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GEOGRAFIAS DO CONSUMO ROTAS EXPLORADAS E NOVAS LINHAS DE RUMO Herculano Cachinho* Elaborar uma breve narrativa da geografia do consumo nao é facil e dois motivos principais contribuem, de forma decisiva, para que isso acontega. Em primeiro lugar, as investigagdes que inscrevem 0 seu objecto de estudo nesta tematica, nao sé contemplam perspectivas e metodologias muito diver- sas, Como percorrem um conjunto de tépicos estonteante, susceptivel de des- concertar 0 mais atento investigador. Sobre este ponto bastaria lembrar que existem pelo menos quatro grandes dominios de investigagao: o das activida- des comerciais, onde se incluem os indmeros estudos sobre 0 comércio reta- Ihista; 0 dos consumidores, orientado para as questées da percepgiio das for- mas comerciais, dos campos de informagio espacial dos consumidores e das decisGes em matéria de escolha espacial; o do urbanismo e da arquitectura de consumo, relacionado com a anilise dos tecidos comerciais, o seu significado e planeamento; e o do consumo em si mesmo, no qual se integram as milti- plas abordagens sobre a sociedade e a cultura de consumo, sobre as praticas de compra e de abastecimento das familias e ainda sobre os padrées de con- sumo. Em segundo lugar, sendo os tempos modernos marcados pela cres- cente dilui¢ao das fronteiras entre as ciéncias sociais, a transdiciplinaridade e a multi-referencialidade, e o consumo uma tematica transversal a varias 4reas do saber, muito dificilmente se poderd atribuir as mais distintas abordagens um cardcter disciplinar e, por conseguinte, identificar no conjunto das nar- rativas as que realmente poderio ser consideradas verdadeiramente geografi- cas. Naturalmente, excepgGes existem, mas estas pouco significado tém no conjunto das abordagens. A este respeito nao deixa de ser significativo que as principais publicagdes sobre a temdtica do consumo, sob a forma de readings, reinam quase sempre especialistas de diferentes Areas do conheci- mento, com especial destaque para a Geografia, a Antropologia, a Sociologia € os Estudos Culturais. Percorrer os territérios conturbados do consumo, num contexto de auséncia de paradigmas fortes, de grande diversidade de abordagens e de * Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigador do Centro de Estudos Geograficos, da mesma universidade. Inforgeo, 14, Lisboa, Edigdes Colibri, 1999, pp. 157-178 158 Inforgeo, 14 — Espagos Urbanos transfiguragao da identidade disciplinar, de modo algum significa que pos- samos navegar ao sabor dos ventos. Mais do que em qualquer outra situagao, para saber se os ventos so favorveis, torna-se essencial que no momento da largada saibamos para onde queremos ir. Na pratica, isto significa que, inde- pendentemente dos objectivos que norteiem a viagem, se tracem com preci- sdo as grandes linhas de rumo, se defina criteriosamente o percurso, se esco- Iham os portos de abrigo e se seleccionem as ferramentas julgadas mais adequadas, sempre em perfeita consciéncia que muitas outras opgdes pode- riam ter sido tomadas, quig4 mesmo até mais eficientes face aos objectivos que se pretendem alcangar. 1. A problemitica Nao pretendendo ser este estudo mais do que uma breve reflexdo sobre a evolugdo das perspectivas sobre 0 consumo, entre muitas outras possiveis, perante a grande diversidade de temas e as miltiplas abordagens a que os mesmos estiveram sujeitos nos meios académicos, duas opgdes foram toma- das & partida. A primeira, consistiu em restringir 0 itinerério apenas As 4reas de investigagao mais directamente ligada a discussio do papel econémico e cultural do consumo. Isto é, com as perspectivas preocupadas com a forma como os produtos, os servigos e os lugares comerciais, uma vez criados, se transformam em mercadorias e através do valor de uso e do valor simbdlico se tornam objectos de consumo. Assim, foram deixadas de fora as andlises directamente relacionadas com as actividades comerciais, 0 urbanismo e as estruturas da distribuigdo. Estas teméticas, pelo interesse que manifestam na geografia e pela riqueza da sua diversidade, s6 por si justificam um trata- mento especial. A segunda opgao foi a de nao elaborar uma crénica dos estu- dos do consumo, revendo para 0 efeito a literatura representativa de cada um dos paradigmas, tarefa dificil sendo mesmo impossivel e necessariamente parcial. Em alternativa, para prosseguir a viagem, seleccionaram-se alguns conceitos-chave que pudessem servir de ancora a reflexdo e a partir da and- lise do seu significado dar entao conta da forma como 0 tema tem sido pen- sado e reconstrufdo na geografia ao longo dos tiltimos cinquenta anos?. Partindo da ideia que o consumo pode ser visto como um sistema dina- mico permanentemente moldado por um conjunto de agentes (os consumido- Tes, OS comerciantes, os produtores...), objectos (mercadorias, estabeleci- mentos), lugares e relagdes, a primeira questo com que nos deparémos foi a 1 A evolugio dos estudos neste campo, genericamente conhecido por geografia do comércio, mereceu j, de resto, a ateng’o de numerosos investigadores. A titulo ilustrativo, refiram-se, por exemplo, os trabalhos de Thorpe (1978), Mérenne-Schoumaker (1987), Carreras (1989), Brown (1992), Fernandes (1997), Barata Salgueiro (1996a), Teixeira (1996), Wrigley e Lowe (1996), Cachinho (1999), Corréa (2000). Pela fraca importancia que 0 consumo teve na reflexao geografica antes dos anos cinquenta, nao nos pareceu ser ttil ir mais longe no tempo. Na realidade, até aquela data apenas 0 ‘comércio associado & cidade tinha despertado alguma atencao dos gedgrafos. Geografias do Consumo 159 de saber em que conceitos-chave deveremos ancorar 0 estudo, Neste con- texto, tendo em conta a natureza do sistema em causa e as tepresentagdes que dele fomos construindo, nomeadamente acerca do seu funcionamento e mudanga, trés elementos parecem assumir um papel fundamental na sua interpretagao: o imagindrio social (moderno e pés-moderno), os individuos- -consumidores e 0 espago. Na geografia, o significado atribuido a estas trés categorias conceptuais tem sofrido profundas mudangas ao longo dos tem- pos. Analisar a forma como as diferentes perspectivas geograficas se tém apropriado destes conceitos, vestindo-os de uma nova roupagem, ao