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AEG – Ambiente Econômico Global

Curso de Administração de Empresas e Comércio Exterior


8º Semestre

Caderno 3
Impactos e Tendências
Prof Fabio Uchôas de Lima

fabio-prof@uol.com.br

Este material foi produzido com o intuito de fornecer melhores subsídios aos alunos
dos diversos cursos, tomando como base informações contidas em diversos livros,
periódicos e sites da Internet, preferencialmente àqueles indicados no programa do
curso, reunindo várias pesquisas e conhecimentos adquiridos ao longo da vida
acadêmica. Quero esclarecer que este material não possui nenhum vínculo com as
Instituições de Ensino onde atuo, nem nenhuma forma de comércio autorizada. Peço
apenas a gentileza de não fazer nenhum uso comercial ou inserção em livros,
periódicos, ou quaisquer outras mídias sem minha expressa autorização, garantida
pela Lei 9610/98. Quaisquer críticas ou sugestões serão muito bem recebidas e
podem ser enviadas ao meu e-mail. Periodicamente faço uma revisão do material de
modo à aprimorá-lo ainda mais, e agradeço as colaborações recebidas.

São Paulo – Outubro 2008


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O Conceito de Subdesenvolvimento
As nações capitalistas subdesenvolvidas abrangem atualmente pouco mais da
metade da população mundial. Se somarmos a elas os países de "Economias de
Transição" mais pobres – como a Mongólia, a China ou o Vietnã -, teremos o conjunto
denominado Sul, que compreende pouco mais de 75% da população mundial.
O termo subdesenvolvimento surgiu após a II Guerra Mundial, nos documentos
dos organismos internacionais, como a ONU e a UNESCO, principalmente. A
"descoberta" do subdesenvolvimento deu-se com a descolonização e com a
publicação pelos organismos internacionais de dados estatísticos dos diversos países
do mundo (índice de mortalidade, salário, formas de alimentação, habitação, consumo,
distribuição de renda, etc.). Esses dados revelaram um verdadeiro "abismo" entre o
conjunto dos países desenvolvidos e o dos subdesenvolvidos.
Tal realidade é mais antiga que o seu conceito, pois os países subdesenvolvidos
a partir do momento em que deixaram de ser colônias e se constituíram em Estados-
Nações politicamente independentes, se viram inseridos dentro deste contexto. Na
América Latina isso ocorreu desde o início do século XX. Na Ásia e na África tal
processo se deu tardiamente, acontecendo neste século.
A expressão "Terceiro Mundo", apesar de ser geralmente usada como sinônimo
do conjunto de países subdesenvolvidos, surgiu apenas em 1952 com o francês Alfred
Sauvy.
Os países subdesenvolvidos resultaram da expansão do capitalismo a partir da
Europa Ocidental, desde os séculos XV e XVI. O capitalismo, que nasceu na Europa,
expandiu-se por toda a superfície do globo e produziu um mundo interligado, dividido
em áreas centrais ou desenvolvidas e áreas periféricas ou subdesenvolvidas.
Nos países desenvolvidos o capitalismo resultou de um processo endógeno
(interno), ou seja, desenvolveu-se a partir da própria sociedade. No Terceiro Mundo o
capitalismo foi imposto de fora, isto é, resultou de um processo exógeno (externo).
As sociedades que existiam nos países colonizados – por exemplo, as
sociedades indígenas ou a milenar sociedade indiana – acabaram sendo destruídas
ou submetidas a um novo modelo social, colonial.
A exploração colonial visava a expansão do comércio e a produção de minérios
ou gêneros agrícolas baratos para suprir o mercado mundial.
No início havia mão-de-obra escrava em grande parte dos atuais países
subdesenvolvidos. A partir de meados do século XIX, a escravidão começou a
atrapalhar o desenvolvimento da economia de mercado, pois o escravo não era
comprador e consumidor. Extinto o regime servil, uma massa de trabalhadores com
baixíssimos salários substituiu os escravos. Dessa forma, a intensa exploração da
força de trabalho constitui uma das características essenciais do subdesenvolvimento.
Em alguns lugares, como a América Latina, os europeus desprezaram as
sociedades preexistentes e estabeleceram outra, trazendo trabalhadores escravos da
África e a elite dominante da própria Europa. Em outras áreas, onde havia populações
muito numerosas – como foi o caso da Ásia -, os dominadores europeus corromperam
algumas elites locais: provocaram rivalidades e conflitos entre grupos sociais,
conseguindo que certas camadas dominantes já existentes fossem coniventes com a
economia colonial, e recrutaram trabalhadores mal remunerados no próprio local.
Particularmente na Índia, os colonizadores ingleses encontraram uma sociedade
extremamente complexa, que tinha um desenvolvimento econômico avançado para a
época, com produção manufatureira superior à da própria Inglaterra. Como o que
interessava era uma Índia submissa, compradora de bens manufaturados ingleses e
produtora somente de matérias-primas a serem vendidas a preços baixos, os ingleses
acabaram destruindo essas oficinas manufatureiras indianas, provocando o atraso em
que hoje se encontra aquele país.

