Você está na página 1de 2

A beleza brota das rochas

Ecologistas brasilienses estudam há dois anos as plantas que vivem em ambientes pedregosos do
cerrado
Darse Júnior
Da equipe do Correio

Sobre o chão de rochas, a natureza do cerrado surpreende pela Fotos: José Roberto
Rodrigues/Fundação O Boticário
riqueza de formas e cores. São nas áreas de solo pedregoso, onde
os tratores e máquinas utilizadas nas lavouras não chegam, que
essa vegetação exótica encontra proteção. Trabalho de três
doutores em Ecologia da Universidade de Brasília (UnB) revela a
importância da vegetação do Planalto Central que cresce em
condições adversas. Além da beleza das flores e de plantas com
troncos retorcidos que brotam entre pedras, a vegetação rupestre
tem papel de destaque no bioma cerrado.

Relatório elaborado em 2004 pela ONG WWF Brasil (World Wildlife Pau-bicho
Fund – Fundo Mundial para a Natureza) revela que apenas 25% da A bonita planta que exibe flor
cobertura vegetal nativa do cerrado sobreviveram a meio século exótica, em tom de laranja,
também é chamada de flor-de-
de ocupação humana. Outro documento internacional também pau
alerta para a devastação. De acordo com a CI – Brasil
(Conservation International), se as atuais taxas de desmatamento
se mantiverem até 2030, a vegetação natural do cerrado ficará
restrita às unidades de conservação, terras indígenas e áreas
impróprias à agropecuária.

O ambiente rupestre representa menos de 10% dos mais de 2


milhões de quilômetros quadrados do bioma. A vegetação típica
nasce e cresce em altitudes elevadas e em terrenos rochosos. “Em
geral, quando as pessoas compram uma propriedade rural, tratam
o ambiente rupestre como inútil. Esquecem do valor ambiental”, Noranteia adamantium
comenta o engenheiro florestal e professor da UnB, José Roberto Flor encanta à primeira vista e
Rodrigues Pinto, 35 anos. poderia ser utilizada facilmente
em paisagismo de casas

Ele e os biólogos Alexandre de Siqueira Pinto, 33 anos, e Eddie Lenza de Oliveira,


35, catalogam as espécies encontradas. O estudo começou em 2003 sem apoio
financeiro. Os três pesquisadores dividem as depesas com o aluguel de uma casa usada
como sede da pesquisa na região de Cocalzinho de Goiás (GO), a 120km de Brasília.
Nos finais de semana, eles vão a campo medir, coletar e catalogar as plantas. Depois
de mais de 18 meses de pesquisa, conseguiram aprovar um financiamento de R$ 22
mil.

No primeiro semestre deste ano, inscreveram o projeto de pesquisa Ecologia das


espécies lenhosas em áreas de cerrado rupestre no Programa de Incentivo à
Conservação da Natureza, da Fundação O Boticário. Depois de concorrer com outras
257 propostas de todo o Brasil, o grupo conquistou um lugar na lista dos 23 escolhidos.
Apenas dois projetos foram selecionadas na região Centro-Oeste. Com o apoio
financeiro, os três pesquisadores expandiram o estudo para mais duas novas áreas:
Alto Paraíso e Cristalina, duas cidades de Goiás.
Cada cidade é visitada, pelo menos, cinco vezes. Na
primeira, os especialistas fazem um levantamento geral da
região e escolhem os pontos onde a vegetação será
estudada. Nas três viagens seguintes, eles vão a campo,
medem e coletam plantas. A última viagem é dedicada à
educação ambiental, com palestras em escolas de ensino
médio e fundamental. É uma forma de repassar às
comunidades que vivem nas proximidades informações
sobre a importância do cerrado e de sua preservação,
inclusive dos ambientes rupestres. Ao todo, serão mais de
20 viagens até o final do próximo ano, quando o projeto Chuveirinho
será concluído. Essa espécie de flor, que cresce
sobre rochas, é bastante comum
em outras áreas de cerrado
O grupo estuda também a biologia reprodutiva das espécies
do cerrado que vivem sobre rochas. Registram o agente
polinizador de cada planta, o período em que elas perdem e
emitem as folhas, florescem e disponibilizam os recursos
para a fauna, como os frutos ou sementes que servirão de
alimento. “O estudo do ciclo reprodutivo é importante para
mostrar a correlação entre a vegetação e as espécies da
fauna silvestre local. As informações facilitam a
preservação, que é o nosso principal objetivo”, explica
Eddie.
Candomba
Embora ainda falte mais de um ano para concluir o estudo, A planta exibe uma bela flor lilás,
os profissionais acreditam que a maior parte das espécies que lembra uma orquídea de
pétalas grandes
de plantas lenhosas que ocorrem no cerrado rupestre
também podem ser encontradas nas áreas de grande interesse da agropecuária, onde o
relevo é plano e o solo profundo. “Será uma boa surpresa. Se o cerrado for mesmo
devastado nas áreas planas, como indica o relatório da CI – Brasil, a conservação de
parte das espécies do bioma estará garantida nos ambientes rupestres”, explica José
Roberto.

Você também pode gostar