ponto de lhes alterar radicalmente o seu significado, constitui, segundo o nosso ponto de vista, um bom caminho para poderemos navegar com rumo pelas diversas narrativas do consumo que ao longo dos tempos foram sendo construfdas pelas ciéncias sociais e, em particular, pela geografia. Dos caminhos percorridos.. Na geografia, o entendimento do papel que o imaginério social?, os individuos-consumidores e 0 espaco desempenham no consumo tem variado substancialmente ao longo dos tempos, reflectindo, em cada momento, os paradigmas e os modelos de ciéncia dominantes da época. Na figura 1 apre- sentam-se, de forma esquemiatica, as cambiantes que mais se afirmaram nas teorias geograficas e esbogam-se as linhas gerais de uma outra perspectiva que, de alguns anos a esta parte, vem ganhando contornos na interpretagao da realidade. De modo bastante simples pode resumir-se a evolugio da explicagio geografica do consumo a um sistema de eixos cartesianos que cruza e opoe, por um lado, a énfase concedida ao individuo e As estruturas sociais (colecti- vidades) e, por outro lado, a objectividade 4 subjectividade. A este sistema de eixos podem ainda sobrepor-se outros que na mesma légica combinam as dicotomias particular/geral e local/global. Em cada um dos quadrantes defi- nidos inscreve-se uma perspectiva geogrifica com uma forma de olhar para os individuos-consumidores, 0 espago e 0 consumo substancialmente dife- rente, em grande medida condicionadoras do entendimento do papel que desempenham na sociedade e da explicagiio das mudangas que tém experi- mentado ao longo dos tempos. No quadrante superior esquerdo, que combina a procura da objectivi- dade com o enfoque no individuo, posiciona-se a abordagem do consumo tipica da corrente de pensamento que, genericamente, ficou conhecida pela expressao de Nova Geografia. Empenhada na procura de regularidades e na 3 Entende-se por imagindrio social o sistema de simbolos necessétios & vida em sociedade. através destes e mais concretamente da representag’io dos seus significados, que os seres humanos se ligam ao mundo em que vivem ¢ Ihe conferem um sentido. A mudanga de signi- ficado do conjunto de simbolos que formam o nticleo duro do sistema produz consequéncias profundas no quotidiano das pessoas. Isto parece ser 0 que esta a ocorrer com a passagem progressiva da modernidade para a pés-modernidade. 160 Inforgeo, 14 - Espagos Urbanos Fig. | — Perspectivas geogrificas sobre o consumo, 0s consumidores e 0 espago NOVA GEOGRAFA GEOGRAFIA HUMANISTA, ‘Homo ceconomicus Homo sensibite Consumo = processo ‘Consume = proceso psico-social Mundo vivido (valores, Espa atsraco aitudes, represontagées) sgeomético Classes Sociais ‘Comunidades, “ribos" Consumo = proceso sicio ‘Consumo = processo s6c0 ‘economico ‘cultural Espago produto social Torrtécio GEOGRAFIA MARXISTA construgdo de modelos normativos capazes de funcionarem como verdadei- ras sinteses da realidade, os individuos, sejam eles produtores ou consumido- res, assumem aqui a figura de verdadeiros autématos que, dotados de um per- feito conhecimento do mercado, regem a sua conduta por mecanismos puramente econémicos. Geografias do Consumo 161 Um processo econémico é também a forma como pode ser classificado 0 entendimento que esta corrente de pensamento faz do consumo. Embora se abordem questdes muito distintas, a discussiio da maximizagio da utilidade e da optimizagao da procura sao de longe aquelas que adquirem maior centra- lidade nos estudos realizados. Na base destes principios, os gedgrafos mais do que dissertarem sobre 0 consumo, construfram uma verdadeira geografia da oferta ¢ da procura. Por um lado, analisam-se 0s comportamentos espa- ciais dos consumidores e, por outro lado, interpretam-se os padrées e as regularidades espaciais nas 4reas urbanas dos centros de comércio e servigos ¢ das diferentes formas de distribuigdo. O espago destes modelos, deduzido a partir de um conjunto de princi- pios e axiomas, incorporando como atributos quase sempre apenas as distan- cias (absolutas ou relativas), mesmo na sua acepgdo mais relativa, transfor- ma-se numa pura abstracgdo geometrizante muito distante da realidade, e por isso ndo possui outro significado que o de servir de suporte indiferenciado as praticas do investimento dos retalhistas e de abastecimento dos consumido- tes. Os principios em que se alicergam, por exemplo, as teorias dos Lugares centrais de Christaller (1933) e Losch (1940), da Interaccfio espacial de Reilly (1931), da Bid Rent de Haig (1927) e da Diferenciag&io Mfnima de Hotteling (1929), sio redescobertos pela geografia, submetidos a numerosos testes no sentido de avaliar a sua real aplicabilidade e utilizados vezes sem conta no planeamento. No entanto, apesar dos resultados alcangados terem constitufdo muitas vezes uma decepgio, o interesse pelas figuras do homo @conomicus e do homo medium inerente a tais teorias e modelos iré manter- -se inabalavel durante alguns anos. Perante as suas limitagdes, a reacgo mais comum consistiu em procurar ultrapassar o seu reducionismo introduzindo um maior nimero de atributos na sua formulacio. O vasto conjunto de investigagdes desenvolvidas no Ambito desta pers- pectiva podem ser agrupadas em dois grandes dominios que alcangaram expressdes bem diferentes nos dois lados do Atlantico. No primeiro, posicio- nam-se as abordagens estruturalistas que colocam a ténica nas caracteristicas da oferta e se preocupam sobretudo com a classificago dos centros de comércio e servigos, a hierarquia funcional das cidades ou a emergéncia e difusio das novas formas de distribuigiio. Esta trajectéria de investigagdo conheceu maior desenvolvimento no mundo franc6fono, alimentando directamente a 4rea de conhecimento que designdmos anteriormente por geografia do comércio. No segundo, integram-se as investigagdes preocupa- das com as regras e os processos de deciséo dos comerciantes e dos consu- midores no espago. Que imagens possufmos dos centros comerciais? Quais sao as caracteristicas e os determinantes do campo espacial de informagio dos consumidores? De que regras se serve 0 consumidor para optar por um lugar de compras entre muitos outros? Ser4 possivel conceber um modelo de comportamento espacial do consumidor relativamente 4s compras? Estas sio apenas algumas