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EMPREGO DE PROCESSO PROIBIDO


OU DE SUBSTÂNCIA NÃO PERMITIDA

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51.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO


CRIME

O tipo legal de crime está contido no art. 274 do Código Penal:

“empregar no fabrico de produto destinado ao consumo, revestimento,


gaseificação artificial, matéria corante, substância aromática, anti-séptica,
conservadora ou qualquer outra não expressamente permitida pela legislação
sanitária”.

A pena é reclusão, de um a cinco anos, e multa.

A norma tutela, uma vez mais, a incolumidade pública, no caso, a saúde da


coletividade, contra o perigo de danos causados pela conduta incriminada.

Sujeito ativo é qualquer pessoa que realizar a conduta típica. Sujeito passivo é o
Estado, a coletividade.

51.2 TIPICIDADE

O art. 274 contempla a fabricação, por meio de processo proibido, de produto


destinado ao consumo. O art. 276 incrimina outras condutas que recaem sobre o produto
já fabricado indevidamente, por isso será analisado em conjunto com o tipo do art. 274.

51.2.1 Forma típica do art. 274


2 – Direito Penal III – Ney Moura Teles

51.2.1.1 Conduta, elementos objetivos e normativos

Empregar é utilizar. Fabrico é a elaboração, a criação, por qualquer meio, de um produto.


Produto destinado ao consumo é aquele elaborado para que as pessoas possam adquiri-lo e
utilizá-lo para a satisfação de suas necessidades. Trata-se, evidentemente, de produto que,
consumido, de qualquer forma, pelas pessoas, possa afetar a saúde, até porque o tipo compõe
os crimes contra a saúde pública. Não se trata, portanto, de qualquer produto, mas daquele
que, por sua natureza, pode afetar a saúde das pessoas. Assim estão abrangidos os produtos
alimentícios, medicinais e qualquer outro destinado ao consumo das pessoas, da comunidade,
da coletividade.

A incriminação recai sobre o emprego de determinados processos ou substâncias não


expressamente permitidos pela legislação sanitária. Cuida-se, portanto, de norma penal em
branco, que será complementada pelas normas legais ou editadas pelos órgãos da
administração da saúde pública, às quais deve o julgador recorrer para o cerramento do
tipo.

A norma refere-se a alguns processos e substâncias cujo emprego deve estar


expressamente permitido em regulamento. Revestimento é a película ou capa aplicada ao
produto quando de sua elaboração, a ele se integrando, com o fim de conservá-lo, protegê-
lo ou dar-lhe apresentação. Gaseificação artificial é o processo de adicionamento de
substâncias que provocam a dissolução dos gases inerentes ao produto. Matéria corante,
natural ou artificial, é a substância que dá ou aumenta a coloração do produto. Substância
aromática é a que cria ou realça o aroma do produto. Anti-séptica é a substância que
destrói microorganismos nocivos ou dificulta ou impede sua proliferação no produto.
Conservadora a que mantém a integridade do produto contra a ação de microorganismos
nocivos.

A fórmula de encerramento da norma, “qualquer outra não expressamente permitida


pela legislação sanitária”, deve ser interpretada analogicamente às substâncias indicadas
expressamente.

Só será permitido o emprego de processo ou substância autorizado pelo órgão da


administração sanitária por meio de seus atos normativos. Estando o processo ou a
substância, inclusive em quantidade ou qualidade, fora da permissão legal ou
regulamentar, seu emprego importa no reconhecimento da tipicidade.

O crime é de perigo abstrato, presumido pela norma. Não precisa ser demonstrado;
Emprego de Processo Proibido ou de Substância não Permitida - 3

todavia, o emprego do processo ou substância não permitido deve ser cabalmente


demonstrado, através de prova pericial.

51.2.1.2 Elemento subjetivo

Deve o agente estar consciente de que emprega processo ou substância não


permitido pelas normas legais e regulamentares. Sem essa consciência, haverá erro de tipo,
excludente do dolo e da tipicidade, porque não há modalidade culposa. Consciente da
conduta, deve o agente atuar com o dolo genérico, com a vontade de realizá-la livremente e
sem qualquer outra finalidade especial.

51.2.1.3 Consumação e tentativa

A consumação ocorre no instante em que o agente emprega, na fabricação do


produto, o processo ou a substância não permitido pela legislação sanitária. Não se exige
que, em razão da conduta, ocorra qualquer resultado lesivo ou a exposição a perigo de
qualquer bem jurídico. A tentativa é perfeitamente possível, o que ocorre quando o agente
não consegue, por circunstâncias alheias a sua vontade, empregar o meio ou a substância.

51.2.2 Forma típica do art. 276

51.2.2.1 Conduta e elementos do tipo

O art. 276 comina pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa para quem
“vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a
consumo produto nas condições” do art. 274, isto é, produto fabricado com o emprego de
uma das substâncias ou de um dos processos não permitidos pela legislação sanitária. É
crime que será cometido por outra pessoa que não o agente que realizou o tipo do art. 274.
Se for este o autor da fabricação do produto, responderá apenas pelo crime anterior,
porque o segundo crime será post factum impunível.

Vender é alienar a título oneroso. Expor à venda é mostrar, oferecer o produto aos
consumidores. Ter em depósito para vender é guardar, estocar, armazenar com a finalidade
de depois vender. Entregar de qualquer forma a consumo é dar, emprestar, distribuir, fazer
chegar às mãos de uma quantidade indeterminada de pessoas.
4 – Direito Penal III – Ney Moura Teles

Também é crime de perigo abstrato, não necessitando ser provado, mas devendo
ser demonstrado pericialmente que o produto foi efetivamente fabricado com infração das
normas da legislação sanitária.

Para realizar o tipo o agente deve estar consciente de que o produto encontra-se nas
condições mencionadas e atuar com vontade livre de realizar uma das condutas
incriminadas. A modalidade típica “ter em depósito” exige o elemento subjetivo, que é a
finalidade de vender. Não se exige qualquer outro fim especial.

51.2.2.2 Consumação e tentativa

A consumação coincide com a venda, a exposição à venda, a guarda ou a entrega do


produto. A tentativa só não é possível na modalidade típica de ter em depósito.

51.2.3 Formas qualificadas pelo resultado

Incidem, segundo o art. 285 do Código Penal, as formas qualificadas pelo resultado
descritas no art. 258. Se do fato resultar lesão corporal de natureza grave, a pena será
aumentada de metade. Se resultar morte, será aplicada em dobro. São crimes
preterdolosos. Há dolo na realização da conduta e culpa na produção do resultado não
desejado nem aceito pelo agente.

Se o agente tiver realizado a conduta com a finalidade de causar o resultado mais


grave em relação a uma ou mais pessoas determinadas, haverá crime de resultado contra a
pessoa integralmente doloso. Se o fizer com o fim de produzir o resultado mais grave em
relação a um número indeterminado de pessoas, haverá concurso formal imperfeito entre
o crime de perigo e tantos quantos sejam os crimes contra a pessoa.

51.3 AÇÃO PENAL

A ação penal é de iniciativa pública incondicionada, sendo possível a suspensão


condicional do processo penal, salvo nas formas qualificadas pelo resultado.

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