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CALAGEM, COBALTO E MOLIBDÊNIO NO DESENVOLVIMENTO DE SOJA PERENE

(NEONOTONIA WIGHTII, LAKEY) CV. TINAROO

Valdinei Tadeu Paulino1, Newton de Lucena Costa2, Márcia Atauri Cardelli de Lucena3
1Pesquisador científico do CPDNAP do Instituto de Zootecnia, APTA/SAA, E-mail: paulino@iz.sp.gov.br;
2Pesquisador da Embrapa Roraima, Boa Vista, Roraima. E-mail: newton@cpafrr.embrapa.br
3Pesquisadora científica do CPNAP. Instituto de Zootecnia, APTA/SAA. E-mail: lucena@iz.sp.gov.br

Resumo: Foram estudados os efeitos da aplicação de níveis de calagem (ausência, calagem para elevação
da saturação por bases a 35% e 70%) combinados com a aplicação dos nutrientes cobalto (0 ou 0,10 ppm)
e molibdênio (0 ou 0,20 ppm) em arranjo fatorial com quatro repetições, sobre a nodulação, fixação de
nitrogênio, produção de matéria seca e teores de cobalto e molibdênio em soja perene (Neonotonia wighti,
Lakey) var. Tinaroo cultivada em solo Latossolo Vermelho-escuro álico). A calagem aumentou
significativamente a produção de matéria seca, acumulação de nitrogênio e a nodulação. Embora a
nodulação fora aumentada pela calagem, de uma maneira geral o peso seco e número de nódulos foram
bastante baixos, indicando que as estirpes de Rhizobium presente ou inoculada no solo deixaram a desejar
com relação infecção radicular. Fato esse que resultou reduções na acumulação de nitrogênio total na
parte aérea no segundo corte. O emprego de molibdênio favoreceu as acumulações de nitrogênio no
primeiro corte. Os conteúdos de Mo oscilaram entre 0,03 e 4,68 ppm, sendo incrementados com a
calagem. A aplicação de Co incrementou os conteúdos desse micronutriente na parte aérea da soja perene,
porém, à medida que os valores de pH do solo incrementaram com a calagem, houve reduções na
disponibilidade de cobalto.

Palavras-chave: leguminosa forrageira, micronutrientes, nitrogênio total

Lime, cobalt and molybdenum on legume forage development Neonotonia wigthii (Lakey)
Abstract: The effects of lime and micronutrients (molybdenum and cobalt) application on growth,
nodulation, nitrogen accumulation in soybean perennial (Neonotonia wightii (Lakey) var. Tinaroo,
cultivated in alic Red Dark Latosol soil were studied. Three levels of lime were applied for the legume
(equivalent to zero, lime to raise the base saturation index to 35% or to 70%). Twelve treatments were
arranged in randomized complete block design with four replications in pot trials. The dry matter
production of shoots, total nitrogen and nodulation were significantly increased by the application of lime
levels. The use of molybdenum resulted in favorable effects upon nitrogen accumulated. The
molybdenum contents placed into 0.03 to 4.68 mg per kg. The utilization of both cobalt and molybdenum
increased significantly the contents of these micronutrients. Lime favored the absorption of Mo, but
decreased Co absorption.

Keywords: legume forage, micronutrients, nitrogen accumulation

Introdução
As leguminosas forrageiras são plantas fixadoras de nitrogênio biológico, além de servir como
alimento de melhor qualidade, introduzem o nitrogênio no sistema de maneira mais econômica, com
redução da necessidade de uso de nitrogênio mineral por fertilizantes. Essas plantas podem ser cultivadas
em pastos consorciados, bancos de proteína, ou usadas como forragem conservada para alimentação
animal. Alguns estudos mostram que as leguminosas apresentam uma capacidade variável em tolerar
estresses nutricionais no solo. A maior parte dos solos cultivados com forrageiras são ácido com
problema de toxidez de Al e de Mn e de baixa fertilidade, exigindo a calagem para neutralização da
toxidez desses elementos e uma adequada nutrição mineral. A soja perene ocupa posição de destaque, por
sua persistência e bom valor nutritivo. Paulino (1990) demonstrou que a soja perene responde à calagem
em solos ácidos. Por outro lado, um dos fatores limitantes de fertilidade do solo ao sucesso da fixação
biológica do N2 leguminosas é a deficiência de micronutrientes, com destaque ao molibdênio e ao
cobalto.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar os efeitos de níveis de calagem sobre a produção de
matéria seca, acumulação de nitrogênio, nodulação e da presença ou ausência de molibdênio e cobalto
sobre os conteúdos desses micronutrientes em soja perene (Neonotonia wightii, Lakey) cv. Tinaroo
cultivada em um solo Latossolo Vermelho-Escuro álico.

