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O DNA E SUAS PRESUNÇÕES: A COISA JULGADA E VÍNCULO DE

FILIAÇÃO

O texto constitucional garante como direito fundamental a vida digna,


garante, também, o direito a impossibilidade de distinção entre filhos de
diferentes origens. O Código Civil normatiza o direito de personalidade e da
sua proteção. Então, sob, a perspectiva, civil-constitucional, o princípio da
isonomia entre filhos é uma diretriz fundamental a ser seguida pelo hermeneuta
no estudo da matéria.

A ciência nos possibilita uma certeza quase absoluta sobre os vínculos


biológicos por meio do exame de DNA. O dilema se posiciona quando o
sistema aponta: a existência de ações com trânsito em julgado em confronto
com a realidade revelada pelos avanços tecnológicos.

Este estudo, de forma sucinta, vai analisar este confronto: o que há de


prevalecer - a verdade processual, já consagrada pelo advento da coisa
julgada (garantia constitucional) ou a realidade biológica verificada anos depois
(que afirma o verdadeiro estado do indivíduo)?

O direito ao conhecimento da ascendência biológica é um anseio natural


do homem, o objeto da tutela do direito ao conhecimento da origem genética é
assegurar o direito a personalidade, na espécie o direito à vida, como uma
forma de saber a história de saúde de seus parentes biológicos.

A presunção de paternidade é prevista no art. 1597, I, V, Código Cívil.


Doutrinadores já conceituaram o tema.

De tal forma que podemos deparar com uma presunção comum ou com
presunções legais. A previsão comum, não há previsão legal, fundamentando-
se no que ordinariamente acontece, admitindo-se, somente quando a prova
testemunhal é admitida (art. 230, CC).

As presunções legais são previstas no direito positivo. Dividem-se em


absolutas, em que a própria lei a admite como prova absoluta, como verdade
indiscutível, não se admite prova em contrário, exemplificando, temos máximas
de que todos conhecem a lei, de que a coisa julgada é tida como verdadeira);
as relativas, condicionais, cabe prova em contrário, é o caso da comoriência.

No Código Civil, art. 1601, temos cabe ao marido o direito de contestar a


paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.

Percebe-se, assim, que com esta medida, o nosso sistema consagrou a


imprescritibilidade das ações do estado.

Na doutrina sempre houve tal noção.

A jurisprudência no STF em sua súmula nº 149 diz: “ é imprescritível a


ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no art. 27 dispõe que “ o


reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e
imprescritível”.

Sem dúvida o sistema brasileiro consagrou a imprescritibilidade para as


ações de paternidade, porém é fato a normatização da limitação temporal em
situações peculiares, como o dado no art. 1614 do Código Civil.

Assim, aponta o julgado do Desembargador Rui Portanova do Tribunal


de Justiça do Rio Grande do Sul, segundo o qual “a peculiaridade de cada caso
será norteada pela investigação da paternidade sócio-afetiva”, tal posição
mostra-se interessante, pois concilia a imprescritibilidade prevista no art. 1601
com a previsão do artigo 1614.

Outro ponto desse estudo é a evolução do exame de DNA e a


importância para a instrução probatória do processo.

O desenvolvimento das técnicas do exame de DNA tornou possível uma


probabilidade de acerto de 99,99 por cento na identificação da paternidade,
tornado, dessa forma, um importante meio de prova.

A Sociedade Brasileira de Medicina Legal reuniu em uma publicação


intitulada:“ Teste de paternidade através do DNA: Recomendações para
laboratórios”, um conjunto mínimo de requisitos que devem ser cumpridos
pelos laboratórios que atuam na área.
A presunção legal decorrente da negação de se submeter a exame
médico. O código Civil nos artigos 231, 232 versa sobre o tema.

Os doutrinadores ao versarem sobre estes dispositivos aludem as ações


de investigação de paternidade. Ricardo Fiuza tem o entendimento de que ao
se negar fazer o exame de DNA para a comprovação de um fato não poderá
aproveita-se dessa recusa, assim ao se negar fazer o exame alegando violação
à sua privacidade, terá a presunção ficta da paternidade.

A prova testemunhal muitas vezes é utilizada, porém com reservas, pois


os demandados muitas vezes, utilizavam desse meio para denegrir a imagem
das mulheres. Os doutrinadores também têm suas reservas quando um
suposto pai se recusa a submeter-se a exame de DNA.

Para a magistrada gaúcha Maria Berenice Dias, a ausência de prova


pericial não pode levar a um juízo de improcedência. A solução adotada ante a
ausência de prova nas ações de investigação de paternidade devem ser
repensadas:

“o que se verifica é a falta de pressuposto ao eficaz desenvolvimento


da demanda, ou seja, a impossibilidade de formação de um juízo de certeza, o
que impõe a extinção do processo nos termos do inc. IV, do art. 267, do CPC.
Tal solução geraria uma sentença terminativa, viabilizando qualquer das partes
retornar ao judiciário, munida de melhores e seguras provas, para a
identificação da verdade no estabelecimento do vínculo mais caro ao ser
humano.

Não se está diante de pressupostos processuais violados, mas a uma


questão técnica relativa à possibilidade de produção de provas.

Processualmente, poderia se considerar, que na falta de provas, a


demanda seja julgada improcedente por falta de provas, para futuramente se
propor nova ação com novos elementos, para isso seria necessário previsão
legal o que não ocorre no caso em espécie.

A Súmula 301 do STJ: “ em ação investigatória, a recusa do suposto pai


a submeter-se ao exame de DNA induz presunção júris tantum de
paternidade”.
Caio Mario da Silva Pereira vê com reservas a presunção de
paternidade por recusa para quem:

“prejudicada a prova pela recusa do investigado em participar do


exame genético poderá o juiz, excepcionalmente, considerar que os demais
elementos convencem da certeza de paternidade”.

O art. 467 do CPC dispõe que se denomina coisa julgada material a


eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença não mais sujeita a recurso
ordinário ou extraordinário.

No direito moderno a decisão do juiz deve assegurar a estabilidade de


modo que seja precluso um novo juízo sobre o mesmo objeto e que o conteúdo
da decisão seja respeitado e vinculante. Na prática, o instituto garante o fim
das lides, a garantia dos direitos e a estabilidade dos julgados, contribuindo
com a pacificação social.

Vale destacar a diferença entre coisa julgada formal e material:

“Pela coisa julgada formal, temos a preclusão máxima enquanto


impossibilidade de rediscussão da matéria dentro de mesmo processo; já a
coisa julgada material diz respeito à total vedação ao reexame da matéria em
uma outra relação processual como regra geral”.

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