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Algumas Idéias Equivocadas


A realidade dos países subdesenvolvidos tem suscitado uma série de mal-
entendidos, de idéias equivocadas. Talvez a mais absurda seja a de que o
subdesenvolvimento seria uma situação de atraso, como se essas nações fossem
semelhantes a crianças ou adolescentes, que um dia serão adultos. Ë como se no
passado toda a humanidade tivesse sido subdesenvolvida – desde uma tribo indígena
até a Inglaterra do século XVII – e o desenvolvimento ou "progresso" fosse uma coisa
normal, que acontece naturalmente com o passar do tempo.
Para mostrar como tal idéia é duvidosa, vamos expor a seguir algumas teses
fundamentais para entender o subdesenvolvimento.
Os países desenvolvidos nunca foram subdesenvolvidos no passado. Quando
se estuda a Inglaterra antes da revolução industrial, verifica-se que havia um grande
atraso em comparação com a tecnologia atual. Mas o termo país subdesenvolvido não
é apropriado para esse caso, pois não havia dependência econômica, que é
fundamental para definir o subdesenvolvimento.
Foi apenas a partir do nascimento e desenvolvimento do capitalismo na Europa
Ocidental e de sua posterior propagação pelo restante do mundo, que surgiu essa
situação de subdesenvolvimento, caracterizada pela dependência, pela subordinação
das nações periféricas com relação a outras, as centrais.
Subdesenvolvimento não significa apenas atraso econômico ou social. Em
alguns países subdesenvolvidos existem indústrias modernas e, em certos casos, uma
taxa de crescimento bastante razoável. O que os difere dos desenvolvidos é que
continuam a ser países com minorias privilegiadas, concentradoras de renda.
Podemos citar como exemplos a África do Sul e o Brasil, que são bastante
industrializados, bem como o Kuwait e os Emirados Árabes Unidos, exportadores de
petróleo que já possuíram, nos anos 70 e 80 duas das maiores rendas per capita do
mundo.
O alto índice de pobreza, portanto, também define o subdesenvolvimento,
evidenciando o problema distributivo.
Não há uma oposição simétrica entre a realidade do Norte e a do Sul. O país
subdesenvolvido não é exatamente o oposto do desenvolvido: um seria agrícola e
rural, o outro industrializado e urbano. Existem subdesenvolvidos que são
industrializados e têm população predominantemente urbana. Na realidade, esses dois
"mundos" são interdependentes: um deles não existiria sem o outro. Não é possível
que todos os países do mundo sejam desenvolvidos: não há desenvolvidos sem
subdesenvolvidos e vice-versa, ou seja, o capitalismo parece se alimentar de
desigualdades.
É extremamente difícil imaginar um mundo em que todos os países sejam
desenvolvidos de acordo com as "sociedades de consumo" dos dias atuais.

