrar por causa dessa
pessoa, quantos lugares eu vou ter que deixar de conhecer, de viajar porque tem outra pessoa
dependendo de mim pra um monte de coisa. Então pra mim não é a hora, mas pode ser que daqui
há alguns anos eu coloque isso na balança e vou ver que compensa, sim, a alegria de ter um filho,
de ser mãe, de ter uma carinha feliz, de bater palma na formatura e chorar na homenagem aos
pais eu vou ter, eu vou bancar. A forma que eu faria, que é uma coisa que eu converso com a
minha parceira, que já li a respeito, já li bastante, é a inseminação artificial com a troca de óvulos.
Já li isso sobre isso. Faz uma inseminação artificial, pega um óvulo e insemina com um doador.
Aí que eu acho que é um problema grande. Você vai ter que ver se é uma pessoa conhecida ou
um desconhecido, que eu acho que é o conflito maior da história toda. E aí coloca, implanta no
útero da outra. Então é uma maneira do filho ser das duas. Eu acho que é a maneira mais real dele
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ser. E isso é muito fácil, é super acessível. A preços super tranqüilos você consegue fazer isso.

A história feminina e história das lésbicas... Nossa, eu não conheço muito não, só de Lesbos,
aquelas histórias que a gente ouve contar. Não sou militante, não tenho muito conhecimento.
Nunca procurei, pesquisei a fundo sobre isso, sobre a história, sobre questões políticas. Eu me
interesso sim, muito, por notícias sobre direitos e avanços em vários países e aqui no Brasil
também, mas é uma coisa atual. Não conheço nada além do que é falado, do que é divulgado
bastante, ou de outras pessoas na história serem gays, serem lésbicas, de Lesbos, os poemas, nada
além disso. Só isso mesmo que eu conheço.

Como a história representou as mulheres... Todos os conflitos que teve, essas questões sexistas
assim, eu sei muito pouco também. Eu sei de alguns fatos que foram importantes, sufrágio, voto
feminino, aquele manifesto feminista ou relato histórico que eu não lembro, que eu já li há muito
tempo atrás. Estas questões feministas eu não lembro de algumas passagens, da Revolução
Industrial, quando as mulheres começaram a ter voz e tal. E mesmo da importâcia de Maria
Madalena na história, que eles apagaram, abafaram, que sei lá se é verdade, ninguém nunca vai
saber. Mas pode ser que seja sim, que ela tenha. Quando, no século XXI, o pessoal resolveu olhar
pras mulheres... Eu falo século XXI mesmo, eu acho que nem no século XX eles chegaram a isso.
Quando eles olharam para as mulheres, aí eles começaram “É, mulher”, vão olhar pra trás. Aí
falaram “Ah, tinha Maria Madalena”, nossa, agora “Maria Madalena tinha, devia ter, uma super
importância, que agora a mulher é importante”, aí eles voltam dois mil anos e pra dar importância
a uma mulher que eles deixaram de dar importância, e que agora talvez seja tarde demais resgatar
a importância dela.

A mídia mostra os homossexuais de uma maneira totalmente deturpada, quer dizer, a mídia
nacional. Eu só vejo hoje estereótipos, que noventa e nove por cento das vezes que aparecem, em
programas humorísticos, como motivo de piada. E quando tem uma novela e viram um papel
secundário, uma coisa secundária ali, totalmente sem explorar os conflitos. Sempre a família
perfeita que aceita seu filho, ou então a outra família não aparece. Vira aquele casal ali só pra
falar que é bonito ou que está pensando em todo mundo. Mas ninguém explora, ninguém sabe. É
o casal que não separa, é o casal que não tem nenhum conflito, que é totalmente "fake", que é
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totalmente fora da realidade. Não é assim. Se todos os personagens na trama sofrem alguma
coisa, têm algum problema, é explorada a relação, é explorado o ciúme, é explorada a
maternidade, paternidade de sei lá quem, e o casal gay é sempre intacto, sempre perfeito. Quando
arrumam um conflito é mínimo. É assim, um ou outro vai viajar e o outro vai ficar. Não tem uma
exploração real do que é a homossexualidade e os conflitos que ela traz pra pessoa e nem
preconceito. Isso quando não é também a parte cômica da novela. Acho que é só pra no final
preencher páginas de revista falando se vai ter beijo gay ou se não vai. Não explorou o negócio
hora nenhuma na trama, aí no final vai ter beijo gay. “Pô” ninguém nem deu confiança pra eles,
pra quê que vai ter beijo gay? Agora também não precisa, beijo gay é o mínimo. E ainda só pra
falar não vai chocar a população do Brasil, “não vamos fazer”. Então eu acho que é totalmente
hipocrisia. É uma coisa que eu acho que com certeza que é melhor falar do que não falar. Tem
muito que avançar pra falar corretamente, pra falar mais seriamente sobre o problema do
preconceito e da falta de aceitação e do respeito também, e a palavra certa pra isso tudo é
homofobia.

As lésbicas aparecem muito pouco ainda, inclusive em programas humorísticos. Já teve três
novelas que foram "Vale Tudo", "Torre de Babel" e "Mulheres Apaixonadas", que mostraram três
casais de lésbicas. E uma que foi na década de 80 foi "Vale Tudo". Foi super tranqüilo, também
não foi um tema muito explorado, mas não teve problemas. Quando foi na década de 90 eles
tiveram de novo com a Christiane Torloni e a Sílvia Pfeifer em "Torre de Babel". Explodiram
literalmente as duas da novela. E aí você viu o conflito adolescente que foi a Clara e Rafaela de
"Mulheres Apaixonadas", em 2003, se eu não me engano a novela. E aí sim teve uma coisa maior
que as duas eram adolescentes, uma teve problema sim com a mãe que eu acho que foi o caso
mais explorado até hoje em novela de homossexualidade feminina. Masculina também eu acho
que o único caso que foi o maior foi o do Sandrinho e do Jeff em "A Próxima Vítima". O André
Marques, que fazia o Sandrinho, foi espancado dez vezes na rua por só por fazer o personagem
homossexual. Isso já foi também na década de 90, ou seja, nem foi tanto tempo assim.

