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FUNDAMENTOS DA FÍSICA MODERNA E CONTEMPORÂNEA

Unidade V – TEORIA DA MATÉRIA CONDENSADA

SÓLIDOS CRISTALINOS – A TEORIA DE BANDAS EM SÓLIDOS

A Física Quântica descreve os estados permitidos dos elétrons em um átomo


de acordo com quatro números quânticos que os elétrons podem assumir neste
átomo. Mas estes mesmos elétrons, de acordo com a disponibilidade de
estados, poderão trocar seus números quânticos (trocar de nível e subnível).
Uma vez que o nível está intimamente relacionado à quantidade de energia
que o elétron possui, saltos entre níveis (ou entre subníveis) exigem que se
tenha transferência de energia. Para um elétron se mover para uma camada de
energia superior há a necessidade de se transferir uma quantidade adicional de
energia proveniente de uma fonte externa. Inversamente, o elétron que pula de
uma camada mais alta para uma mais baixa emite o excedente de energia na
forma de radiação eletromagnética. Nem todos os saltos eletrônicos são iguais,
pois os saltos entre as diferentes camadas eletrônicas requerem uma
quantidade substancial de energia, mas os saltos entre as subcamadas (ou
subníveis) requerem trocas menores energias. Quando os átomos se
combinam para formar substâncias compostas, as camadas mais externas,
subcamadas e orbitais se misturam formando um grande número de níveis de
energia para que os elétrons possam ocupar. Quando há um grande número
de átomos próximos uns dos outros, esses níveis de energia disponíveis
formam uma banda aproximadamente contínua por onde os elétrons podem se
mover. Veja figura 1.

É a largura dessas bandas e sua proximidade com os elétrons existentes que


determinam quão móveis esses elétrons serão quando expostos a um campo
elétrico. Em substâncias metálicas, as bandas vazias se sobrepõem às bandas
que contêm elétrons, significando que os elétrons de um único átomo podem
se mover para o que normalmente seria um estado de mais alto nível com

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pouca ou nenhuma energia adicional destinada para essa transição. Assim, os
elétrons mais externos são ditos livres e têm movimento fácil mesmo em se
aplicando um campo elétrico fraco.

Figura 1: A figura mostra como o aumento do número de átomos faz com


que os níveis de energia se aproximem formando bandas contínuas.

A superposição das bandas não ocorrerá em todas as substâncias, não


importando quantos átomos estejam próximos uns dos outros. Em algumas
substâncias, um gap substancial permanece entre a banda mais alta cheia de
elétrons (a chamada banda de valência) e a banda mais próxima que está
vazia (a banda de condução). Veja a figura 2.

Figura 2: No diagrama está representado um gap de energia grande o


suficiente para que o salto entre a banda de valência e a banda de
condução dificulte a condução em um isolante elétrico.

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O resultado é que os elétrons de valência estão ligados aos seus átomos
constituintes e não podem se tornarem móveis dentro de uma substância sem
uma quantidade significativa de energia fornecida. Essas substâncias são os
isolantes elétricos.

Materiais que caem dentro da categoria dos semicondutores têm um estreito


gap entre as bandas de valência e de condução. Assim, a quantidade de
energia requerida para promover uma transição de um elétron de valência para
a banda de condução onde ele se torna móvel é bastante modesta. Veja figura
3.

Figura 3: Representação das bandas de valência e de condução para


materiais (a) semicondutores com um pequeno gap de energia e (b)
condutores, os quais são representados em sua grande maioria pelos
metais e possuem um gap insignificante de energia.
Em temperaturas baixas, pouca energia térmica há disponível para empurrar os
elétrons de valência através do gap, de forma que o material semicondutor atua
mais como um isolante elétrico. Em altas temperaturas, por outro lado, a
energia térmica ambiente torna-se suficiente alta para forçar os elétrons a
cruzar o gap, e o material aumentará sua condução elétrica. É difícil predizer as
propriedades condutoras de uma substância simplesmente examinando-se as
configurações eletrônicas de seus átomos constituintes. Embora os melhores
condutores metálicos de eletricidade (prata, cobre e o ouro) todos têm
subcamadas s mais externas com um único elétron, a relação entre o número
de elétrons de condução para os elétrons de valência não é necessariamente
consistente, ou seja, não forma uma regra. Para comparação, a tabela 1

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mostra vários metais com suas respectivas resistividades elétricas específicas
e configurações eletrônicas das últimas camadas. As configurações de bandas
eletrônicas de diferentes elementos desafia a ingênua associação com as
configurações eletrônicas de seus elementos constituintes.

Elemento ρ a 20°C Config. Elemento ρ a 20°C Config.


em μΩ.cm Elet. em μΩ.cm Elet.
Prata (Ag) 1.5870 4𝑑10 5𝑠1 Modibdênio 5.3397 4𝑑 5 5𝑠1
(Mo)
Cobre (Cu) 1.6774 3𝑑10 5𝑠1 Zinco (Zn) 5.9000 3𝑑10 4𝑠 2
Ouro (Au) 2.2144 5𝑑10 6𝑠1 Níquel (Ni) 6.9307 3𝑑 8 4𝑠 2
Alumínio 2.6499 3𝑝1 Ferro (Fe) 9.6105 3𝑑 8 4𝑠 2
(Al)
Tungstênio 5.2799 5𝑑10 6𝑠 2 Platina (Pt) 10.5000 5𝑑 9 6𝑠1
(W)
Tabela 1: Tabela mostrando os principais condutores, suas resistividades
elétricas específicas e suas distribuições eletrônicas nas ultimas
camadas.