Os Diversos Patamares ou Grupo de Países do Sul

Levando-se em conta tanto o grau de riqueza (principalmente industrialização)


de cada país ou grupo de países, como também suas perspectivas para o século XXI,
podemos dividir o Sul em três principais conjuntos ou patamares: a PERIFERIA
PRIVILEGIADA, a PERIFERIA INTERMEDIÁRIA e a PERIFERIA MAIS PERIFÉRICA.
A periferia privilegiada é formada pelos países mais industrializados do Sul, que
possuem ainda um razoável mercado de consumo interno. É um seleto grupo de
países subdesenvolvidos que já conseguiram grandes avanços na produção industrial
e possui maior viabilidade para se desenvolver (ou, pelo menos, crescer igual ou mais
que a média dos países ricos). Desse conjunto, podemos distinguir três subgrupos: a
China, os "Tigres Asiáticos" e os países industrializados da América Latina.
A China é um caso à parte, pois poderá se tornar uma das grandes potências do
século XXI (junto com os EUA, Japão e Europa Ocidental), desde que continue

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evoluindo no ritmo acelerado dos últimos anos. É a economia que mais vem
crescendo desde o final dos anos 80, em todo o mundo. A China poderá se tornar um
dos mercados de consumo mais disputados do planeta, evidentemente se conseguir
distribuir bem a sua renda nacional, que ainda é muito baixa (renda per capita de
US$480).
Os chamados "Tigres Asiáticos" – Coréia do Sul, Taiwan ou Formosa, Hong
Kong e Cingapura – são economias dinâmicas, que cresceram enormemente nas
últimas décadas, bem mais que o resto do mundo em conjunto. O nível médio salarial
de suas populações já é bem maior que os de todos os demais países
subdesenvolvidos. A renda per capita em Cingapura, por exemplo, já é de cerca de
US$16.000, semelhante à do Japão quinze anos atrás e maior que a de muitos países
desenvolvidos hoje. Os "Tigres Asiáticos" exportam nos dias atuais produtos de
tecnologia intermediária, inclusive microcomputadores, e possuem ótimos sistemas
educacionais (os melhores do Sul) para a maioria de suas populações.
Quanto aos países industrializados da América Latina – principalmente o
BRASIL, o MÉXICO e a ARGENTINA, e secundariamente o Chile – também estão
num outro patamar ou degrau, acima da maioria dos países do sul. São bastante
industrializados, com rendas per capita intermediárias (US$ 3.500 no Brasil e no
México) e mercados de consumo razoáveis, que só não são maiores devido às
grandes desigualdades sociais. Esses países conheceram uma época muito ruim
(década de 80), onde a produção cresceu menos que a população, a dívida externa
aumentou assustadoramente, os ricos ficaram mais ricos e os pobres mais pobres.
Todavia, parece que encontraram novamente o caminho do desenvolvimento (alguns
deles) nos anos 90, quando conseguiram derrubar a inflação, que era a maior do
mundo nessa região.
Da periferia intermediária podemos dizer que são os países do Sul com
produção industrial e rendimentos em geral médios. Incluem-se nesse grupo a África
do Sul, Egito, Turquia, Índia, Venezuela, Colômbia, Peru, Indonésia, Filipinas,
Tailândia, Arábia Saudita, Kuwait, Argélia, Marrocos e alguns poucos outros. São
economias com características que as colocam bem acima dos países mais pobres
(Haiti, Sudão, Uganda, etc.), mas por outro lado, não possuem a viabilidade que existe
no grupo do Sul dos países periféricos privilegiados. Alguns desses países têm renda
per capita baixíssima, em especial a Índia (US$ 360), mas sua produção industrial é
considerável, havendo setores modernos convivendo com outros atrasados.
Infelizmente, ainda se debatem com gravíssimos problemas internos como
crises políticas, econômicas, étnico-nacionais, religiosas, separatistas, etc. A África do
Sul, por exemplo, o país mais industrializado do continente africano, precisa
urgentemente resolver seus conflitos etnico-tribais, evitando que estes atrapalhem o
processo de democratização multiracial do país.
Os países exportadores de petróleo, por sua vez, precisam encontrar outras
alternativas econômicas, além de resolver problemas internos graves como o
radicalismo religioso, pois o petróleo não durará para sempre e o radicalismo religioso
é fator de atraso social e científico.
Por fim, temos a periferia mais periférica, ou seja, os países paupérrimos e
menos industrializados do planeta, o chamado "Quarto Mundo" por alguns autores.
Nesse grupo estão a imensa maioria das nações do Sul, como as da África
subsaariana, da América Central a da Ásia (excluindo-se os "Tigres Asiáticos" e a
periferia intermediária). São economias com pouquíssimas chances de viabilidade de
crescimento real nos anos 90 e início do século XXI. Provavelmente irão ficar mais
pobres ainda devido ao grande crescimento demográfico, o maior do mundo,
agravando a escassez de alimentos, empregos, escolas, moradias decentes, etc.
Apenas possuem mão-de-obra e matérias primas baratas para oferecer, elementos
esses cada vez mais desvalorizados na nova ordem mundial.