questées as quais a problematica da deciséo em matéria de 162 Inforgeo, 14 — Espagos Urbanos escolha dos lugares de abastecimento procura responder. Influenciados pela démarche comportamental, este eixo de pesquisa € privilegiado sobretudo pelos geégrafos anglo-saxénicos. Para uma andlise das pesquisas realizadas neste domjnio, o trabalho de Thill e Timmermans (1992) constitui uma refe- réncia fundamental. Nele se discutem os conceitos, os métodos ¢ os resulta- dos dos estudos que tinham por objectivo a modelizagao do comportamento espacial dos consumidores, desde a Teoria dos Lugares Centrais aos modelos multicritérios, desenvolvidos mais recentemente. No mundo francéfono, os trabalhos de Vanderschraege (1980) e Mérenne-Schoumaker (1985), que comungam deste tipo de preocupagées, constituem verdadeiramente uma excepcao. No quadrante inferior esquerdo, o interesse pela objectividade mantém-se, mas 0 enfoque das andlises move-se agora do individuo para as colectivi- dades humanas e as forgas que permitem explicar as praticas sociais. A cor- rente de pensamento que melhor retrata este tipo de abordagem é, sem diivi- da, a Geografia Radical de influéncia marxista. Tendo por suporte a problematica do materialismo histérico, o objectivo destas abordagens con- siste em identificar as estruturas, as ideologias e a natureza dialéctica dos fenémenos sociais subjacentes as praticas espaciais e, por essa via, realgar a forma como as contradiges na estrutura da sociedade se encontram no cen- tro da criagio e da reprodugao social. Nesta perspectiva, 0 consumo, tal como a producio, obedece a uma légica material e transforma-se num objecto ideolégico. Passa a ser considerado como um processo social de apropriag&o dos produtos, regulado pelos modos de produgdo e a matriz social na qual se realiza. Por outras palavras, constitui, simultaneamente, a expresso € o meio para concretizar a produgio, a distribuigdo e a troca ou, parafraseando Bailly e Béguin (1982: 26), «a realizacao espacial das transfe- rénci Nesta corrente de pensamento, o individuo e por ineréncia 0 consumi- dor, visto isoladamente deixa de ter qualquer significado. Sendo a matriz social a estrutura que possibilita a assimilagao das contradigdes vividas pelos grupos nos processos de reprodugao da sociedade, 0 comportamento dos individuos é preterido ao das classes sociais de pertenga; isto é, 4 média do grupo de individuos que se distinguem pelo lugar que ocupam na sociedade. As classes sociais, classificadas em fung&o da posig&o que ocupam na organizagio social e na capacidade de agambarcar uma parte da riqueza ptiblica de dominantes e dominadas, encetam entre si um processo de luta para defenderem os seus interesses. No entanto, neste sistema, apenas as classes dominantes, pela posig&o hegeménica que detém no sistema social, possuem poder suficiente para organizar a sociedade e ditar as ideologias do consumo. As classes dominadas, pelo contrario, desempenham sempre um papel subalterno. Como nio controlam os meios de produgdo, limitam-se a oferecer a sua forga de trabalho em troca de um saldrio que apenas representa uma parte do valor criado. O restante valor é apropriado pelo capital, sob a Geografias do Consumo 163 forma de mais-valias, alimentando por essa via a reproduciio do sistema e 0 poder das classes dominantes. Preocupados com a produgiio das mercadorias ¢ as relagGes sociais que Ihe est&o inerentes, os investigadores radicais de influéncia marxista nunca concederam um papel de relevo ao consumo e os gedgrafos nao constituem excepgao. A sua abordagem da-se sempre indirectamente pela via da produ- ¢40, porque segundo esta perspectiva é através da produgao e da circulagio que as mercadorias adquirem valor: simultaneamente, um valor de uso e um. valor de troca. Porém, embora Marx nunca tenha prestado grande atengio as questdes referentes ao simbolismo do consumo, paradoxalmente, é a ele que se deve a heranga do «feiticismo das mercadorias»*, que se refere precisa- mente a ligagdo que as pessoas estabelecem com os produtos e A relagiio entre valor de uso e valor de troca. Infelizmente quando aplicado ao con- sumo, este conceito foi sempre usado de forma demasiado genérica e pouco Tigorosa para que pudesse ter utilidade analftica. O estudo de Jhally (1987), Os Cédigos da Publicidade: o Feiticismo e a Economia Politica do Signifi- cado na Sociedade de Consumo, constitui uma verdadeira excepgdo. Embora nao sendo um trabalho geografico, pois nele a dimensdo espacial do consumo € simplesmente ignorada, nao poderfamos deixar de lhe fazer aqui uma breve referéncia. Recusando-se a aceitar as teses de Sahlins (1976) e Baudrillard (1972) acerca da interpretacao feita por Marx sobre a relaciio entre valor de uso € valor de troca, que retiram a qualquer abordagem a possibilidade de compreender perfeitamente o elemento simbdlico presente na utilidade e, consequentemente, no consumo, este autor demonstra através da andlise da publicidade que a simbolizag&o das mercadorias nao se reporta unicamente ao modo como os bens so consumidos, mas também 8 forma como sio produzidos. Por essa via defende que o «feiticismo das mercadorias» oferece um amplo enquadramento para a compreensio das relagdes entre as pessoas € os objectos na sociedade moderna. Esta concepg¢ao estruturalista da organizago social em torno das classes sociais reflecte-se directamente na concep¢iio de espago. O espaco e a espa- cialidade das relagdes sociais s4o aqui entendidas como um produto social das praticas de classe. Em cada momento, este nao € mais do que um reflexo dos interesses das classes em presenga, ou um-produto do jogo de forcas intervenientes na luta entre classes. Preocupados em verificar 0 papel motor das estruturas sociais, os geégrafos desta corrente de pensamento, na reali- dade, acabam por transformar o espago mais num suporte onde se projecta a sociedade do que num elemento dotado das suas prdprias dinamicas. 4 Teoria que consiste em naturalizar propriedades das mercadorias que, na realidade, sio sociais. Trata-se no fundo de ver como eternas e naturais relag6es sociais que so historica- mente especificas. Parafraseando Jhally (1987: 74-75), consiste, antes de mais, «em esvaziar as mercadorias de significado, em esconder as verdadeiras relacGes sociais que nelas se encontram objectificadas através do trabalho humano, de mancira a tornar possivel que, num segundo nivel, se injectem na construcao do significado as relagdes sociais simbélico-imagi- nérias. A produgo esvazia. A publicidade preenche. O real € ocultado pelo imaginario.» 