O Gás de Fermi

Em Física Clássica, o comportamento de um gás é dado pela distribuição de


Maxwell-Boltzmann. Esta distribuição foi introduzida pela Mecânica Estatística
a fim de reunir a Mecânica Newtoniana e a Termodinâmica. Parte-se da
equação para uma única partícula, aplica-se para um sistema com um número
gigantesco de partículas e, portanto, de equações e, finalmente, aplica-se um
método estatístico para recuperar a Termodinâmica. Esse é um procedimento
que tem como conseqüência a obtenção de equações válidas para grandezas
macroscópicas a partir de uma dinâmica válida microscopicamente. Quando
um procedimento semelhante é aplicado para sistemas quânticos, uma
diferença substancial aparece: duas distribuições semelhantes à distribuição de
Maxwell-Boltzmann existem para tratar sistemas de partículas com spins
inteiros (bósons), que é a distribuição de Bose-Einstein, e a com spins semi-
inteiros (férmions), que é a distribuição de Fermi-Dirac. Exemplos de bósons

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são os fótons (spin 1) e os átomos de hélio 4 (spin 0) e exemplos de férmions
são os elétrons, os prótons e os nêutrons (spin ½). A característica principal de
cada uma das distribuições é que na distribuição de Bose-Einstein não há uma
limitação para se colocar um número grande de partículas em um mesmo
estado quântico e por causa disso pode ocorrer o fenômeno da condensação
de Bose-Einstein (do inglês, Bose-Einstein Condensation); já na distribuição de
Fermi-Dirac vale o Princípio de Pauli, que proíbe de colocar mais de um
férmion no mesmo estado. Assim, à temperatura 0 K, para um dado número de
estados quânticos com energia abaixo de uma dada energia (conhecida como
energia de Fermi, 𝜖𝐹 ), todos os estados ficam ocupados para um gás de
férmions, com um férmion para cada estado. Desse modo, a pressão de um
gás de férmions mesmo à temperatura 0 K é diferente de zero, embora a
pressão de um gás ideal não quântico nessa temperatura seja nula.

Um gás de Fermi é um modelo de um gás quântico de férmions não


interagentes, como se fosse um gás ideal. Os elétrons em um metal ou nos
semicondutores são exemplos de um gás de Fermi fracamente interagente. A
energia de Fermi define uma superfície em um espaço em que cada eixo
representa uma das componentes do momento linear. Essa energia no espaço
dos momentos recebe o nome de superfície de Fermi. Além da superfície de
Fermi, pode-se definir a temperatura de Fermi, que é a temperatura que define
um valor que, abaixo dele, o gás pode ser considerado degenerado, isto é,
todos os estados estão com a mesma energia. A temperatura de Fermi
depende da massa dos férmions e da densidade de estados de energia. Um
exemplo: para o caso dos metais, a temperatura do gás de Fermi (no caso, um
gás de elétrons) é muito alta (milhares de graus). Desse modo, à temperatura
ambiente um gás de elétrons é considerado degenerado e as interações são
desprezadas e o comportamento dinâmico é obtido tratando-o como um
sistema de partículas independentes. Porém, abaixando-se a temperatura, a
interação entre os férmions ocorre e o gás pode sofrer uma transição de fase
tornando-se um líquido de Fermi.

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Semicondutores – Elétrons e Buracos
Os semicondutores puros são considerados bons isolantes se comparados
com os metais, embora não tão bons isolantes quanto os verdadeiros isolantes
como a mica, o vidro ou o quartzo. Em aplicações que sejam úteis, o
semicondutor intrínseco, puro, sem dopagem (impurezas propositalmente
introduzidas), não possui mais que um átomo de impureza em dez bilhões de
átomos. Os semicondutores impuros (ou sujos) são mais condutores, mas
também não tão bons condutores feitos os metais. Como é esse mecanismo?

Figura 4: (a) Um semicondutor intrínseco é um isolante e possui a camada


externa fechada; (b) a energia térmica pode criar um par partícula-buraco
que faz com que o material fique fracamente condutor.
Na figura 4 há a apresentação de quatro elétrons na camada de valência de um
semicondutor formando ligações covalentes com quatro outros átomos. Todos
os elétrons de um átomo são unidos por quatro ligações covalentes (pares de
elétrons compartilhados). Os elétrons não são livres para se moverem em volta
no retículo cristalino. Assim, semicondutores intrínsecos (puros) não são
relativamente bons condutores se comparados aos metais. A energia térmica
pode ocasionalmente liberar do retículo cristalino um elétron. Este elétron é
solto para a condução e, uma vez liberado, é deixado um espaço vazio com
uma carga positiva no retículo cristalino conhecido como buraco. Esse buraco
não está fixo no retículo, mas está livre para se mover sobre ele, tal qual um
elétron. Ambos, elétron livre e buraco, contribuem para a condução. O elétron e
o buraco são livres até que se encontrem, quando então o elétron cairá no
buraco, fenômeno que se chama recombinação. Mas se um campo elétrico for
aplicado ao semicondutor, os elétrons e os buracos se deslocarão em direções
opostas e o aumento na temperatura aumentará o número de elétrons e de
buracos, diminuindo a resistência elétrica, caso contrário ao dos metais. Os

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elétrons e os buracos formam-se sempre em pares, mas os portadores não se
movem necessariamente com a mesma velocidade com a aplicação do campo
externo. Outra forma de dizer isto é que a mobilidade não é a mesma para
elétrons e buracos.

Os semicondutores puros em si não são úteis. Embora os semicondutores


devam ser refinados a um alto nível de pureza, a adição controlada de
impurezas faz deles substâncias especiais. Enquanto para o semicondutor puro
há uma parte de impureza em dez bilhões, podem-se adicionar impurezas até
uma parte em um milhão para aumentar o número de portadores de carga. A
adição de uma impureza específica e controlada recebe o nome de dopagem e
a impureza em si, de dopante. O dopante aumenta a condutividade de um
semicondutor de modo a torná-lo mais parecido a um metal do que a um
isolante. É possível tornar o número de portadores de carga negativa em um
retículo cristalino de um semicondutor dopando-o com um doador de elétrons
tal como o fósforo. Os doadores de elétrons são conhecidos como dopantes do
tipo N e incluem os elementos da tabela periódica: nitrogênio, fósforo, arsênio e
antimônio. O nitrogênio e o fósforo são dopantes do tipo N para o diamante;
fósforo, arsênio e antimônio são usados com o silício. O retículo cristalino de
silício da figura 5 em (a) contém átomos tendo quatro elétrons em sua camada
mais externa formando quatro ligações covalentes aos átomos subjacentes. (b)
A adição de um átomo de fósforo com cinco elétrons na camada mais externa,
isto é um elétron extra no retículo em comparação ao átomo de silício ou (c) de
boro, com três elétrons, em que um buraco com carga positiva é formado,
constituindo assim um dopante tipo P.

