Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Neste dia, recorda-se a consagração da igreja de Santa Maria Menina, construída perto do
Templo de Jerusalém para comemorar a dedicação que a Virgem – conforme uma piedosa
tradição – fez de si própria ao Senhor, desde a sua primeira juventude, movida pelo Espírito
Santo, de cujas graças estava repleta desde a sua Conceição Imaculada. A festa foi
introduzida no Ocidente no século XIV.
São Lucas, tão diligente em examinar todas as fontes que pudessem trazer-
lhe notícias e dados, omite qualquer referência à meninice da Virgem. Muito
provavelmente, Nossa Senhora nada lhe disse dos seus primeiros anos porque
pouco tinha a contar: tudo se passou na intimidade da sua alma, num diálogo
contínuo com seu Pai-Deus, que esperava, sem pressas, o momento inefável e
único da Encarnação. “Mãe! Por que nos ocultaste os anos da tua primeira
juventude? Virão depois os evangelhos apócrifos e inventarão mentiras;
mentiras piedosas, sim, mas, ao fim e ao cabo, imagens falsas do teu
verdadeiro ser. E dir-nos-ão que vivias no Templo, que os anjos te traziam de
comer e falavam contigo... Sempre milagres, milagres... E assim te afastam de
nós”1, quando estás tão perto da nossa vida quotidiana!
A festa que celebramos hoje não tem a sua origem no Evangelho, mas numa
antiga tradição. A Igreja não quis aceitar as narrações apócrifas segundo as
quais Nossa Senhora teria passado a viver no Templo desde os três anos de
idade, consagrada a Deus por um voto de virgindade. Mas aceita o núcleo
essencial da festa2, a dedicação que a Virgem fez de si própria, já desde a
infância, movida pelo Espírito Santo, cuja graça a inundava desde o primeiro
instante da sua concepção. Do que não há dúvida é de que foi absolutamente
real a plena entrega de Maria a Deus, conforme foi crescendo.
Hoje pedimos à nossa Mãe que nos ajude a tornar realidade essa entrega do
nosso coração, segundo a peculiar vocação que cada um tenha recebido.
“Tens de entrar em colóquio com Santa Maria e confiar-lhe: – Ó Senhora, para
viver o ideal que Deus meteu no meu coração, preciso voar... muito alto, muito
alto!
“Não basta que te desprendas, com a ajuda divina, das coisas deste mundo,
sabendo que são terra. Mais ainda: mesmo que coloques o universo inteiro
num montão debaixo dos teus pés, para estares mais perto do Céu..., isso não
basta!
II. A VIRGEM MARIA foi a criatura que teve maior intimidade com Deus, a
que d’Ele recebeu o maior amor; foi a cheia de graça6. Nunca negou nada a
Deus, e a sua correspondência à graça e às moções do Espírito Santo foi
sempre plena. Devemos aprender d’Ela a dar-nos por inteiro ao Senhor, com
uma plenitude de correspondência generosa, no estado e na vocação que
Deus nos deu, no meio dos afazeres quotidianos no mundo. Ela é o exemplo
que temos de imitar. “Tal foi Maria – ensina a este respeito Santo Ambrósio –,
que a sua vida, por si mesma, é para todos um ensinamento”. E conclui:
“Tende, pois, diante dos olhos, pintadas como uma imagem, a virgindade e a
vida da Bem-aventurada Virgem, na qual se reflecte como num espelho o brilho
da pureza e a própria força da virtude”7.
Acontece o mesmo na alma dos santos: quanto mais perto vão estando de
Deus, mais fiéis são às graças recebidas e mais rapidamente caminham para
Ele. “É o movimento uniformemente acelerado, símbolo do progresso espiritual
da caridade numa alma que em nada se atrasa, e que caminha para Deus
tanto mais depressa quanto mais se aproxima d’Ele, quanto mais é atraída por
Ele”10. Assim deve ser a nossa vida, pois o Senhor nos chama à santidade no
lugar onde nos encontramos. E serão precisamente as alegrias e as penas da
vida as que nos servirão para irmos cada vez mais depressa para Deus,
correspondendo às graças que recebemos. As dificuldades habituais do
trabalho, o convívio com as pessoas, as notícias que recebemos..., devem ser
motivo para amarmos cada dia mais o Senhor.
Hoje, pode ser uma boa oportunidade – todos os dias o são – para que,
meditando nesta festa de Maria, na qual se põe de manifesto a sua completa
dedicação ao Senhor, renovemos a nossa entrega a Deus no meio dos
afazeres quotidianos, no lugar em que o Senhor nos colocou. Mas devemos ter
em conta que todo o avanço na nossa união com Deus deve passar
necessariamente por um trato mais frequente com o Espírito Santo, Hóspede
da nossa alma, a quem Nossa Senhora foi tão dócil ao longo da sua vida. Para
pedirmos essa graça, pode ser-nos útil a oração que o Bem-aventurado
Josemaría Escrivá compôs para a sua devoção pessoal:
“Vem, ó Santo Espírito!: ilumina o meu entendimento para conhecer os teus
mandatos; fortalece o meu coração contra as insídias do inimigo; inflama a
minha vontade... Ouvi a tua voz e não quero endurecer-me e resistir, dizendo:
depois..., amanhã. Nunc coepi! Agora!, não aconteça que o amanhã me falte.
Peçamos também a Nossa Senhora que haja muitas pessoas que, dóceis ao
Espírito Santo, se entreguem inteiramente a Deus, como Ela, desde a sua
primeira juventude.
(1) Salvador M. Iglesias, O Evangelho de Maria, Quadrante, São Paulo, 1991, pág. 16; (2) cfr.
Paulo VI, Exort. Apost. Marialis cultus, 2-II-1974, 8; (3) cfr. Lc 1, 34; (4) cfr. Conc. Vat. II, Const.
Gaudium et spes, 48; (5) S. Josemaría Escrivá, Forja, n. 994; (6) Oração colecta da Missa do
dia 21 de Novembro; (7) Santo Ambrósio, Sobre as virgens, II, 2; (8) cfr. R. Garrigou-Lagrange,
La Madre del Salvador, pág. 100; (9) cfr. Conc. Contantinopolitano II, Dz 224; (10) ib., 103; (11)
S. Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 31; (12) Santo Afonso Maria de Ligório, As glórias
de Maria, II, 3; (13) S. Josemaría Escrivá, Postulação para a Causa de Beatificação e
Canonização, Registro Histórico do Fundador, 20172, pág. 145.