164 Inforgeo, 14 - Espagos Urbanos Nas abordagens do espaco pela via das praticas e dos processos sociais, assumem particular relevo as ideias de Lefebvre (1981). Para este autor, 0 espaco (social) é um produto (social). Todas as sociedades e modos de pro- dugdo, produzem o seu préprio espago. Mas a produgio do espago social nada tem de semelhante com a produciio de mercadorias porque esta inclui coisas muito diferentes. E, simultaneamente, consequéncia e processo, pro- duto € acco, consiste nos objectos e nas suas relagdes, contém as coisas ainda que nao seja um objecto material; é um conjunto de relagées entre as coisas (Peet, 1998). No campo social, se algo permite a sua definigao, isso sera certamente a figura da «hiper-complexidade» de espagos, em que cada fragmento esconde nao uma mas miiltiplas relagdes sociais. Para dar conta do processo generativo do espaco, Lefebvre serve-se de uma triade de conceitos espaciais reveladora das relages sociais envolvidas na sua produgio: a pratica espacial (associada ao espago percebido), as repre- sentagdes do espaco (ligadas ao espago concebido) e os espagos da repre- sentagao (relacionados com o simbolismo complexo inerente a espacialidade social e, por conseguinte, ao espago vivido). Embora passiveis de separacao, estes trés tipos de espaco considerados (0 percebido, 0 concebido e 0 vivido) mantém-se unidos através de complexas relages dialécticas, téo distintas quantos os modos de produgio e os periodos histéricos. Na realidade, é pre- cisamente quando colocados em relagio que a produg&o do espago enquanto pratica espacial acontece. Detivemo-nos por algum tempo na anélise do trabalho de Lefebvre por- que talvez nenhum outro autor tenha influenciado até ao momento de forma tio profunda o debate sobre a produgao do espago na teoria social (pés- -)moderna. Apenas a titulo de ilustragao, Harvey (1989) utiliza-o para desen- volver os conceitos de materialismo histérico-geogrifico e de compressio espacio-temporal; Soja (1989; 1996) encontra nele um poderoso argumento para defender a centralidade do espago na teoria social e na pratica politica; Shields (1991) valoriza a concepg&o de espaco vivido com os seus valores simbélicos e confianga na vida quotidiana e, por ultimo, Gregory (1994) realga a centralidade concedida ao corpo no espago. Na geografia do consumo, a influéncia do paradigma marxista faz-se sentir sobretudo nos estudos do comércio. Neste campo, os seus partidarios argumentam que os padrées da actividade comercial nao podem compreen- der-se pela andlise dos padrdes em si mesmos mas apenas através do estudo dos processos sécio-econémicos que esto na sua origem. Para muitos auto- res, estas forgas emanam do modo de produgao dominante, da forma pela qual as mais-valias do capital circulam, se concentram e so utilizadas no espago, e pelas contradigdes do capitalismo que necessitam da continua reestruturagao do processo de acumulagao (Harvey, 1985). O trabalho de Ducatel e Blomley (1990), que procura explicar, em termos marxistas, 0 crescimento da concentragio da venda a retalho no Reino Unido e a sua mudanga de poder, e de Phillips (1992), que aplica uma metodologia seme- Geografias do Consumo 165 lhante ao comércio britinico no século XIX, constituem seguramente os melhores exemplos deste tipo de abordagem. No quadrante superior direito, a tonica das abordagens é colocada de novo no individuo, mas ao contrario do que acontece com a geografia neopo- sitivista, a subjectividade deixa de ser rejeitada para adquirir uma posigao central na compreensao dos fendmenos humanos. A corrente de pensamento que melhor traduz esta visio da realidade é a Geografia Humanista na versio existencialista fenomenoldgica. Insurgindo-se contra o reducionismo e a abstracgo do positivismo légico, esta perspectiva propde-se estudar o verda- deiro mundo em que os homens vivem e actuam, em vez de considerar mun- dos hipotéticos habitados por seres omniscientes (Estébanez, 1982: 122). A preocupagdo com a procura das explicagées causais e a predigiio cede assim lugar 4 compreensdo empatica dos distintos aspectos dos seres humanos (significados, valores, objectivos e propésitos) e ao lugar que estes ocupam no mundo (Entrikin, 1976; 1985). Ao apelar para uma visio integral do ser humano, ou na terminologia de Tuan (1976), para uma compreensio do sujeito, simultaneamente, enquanto organismo bioldgico, ser social e individuo, a figura do consumidor, como qualquer outra categorizago que implique segmentagao, deixa de fazer sen- tido. O comportamento do individuo relativo ao consumo deve ser entendido como um processo global intersubjectivo; isto é, em que na sua configuragio a racionalidade se conjuga com a emotividade, os sentimentos, a afectivi- dade, os valores e muitas outras manifestagdes intrinsecas a existéncia humana, mediante as quais as pessoas se envolvem com o mundo. Neste sentido, enquanto categoria conceptual, o consumo é fundamentalmente um processo psico-social e simbélico. A sua explicagao parte sempre do sujeito (consumidor), das representacGes e das relagdes afectivas que estabelece com os objectos e os lugares de consumo, e nenhuma ou pouco importancia € concedida 4 6ptica dos produtores ou dos comerciantes responsiveis pelo fabrico e a distribuig&o dos bens e servigos que sao objecto de consumo. Na acepcao existencialista o espago ganha também, necessariamente, uma nova dimensio. A ideia abstracta de espacialidade adquire dimensdes significativas e a distancia define relagdes de proximidade ou de desumani- zagao. Para os defensores desta perspectiva nao hé um «mundo» & parte dos seres humanos, tal como também estes nfo existem fora do mundo em que vivem; «existir é estar no mundo» (Peet, 1998: 36). Visto em estreita relagdo com as experiéncias do quotidiano, 0 espago converte-se num «mundo vivi- do», num sistema de lugares com contetido. O grau de significincia é tanto maior quanto mais intensos forem os lagos que unem o ser humano aos luga- res. Quando perdem