Eu não me reconheço nos produtos veiculados pela mídia. Tem duas propagandas super legais.
Uma da tim que mostrava um beijo gay, mas mesmo assim sem propósito, uma coisa totalmente
sexual pra homem ver, que eu achei legal mas veiculou na globo, então foi uma coisa assim mais
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tranquila. E a Fiat. A da Fiat é muito legal porque o mote da campanha era "está na hora de você
rever seus conceitos", aí aparecia uma sala de aula e a professora falava "Ah, fulano de tal é um
aluno muito bom" aí chegava no fulano, "ah, fulano é uma gracinha, quem são os pais de
fulano?" e levantavam duas mulheres. Essa foi muito bacana, muito explícita e foi, de comercial,
o mais enfático assim na questão. Nossa, nem lembro de outro. Acho que são muito poucos que
tem, quase nenhum.

Se eu conheço alguma série lésbica? Conheço algumas. Conheço "The L Word", "South of
Nowhere", "Sugar Rush" e "Chica Busca Chica".

Eu conheço a série "The L Word" desde que ela foi lançada nos EUA, desde que falaram que ela
ia ser lançada nos EUA, porque começou a circular na internet um monte de coisa e aí foi um
boca-a-boca, “vai estrear uma série”, “vai estrear uma série”. O primeiro episódio, no dia
seguinte, já tava todo mundo fazendo donwload. O pessoal dos Estados Unidos já tinha subido o
arquivo pra internet juntaram os primeiros aqui no maior esforço, super bacana, fizeram as
legendas. E até hoje, na 5ª temporada, tem várias turminhas aí fazendo legenda, disponibilizando
na internet e o pessoal de fora também. Acaba o episódio lá já sobem o arquivo. Então
pouquíssimos minutos depois que o episódio terminou já tem na internet pra gente ver.

A idealização das lésbicas feita no seriado eu acho super legal. Acho que tem de tudo um pouco.
Às vezes é uma coisa meio fora da nossa realidade, aqui no Brasil é um pouco diferente. Mas eu
acho que se propondo o que ela é que é um núcleo rico, são mulheres ricas e bem-sucedidas e,
enfim, então é super legal. Acho que cada temporada eles colocam elementos novos como o Max
que é transgênero; a Kit, que eu acho que às vezes tem uns conflitos que eu acho que ela quer ser
gay mas não consegue, que ela gosta mesmo é de homem; a Shane, que é totalmente
masculinizada, que é o estereótipo da mulher lésbica mesmo, o estereótipo masculino né,
masculinizado. O casal meio intocável, que é Bette e Tina, que acaba não sendo tão intocável
porque a trama tem que andar, mas é o casal perfeito pra se constituir a família. A Dana, que era a
esportista e ainda abordou outro problema também do câncer. A Alice, que é o lado cômico, que
precisa ter, do seriado mas é uma pessoa também que vive, consegue viver os conflitos de ciúme,
e que no começo eles exploraram muito que era a bissexual, depois eu acho que eles desistiram
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dessa idéia e nem se fala mais nisso. E pessoas que têm conflito, como a Tasha, de se assumir,
porque ela precisa de ir pro exército e não aceitam a homossexualidade então ela fica nesse
conflito. Enfim, eu acho que está super bem representado. Eu acho que cada temporada eles
conseguem mais colocar um elemento ou vários elementos numa personagem só. É claro que pra
dar uma visibilidade, pra ser dramático, pra ser a história, pra dar audiência, eles precisam de
caricaturizar algumas coisas. Mas isso é normal, acho que dá pra entender o recado.

Se eu acho que a série traz uma abordagem mais próxima da realidade lésbica do que outros
produtos audiovisuais? Depende. Tem filmes, alguns curtas, que são muito reais. Tem alguns
longas também que são muito reais, mas acho que sempre pecam pela idéia que filme gay precisa
de ser totalmente chocante, totalmente dramático, uma pessoa tem que morrer no final, tem que
cortar os pulsos e sei lá mais o que, tem que tomar um tiro na cara, enfim, tem sempre esse lado
que as pessoas não conseguiram entender. Até umas comediazinhas românticas, mas aí no final a
mocinha fica com um homem. Então eu acho que a série, sem dúvida nenhuma, é a maior e
melhor representação feita de todos os tempos, de tudo o que eu já vi. Não é muita coisa, mas, de
tudo o que eu já vi, que eu já ouvi falar também, é a mais próxima da realidade. É mais bem
produzida também do que as outras séries que eu conheço.

Em que e com quem eu me identifico na série? Ah, eu não tenho uma pessoa. Todo mundo fala
que eu não tenho uma pessoa, que eu acho que eu me identifico. Eu tenho alguns elementos de
algumas, de várias pessoas. Tenho o elemento da Dana, acho que eu tenho muito da Dana. Acho
que se fosse a pessoa que eu mais me identificaria seria a Dana pelos conflitos dela, não o de
auto-aceitação, de se assumir, igual ela teve na primeira temporada, mas depois os conflitos que
ela viveu e tal. Eu me identificaria mais com ela.

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