Figura 5: Em (a) o retículo cristalino feito de silício (Si) é dopado com (b)
fósforo (P) que é dopante tipo N ou com (c) boro (B), que é dopante tipo P.

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As impurezas pentavalentes formam quatro ligações covalentes com os quatro
átomos de silício e com quatro dos cinco elétrons, ajustando-se ao retículo com
um elétron deixado de fora. Note que este elétron não está ligado de forma
forte ao retículo como os elétrons normais dos átomos de silício estão. Ele é
livre para se mover no retículo cristalino, não sendo ligado ao sítio do retículo
onde se encontra o fósforo. Uma vez que é feita a dopagem de uma parte de
fósforo em 10 milhões de átomos de silício, muitos elétrons livres foram criados
comparados com os poucos pares de elétrons-buracos do silício intrínseco. A
aplicação de um campo externo produz uma forte condução no semicondutor
dopado na banda de condução (acima da banda de valência). Um nível de
dopagem maior produz mais intensa condução. Desse modo, um semicondutor
intrínseco que é muito pobre em condução pode ser convertido em um bom
condutor elétrico. Um raciocínio análogo é feito para a adição de boro (B) com
três elétrons na última camada, dando surgimento a uma grande formação de
buracos, portadores de carga positiva, que aumentarão a condução do
semicondutor formando uma dopagem do tipo P, mas com correntes de sentido
oposto ao do tipo N.

Estudo do Laser

A luz emitida pelo laser é diferente daquela produzida por fontes de luz comum
tais como as lâmpadas incandescentes e as lâmpadas fluorescentes. A luz do
laser possui monocromaticidade, isto é, todas as ondas possuem o mesmo
comprimento de onda ou a mesma freqüência de oscilação. Se a luz for visível,
pode-se afirmar que o laser possui uma só cor sem nenhuma mistura de outras
cores. A luz branca consiste de uma mistura de sete cores, cada uma com uma
freqüência de oscilação e um comprimento de onda. Ao passar por um prisma,
ela é decomposta em suas diversas cores pelo fato de comprimentos de ondas
diferentes sofrer também desvios diferentes após a refração pelo prisma.
Todas as fontes comuns emitem luz de muitos comprimentos de onda. A luz
branca é uma mistura de todas as cores do espectro visível. A luz colorida
ordinária consiste de uma ampla faixa de comprimentos de onda cobrindo uma
porção particular do espectro de luz visível. Por exemplo, a luz verde de um

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semáforo emite a porção inteira do verde do espectro como também alguns
comprimentos de onda na vizinhança da região do amarelo e do azul. O feixe
de laser de hélio-neônio, por outro lado, é de uma cor vermelha muito pura. Ele
consiste de uma faixa extremamente estreita de comprimentos de onda dentro
da porção vermelha do espectro. Ele é dito uma luz aproximadamente
monocromática. Esta proximidade da monocromaticidade é uma propriedade
única do laser, significando que ele consiste de luz de quase um único
comprimento de onda. Uma luz de perfeita monocromaticidade não pode ser
produzida até mesmo por um laser, porém a luz de um laser é muitas vezes
mais monocromática do que a luz de qualquer outra fonte. Em algumas
aplicações, algumas técnicas especiais são empregadas para estreitar a faixa
de comprimentos de onda contida na saída do laser e, dessa forma, aumentar
a monocromaticidade. Quanto à direcionalidade, a luz de uma lâmpada comum
é emitida em todas as direções. As lâmpadas conhecidas emitem dessa
maneira, mas sistemas ópticos presentes nos faróis dos carros e nas lâmpadas
do tipo spotlights colimam a luz emitida, de forma que ela deixa o dispositivo
em um feixe direcional de luz; entretanto, o feixe produzido sempre diverge
(espalha-se) mais rapidamente do que o feixe gerado por um laser. A luz do
laser, portanto, possui direcionalidade, que é a característica de manter-se em
uma única direção sem se dispersar em um cone largo (mas é dispersa em um
cone muito estreito, quase imperceptível). Mas, novamente, feixes
perfeitamente paralelos de luz direcional – que são conhecidos como feixes
colimados – não podem ser produzidos. Todos os feixes de luz eventualmente
se espalham (divergem) quando eles viajam pelo espaço, mas a luz de um
laser é altamente mais colimada (mais direcional) que a luz de uma fonte de luz
convencional e assim menos divergente. Em algumas aplicações, sistemas
ópticos são empregados com lasers para melhorar a direcionalidade do feixe
de saída. Um sistema desse tipo pode produzir uma mancha de luz de menos
de 1 km na Lua, sendo que ela está a cerca de 380 000 km da Terra.