a solidez e a afectividade estes deixam de gerar no indi- viduo o sentimento de identidade e pertenca, convertendo-se entéo em «nao lugares», no mundo do outro, nas terras de ninguém. Para Sanguin (1981), na sociedade moderna (pés-moderna) um bom exemplo de «nao lugares» da pelo nome de fenémeno kitsch, no qual a produgio de objectos falsos cria 166 Inforgeo, 14 - Espacos Urbanos uma relagao artificial entre os seres humanos e os objectos produzidos para 0 consumo de massas e, neste processo de inautenticidade, os lugares e as pai- Sagens sao tratados como objectos de consumo. Alienados, os individuos sao levados a considerar e a consumir 0 trivial como se de uma necessidade vital Se tratasse, e a ver o fantastico e a simulagao como reais e auténticos. Os estudos do consumo, marcados por esta corrente, conhecem especial desenvolvimento no mundo francéfono. Influenciados pelo conceito de «espago vivido» desenvolvido por Fremont (1974; 1976), autores como Metton (1978), Bertrand (1978), Mérenne-Schoumaker (1979), C.E.R.A. (1979), Bertrand e Metton (1976; 1982), relacionam a percepgao e as vivén- cias da cidade com as praticas comerciais, procurando demonstrar que o equipamento comercial constitui 0 elemento da paisagem urbana que melhor traduz as atitudes, as frequéncias, as escolhas das pessoas, independente- mente se 0 critério de referéncia é econdmico ou social. E neste contexto, que Metton procura interpretar na aglomeragio parisiense o papel desempe- nhado pelo aparelho comercial nas praticas urbanas e as transformagées dos espacos vividos, bem como as modificagdes nos comportamentos das com- pras provenientes da «revolugaio comercial», tais como a anomalia do abaste- cimento quotidiano e¢ a difusdo das deslocagdes motorizadas; que em Caen, os investigadores do C.E.R.A., através de um inquérito dirigido a adultos e criangas, descrevem as priticas comerciais nos bairros antigos e na periferia, concedendo particular importancia aos significados, aos sentimentos e as emog6es que as pessoas associam aos lugares de comércio; que na India, Golbéry associa 0 estudo das praticas comerciais as prdticas das migragdes € das castas; ou ainda que em Mopti (Mali), Gallais retira da sua experiéncia africana algumas relacdes pitorescas dos contrastes entre a frequéncia dos mercados tradicionais e dos supermercados implantados nas margens da cidade’. Sem divida interessante, é também o estudo desenvolvido por Jansen (1982) sobre a politica de planeamento do comércio retalhista e do compor- tamento do consumidor na area de Oospark do centro da cidade de Amster- dao. Depois de expor os seus motivos, altamente subjectivos, das compras & chegar 4 conclusio que sio influenciados por um leque de factores raramente tidos em consideragio pelos estudos “cientfficos”, esta autora volta a Ooster- park, onde foram feitas intervengées no sentido de substituir 0 mix comercial formado por pequenos retalhistas independentes por um outro composto por grandes estabelecimentos integrados num modemo complexo comercial. Longas entrevistas realizadas a vinte residentes, revelam, porém, os fortes valores emocionais e sociais que os individuos ligam as actividades comer- ciais, que suplantam em muito as vantagens dos baixos pregos oferecidos pelos supermercados. Jansen conclui que a sua abordagem fenomenoldgica 5 Comunicagdes inéditas apresentadas no coléquio do CNRS de Caen sobre Espace vécu e pratique commerciale, em 1978. Referencias extraidas de CNRS (1982). Espaces vécus et civilisations, Paris. Geografias do Consumo 167 «da vida quotidiana, tal como foi experienciada pelos individuos envolvidos no seu trabalho, tinha muito a oferecer ao estudo do comércio e a definigao de adequadas politicas de planeamento» (Brown, 1992: 152). Nestes estudos humanistas sobre 0 consumo, onde se opdem as praticas comerciais entre o centro da cidade e as novas formas de distribuigao perifé- Ticas, existem dois aspectos que tendem a assumir um destaque particular: por um lado, a énfase no tinico e a intensa relacdo que os individuos estabe- lecem com os lugares frequentados e, por outro lado, a conotacao do “sentido de lugar” com o centro da cidade ¢ 0 pequeno comércio e de “nao-lugar” com a periferia e os novos espagos comerciais. Por Ultimo, no quadrante inferior direito, integra-se um conjunto de investigagOes bastante heterogéneas que privilegiam a subjectividade e trans- ferem a atengio do individuo para as comunidades humanas e os grupos sociais. Profundamente ancorada na cultura’, nos valores sociais e nas identidades territoriais, esta corrente de pensamento designada por Claval (1992: 29) de Etnogeografia, conhece um forte desenvolvimento a partir dos anos oitenta e tem como preocupagiio fundamental fornecer «uma visio glo- bal das representagdes que as sociedades elaboram do mundo, da natureza e das caracterfsticas espaciais da vida de relagdo». No entanto, ao contrario do que ocorreu, nomeadamente, durante a vigéncia do paradigma da geografia neopositivista, 0 objectivo destas abordagens nio se centra na procura de regularidades e na obtengao de leis gerais, mas antes na compreensiio das particularidades das praticas sociais e das representagdes que tormam cada lugar diferente dos demais. Esta nova forma de perspectivar a realidade social responde de algum modo ao que constitui hoje, provavelmente, o principal paradoxo da globali- zagao. Isto €, quando mais o mundo tende em alguns aspectos da vida mate- tial para uma certa homogeneizagao, mais os povos e os grupos procuram fazer valer as suas diferengas, sublinhando aquilo que os separa dos outros e conforta as suas identidades, mesmo se na prética os seus modos de vida jé pouco ou nada tém de singular. Este duplo movimento de sentido aparente- mente inverso, adquire grande visibilidade ao nivel do consumo. A uniformi- zagao provocada pela difusdo dos produtos comercializados pelas grandes empresas de distribuicao ¢ pela informagdo divulgada pelas poderosas cadeias de televisdo, 6 contrabalangada pelo desenvolvimento de inimeros consumos culturais, estimados necessarios aos diferentes estilos de vida. Nas cidades mais cosmopolitas, que constituem os nés por exceléncia das rela- gdes mundiais, a multiculturalidade nao sé promove a existéncia de diferen- tes tipos de consumo como permite que estes coabitem 0 mesmo espacgo sem © Por cultura entende-se aqui «tudo aquilo que os homens recebem por heranga, ou que eles inventam. E, por conseguinte, formada pelo conjunto de representagdes sobre as quais ta a transmissio de uma geracio para outra ou entre parceiros da mesma idade, das sen- ilidades, das ideias e das normas. Inclui a imagem do ambiente préximo e os conheci mentos, as praticas ¢ os instrumentos que permitem dela tirar partido» (Claval, 1992: 11-12). 