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De janeiro a setembro, número de crianças ocupadas passou de 88 mil para 132 mil em seis
regiões metropolitanas
Crianças
recolhem papel
perto da rua 25 de
Março, no centro
de SP
O número de crianças trabalhadoras na faixa etária de 10 a 14 anos cresceu nas seis principais
regiões metropolitanas do país nos primeiros nove meses do governo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Em setembro, o aumento foi de 50% em relação a janeiro e de 76% em relação a
setembro do ano passado.
Os dados são da PME (Pesquisa Mensal de Emprego), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística), feita mensalmente nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio, Recife, Salvador,
Belo Horizonte e Porto Alegre.
Segundo a pesquisa, o contingente de crianças trabalhando nos seis centros urbanos passou de 88
mil em janeiro para 132 mil em setembro. É o maior número apurado desde março de 2002,
quando o IBGE passou a tabular os dados desta faixa etária. Em setembro de 2002, o contingente
era de 75 mil crianças.
O trabalho exercido por crianças e adolescentes de até 15 anos é ilegal no Brasil. É permitido que o
jovem de 16 ou 17 anos trabalhe na condição de aprendiz, desde de que frequente a escola.
Para o gerente da PME, Cimar Pereira, o aumento do número de crianças que trabalham é
consequência da queda na renda do trabalhador. Segundo ele, o fenômeno está em linha com o
verificado, de maneira mais ampla, pela PME de setembro -um crescimento do número de pessoas
que não trabalhavam antes e que entraram no mercado para complementar o orçamento familiar.
Em setembro passado, a renda média real (já descontada a inflação) do trabalhador caiu 14,6% em
relação a setembro de 2002 -o nono mês consecutivo de queda nesse tipo de comparação. A taxa de
desemprego no mês foi de 12,9%, contra 11,5% em setembro de 2002.
Pereira ressalta, entretanto, que a participação da faixa etária de 10 a 14 anos no total da população
que trabalha é pouco representativa, o que aumenta a margem de erro da pesquisa.
Em janeiro, 2,5% das crianças de 10 a 14 anos trabalhavam. Em setembro, esse percentual subiu
para 3,7%.
Também aumentou em 44,4% a procura por trabalho nessa faixa de idade. Em setembro passado,
eram 26 mil considerados desempregados, ou seja, que afirmaram estar procurando trabalho. Em
janeiro, eram 18 mil.
Para o economista Claudio Dedecca, da Unicamp, os números são "significativos e preocupantes",
pois mostram uma tendência de crescimento do trabalho infantil no país.
"Segundo a Constituição, não deveria existir trabalho nesse grupo. É um sinal de que a deterioração
do mercado está empurrando os filhos para o trabalho. Isso significa perda da infância, do lazer e
má formação escolar", disse.
Na avaliação de José Roberto Novaes, economista da UFRJ (Universidade Federal do Rio de
Janeiro), os programas do governo, como o Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil),
são necessários, mas insuficientes para acabar com o problema. "O assistencialismo tem que ser
feito, mas é preciso que seja entendido como circunstancial."
A maior parte do crescimento do trabalho infantil ocorreu no Rio e em São Paulo, onde a
população de 10 a 14 anos ocupada quase dobrou desde o início do ano, passando de 50 mil para
90 mil de janeiro a setembro.
Foi exatamente nessas duas regiões metropolitanas que a queda da renda e o aumento do trabalho
informal (sem carteira assinada) mais se acentuaram em setembro.
A pesquisa do IBGE é feita por amostra e abrange 38 mil domicílios. As perguntas sobre a situação
de emprego e renda são feitas para cada membro da família com 10 anos de idade ou mais.
O IBGE pergunta se a pessoa trabalhou na semana que passou. Se trabalhou, o IBGE segue com
questões sobre o tipo de ocupação, remuneração, quantidade de horas trabalhadas e se o emprego
teve carteira assinada. Se não trabalhou, o entrevistado responde se gostaria de trabalhar e se estava
disponível para trabalhar.
J.C. começou a trabalhar há cerca de seis meses. Logo depois, abandonou a escola. Ele fazia
malabarismo em sinais de trânsito, mas atualmente vende balas em uma esquina do Leblon (zona
sul do Rio de Janeiro). Tem 13 anos, mas aparenta menos.
O menino mora em Benfica (zona norte da cidade) com a mãe, empregada doméstica, e com o
irmão de 16 anos, que também deixou de estudar e vende balas em esquinas há três anos. O pai é
porteiro de um prédio de classe média alta na zona sul.
J. afirma que a decisão de trabalhar foi sua. Ele diz que arrecada entre R$ 20 e R$ 30 a cada dia. O
menino abandonou os estudos na 5ª série do ensino fundamental.
Na Baixada Fluminense (região metropolitana), a ONG Casa da Cultura estimula crianças a parar
de trabalhar e voltar a estudar. Uma delas, R.A.S., 11, trabalhou durante dois anos em um açougue.
Sua função era afastar as moscas da carne. Por esse trabalho, ganhava R$ 10 por semana.
Filho mais velho de uma mãe que teve cinco pares de gêmeos, R.A.S. voltou a estudar, registra
ótimas notas e joga futebol na Casa da Cultura. Em compensação, o irmão L.S., 8, passou a
trabalhar em seu lugar no açougue. A mãe, faxineira, engravidou de novo e precisava do dinheiro.
(FABIANA CIMIERI)
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