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DIREITOS HUMANOS: UTOPIA DISTANTE

Ontem visitei pela ensima vez o antigo Cepaigo. Ainda a caminho do presdio falava para as duas jovens estagirias da promotoria, curiosas e vidas por conhecimento e que me acompanhariam naquele ato de rotina, que assim procedo desde 1995. Numa dessas idas quase no voltei, verdade. Na rebelio liderada pelo famoso Leonardo Pareja, em 1996, fiquei uma semana preso. Uma constatao quase absurda, nesses 16 anos, a de que no h nada to ruim que no possa piorar um pouco mais. Os direitos humanos caminham, nos presdios goianos, na contramo da histria. Onde h menos de duas dcadas havia 500 homens, hoje h 1500. Ocupando os mesmos espaos, em prdios que h muito gritam silenciosamente para serem jogados ao cho. No diferente, porm, o trato com os direitos humanos do lado de fora da priso. A polcia, do lado de c dos muros, chamada a resolver a qualquer custo as deficincias da segurana pblica, torna-se truculenta, trabalha em guerra. Grave erro, pois dessa guerra retrica s restam vtimas civis. A plateia, que nunca se incomoda com a violncia oficial a no ser quando a vtima est muito prxima, se diverte com o espetculo monstruoso, inerte, aptica e insensvel. Policiais suspeitos da prtica do extermnio tornam-se heris, a exemplo do nada fictcio personagem Capito Nascimento. Defensores de direitos humanos, alguns convivendo diuturnamente sob ameaa de morte (minha solidariedade, Pe. Geraldo!), so ridicularizados por pseudojornalistas que se banham em sangue em frente s cmeras de televiso. Cad os direitos humanos? o que sempre perguntam, como se quisessem mesmo a resposta do passivo telespectador. Gosto muito da noo de utopia de que fala Boaventura de Sousa Santos, fadada a acontecer, desde que haja a vontade dos homens, pois a humanidade tem o direito de desejar e lutar por algo radicalmente melhor. S no percebo vontade de mudana em Gois. Com tantas atrocidades cometidas pelo Estado dentro e fora do crcere, no sei se d para acreditar em dias melhores para os direitos humanos. Talvez Ceclia e Flvia, aquelas duas meninas que comigo ontem conheceram a penitenciria, possam mostrar alguma luz.

HAROLDO CAETANO DA SILVA PROMOTOR DE JUSTIA haroldocaetano@gmail.com

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