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CULTURA © OBJETIVO DESTE TEXTO & tornar mais familiar, para os estu- diosos das ciéncias juridicas, o significado antropolégico do concei- to de cultura. Essa tarefa parte do principio de que a maioria dos advogados estd familiarizada com 0 significado recorrente do termo, tomado como sindnimo de erudigao. Desde 1871, quando Edward Tylor escreveuA cultura primitiva, os antropélogos consideram cultura tudo o que o homem aprende ¢ faz como membro de uma determinada sociedade. Nesse sentido, o conceito de cultura abran- ge tanto as artes (misica, pintura, escultura, teatro, literatura etc.), que so atividades concebidas como eruditas, quanto os mais corri- queiros costumes (modo de andar, de sentar, de vestir-se, de rir etc.), incluindo inclusive aqueles tidos como antissociais, como 0 uso de palavroes, blasfémias e insultos. Enfim, todas as agdes que permitem identificar seus atores como membros de uma sociedade. £ interessante lembrar que, na sexta década do século xrx, quan- do a antropologia cultural comesou a se estabelecer como disciplina cientifica, a maioria daqueles que hoje sao aceitos como os primeiros antropologos tinha formacao juridica ou filoséfica. Seus trabalhos, que visavam ao conhecimento da origem das instituigdes juridicas e sociais modernas, contribuiram fortemente para o desenvolvimento do conceito de cultura, tendo sido influenciados pela publicacao, em 1849, do livro A origem das espécies, de Charles Darwin, razéo pela qual se observa em suas obras uma orientaco evolucionista. Além 55 século x1x, Buscavam seus objetis cias naturais,¢ sim em seus gabinetes de estudo, onde analisavam o§ dados coletados por terceiros (vigjantes, missionérios, funciondrios coloniais etc.) sobre os povos denominados pr como sobreviventes de um periodo arcaico da dade. Eles acreditavam que esses povos ainda estavam nas mesmas etapas de desenvolvimento que os europeus tinham vivido milha- res de anos antes e procuravam compreender 3s ins contemporaneas por intermédio da hist6ria, tendo alguns deles in- cluido em sua busca civilizagdes antigas, como Roma, Grécia e Egito, conhecidas de acordo com os documentos escritos pelos primeiros historiadores. © primeiro livro publicado nesse periodo a tratar disso foi — 0 Direito artigo (1861), de sir Hency Maine (1822-1888), que fez cor~ responder a uma grande revolucao social a transformacio de uma sociedade baseada no status para outta calcada no contrato, Em ou- ‘ras palavras, Mayne defendia que as sociedades humanas evoluiram a partir do momento em que as relagdes sociais deixaram de ser regu- ladas apenas por papéis sociais atribuidos pelo parentesco e passaram a se dar também por meio de agdes contratuais firmadas entre ho- ‘mens de grupos familiares ou socias diferentes. Sem essa transforma ‘40, seria dificil imaginar a existéncia das sociedades modernas. Ainda em 1861, publicou-se o lirro © Direito materno, de Johann Jakob Bachofen (1815-1887), para cuem as primeiras sociedades hu- manas eram matriarcais. De acorco com Bachofen, 0 matriarcado foi precedido por um petiodo de intensa promiscuidade sexual, no qual as mulheres haviam sido usadss arbitrariamente pelos homens. Da revolta das mulheres ~ nesse ponto, Bachofen se inspira 110 mito das Amazonas — teria surgido ums sociedade em que poder con- centrou-se em mios femininas. Tal etapa, contudo, foi uma forma ‘transit6ria, que possibilitou o surgmento de outra “sociedade mais avangada’, ou seja, a que se baseia no patriarcado, Suas ideias aca- 56 5 ANTRoPOLoGIA F DIRE ‘em aceltar ti pertodo de promise dade, Een assem a existéncia, em quiet tempo ou lugar, de uma sociedace matriareal, sendo im= nte aqui nio conti iarcado, regime no qual o poder ‘mos das mulheres, com matrilinearidade, que éum sistema cial em que 0 parentesco se transmit pela linha feminina. ‘Em 1864, surgi na Franca o livro A cidade antiga, de Fustel de oulanges 11830-1890), que buscou compreender nossa propria