Além das propriedades já citadas, a luz de um laser exibe a coerência, que


vem a ser a característica que um grupo de ondas tem de viajar em uma única
freqüência de oscilação e em uma única fase, isto é, quando uma das ondas

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chega a um máximo todas chegarão ao mesmo tempo e o mesmo valendo
para um mínimo. As ondas viajam em conjunto oscilando de forma “uníssona” e
são altamente colimadas. A luz ordinária é uma luz incoerente, pois além de ter
uma mistura de várias cores e, portanto, ser composta por ondas de diversas
freqüências, as ondas oscilam ao acaso, em múltiplas fases. Assim como a luz
do laser não pode ser perfeitamente monocromática ou perfeitamente
direcional, ela não pode ter coerência perfeita, ainda que seja de longe a luz
mais coerente do que qualquer outra luz proveniente de outras fontes. Técnicas
atualmente em uso melhoram de forma considerável a coerência da luz de
muitos tipos de laser. A coerência é a propriedade mais importante da luz de
um laser que a distingue de outras fontes. Assim, um laser pode ser definido
como uma fonte de luz coerente. A completa importância da coerência não
pode ser compreendida até que outros conceitos tenham sido introduzidos,
mas a evidência da coerência da luz do laser pode ser observada facilmente.
Assim, um feixe de laser de baixa potência incide sobre uma superfície áspera,
tal como um pedaço de papel ou de madeira e é refletido em todas as direções.
Uma porção desta luz chega aos olhos de um observador situado a muitos
metros de distância. O observador verá uma área brilhante que parece ser
composta de muitos pontinhos brilhantes e escuros alternados, característicos
da luz coerentes, causados por um fenômeno conhecido por interferência
luminosa.

Um laser produz luz coerente por intermédio de um processo chamado


emissão estimulada de luz. A palavra LASER significa Light Amplification by
Stimulated Emission of Radiation ou Amplificação da Luz por Emissão
Estimulada de Radiação. Uma breve discussão da interação da luz com os
átomos é necessária antes que a emissão estimulada possa ser descrita. É
sabido que um átomo é a menor partícula de um elemento que preserva suas
características químicas. Ele consiste de um núcleo positivo envolto por uma
nuvem de elétrons negativos. Os elétrons podem ter energias diferentes em
seu movimento no interior da nuvem em torno do átomo. Caso ele tenha a
menor quantidade de energia possível para um elétron ligado ao núcleo diz-se
que está no estado fundamental. Assim, não é possível para o elétron ter

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energia menor que a do estado fundamental. Qualquer outro elétron que esteja
em um nível de energia maior do que a do estado fundamental encontra-se em
um estado excitado do átomo. Um átomo pode conter vários estados excitados,
cada um correspondendo a um nível de energia. Não há possibilidade de um
elétron possuir energia intermediária entre dois estados excitados contíguos:
ele só pode permanecer em níveis de energia, mas nunca fora deles. Um
átomo pode conter muitos níveis de energia, às vezes, centenas de níveis ou
até milhares. Para a produção da luz de um laser é necessário que se tenha
uma situação envolvendo três níveis de energia em uma estrutura bem
definida. Não que os átomos tenham de ter apenas três níveis, mas que três
deles se apresentem na estrutura adequada à produção de laser.
Didaticamente, os outros níveis além dos três não são apresentados nos
diagramas. Seja a energia do estado fundamental 𝐸1 e dos outros dois estados
excitados, 𝐸2 e 𝐸3 . Como já foi afirmado, se o elétron está no estado
fundamental ele é incapaz de liberar energia, mas se ele está no estado
excitado 2 ou no estado excitado 3, ele pode liberar energia depois de uma
única transição ou depois de uma série de transições envolvendo os estados
intermediários (isto no caso de haver mais de três níveis), descendo para o
estado fundamental. Um estado excitado é, portanto, instável e pode liberar o
excesso de energia em relação a um nível inferior espontaneamente ou por
estimulação. Em uma transição atômica, uma quantidade de energia igual à
diferença de energia entre os dois níveis deve ser liberada pelo átomo na forma
de um fóton (quantum ou partícula de luz) com uma freqüência que será
proporcional a energia (Lei de Planck, 𝐸 = ℎ𝜈). Assim, um fóton de luz
vermelha possui menos energia do que um fóton de luz violeta, pois a
freqüência da luz vermelha é menor do que a da luz violeta. Em fontes de luz
ordinárias, os átomos individuais liberam fótons aleatoriamente. Nem a direção
nem a fase dos fótons resultantes são controladas na produção desses fótons.
Em geral, fótons de muitas freqüências estão presentes na emissão
espontânea de luz. A luz produzida não é monocromática, nem direcional e
nem coerente.

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A luz coerente de um laser é produzida por um fenômeno conhecido como
emissão estimulada de luz. Nesse caso, o átomo excitado é estimulado por
uma influência externa para emitir um fóton. O agente estimulador é outro fóton
cuja energia é exatamente 𝛥𝐸 = 𝐸3 − 𝐸2 . Este fóton estimula o átomo a fazer
uma transição e a emitir, em fase, um fóton idêntico ao fóton estimulador. O
fóton emitido tem a mesma energia, mesmo comprimento de onda e a mesma
direção de percurso do fóton estimulador e os dois estão exatamente em fase.
Assim, a emissão estimulada produz luz que é monocromática, direcional e
coerente. Esta luz aparece como saída do feixe de laser.

Outro processo que ocorre em um laser é a absorção de fótons. O fóton incide


sobre um átomo em um estado de energia 𝐸2 e é absorvido pelo átomo. O
fóton cessa de existir e sua energia aparece como um aumento de energia no
átomo, com o elétron se movendo para o nível de energia 𝐸3 . O processo de
absorção remove energia do feixe do laser e reduz a saída desse laser.