1
Material e Métodos
O presente trabalho foi conduzido em condições de casa-de-vegetação, num solo Latossolo
Vermelho-escuro álico, sendo cultivada a soja perene (Neonotonia wightii, Lakey) cv. Tinaroo, no
Instituto de Zootecnia em Nova Odessa/SP. Essa leguminosa foi cultivada em vasos de cerâmica
contendo 4kg de solo. A calagem, proposta para elevar o índice de saturação por bases do solo (RAIJ,
1981), foi realizada com calcário calcinado com PRNT (Poder Relativo de Neutralização Total) de 130%,
contendo 44% de CaO e 20% de MgO. Foram estudados os seguintes níveis de calagem (Cal zero . sem
calcário, Cal 1 . calagem para elevação da saturação com bases a 35% e Cal 2 . para elevação da saturação
por bases a 70%). O corretivo foi misturado com o solo, acrescentando água destilada e deionizada,
elevando a umidade até próximo à capacidade de campo. Após um período de incubação de 45 dias foram
semeadas 30 sementes de soja perene, após desbastes periódicos, foram deixadas 5 plantas por vaso.
Nessa ocasião, as plântulas foram inoculadas com 1,0 ml por planta de uma suspensão de células de
Rhizobium, com aproximadamente 108 bactérias por ml.
Os nutrientes P (superfosfato simples), K (cloreto de potássio), S (superfosfato simples) e os
micronutrientes (B - ácido bórico, Co - cloreto de cobalto, Cu - sulfato de cobre, Fe - sulfato ferroso, Mo
- molibdato de sódio e Zn - sulfato de zinco) foram aplicados na semeadura na forma de solução nutritiva.
Em quantidades (mg/kg) equivalentes a: P = 125, S = 170, B = 0,75, Cu = 0,75, Zn = 1,50, Fe = 5,00, Co
= 0,10 e Mo = 0,20.
O experimento foi conduzido usando um delineamento experimental de blocos ao acaso, em
arranjo fatorial, com quatro repetições. Os fatores estudados foram cobalto (presença e ausência),
molibdênio (presença e ausência) e calagem (Sem calagem, Cal 1 e Cal 2). Foram realizados dois cortes
de avaliação (o primeiro aos 47 dias após o plantio, e o segundo 37 dias após o primeiro). A parte aérea
foi coletada e o material foi seco em estufa a 65° por 48 horas. As raízes foram separadas do solo, através
de jatos de água corrente. A seguir, procedeu-se a remoção, purificação dos nódulos e sua contagem. As
raízes foram lavadas com água destilada e deionizada. As análises dos micronutrientes cobalto e
molibdênio foram realizadas no Centro de Energia Nuclear na Agricultura em Piracicaba, SP, conforme
metodologias propostas por Bataglia et al., 1983. As análises de variâncias, comparações de médias,
através do Teste de Tukey, e as análises de regressão foram realizadas, através dos Programas SAS.

Resultados e Discussão
A aplicação de calcário incrementou linearmente, os rendimentos de matéria seca (da parte aérea,
das raízes e da planta inteira), acumulações de nitrogênio e a nodulação, até a dose equivalente a 2,89 t de
calcário/ha, proposta para elevar o índice de saturação por bases a 70 %, para esse nível de calagem os
rendimentos da soja perene em termos de matéria seca da planta inteira, foram incrementados em 157 %
em relação à ausência de calagem (Tabela 1).

Tabela 1. Produção de matéria seca, nitrogênio acumulado e nodulação da soja perene em função dos
níveis de calagem (calagem 1 e calagem 2, propostas para elevação da saturação por bases à
35 e 70%, respectivamente).
Tratamentos Matéria seca - g/vaso N total acumulado Nodulação
mg/vaso
1º Corte 2º Corte Raízes Planta Inteira 1º Corte 2º Corte Número Peso Seco

Sem calagem 5,59 1,69 1,32 3,01 171 41 17 9


Calagem 1 6,69 3,23 1,63 4,86 203 93 113 53
Calagem 2 7,92 6,04 1,69 7,73 235 178 209 105
Reg. Linear ** ** ** ** ** ** * *
Reg. Quadrática ns ns ns ns ns ns ns ns
Equações de Matéria seca (1º corte) Calagem sem Molibdênio Y= 5,07 + 0,045x
regressão para Calagem com Molibdênio Y= 6,11 + 0,018x
interações Nitrogênio total (1º corte) Calagem sem Molibdênio Y= 172,4 . 0,21x + 0,020x2
significativas Calagem com Molibdênio Y= 179,8 + 0,60x

Esses resultados concordam com a maioria dos estudos realizados com essa espécie, que
apontam à sensibilidade da soja perene às condições de acidez do solo (Munns & Fox, 1977 e Paulino,
1990). Além da eliminação de Al e Mn tóxicos, a calagem melhorou o suprimento de Ca (de 9 para 28
mmolc/dm3) e de Mg (1 para 12 mmolc/dm3) no solo, favorecendo o crescimento e a nodulação. A
nodulação foi bastante baixa indicando que a estirpe de Rhizobium presente no solo ou inoculada
deixaram a desejar em relação à infecção radicular. Isto refletiu na eficiência da fixação biológica de N,
com reduções nas acumulações de N no segundo corte comparado ao primeiro corte. Para o peso de
matéria seca da parte aérea no primeiro corte, a interação calagem x molibdênio foi significativa, e o