so* ide a luz das sociedades grega ¢ romana. Com efeito, com base ua leitura, € possivel entender muito de nossos ritos matrimo= nis ¢ funerdrios, fazendo com que a importa 1omano tomasse o livro muito ( tinico dos aqui mencionados ja traduido para o portugues. No anoseguinte, o escocés John Ferguson McLennan (1827-1881) pul tivo, com o qual procurou de- to é aquele que 0 noivo eap- tura sua fatura esposa em outro grupo, teria correspondido a forma Ide unio entre homens ¢ mulheres. Ele tentou comprovar sta {ese pela identificagio, em ritos matrimoniais de diversos povos, de bes simbdlicas desse ato, sendo conhecido como o primeira a ou seja, 0 costume de casar-se com pessoes de outro grupo familiar ou social. A critica mais ¢o- mum feita s McLennan procura mostrar que, até hoje, o casamento lades que possuem outras formas ‘queses no Estado de N , dade e afinidade da familia humana. Foi um dos primeiros autores a chamar a atengao para 0 fato, até entao praticamente desconhecido, de os sistemas de parentesco variarem de sociedade para sociedade, ‘Como outros evolucionistas, Morgan aceitava a ideia de uma etapa ial na histéria da humanidade em que teria immperado grande cunruna § 57 Promiscuidade sexual, ¢ seu livro aleangou | ee A ee Tee ee eee , e ett om deter inagto é considereda uma " pode ser punida com medidas extremas. f verdade sna possui leis e costumes muitos diferentes daqueles dia, mas ¢ importante que o advogado compreendia 0 ir desses réus, & luz dos costumes matrimoniais do pats ou Givilizagai imbém tem sido palco de conflitos ce mesma natu- Este todo See ae ee amplo sentido etnografiegy que visa reforgar 0 caréter Iaico do leis, costumes ou qualquer outra acide tos, crencas, arte, moral, J proibiu 0 uso de simbolos religiosos no interior das escolas, como membro de uma sociedade” Tylor nto 26 habitos adquiridos ‘atingindo 0 uso de solidus pelos alunos judeus ¢ 0 de véus palavra todas as possibilidades de realiza aa abrangeu numa s6 “meninas islimicas, Como ambos os costumes sto respaldados dau 0 caréter de aprendiado préprio a erttu eon eect fortes crengas religiosas, a proibigio causou enorme polémica. cepgao de uma aquisicio inata, transmitida em oposi¢ao & con- semelhante ocorreu em Mocambique logo apés a independén- Assim, reafirmou as ideias de John ae mecanismos biolé- quando Samora Malcher proibiu que as mulheres usassem 08 1690, ao escrever Ensaio acerca do entendinn = Ossant704) auc ies que eram simbolos de identidades tribais. No ambito do demonstrar que a mente humana, por 0 pitts iumano, procurara moderno, questoes como estas podem resultar em agdes alr dS ue unit ae ain gee ee Jnis, nas quais € relevante conhecer possiveis consequéncias da » dotada apenas da capacidade ilimitada idade aultur de obter conhecimento, por meio IrOces th colts Moree a oe fa rocesso que hoje chamamos Os exemplos citados parecem bastante distantes de nés, mas € * 25; ciso lembrar que o Brasil é um pafs que abriga muitos imigrantes, ‘Num pais e nut ‘ couse — es macs hos quais convivem pes- Iportadores éas mais diferentes culturas, é habitat de aproximada- dos ampliem 0 conceito de cultura a que portante que os advoga- - jnente 220 sociedades indigenas, que representam enorme i- Fa Lea US ee ear anion ey dade cultural. Como se vera adiante, juizes federais tém recorrido utilizamos alguns exemplos que dee ET crudicao. A seguir, {aos servicos de antropélogos para definir o grau de compreensio Os advogados criminalistas ingleses si n tal necessidade, cultural por parte de algum indio acusado da pratica de atos ilegai wee Entre muitos trabalhos antropolégicos que podem servir de a creaea a ciate ee ree en ae ‘exemplo desse tipo de conflito, encontra-se o livro Herdeiros da ter Inglaterra contra suas préprias filhas, Na que migraram para a ‘parentesco e heranga numa drea rural (1978), de Maria Margarida Ho dessesatos se deve ao fato de as jovens,criadas dos casos, a ra- ‘Moura, que descreve as maneiras utilizadas pelos membros