168 Inforgeo, 14 - Espacos Urbanos se fundirem e, por conseguinte, que os individuos, embora expostos as influéncias dos processos globais, possam preservar a sua identidade, mesmo NOs seus tragos mais primordiais. A recentragem na cultura, nas comunidades territoriais ¢ nos grupos sociais (de filiagdo afectiva ou tribal), € acompanhada por mudangas signifi- cativas na maneira de entender 0 individuo, o espago € o consumo. O desen- volvimento do individualismo e da egologia, que traduz a evolugao recente para a autonomia e a responsabilidade do individuo, nao se compadece com a concep¢do do homo hierarquicus das sociedades holistas, fechadas e rigidas. Esta cede assim lugar ao homo aequalis (Dumont, 1977), uma concep¢gaio mais humanista, que coloca o individuo em primeiro lugar e 0 torna pessoa; isto é, um ser independente, auténomo e responsdvel, que reage em confor- midade com 0 espirito da sociedade e dos grupos de pertenga. Despido de contetido cultural e, por conseguinte, sem significado para as comunidades humanas, 0 conceito de espaco é substituido pelo de territ6- rio, que em linhas muito gerais se pode definir, simultaneamente, como um espago social e um mundo vivido. O territério simboliza, por um lado, 0 «sistema de lugares tecidos pelo entrelagado das relagdes sociais e espaciais caracteristicas dos grupos humanos que os ocupam, os produzem ou sim- plesmente os cobigam [...] e, por outro lado, as relagdes existenciais, neces- sariamente subjectivas, que os individuos socializados estabelecem com os diferentes lugares do sistema» (Di Méo, 1998: 107). Para esta perspectiva, 0 consumidor torna-se um verdadeiro actor e 0 consumo uma manifestagio simbélica e comunicacional. O poder simbélico do consumo diz tanto respeito 4s mercadorias como aos lugares erigidos em seu nome (os diferentes tipos de empreendimentos comerciais), que no fundo Ihe servem de contexto e de montra. Numa sociedade em que os individuos constroem a sua identidade e se dao a conhecer aos outros através do consu- mo, a dimensio simbdlica transformou-se numa necessidade vital e incontor- navel da prépria existéncia humana. E através desta que as pessoas criam lagos com os objectos, o ambiente construfdo ganha sentido social e, na pratica, «o real se torna inteligfvel e apropridvel» (Monnet, 1998). Em nenhum outro paradigma o consumo suscitou tanto interesse nos gedgrafos ou ocupou um lugar tao privilegiado nas suas abordagens, ao ponto de chegar a ser considerado por varios analistas como a principal nar- rativa da sociedade dos finais do século XX. Os impactos da revolucio comercial, protagonizada pelas novas formas de distribuig&o e os novos for- matos de estabelecimentos, imbuidos de forte teor simbélico (centros comerciais, parques tematicos, megastores...), a ascensao ao primeiro plano da economia das grandes organizagées internacionais da venda a retalho, em detrimento da secundarizagao do poder dos produtores, a segmentagado do mercado de massas em miiltiplos nichos, possivel através do desenvolvi- mento das formas de produgao e gestio pés-fordistas e, sobretudo, a emer- géncia nfo de uma mera sociedade de consumo mas de uma verdadeira cultu- ra do consumo, muito contribuiram para que isso tivesse acontecido. Geografias do Consumo 169 Nesta forma de perspectivar 0 consumo, importa destacar trés grandes linhas de pesquis: i. em primeiro lugar, os estudos associados a andlise da forma, das fun- gdes, do significado e do simbolismo do ambiente edificado pelo comércio retalhista, com especial destaque para os centros comerciais e os parques temdticos, paradigmas dos espagos de consumo da pés-modernidade. Inse- rem-se nesta linha, por exemplo, os trabalhos sobre a espacializagio social no West Edmonton Mall, de Shields (1989); a andlise do MetroCentre enquanto forma cultural, de Chaney (1990); a leitura dos parques tematicos nos Estados Unidos, de Sorkin (1992); as teses sobre a “magia” e o signifi- cado dos centros comerciais norte-americanos, de Goss (1993; 1999); a inter- pretagaio dos centros comerciais como habitat do consumidor, de Bloch, Ridgway e Dawson (1994); o estudo do design e arquitectura figurativa pés- -moderna dos centros comerciais em Buenos Aires, de Capron (1997); a and- lise comparativa entre o Mall of America e o Colombo realizada por Balsas (1999); ou ainda a interpretagio do papel da mesma férmula comercial na simulagdo e reprodugio do espago urbano de Lisboa de Barata Salgueiro e Cachinho (2000). ii.em segundo lugar, encontram-se os estudos preocupados com a constituig&o da subjectividade, ou se quisermos, com a dialéctica através da qual os objectos e os lugares de consumo produzem os sujeitos € vice-versa. Até ao momento, McCraken (1990: xi) talvez seja o autor que melhor des- creveu 0 significado social do consumo como fenémeno cultural. Na sua perspectiva, nas sociedades ocidentais mais desenvolvidas, a cultura encon- tra-se profundamente ligada e dependente do consumo. Sem os bens de con- sumo, estas sociedades nfo sé perderiam instrumentos cruciais para a repro- ducio, representagao e manipulagdo das suas culturas, como ainda alguns actos da definig&o pessoal e colectiva nestas culturas seriam impossiveis. De facto, enquanto consumidores, além de reproduzirmos, simplesmente, a nossa existéncia fisica, também reproduzimos modos de vida significativos, culturalmente especfficos. Isto acontece porque o consumo, na realidade, actua como uma ponte entre o individuo e a sua experiéncia no espago (Miles e Paddison, 1998). No entanto, depois de McCracken, outros autores se preo- cuparam com a mesma questao, incidindo sobre aspectos mais concretos. Miller, Jackson, Thrift, Holbrook e Roelands (1998), relacionando as praticas da compra com a vida dos centros comerciais e a natureza