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desdobramento dessa interação mostrou efeito positivo e linear da calagem tanto em presença como na
ausência de aplicação de molibdênio. A prática da calagem ressaltou os efeitos do uso de Mo,
possivelmente por aumentar a disponibilidade do Mo presente no solo ou o adicionado. A falta de
resposta à adição de Mo, na ausência de calagem resultou em menores acumulações de N, o que permite
supor que esse micronutriente foi adsorvido pelos colóides do solo. Por outro lado, Reisenauer et al.
(1962) propõem que a alta disponibilidade de Mn no solo pode influenciar a não resposta ao molibdênio.

Tabela 2. Teores de molibdênio e de cobalto (ppm) na matéria seca da parte aérea para os níveis de
calagem (calagem 1 e calagem 2, propostas para elevação da saturação por bases à 35 e
70%,respectivamente) mediante à aplicação ou não dos micronutrientes.
Níveis de Calagem Molibdênio (ppm) Cobalto (ppm)
Sem Mo Com Mo Sem Co Com Co
Sem calagem 0,03 b 2,37 a 0,14 b 0,26 a
Calagem 1 0,44 b 3,33 a 0,11 b 0,21 a
Calagem 2 2,47 b 4,68 a 0,07 a 0,12 a
Médias seguidas pelas mesmas letras, dentro de cada nível de calagem não diferem entre si, pelo testede Tukey à
5%.

A calagem incrementou, como era esperado, os conteúdos de Mo que oscilaram entre 0,03 (sem
Mo e sem calagem) a 4,68 ppm (com Mo e com calagem) (Tabela 2). Na ausência de calagem e sem
aplicação de Mo, o conteúdo desse micronutriente situou-se abaixo de 0,1 ppm, concentração descrita em
plantas deficientes (Kabata-Pendias & Pendias, 1984). Os aumentos nos conteúdos de Mo, mediante a
calagem, ajustaram-se as seguintes equações: a) Sem uso do Mo: Y= 0,03 . 0,012x + 0,00061 x2 e b)
Com uso de Mo: Y= 2,31 + 0,33x. Enquanto a disponibilidade do Mo aumenta com a correção da acidez,
a do cobalto diminui. Os conteúdos de Co variaram significativamente com a calagem (P<0,05), a
interação calagem x cobalto foi significativa em ambos cortes. Os conteúdos de Co apresentaram-se
acima de 0,07 ppm considerado limite mínimo de deficiência de cobalto na matéria seca de forrageiras
(Kabata-Pendias & Pendias, 1984).
O desdobramento da interação revelou que adição de Co elevou seus conteúdos na parte aérea da
soja perene, na ausência ou no nível de calagem para elevar a saturação por bases a 35%. Entretanto
quando a calagem foi proposta para elevar a saturação por bases a 70%, os teores de Co foram
semelhantes, com ou sem o emprego desse micronutriente. Verificaram-se reduções lineares nos teores de
Co, tanto em presença (Y= 0,34 . 0,0035x) como na ausência da aplicação de Co (Y= 0,15 . 0,0015x),
decorrentes da calagem. Esse fato é esperado porque a disponibilidade do Co é maior em condições de
acidez.

Conclusões
A aplicação de calcário beneficiou o desenvolvimento e acumulações de nitrogênio e nodulação
da soja perene cv Tinaroo. O emprego do micronutriente molibdênio beneficiou a fixação biológica de N,
resultando em maiores acumulações de N, de matéria seca. A aplicação dos micronutrientes (cobalto e
molibdênio) elevou os conteúdos desses nutrientes à níveis não limitantes para o desenvolvimento de soja
perene.

Literatura citada
1. BATAGLIA, O.C. et al. Métodos de análise química de plantas. Bol. Tec., IAC, Campinas, 78:
48p., 1983.
2. KABATA-PENDIAS,A.; PENDIAS, H. Trace elements in soils and plants. Boca Raton, Florida, CRC
Press Inc. 259 p. 1984.
3. MUNNS, D.N.; FOX, A.L. Comparative lime requirement of tropical and temperate legumes. Plant
and Soil, Hague, 46: 533-548, 1977.
4. PAULINO, V.T. Efeito da fertilização fosfatada, da calagem e micronutrientes no
desenvolvimento de plantas forrageiras. Piracicaba: Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz 1990. 290p. Tese. (Doutorado em Agronomia), 1990.
5. REISENAUER, H.M.; TABIKH; A.A.; STOUT, P.R. Molybdenum reactions with soils and hydrous
oxides of iron, aluminum and titanium. Proc. Soil Sci. Soc. Amer., Madison, 26:23-7, 1962.

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