A inversão de população é um fenômeno que foi introduzido a fim de produzir


uma saída maior para o laser, de forma que mais luz deva ser produzida pela
emissão estimulada do que o que é perdido pela absorção. Para esse processo
ocorrer, mais átomos devem estar em um nível de energia 𝐸3 do que em um
nível de energia 𝐸2 , o que não ocorre em circunstâncias normais. Em uma
grande coleção de átomos na matéria a uma temperatura T qualquer, a maioria
dos átomos estará no estado fundamental em um instante particular e a
população de cada estado de energia mais alta será mais baixa do que
qualquer dos estados de energia menor. Isto é chamado de distribuição normal
de população. Sob circunstâncias normais, cada nível de energia contém muito
mais átomos do que o nível de energia logo acima dele. Assim, se há um
número N de átomos com elétrons no estado fundamental do neônio (Laser de
He-Ne), com elétrons no nível imediatamente acima (1º estado excitado) há
apenas 10−33 𝑁 átomos e muito menos no segundo estado excitado e assim por
diante. A população de átomos com elétrons nos níveis ascendentes decresce
exponencialmente. Uma inversão de população existe sempre que mais
átomos estão em um estado atômico excitado em relação a um estado de

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menor energia. O estado de menor energia pode ser o estado fundamental,
mas em muitos casos pode ser um estado excitado de energia mais baixa. Os
lasers produzirão luz coerente por emissão estimulada apenas se uma inversão
na população estiver presente. Esta pode ser alcançada apenas por intermédio
de excitação externa da população atômica.

Quatro elementos funcionais são necessários no laser para produzir luz


coerente por emissão estimulada de radiação:
1) é necessário ter um meio ativo, o qual sofrerá a excitação eletrônica dos
átomos. Este meio é um conjunto de átomos ou moléculas que poderá ser
excitado para um estado invertido de população; ou seja, há mais átomos
ou moléculas em um estado excitado do que em algum nível de menor
energia. Os dois estados escolhidos para a transição que produzirá o laser
devem possuir certas características. Primeiro: os átomos devem
permanecer no nível superior para a produção de laser por um tempo
relativamente longo para fornecer mais fótons emitidos por emissão
estimulada do que por emissão espontânea. Segundo, deve haver um
método efetivo de “bombeamento” de átomos a partir de um estado
fundamental altamente populado para um estado superior que irá produzir o
laser a fim de aumentar a população do nível de energia maior em relação à
população do nível de energia menor. Um aumento na população do nível
mais baixo de energia para um número acima do de mais alta energia
negará a inversão de população e, desse modo, impedirá as amplificações
de luz emitida por emissão estimulada. Em outras palavras, quando átomos
se movem a partir de um nível superior para um nível menor de energia,
mais fótons serão perdidos por emissão espontânea, produzindo-os com
direções aleatórias, fora de fase, diferentemente do que aconteceria no
processo de emissão estimulada. O meio ativo de um laser pode ser
pensado como um amplificador óptico. Um feixe de luz coerente que entra
em um terminal do meio ativo é amplificado pela emissão estimulada até
que um feixe coerente de intensidade aumentada deixa o outro terminal do
meio ativo. Assim, o meio ativo fornece um ganho óptico ao laser. Este meio
ativo pode ser um gás, um líquido ou a junção entre dois materiais

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semicondutores sólidos. Um cristal de rubi foi o meio ativo do primeiro laser
inventado por Theodore Maiman nos Hughes Laboratories em 1960. Um
meio líquido em lasers com corantes sintonizáveis consiste em certos
corantes dissolvidos em álcool metílico ou etílico. Outros meios ativos
incluem muitos tipos de gases e misturas de gases. Lasers que contêm uma
mistura de hélio e neônio ou o laser de gás carbônico são exemplos
comuns de meios ativos gasosos. Um semicondutor de junção PN
composto de arsenieto de gálio ou fosfeto de gálio são exemplos de meios
ativos sólidos
2) O mecanismo de excitação é uma fonte de energia que excita ou “bombeia”
os átomos no meio ativo a partir de um estado de energia mais baixa para
um estado de energia mais alta a fim de criar a inversão de população. Em
lasers a gás e nos semicondutores, o mecanismo de excitação usualmente
consiste de um fluxo de corrente elétrica através de um meio ativo. Lasers
sólidos e líquidos freqüentemente empregam bombas ópticas. Por exemplo,
em um laser de rubi, os átomos de cromo dentro do cristal de rubi podem
ser bombeados para um estado excitado por meio de um poderoso feixe de
luz a partir de uma lâmpada de flash fotográfico contendo o gás xenônio;
3) O mecanismo de realimentação retorna uma porção da luz coerente
originalmente produzida no meio ativo de volta para posterior amplificação
por emissão estimulada. A quantidade de luz coerente produzida por
emissão estimulada depende de ambos os graus de inversão da população
e da intensidade do sinal estimulador. O mecanismo de realimentação
consiste usualmente de dois espelhos – um em cada terminal do meio ativo-
alinhados de tal forma para que eles possam refletir a luz coerente para
frente e para trás através do meio ativo;
4) O acoplador de saída permite que uma porção da luz do laser contida entre
os dois espelhos deixe a cavidade do laser na forma de um feixe. Um dos
espelhos do mecanismo de realimentação permite que alguma luz passe
por ele se ela tiver o comprimento de onda da luz do laser. A fração de luz
coerente que se permite escapar varia grandemente de um laser para outro-
desde menos de um por cento para alguns lasers de hélio-neônio para mais
de 80% para muitos lasers de estado sólido.

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Quando o mecanismo de excitação de um laser é ativado, a energia flui pelo
meio ativo fazendo com que átomos passem do estado fundamental para
certos estados excitados. Desta forma, a inversão de população é criada.
Alguns dos átomos no nível superior descem para o nível inferior
espontaneamente, emitindo fótons de luz não coerente em comprimentos de
onda e direções aleatórias. Muitos desses fótons escapam do meio ativo, mas
aqueles que viajam ao longo do eixo do meio ativo produzem emissão
estimulada. O feixe produzido é refletido de volta ao meio ativo pelos espelhos.
Uma porção da luz que incide sobre o acoplador de saída escapa do laser
como um feixe de saída. Se o ganho na viagem do percurso no meio do laser
exceder a perda (incluindo a referente ao feixe de saída), a potência de saída
do laser aumenta. Se as perdas excederem o ganho, a potência do laser
decresce.