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Inovação e competitividade
A qualidade de vida das pessoas, o sucesso das empresas e o nível de
desenvolvimento das nações dependem, cada vez mais, da velocidade e eficácia com
que estas produzem, absorvem e utilizam conhecimentos científicos, tecnologia e
inovações. Vantagens tecnológicas constituem a base competitiva das economias
desenvolvidas. Nas economias em desenvolvimento, entretanto, a competitividade
costuma depender em grande parte do pagamento de baixos salários, da exploração
de recursos naturais, de subsídios ou proteção estatais. Essas estratégias constituem
uma armadilha para o desenvolvimento sustentado. É preciso reduzir a importância de
tais subterfúgios e incorporar conhecimento e inovação ao processo produtivo.
O diagnóstico econômico indica claramente que o país perdeu muito tempo na corrida
por competitividade. A análise da evolução da produtividade média do trabalhador
brasileiro durante as últimas décadas mostra isso. Esta produtividade dobrou entre
1960 e 1980, mas seu crescimento foi comprometido a partir de 1980, chegando ao
ano de 2002, praticamente inalterada.

Produtividade do trabalho de países selecionados como proporção da


produtividade do trabalho dos Estados Unidos, 1960- 2002

Fonte: Viotti, 2004.


Notas: A produtividade foi medida como Produto Interno Bruto (PIB) dividido por pessoa empregada. O
PIB foi medido em dólares norte-americanos, a preços constantes de 1990, convertidos por índices que
refletem a paridade de poder de compra das moedas nacionais.

Durante esse período de estagnação para o Brasil, a produtividade do trabalhador da


economia industrial líder, os Estados Unidos, cresceu 40%. Com isto, a produtividade
média do brasileiro, que havia atingido cerca de 35% da alcançada pelo norte-
americano no ano de 1980, passou a representar apenas 24% desta em 2002, como
indicado no gráfico abaixo. Isto significa que, se em 1980, um trabalhador norte-
americano produzia aproximadamente o mesmo que 3 brasileiros, em 2002, já eram
necessários cerca de 4 brasileiros para produzir o mesmo que um norte-americano,
mais ou menos a mesma proporção existente no longínquo ano de 1960.
O baixo dinamismo na incorporação de conhecimentos e inovações à estrutura
produtiva certamente desempenha papel central para explicar o medíocre crescimento
da produtividade no Brasil durante as últimas décadas. A dimensão do problema fica
caracterizada quando se compara a taxa de inovação nas empresas brasileiras

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(definida como a proporção de empresas com mais de 10 empregados que
introduziram algum novo produto ou processo entre 1998 e 2000) com a de alguns
países europeus, como apresentado no gráfico abaixo.

Percentual das empresas industriais que implementaram e que não


implementaram inovações de 1998 a 2000, para países selecionados

Fontes: EUROSTAT, 2004; IBGE, 2004; Viotti, Baessa e Koeller, 2005.