de uma ‘ocidental, deixarem de aceitar a interferéncia numa sociedade comunidade camponesa no sul de Minas Gerais para, no que se re- Sst Saison ees ee eee ea ania oe fore a heranca da terra, fazer prevalecer 0 direito costumeiro, em de See pe air ae Ii eo pas trimento do Cédigo Civil. Trata-se de uma comunidade constitufda s de suas filhas, sendo tal por pequenos proprietérios rurais que utilizam a propria familia cvrrena 5 59 585 awtRoPoLogia F pinetro 6 ss o tiltimo a nascer e a casar; concretamente, porém, 0 suces como a principal forca de trabalho, Sendo a terra pequena € os filhos, pio, js novo” (:177). Isso porque os See eens Gree eee ee Srna cesta nee (7. Wop priedade e a nao observancia dos limites minimos de sustentabilidade. ease Ce te jdade agricola. Consideram que soment ‘tomar conta da terra. Por isso, filho, ignorando o direito da sua aptidao para a at 08 fisicamene fortes sio capazes pode aconte:er de escolherem outro ultimogenitura. d Emr outto trabalho, Woortmann (1999) mostra aa diene importante entre 0s modelos brasileiro e germane’ brasileiro, rm ve prevalecia nu heranca, em ver da total regula pelo. one arte de cada um ue de jus laboranti, ou sejay em que 4 P: a sre em funsdo de sua contibuiglo, sob a forma de taba at . ,cita 0 exemplo de um rapaz. que eer ane ibilitado de trabalhax, tendo ‘40s 16 anose ficou muito tempo impossil sea familia arcado com grandes despesas médicas, Quando =a o periodo deinatividade eos gastos médicos foram considerados uaa i -beu bem menos do que seus irmaos. divida por sua famnfla,e ele rece a i inalada pela autora é 0 ‘Uma segunda diferenga importante ass dea tnsfetencia da heranca realizar-s principalmente no momento 08, \do-se isso numa partilha final, 7°= do casamento do fs, compuando sso mam Pash Hi jorte dos pais. oar lo ens aa lg, meas geass le tus. Em nC ul O pont fr 1 (1973), também estudou o sistema de heranga gem niponica,em Marilia,noestado ngao A transmissdo dos bens jade da linhagem patrill- as filhas pode adotar um geno, Um Em seu livro, Moura analisa os artificios utilizados para manter a terra indivisivel. Em geral, 0 filho mais velho casa muito cedo e recebe um lote dentro da propriedade para construir a sa moradia, ‘Trabalha em conjunto com o pai e, mais tarde, como de co: torna-se responsivel pela manutensao de seus progenitores, q os mesmos atingem idade avancada, Estimula os irmaos mais jo- vens do sexo masculino a migrar para a cidade, em busca de tra- balho e até mesmo estudo. Ao mesmo tempo, assegura a eles uma mesada, que ser cobrada de maneira enfitica na época da partilha, E facil demonstrar que eles terao recebido antecipadamente a sua parte da heranga. Quanto as irmas, o ideal € que se mantenham sol- teiras e tabalhem com 0 primogénito, na condigao de suas depen- dentes. Como isso nem sempre é possivel, este procurara convencer seus eventuais cunhados a vender para ele 0 quinhao de suas irmas, restabelecendo-se assim a unidade da terra. A venda é conveniente quando tais cunhados pertencem 4 mesma comunidade, pois pode- 0 dinheiro para comprar a terra de suas proprias irmas, tendo sido essa a via encontrada pela comunidade para assegurar 0 dircito legado a primogenitura sem grandes choques com o direito civil brasileiro. Outro exemplo, que pode ser tomado como um contraponto do primeiro, € analisado no livro Herdeiros, parentes e compadres (1995), de Fllen Woortmann, que estudou o sistema de heranga da terra en- tre colonos de origem alema no estado do Rio Grande do Sul. Nesse caso, 0 sucessor escolhido ¢ 0 filho mais novo, que se torna responsi- vel pela manutengdo dos progenitores, quando estes deixam de tra- balhar, Os filhos mais velhos recebem de seus pais terras em outras, coldnias e, assim, perdem seus direitos sobre as terras da fazenda paterna. A parte das filhas, por sua vez, écalculada em dinheito ou gaco como dote, e permanece sujeita ao controle de scus maridos, ‘A autora chama a atengao para o fato de que o herdeiro, “em prin