Os lasers podem ser classificados de acordo com o tipo de meio ativo,


mecanismo de excitação ou duração dos pulsos de saída. A classificação feita
pelo meio ativo será utilizada aqui:
1) Laser a gás: constitui uma importante família de lasers. O gás pode ser
misturado ou não. A excitação usualmente é obtida por meio de um fluxo de
corrente elétrica através do gás. Um tipo popular é o de hélio-neônio, em
que a mistura está em baixa pressão dentro de um tubo de vidro selado
chamado de “tubo de plasma”. A corrente elétrica excita os átomos de hélio
e estes transferem a energia para os átomos de neônio que sofrem uma
transição de um estado de energia mais baixa para um estado de energia
mais alta, formando o laser. O mecanismo de realimentação consiste em
um par de espelhos selados nos terminais do tubo de plasma. Um desses
espelhos, o acoplador de saída, transmite de 1-2% para um feixe de saída;
2) Lasers de sólidos cristalinos: Exemplos comuns são os de rubi e de
neodímio, os quais possuem largas aplicações industriais. O rubi é o óxido
cristalino de alumínio em que alguns dos íons de alumínio no retículo
cristalino foram substituídos por íons de cromo. Estes íons são os
elementos ativos no laser de rubi. O laser de ítrio-alumínio-granada (YAG) é

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de um cristal-hóspede de granada (pedra semipreciosa vermelha) em que
alguns dos átomos de alumínio foram substituídos pelo neodímio
triplamente ionizado (Nd3+), um elemento das terras raras;
3) Lasers de corantes líquidos: Usam uma solução de um material complexo
corante como meio ativo. Os corantes são grandes moléculas orgânicas
com pesos moleculares de várias centenas de unidades de massa atômica.
Exemplos são a rodamina 6G e a fluoresceína de sódio. O material corante
é dissolvido em um solvente orgânico, tal como álcool metílico. Assim, o
meio ativo é um líquido. Lasers de corantes são os únicos tipos de lasers
líquidos que alcançaram um status bem desenvolvido. Uma das mais
importantes características que os lasers de corantes oferecem é a
sintonizabilidade, ou seja, a cor do feixe de saída pode ser variada por
ajuste do elemento de sintonia da cavidade e também ao se mudar o
elemento corante usado. A saída monocromática de lasers de corantes
disponíveis pode ser sintonizada em uma ampla faixa, desde o ultravioleta
até próxima ao infravermelho. Os lasers de corantes líquidos que podem ser
sintonizados para qualquer comprimento de onda visível e para porções do
infravermelho e do ultravioleta são disponíveis comercialmente em ambos
os modelos contínuo e pulsado. Estes lasers são adequados a aplicações
tais como em espectroscopia, cuja sintonizabilidade é importante;
4) Lasers Semicondutores: Se dois materiais semicondutores, um do tipo P
(aquele que possui deficiência de elétrons na estrutura do cristal) e um do
tipo N (aquele que possui excesso de elétrons na estrutura cristalina), são
reunidos eles formam uma junção PN. Quando a corrente flui através de
uma junção PN, os elétrons livres de um material tipo N se combinam com
os buracos de um material tipo P e liberam energia. Esta energia pode
aparecer como luz visível, tal qual em um diodo emissor de luz (LED). O
diodo emissor de laser é um cristal em formato retangular de arsenieto de
gálio que contém uma junção PN. O aparelho inteiro tem tamanho de
aproximadamente um grão de areia. As faces terminais do diodo a laser são
clivadas ao longo dos planos do cristal de forma a constituir superfícies
paralelas de reflexão que irão atuar como espelhos do mecanismo de
realimentação. O fluxo de corrente através da junção é o mecanismo de

16
excitação. Os lasers semicondutores usualmente têm saídas na faixa do
infravermelho, embora alguns modelos emitam na região do visível.

Os lasers possuem um número enorme de aplicações tecnológicas. Uma


pequena amostra pode ser acessada em http://en.wikipedia.org/wiki/Laser .

Superfluidez
Superfluidez é a propriedade de um líquido fluir sem fricção através de um
capilar. Esta propriedade manifesta-se no 42𝐻𝑒 abaixo da temperatura absoluta
𝑇𝜆 = 2.17 𝐾, o conhecido ponto de transição lambda, assim denominado porque
o formato da curva do calor específico é parecido com a letra grega lâmbda.
Veja a figura 6.

Figura 6: Ponto λ de transição para a superfluidez.


http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/Hbase/imgmod/helambda.gif

Abaixo de 1 K, 100% do líquido exibem esta propriedade. A condensação de


Bose-Einstein (do inglês, BEC) é a propriedade de que uma grande fração das
partículas que constitui um sistema se condensa em um mesmo estado. Por
exemplo, em um gás ideal de Bose (um gás constituído de bósons não
interagentes), 100% das partículas condensarão no estado de menor energia

17
disponível. Entretanto, um gás de Bose ideal não se tornará um superfluido. E
inversamente, no hélio 4 líquido, apenas 7% dos átomos realmente forma um
condensado, embora 100% dos átomos possam fluir sem fricção. De fato, não
há razão porque um sistema não possa tornar-se um superfluido até mesmo se
uma pequena fração dos átomos formasse um condensado. Tudo isso ilustra
de uma maneira simples o fato de que a superfluidez e a BEC são dois
fenômenos diferentes, embora os livros-textos introdutórios tendem a colocar
os dois juntos. A diferença principal entre os dois fenômenos é que a BEC é
uma propriedade do estado fundamental, enquanto a superfluidez é uma
propriedade dos estados excitados. Isto é inteiramente análogo à
supercondutividade, como será visto mais adiante, em que os elétrons se
condensam em pares de Cooper (estado fundamental) e a interação entre os
pares de Cooper introduz um gap de energia entre o estado fundamental e os
estados excitados. Por sua vez, este gap de energia é responsável pelo
sistema tornar-se um supercondutor. Assim, em ambos os sistemas, é a
interação entre as partículas que é responsável pelos comportamentos, não é
a forma como elas se arranjam no estado fundamental. Assim, o fato de que o
hélio não se solidifica em nenhuma temperatura é um efeito puramente
quântico. As forças de van der Waals são muito fracas entre os átomos e não
são suficientemente fortes para superar o movimento do ponto zero associado
com a tentativa de confinar um átomo de hélio a um sítio no retículo. O
segundo aspecto que torna o hélio diferente de outros líquidos é que ele toma
uma quantidade finita de energia para criar uma perturbação no líquido. Isto é
mostrado na figura 7.