dos compradores, constroem uma nova compreensio sobre o significado do lugar e a constru- gio da identidade; Mort (1996, 1998), através do mapeamento da interacgao do género com 0 comércio e a geografia, elabora uma narrativa consistente sobre a sociedade britanica, deixando bem explicito 0 quanto 0 espago € 0 lugar s&o elementos fundamentais da identidade de determinados grupos de consumidores, desde 0 gentlemen as figuras do yuppie e do flaneur urbano homossexual; e para nao alongar mais a lista, Blomley (1996) e Dowling 170 Inforgeo, 14 - Espagos Urbanos (1993), analisam a relagdo entre o consumo e a feminilidade, a masculini- dade e o lugar. iii. por tiltimo, a terceira linha de investigagdo preocupa-se com a forma como 0 espago e os lugares definem o mundo dos consumidores. Em linhas gerais, a inteng’o nao é outra que a de demonstrar como o espago e os lugares constituem © contexto mediante o qual as pessoas dao sentido ao mundo e nele actuam, e por isso, no caso do consumo, estes se tormam cru- ciais na definig&o das identidades dos consumidores. Esta abordagem é desenvolvida, nomeadamente, por Sack (1988; 1992), Lash e Urry (1994), Urry (1995) e Bell e Valentine (1997). Sack concede particular destaque forma como os diferentes lugares de consumo de massa (centros comerciais, grandes armazéns, parques temiticos...) sio criados e como, em conjunto com a publicidade, alteram intencionalmente os aspectos da realidade, de modo a criar os atributos desorientadores associados 4 pés-modernidade. Lash e Urry debatem, entre outras questdes, a mudanga da natureza do con- sumo e as tensdes entre a mercadorizacao e o entusiasmo colectivo no con- texto das formas mutantes, mediante as quais os lugares séio consumidos ou econdémica e culturalmente transformados. Por sua vez Bell e Valentine, em Consuming Geographies, 0 seu mais profundo trabalho neste dominio, estendem a andlise geografica do consumo 4 restauragio para demonstrar 0 quanto os espacos e os lugares de consumo alimentar sao fundamentais na formacao da identidade. Segundo estes autores, explorando as geografias do consumo alimentar, nés poderemos avaliar o papel que a alimentagio desempenha na constitui¢io das identidades dos lugares. Isto acontece por- que, em grande medida, «todos nds pensamos 0 lugar e a identidade através da alimentagao: nés somos onde comemos». as rotas em construgao Com 0 aprofundamento da pés-modernidade, a afirmag&o dos modos de produgio flexiveis e o desmantelamento do capitalismo organizado, de que Lash e Urry (1987) brilhantemente nos deram conta alguns anos atras, torna- -se cada vez mais evidente que os itinerdrios alicergados nas tradicionais dicotomias entre a objectividade e a subjectividade, o individuo e as estrutu- ras sociais ou 0 global e o local, tém grandes dificuldades em fornecer uma interpretagdo satisfatéria do mundo social no qual se integra directamente 0 consumo. Neste contexto, a geografia humana, enquanto teoria social e espa- cial, tem necessidade de procurar novos caminhos interpretativos para a espacialidade dos fenédmenos. Para esta mudanga de atitude, em permanente reconstrugdo sobretudo a partir dos finais dos anos oitenta, muito tém contri- buido as correntes de pensamento pés-estruturalistas, estruturacionistas ¢ pés-modernistas, integradas na geografia, nomeadamente, por Dear (1988), Soja (1989; 1996; 2000), Harvey (1989) e Doel (1999). Na realidade, mesmo se nao existe uma teoria social pés-moderna unificada ou até mesmo segundo Geografias do Consumo im alguns autores, simplesmente, um conjunto coerente de posigées (Best e Leliner, 1991)’, todas as perspectivas acima referidas partilham pelo menos em comum o facto de serem profundamente criticas em relagdo ao projecto da modernidade e 4 capacidade libertadora da ciéncia moderna, a qual baseando-se em exclusivo na racionalidade, procura alcangar a grande ver- dade no mundo das evidéncias e na andlise dos factos. Esta descrenga no projecto moderno, na verdade tinica e na grande teoria, chega mesmo a ser aproveitada por alguns autores de vanguarda para rejeitarem os princ{pios modernos da coeréncia e da causalidade mecanicista e, apoiando-se nas rela- g6es de contingéncia, nos processos de mediagiio e na flexibilidade, apelarem para a fragmentacao, a multiplicidade e a indeterminagio. Além de negarem a abstracedo ¢ a generalizagio, apelarem para a rela- tividade, as relagdes de contingéncia, o posicionamento, a contextualizagao e os efeitos da glocalizagio, as teorias pés-modernas e pés-estruturalistas tor- nam-se ainda particularmente interessantes no presente contexto porque deslocam 0 centro da sua atenc&o da produgio para o consumo, desenvol- vendo em torno desta categoria conceptual, da identidade dos consumidores, do espaco e do lugar, uma profunda reconceptualizag3o. Nao passando até essa altura de uma mera reflex&io do processo produtivo, com as teorias pds- -modernas © consumo e os consumidores nao s6 adquirem estatuto de objecto de estudo em si mesmo, como servem de Ancora A discussiio de intimeras questées sociais, culturais e econdémicas, incluindo as relacionadas com a prépria produgao. Esta recentragem dos estudos, nao teria sido possfvel sem o reconheci- mento do papel social, cultural ¢ simbélico que o consumo desempenha na sociedade contemporanea, para o qual muito contribufram, nomeadamente, as teses desenvolvidas por Baudrillard (1968; 1972), Bourdieu (1979) e Featherstone (1991). Muiltiplas diferengas separam as ideias destes pensado- res, mas pelo menos todos sdo perempt6rios em reconhecer que, ao contrério do que sempre se pensou, 0 consumo nao é uma absorgdo passiva das coisas em contraste com 0 activo processo da producdo, mas antes uma relacao activa com os objectos nos quais se baseia a construgao de todo o sistema cultural. Com uma posigio mais radical, Baudrillard (1968; 1972) chega mesmo a defender que, na sociedade pés-moderna, o consumo deixou de ser uma prdatica material para se transformar na organizacio das coisas num mero processo de fabrico de significados. Para que um objecto adquira o estatuto de produto de consumo € necessdrio que este se transforme num signo com significado no sistema de objectos-signo, porque as mercadorias, segundo este autor, nado so consumidas mais pela sua materialidade mas antes pela sua diferenga significativa. A converséo dos objectos num sistema de signos de que nos fala Baudrillard, implica também uma transformagio das relagdes do sujeito com 7 S. Best; D. Kellner (1991). Postmodern Theory: Critical Interrogations, Guildford, Nova Torque. Citado por R. Peet (1998: 214). 