dle expansio ps entrecolonos; em seucaso, de suldades relacionadas & or a, foram encontrados sete casos de mukoyoshi dom juriaica bras cusnuna 4 6 60 4 AvtMoPoL00I4 x nemnitO ‘ em Marflia, cujos impedimentos previstos pela legislagao brasileira foram contornados, entre outras formas, por meio de um casamento realizado no consulado japonés, com a adogao do noivo pela familia da esposa e a alteragao do sobrenome dele, ¢ 0 envio da filha mais ve- tha para o Japio, com a finalidade de encontrar um noivo que emi- grasse posteriormente com ela para o Bras ‘Ao mesmo tempo que o privilégio da primogenitura p tradicional japonés estimula a aceitacao dessa prética pelos demais filhos, equivalendo 4 uma rentincia ao nome paterno, a maior integracao cultural dos descendentes de japoneses na sociedade brasileira deve té-la torna- dda mais rara do que hé quase quarenta anos, quando a pesquisa da autora foi realizada, De maneira contréria, embora o pais se tenha tornado laico com a proclamagéo da Reptblica, as religides afro-br: grande perseguisao policial até o final da década de 1940. A insistén- cia em desconhecer 0 fato de que culturas diferentes tém sistemas de crengas diferentes fazia com que os setores dominantes da socieda- de considerassem os rituais religiosos de origem africana fruto do atraso € da superstigfo. A simples rotulagao dessas praticas religio- sas como feitigaria indica o preconceito entao existente, bem como 2 ignorincia da enorme contribuigao das culturas afticanas para a formagéo da cultura brasileira, Nao devem ser desconhecidas a importancia cultural dos as- pectos religiosos de uma sociedade e as suas implicagoes inclusive . Os casos da Irlanda do Norte e de todo 0 Orien- te Médio exemplificam o papel das religiées no comportamento da populagao, Por exemplo, a crenca na existéncia de uma “guerra santa’, em que 0 martirio € mais enfatizado do que o heroismo, 86 se torna possivel por meio da fé numa premiacéo divina para os que morrem em defesa da causa, Situagio idéntica ocorreu no Brasil durante a Guerra de Canudos, na qual tanto Antonio Con- iro quanto seus seguidores acreditavam estar defendendo a 624 ANTHOPOLOGIA x pInALTO pela pétria era a maneira de assegurar uma reencarnaca0 numa casta ou classe superior. A propésito, essa crenga cultural repercutiu no Brasil, tendo a derrota na guerra abalado parte da coldnia japonesa localizada no este do Estado de Sao Paulo, principalmente nas cidades de Tupa, Marilia e Pendpolis. Com efeito, o Japao se manteve invenctvel du- rante séculos, tendo chegado, no inicio do século xx, a derrotar um pais imensamente maior, a Assim, muitos dos imigrantes custaram a zcreditar na rendigao e, pior do que isso, nos termos des- foi forgado a declarar publicamente a | anos, os japoneses acreditaram. ser governados por um deus que descendia diretamente da Deusa Solar, 05 colonos mais exaltados alegaram que a derrota nao passava dle propaganda falsa divulgada pelos americanos e chegaram a criat uma organizacio secreta, a Shindo Renmei, cuja finalidade era ell- inar os membros da colonia que admitissem o fracasso japonés, io de1947, quando essa organizacao foi finalmente dissolvida. a, 23 pessoas tinham sido mortas € 147, feridas. pela pe ‘Ao todoa policia paulista deteve, identificou e fichou 31.380 imigrantes japoneses suspeitos de ligagao com a seita. Em= bora 1.423 tenham sido acusados pelo Ministério Pal Justiga aceitou a dentincia contra 381 deles. [..] No final de 1946, 0 presidente da Republica, Eurico Gaspar Dutra, bai- xou um decreto considerando elementos nocivos aos inte- tresses nacionais e expulsando do Brasil oitenta imigrantes. ‘Nenbum desses, entretanto, chegatia de fato a ser expul- ‘40 do pals, Os recursos judiciais impetrados pelos advogados protelaram a execuglo das penas de expulsio até meados dos anos 1950, No Natal de 1956, quando a maioria deles ja lo pelo menos dezanos de prisio, o presidente Juscelins Kubitschek comutou as penas, colocando todos os presos em