A quantidade real de energia requerida depende do comprimento de onda λ ou


do momento 𝑝 = ℎ/𝜆 dessa perturbação. Os valores medidos para o custo de
energia são mostrados na figura 7. Em pequenas transferências de momento
(comprimentos de onda longos) a perturbação da energia é justamente uma
onda de som (um fônon) e sua energia é dada por 𝐸𝑒𝑥 𝑝 = 𝑐𝑝, o resultado
hidrodinâmico padrão. Em mais altas transferências de momento as excitações
são conhecidas por rótons. Quando se tem menores comprimentos de onda, o
custo de energia começa a se desviar de 𝐸𝑒𝑥 𝑝 = 𝑐𝑝. Para comprimentos de

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onda comparáveis ao espaçamento interatômico d, o custo de energia passa
por um mínimo, após isto ele volta a subir. Este mínimo do gap de energia
entre o estado fundamental e o estado excitado é comumente referido como o
mínimo róton ou simplesmente “róton’, e a curva inteira é chamada de a curva
de dispersão fônon-róton. O róton torna-se a característica determinante dos
superfluidos. A presença deste gap dos rótons é análoga à presença de um
gap similar em sistemas supercondutores.

Figura 7: Energias de excitação medidas no superfluido hélio 4.


Algumas propriedades interessantes da superfluidez apareceram com o tempo.
Por exemplo, o superfluido sobe as paredes de um copo vazio e depois desce
até que o nível interno se iguale ao nível externo. É claro que o copo vazio
deve estar de boca para cima em um recipiente cheio. Forma-se um filme fino
conhecido como “filme de Rollin” e esse efeito é conhecido como “efeito
Onnes”. O superfluido não é capaz de transferir momento também, o que faz
com que ele contorne obstáculos (se houvesse a possibilidade de se tentar
derrubar uma moeda colocada em pé com um jato de superfluido, a moeda não
cairia). Ele forma linhas de fluxo quantizadas, isto é, linhas de fluxo que está
em pequenas porções indivisíveis. Estas linhas dão surgimentos à formação de
vórtices quantizados e de anéis de vórtices quânticos. Enfim, vale a pena

19
estudar o fenômeno da superfluidez, pois ele é muito interessante. Vale dizer
que as linhas de fogo observadas no Sol que podem causar ou até parar as
telecomunicações aqui na Terra são provenientes de deslocamentos de
material superfluido no interior do Sol. Aliás, no interior de estrelas em geral há
superfluidez e no interior de estrelas de nêutrons, a densidade é tão grande
que o princípio de Pauli impede que dois nêutrons (são dois férmions) de
entrarem no mesmo estado e a natureza se encarrega de desagregar o nêutron
em seus quarks, formando um plasma de quarks e glúons no centro das
estrelas de nêutrons. Os núcleos atômicos também podem ter um caroço
central que gira velozmente (a 30 000 km/s) sobre uma camada superfluida,
assim como um rolamento gira sobre uma camada de óleo.

Figura 8: O superfluido sobe as paredes de um copo vazio pelo lado de


fora até igualar os níveis interno e externo.

Supercondutividade

A supercondutividade é um campo fascinante e desafiador da Física. Muitos


cientistas e engenheiros espalhados pelo mundo inteiro têm tentado
compreender este fenômeno há cerca de um século. Por cerca de 80 anos a
supercondutividade tem sido um assunto relativamente obscuro. Até
recentemente devido à necessidade da criogenia para os supercondutores de
baixa temperatura, a supercondutividade ao nível do Ensino Médio era
meramente ocasionalmente discutida em aulas de Física. Hoje, entretanto a

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supercondutividade está sendo aplicada a áreas diversas, tais como medicina,
na ciência experimental e teórica, na área militar, no transporte, na produção
de energia, na eletrônica e em muitas outras áreas. Com a descoberta dos
supercondutores de altas temperaturas, que podem operar em temperaturas do
nitrogênio líquido (77 K), a supercondutividade está agora dentro do alcance
dos estudantes do Ensino Médio. Oportunidades únicas e surpreendentes
aparecem durante seu estudo.

Os maiores avanços na refrigeração de baixa temperatura foram feitos durante


o final do séc. XIX. A supercondutividade foi primeiramente descoberta em
1911 pelo físico holandês Heike Kamerlingh Onnes, que dedicou sua carreira
científica a explorar a refrigeração a baixíssimas temperaturas. No dia 10 de
julho de 1908 ele obteve sucesso na liquefação do hélio refrigerando-o a 4K.
Onnes produziu apenas uns poucos mililitros de hélio líquido naquele dia, isso

Figura 9: Heike Kamerlingh Onnes, o descobridor da supercondutividade.


http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/94/Kamerlingh_portret.jpg

foi o início das suas explorações em regiões de temperaturas que antes nunca
fora alcançadas. O hélio líquido o capacitou a resfriar outros materiais a
temperaturas próximas do zero absoluto (0K), a temperatura mais baixa
imaginável. O zero absoluto é a temperatura em que a energia cinética dos
materiais tornar-se-ia zero, porém o princípio de Heisenberg a torna proibitiva.
Em 1911, Onnes começou a investigar as propriedades elétricas dos metais