Contudo, percebe-se a existência de um pequeno núcleo de empresas industriais que


foram capazes de inovar em sua linha de produtos e competir com sucesso nos
mercados internacionais, chegando a receber, por conta da diferenciação introduzida,
preços significativamente mais elevados do que os recebidos por seus concorrentes.
Tais empresas apresentam elevados coeficientes de exportação, pagam salários mais
elevados para seus empregados e podem constituir uma base importante para a nova
estratégia de crescimento, inovação e competitividade da economia brasileira.
Existem, ainda, outros fatores que podem colaborar para o sucesso desta empreitada.
Destaca-se um aumento vigoroso na produção científica brasileira. O número de
artigos de autoria brasileira publicados em revistas científicas internacionais de
primeira linha subiu cerca de 500% entre 1981 e 2002, passando de um total de 1.887,
no início do período, para 11.285 ao seu término. Durante esse tempo, a produção
mundial de artigos científicos elevou-se apenas 70%. Portanto, a produção científica
brasileira cresceu a uma taxa média mais de 7 vezes superior à mundial.
A oferta de pessoal altamente qualificado também se expande de forma extremamente
acelerada. Entre 1987 e 2003, o número de brasileiros que receberam os títulos de
mestre e doutor a cada ano cresceu, respectivamente, 757% e 932%. Em 2003,
27.630 brasileiros concluíram cursos de mestrado e 8.094 concluíram o de doutorado.
No decorrer dos últimos sete anos, o número de titulações nos dois níveis tem
crescido a uma taxa de aproximadamente 15% ao ano.
O país conta, ademais, com uma estrutura produtiva diversificada e integrada, um
mercado interno de escala considerável, uma importante rede de instituições de
pesquisa e desenvolvimento, uma indústria aeronáutica competitiva, assim como uma
agropecuária cuja elevada competitividade conta com um eficiente sistema de P&D
setorial como um de seus pilares.
Todos estes fatores podem contribuir para o sucesso do grande desafio que se impõe
ao Brasil de hoje – o de mobilizar a capacidade de inovação e aprendizado tecnológico
da empresa brasileira.
A Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior e a Lei de Inovação
representam importantes passos para o bom êxito de tal empreendimento.

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O Brasil em Desenvolvimento
Estabilidade é fundamental para crescimento, mas é preciso complementar com
reformas. Nos debates sobre a conjuntura econômica do País, ouve-se falar em
superávit primário, taxa de juros, recuperação do PIB, combate à inflação, mas a
pergunta por trás de tudo isso é sempre a mesma: como fazer o Brasil crescer de
modo sustentado?
Toda a discussão tem como pano de fundo o tema prioritário para o crescimento
brasileiro: a vulnerabilidade centrada no nó fiscal.
Em decorrência da crise de 2002, quando o Brasil sofreu o impacto da brusca redução
dos fluxos de recursos internacionais e da elevação do risco-país, foi preciso aumentar
os juros e controlar ainda mais os gastos, além de aumentar as receitas para elevar o
superávit primário e assim impedir a dívida pública de entrar em trajetória explosiva
diante da forte desvalorização da taxa de câmbio.
Em 2003, o novo governo aprofundou o ajuste com firmeza de modo a controlar a
inflação, o que viabilizou, em 2004, o início de uma forte recuperação da economia,
com o crescimento do PIB atingindo 4,9%. Esse desempenho foi possível graças ao
aproveitamento da capacidade ociosa existente, tendo sido estimulado também pela
expansão do crédito doméstico e pelo aumento da demanda externa por produtos
brasileiros, fruto das medidas e do ajuste dos anos anteriores. Como resultado das
políticas de ajuste implementadas ao longo de 2003, ao final de 2004, a dívida líquida
do setor público havia diminuído para 51,8% do PIB (contra 57,2% no final de 2003) e
o saldo na conta corrente do balanço de pagamentos havia aumentado para US$ 11,7
bilhões (contra US$ 4 bilhões em 2003). Todos esses indicadores atestam para a
enorme melhoria de desempenho de nossa economia e para a redução de sua
vulnerabilidade, destacando-se o ajuste externo de cerca de 7% do PIB e a reversão
da tendência ascendente da relação dívida líquida/PIB.