liberdade (Morais, 2000: 331-5). euerunn ¢ 69 Se cess0. We se examinasse até onde os fatores decorrentes da diversidade cultural foram levados em c Ao tratar da relacdo ente cultura e dir: deixar de fora a questao indigena, em razto das pecul decorrentes dos efeitos do art, 231 da Const conhece aos indios os direitos referentes € a5 seus costumes, corresponde a aceitag: nos quai as lei brasil ras ndo sao plenamente aplicadas. Um dos componentes importantes da organizacao social dos tema de parentesco, As cerca de 220 sociedades indigenas existen- {es no Brasil sao possuidoras de grande diversidade de sistemas de Parentesco, nos quais as regras de descendéncia variam da extrema Patrilinearidade matrilinearidade, havendo algumas sociedades com regras bilaterais. E um erro, poré lerar que tais sociedades bilaterais se assemelharn & nossa bilateralidade. Nosso sistema reconhece a igual- dade de partcipasao entre o homem ea mulher na reprodusao se. xual, a0 passo que, por exemplo, prevalece entre 0s Timbiraa crenga de que a criansa ¢fruto de sucessivos atos sexuais entre seu pai e sua mie. Quando vérios homens tém relasées sexuais com uma mesma mulher no periodo imediatamente anterior a0 parto, todos cles ado tidos como pais do recém-nascido. Mesmo a regra patrilinear, mais proxima da nossa, pois vigorava re 0S gregos ¢ os romanos, pode causar perplexidade: os T ‘item o casamento entre meios-irmios, desde que nao de um mesmo pai. Filhos de uma mesma mie com homens dife- Fentes ndo sto considerado parentes, uma vez que a mae nao passa de um parente afim. © reconhecimento pela lei brasileira do ma- imOnio como a unio entre um homem e uma mulher cor mi. com o grande ntimero de casamentos ps 0s brasileitos, nio sendo raro 0 casamento de ti uma mulher ea filha desta. ta homem com 64. §. AvTHoPLOGA » oLnnin0 extremamente interessante, portanto, uma andlise do pro- Por sua vzz, os rituais funerdrios indigenas, colidem com as nor- mas preseritis pelo governo brasileiro nos casos em que hi crema- do, necrofagia e enterramentos secundarios. Este consiste, entre os Bororo, no costume de enterrar um morto e desenterré-lo cerca de um més depois, pa Jos com plumagens ¢, «em seguida, colocé-los num cesto, que € arremessado no rio, Guerras entre indios de sociedades diferentes resultam em varios homictdios que nao est8o sujeitos & puniglo. Da mesma forma, ad mitem-se as mortes de invasores de terras ou resultantes de conflitos politicos dentro de um mesmo grupo. Permanecem controvers0s, portanto, os limites da imputabilidade dos indigenas. Alguns juizes consideram que esses terminam quando eles tém conhecimento st ficiente das leis da sociedade majoritéria, razdo pela qual diversos antropélogos tém sido requisitados pela Justia para emit parece res sobre o grau de discernimento de indigenas envolvidos em con- traveng6es, Existem, assim, virias divides em relagao aos indigenas «que mudam para a cidade, em que chegam inclusive a ocupar eg ppblicos. Trata-se de uma discuss4o que tem mobilizado a {gos e advogados desde a década de 1980, quando se realizaram duas reunides sobre o tema em Florianépolis. § outro ponto de grande potencial de conflito entre inter= idicas est contido no préprio caput do art. 231, em que pretagoes, se reconhece que os indios tém “direitos origindrios sobre as terr proteger e fazer respitar todos os seus bens’, Os sete parigrafos des~ 4e artigo se teferem exclusivamente & questtio das terras indigenas, porém, como faz. parte deste volume um texto sobre ela, a mencioné-la. ROQUE DE BARROS LARAIA REFERENCIAS BIBLIOGRAPICAS bacHorENN, Johann Jakob (861) Das ten Welr nach iter religidses und rechtlichen Natur, Stuttgart: Verlag von Krais und Hoffmann, FUSTEL DE COULANGeS, Numa Denys (1864) A cidade antiga Lisboa: Livraria Classica Editora, 1958 DaRWiN, Charles (859) A origemn das espéces. Brasilia: rduwp, 1982, Lawara, Roque de Barros (4986) Cultura wn conceit atropoligic. 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