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em temperaturas extremamente baixas. Era sabido havia muitos anos que a
resistência dos metais caía quando eram resfriados abaixo da temperatura
ambiente, mas não se sabia qual valor limitante para a resistência deveria ser
alcançado caso a temperatura fosse reduzida para um valor muito próximo de
0K. Alguns cientistas - tal como William Kelvin - acreditavam que os elétrons
que fluíam através de um condutor iriam para um completo cessar de
movimento quando a temperatura se aproximasse de zero. Outros cientistas,
incluindo Onnes, pressentiam que a resistência do fio gelado desapareceria.
Isso sugeria que haveria um decréscimo constante na resistência elétrica
permitindo uma melhor condução da eletricidade. Em algum ponto de
temperatura muito baixa, os cientistas percebiam que haveria uma queda na
resistência alcançando algum valor mínimo bem definido permitindo que a
corrente fluísse com pouca ou nenhuma resistência. Onnes passou uma
corrente através de um fio de mercúrio muito puro e mediu sua resistência
conforme ele diminuía gradativamente a temperatura. Para sua grande
surpresa não havia queda da resistência, apenas o cessar do fluxo dos elétrons
conforme sugeriu Kelvin. Em 4.2K a resistência subitamente desaparecia. A
corrente estava fluindo através do fio de mercúrio e nada a estava parando, a
resistência era zero. A figura 10 é um gráfico da resistência versus temperatura
no fio de mercúrio como por Onnes.

Figura 10: Curva apresentando a supercondutividade no mercúrio obtida


por Onnes.
http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/Hbase/Solids/imgsol/mersc.gif

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De acordo com Onnes, “O mercúrio passou para um novo estado, que por
conta de suas extraordinárias propriedades elétricas pode ser chamado de
estado supercondutor”. O experimento não deixou dúvida sobre o
desaparecimento da resistência de um fio de mercúrio. Kamerlingh Onnes
chamou essa nova descoberta de Supercondutividade. Onnes reconheceu a
importância de sua descoberta para a comunidade científica como também seu
potencial comercial. Um condutor elétrico sem resistência poderia carregar
corrente para qualquer distância sem perda significante de corrente. Onnes
descobriu que o supercondutor exibia o que ele chamou de correntes
persistentes, correntes elétricas que continuavam a fluir sem um potencial
elétrico que as forçasse a fluir. Onnes descobriu a supercondutividade e foi
agraciado com o Prêmio Nobel em 1913.

Quando quer que uma nova descoberta seja feita, os pesquisadores devem se
esforçar para explicá-la com suas teorias. Em 1933, Walther Meissner e R.
Ochsenfeld descobriram que os supercondutores são mais que um condutor
perfeito de eletricidade, pois eles também têm uma propriedade magnética
interessante de não permitir que as linhas de campo magnético penetrem em
seu interior. Um supercondutor faz um rearranjo de correntes elétricas de forma
a gerar um campo magnético dentro dele que contrabalanceia o campo que vai
penetrar no material. Este efeito é conhecido como Efeito Meissner e ele
causa a levitação de um supercondutor em um campo magnético em uma já
popular demonstração da supercondutividade. A figura 11 é uma imagem das
linhas de campo magnético em um imã que está levitando em um
supercondutor. O efeito Meissner ocorrerá somente se o campo magnético for
relativamente pequeno. Caso o campo magnético seja muito grande, ele irá
penetrar no interior do metal e o metal perderá sua supercondutividade. Em
1957 os cientistas começaram a desvendar os mistérios da
supercondutividade. Três físicos americanos da Universidade de Illinois, John
Bardeen, Leon Cooper e Robert Schrieffer desenvolveram um modelo que dá
uma boa idéia de como os supercondutores se comportam. O modelo utiliza

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Figura 11: Material supercondutor levitando em um campo magnético de
um ímã. http://www.ict.kth.se/courses/IM2661/bilder/levitate.gif
http://www.iec.ch/online_news/etech/arch_2003/etech_1203/pic_focus/superco
nductivity.gif

idéias avançadas da Mecânica Quântica, mas a idéia principal do modelo


sugere que os elétrons se emparelham com spins opostos e se comportam
como se fosse um bóson (partícula de spin inteiro). Tais pares são conhecidos
por pares de Cooper e por se comportarem como bósons podem sofrer uma
condensação de Bose-Einstein, isto é, todos os pares descem para um estado
fundamental quântico de forma coletiva e coerente. Em 1972, Bardeen, Cooper
e Schrieffer receberam o Prêmio Nobel de Física pela teoria da
supercondutividade, que é agora é conhecida como teoria BCS, utilizando as
iniciais de seus nomes.

Em 1986, Georg Bednorz e Alex Müller, trabalhando na IBM em Zurique, Suiça,


estavam fazendo experiências com uma classe particular de cerâmicas de
óxidos metálicos chamadas perovskitas. Eles inspecionaram centenas de
compostos de óxidos diferentes. Trabalhando com cerâmicas de lantânio,
bário, cobre e oxigênio, eles encontraram indicações de supercondutividade a
35 K, um valor 12 K acima de registro antigo para um supercondutor.
Rapidamente os pesquisadores do mundo todo estariam trabalhando com os
novos tipos de supercondutores. Em fevereiro de 1987, foi descoberto um
material supercondutor cerâmico do tipo peroskita com a supercondutividade
ocorrendo a um valor de 90 K de temperatura. Essa descoberta foi muito

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importante porque agora se tornou possível utilizar nitrogênio líquido como
líquido refrigerante. Esses materiais são conhecidos como Supercondutores de
Altas Temperaturas. Desde então os cientistas tem feito experiências com
muitas formas diferentes de perovskitas produzindo compostos que passam a
ser supercondutores em temperaturas acima de 130 K. Dada a alta demanda
por supercondutores no mundo (trens-bala, aparelhos de ressonância
magnética nuclear para diagnóstico médico por imagens, aplicações em
energia elétrica etc.), a influência no desenvolvimento de novos materiais,
técnicas de produção e evolução da teoria tem sido bastante forte.

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