1m Inforgeo, 14 - Espagos Urbanos os objectos e, necessariamente, uma mudanga da sua identidade na teoria social. Este perde a racionalidade e unidade que habitualmente Ihe foi conce- dida pela teoria moderna e torna-se num ser descentrado, fragmentado, ecléctico, transit6rio, emocional e de miltiplas identidades, por vezes mesmo paradoxais. E precisamente devido a esta complexidade e eclectismo que adornam 0 sujeito pés-moderno, que varios autores deixaram cair nas suas andlises as figuras do indivfduo e do consumidor e passaram a interessar-se pela pessoa e os estilos de vida, categorias conceptuais sem duvida de grande complexidade, mas seguramente mais apropriadas para reconstruir, entre os miltiplos fragmentos e a diversidade de comportamentos, «a fraca unidade que resiste», de que fala Vattimo (1990), ou ent&o caso se prefira a opiniao de Badot e Cova (1992), «a fraca unidade que renasce» com o espirito dos anos noventa. No contexto das teorias pés-modernas e pés-estruturalistas, a espaciali- dade adquire também um novo sentido. Construfdo socialmente a diferentes escalas, 0 espago torna-se multi-dimensional e pluri-significativo. A sua pro- dugio envolve sempre uma relagao dialéctica de contingéncia entre as pes- soas € os lugares, as estruturas sociais, as comunidades territoriais ¢ os siste- mas locais e globais. Este processo aplica-se tanto ao espago real, territorializado, feito de «lugares reais», isto é, que sao significativos para os individuos e os grupos que neles inscrevem as suas praticas do quotidiano, como ao hiper-espago topoldgico, organizado em torno de «ndo-lugares», vistos numa acepgio bem mais ampla do que aquela que lhe atribui Augé (1992). Isto 6, lugares que sao uma criagio da tecnologia e da sociedade de consumo global, que embora no passando de simulacros de lugares reais ou imaginados, na pratica so tidos pelas pessoas como auténticos, ou que pelo menos sao vividos e sentidos enquanto tal. A construgao de itinerarios de leitura que sejam capazes de vencer as tradicionais dicotomias acima mencionadas, constitui talvez o principal desa- fio que os investigadores das ciéncias sociais terao de enfrentar nos préximos anos. No entanto, independentemente das linhas de rumo que venham a ser seguidas ou dos portos de abrigo seleccionados, as viagens apenas poderao ser bem sucedidas se as etnografias construfdas conseguirem responder, teé- rica e metodologicamente, 4 natureza paradoxal de que esté envolto 0 con- sumo em si mesmo. Parafraseando Miles (1998: 1006-1007), implica que os investigadores reconhegam que, por um lado, em termos das experiéncias individuais, as pessoas sio fortemente atrafdas pelo consumo porque, intuiti- vamente, acreditam que a sua realizag&o passa pelo que consomem. Os con- sumidores podem construir a sua soberania através dos objectos que adquirem, os lugares que frequentam e as experiéncias que estes lhes propor- cionam, sejam estas formadas por simples visitas ao hipermercado ou pas- seios em familia nos centros comerciais. Mas, por outro lado, € preciso tam- bém nao olvidar que o consumo tem um papel ideolégico controlador da vida quotidiana. Psicolégica e socialmente, este ao mesmo tempo que potencia ou Geografias do Consumo 173 concede oportunidades também constrange. Na realidade, os espagos de con- sumo sio lugares concebidos para a acgdo e a criatividade humana e, de facto, os individuos-consumidores assim deles se apropriam e consciente- mente fazem uso (Mort, 1998). No entanto, as pessoas até podem saborear as liberdades de acco que Ihes sio oferecidas pelo consumo ¢ os lugares erigi- dos em seu nome, mas essas mesmas liberdades esto sempre impregnadas de um quadro racional no seio do qual as suas vidas so organizadas e con- troladas (Miles, 1998). Marsh (1982: 100) descreve este paradoxo melhor do que ninguém quando refere: «as pessoas até podem fazer histéria, ou exerci- tar a escolha, mas jamais podem escolher as condigdes ou as avenidas das possibilidades que a elas se abrem». Se porventura subsistissem diividas quanto & necessidade da construgio de interpretagdes posicionadas do consumo, isto é, no desenho de itinerdrios de leitura que tenham em linha de conta as relagdes de contingéncia entre 0 individuo e as estruturas sociais, a racionalidade e a subjectividade, a articu- lagdo entre 0 local € o global, estas seriam facilmente dissipadas pelas ten- s6es que caracterizam a multidimensionalidade das experiéncias do consu- mo, para as quais remete o paradoxo descrito anteriormente. Na sociedade contemporanea saber como, onde e porque € que os individuos consomem, so questées que parecem desempenhar um papel fundamental na construgdo da identidade das pessoas e dos lugares, bem como no desenho das relagdes que os individuos estabelecem com a sociedade. Por sua vez, 0 consumo cada vez mais se reflecte na produgao do espaco e na espacialidade das rela- g6es sociais. A avaliagiio deste complexo problema encontra-se ainda, em grande medida, por realizar e faz parte da agenda dos grandes reptos que os geégrafos, em conjunto com outros investigadores das ciéncias sociais, terio de enfrentar. Neste contexto, um grande investimento em sofisticados méto- dos de pesquisa afigura-se fundamental, porque complexos e sofisticados sao também os processos multidimensionais que actualmente modelam 0 con- sumo, as paisagens comerciais e as praticas dos consumidores. Bibliografia AUGE, M. (1992), Non-Lieux, Introduction & une anthropologie de la surmoder- nité, Editions du Seuil, Paris. BADOT, O. e Cova, B. (1992), Le néo-marketing, ESF Editeur, Paris. BAILLY, A. ¢ BEGUIN, H. (1982), Introduction @ la géographie humaine, Masson, Paris. BALSAs, B. (1999), «The Mall of America (USA) and the Colombo (Portugal): a comparative study in retail globalization», in Barata Salgueiro T (eds). The Globalization of Consumption and Retail Places, GECIC, Lisboa, 35-68. 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