A Evolução da Dívida Pública e do PIB, 1991-2004

Fonte: Boletim do Bacen e IBGE

Embora o modelo atual deva ter continuidade no que se refere à preservação da


estabilidade, esta não é suficiente para alavancar o crescimento: o Estado brasileiro
está endividado e o potencial de aumento dos gastos representa uma ameaça ao
controle desse endividamento.
Para se ter uma idéia, entre 1994 e 2002, a receita do governo federal aumentou de
19% para 24% do PIB, mas o gasto elevou-se de 17% para 21%. A maior parte do
aumento tem a ver com os gastos previdenciários associados ao aumento real do
salário mínimo e a uma expectativa de vida cada vez maior da população — logo, ao
aumento do número de idosos e do tempo que usufruem a aposentadoria, segundo as
regras atuais.

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Receitas e Despesas dos Sistemas Previdenciários

Fonte: Ministério da Fazenda e Ministério da Previdência Social

No meio do caminho, muitas pedras. Entre as saídas para os problemas, o texto


mostra a necessidade de expandir a capacidade de produção do País, via estímulos
ao investimento de longo prazo, melhoria dos marcos regulatórios para estimular
investimento em infra-estrutura, redução de tributos que oneram a produção,
diminuição de custo de mão-de-obra e estímulo à formalização das relações de
trabalho.
Para crescer, é preciso fundamentalmente recuperar o investimento em capital fixo, a
capacidade de atrair investimento estrangeiro e desenvolver o mercado de capitais por
meio de melhorias na regulação e na governança corporativa de modo a garantir mais
proteção aos investidores.
Destacam-se ainda alguns passos já consolidados no sentido de superar esses
desafios, como o empenho em corrigir o desequilíbrio financeiro da Previdência Social,
a redução do IPI para desonerar investimentos e exportações, a implementação da
nova PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior) e as Parcerias
Público-Privadas (PPP), que aparecem como uma alternativa potencialmente
promissora para expandir os investimentos em infra-estrutura.

O Desafio da Construção de uma Inserção Externa


Dinamizadora
O Brasil tem um mercado livre e uma economia exportadora. Medido por paridade de
poder de compra, seu produto interno bruto ultrapassa 1.6 trilhão de dólares, fazendo-
lhe a oitava maior economia do mundo e a maior da América Latina em 2006. Já em
2006, com o PIB tendo sido elevado para, aproximadamente, US$ 1,880 trilhão, o
Brasil passou a ocupar a posição de 7ª maior economia mundial, tendo ultrapassado a
França, desta vez. Ainda em 2006, o Brasil ficou a apenas US$ 24 bilhões de também
ultrapassar o Reino Unido e transformar-se na 6ª maior economia do mundo.
É possível (e inescapável) ver que só restarão EUA e CHINA na frente até 2020.
O Brasil possui uma economia sólida, construída nos últimos anos, após a crise de
confiança que o país sofreu em 2002, a inflação está controlada, as exportações
subiram e a economia cresceu em ritmo muito modesto. Em 2007, o PIB brasileiro
demonstrou um crescimento superior ao que se pensava, mostrando uma economia
muito mais saudável e pronta para estrelar junto às outras economias BRICs (BRIC é
um acrônimo cunhado pelo grupo Goldman Sachs para designar os quatro principais
países emergentes do mundo, a saber: Brasil, Russia, India e China).

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Desde a crise em 2002 os fundamentos macro-econômicos do país melhoraram. O
real vem se valorizando frente ao dólar desde 2004, o risco país também vem
renovando suas mínimas históricas desde o começo de 2007, e a Bovespa bateu
recordes de pontos.
Apesar de sua estabilidade macro-econômica, que reduziu as taxas de inflação e de
juros e aumentou a renda per capita, ainda remanescem diferenças entre a população
urbana e rural, os estados do norte e do sul, os pobres e os ricos. Alguns dos desafios
dos governos incluem a necessidade de promover melhor infra-estrutura, modernizar o
sistema de impostos, as leis de trabalho e reduzir a desigualdade de renda.
A economia contém uma indústria e agricultura mista, que são cada vez mais
dominadas pelo setor de serviços. As recentes administrações expandiram a
competição em portos marítimos, estradas de ferro, em telecomunicações, em
geração de eletricidade, em distribuição do gás natural e em aeroportos (embora a
crise área tenha atormentado o país) com o alvo de promover o melhoramento da
infra-estrutura. O Brasil começou à voltar-se para as exportações em 2004, atingindo
em 2006 exportações de US$ 137.5 bilhões, importações de US$ 91.4 bilhões e um
saldo comercial de quase US$ 46 bilhões.

Indicadores macro-econômicos e financeiros


Principais indicadores

O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil medido por paridade de poder de compra
(PPC) foi estimado em US$ 1.835 trilhão em 2007, e em US$ 1.313 bilhão em termos
nominais. Seu padrão de vida, medido no PIB per capita (PPC) era de US$ 9.600,00.
O Banco Mundial relatou que renda nacional bruta do país era a quarta maior do
continente americano e renda per capita em termos nominais de mercado (PCC) era a
oitava maior, sendo US$ 644.133 bilhões e US$ 3.460 respectivamente. Com isso, o
Brasil é estabelecido como um país de classe média. Depois da desaceleração de
2002 o país se recuperou e cresceu 5.7, 3.2 e 3.7% (PCC) em 2004, em 2005 e em
2006, mesmo que se considere estar bem abaixo do crescimento potencial do Brasil.
Em 2007, o PIB demonstrou uma grande aceleração do crescimento, com previsão
inicial de 4,3% de crescimento, subiu para 4.9% e depois 5.2%, terminando por
crescer 5.4%.
A moeda corrente brasileira é o real. O real substituiu o cruzeiro real em 1994 em uma
taxa de 2.750 cruzeiros por 1 real. A taxa trocada remanesceu estável, oscilando entre
R$ 1 e R$ 2,50 por dólar. As taxas de juros em 2007 situam-se em torno 13%. As
taxas de inflação estão em baixos níveis também, a registrada em 2006 foi de 3.1% e
as taxas de desemprego de 9.6%.

Economia do Brasil
Os maiores parceiros do Brasil no comércio exterior são a União Européia, os Estados
Unidos da América, o Mercosul e a República Popular da China.
O Brasil é a 10° maior economia mundial, de acordo com os critérios de Produto
Interno Bruto diretamente convertido a dólares, e está entre as 7 maiores economias
mundiais. Em Outubro de 2007 foi divulgada uma pesquisa da ONU, em que mostra
os melhores países para se investir do mundo. O Brasil ficou em 5º lugar, atrás
apenas da China, Índia, Estados Unidos e Rússia.
O primeiro produto que moveu a economia do Brasil foi o açúcar, durante o período de
colônia, seguindo pelo ouro na região de Minas Gerais. Já independente, um novo
ciclo econômico surgiu, com o café. Esse momento foi fundamental para o
desenvolvimento do Estado de São Paulo, que acabou por tornar-se o mais rico do
país.

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Apesar de ter, ao longo da década de 90, um salto qualitativo na produção de bens
agrícolas, alcançando a liderança mundial em diversos insumos, com reformas
comandadas pelo governo federal, a pauta de exportação brasileira foi diversificada,
com uma enorme inclusão de bens de alto valor agregado como jóias, aviões,
automóveis e peças de vestuário.
Em 2004 o Brasil começou a crescer, acompanhando a economia mundial. Isto se
deve a uma política econômica adotada pelo estado, ainda assim, as taxas de juros e
a política tributária são consideradas abusivas. No final de 2004 o PIB cresceu 5,7%, a
indústria cresceu na faixa de 8% e as exportações superaram todas as expectativas.
Atualmente o país está entre os 20 maiores exportadores do mundo, com US$ 160,6
bilhões (em 2007) vendidos entre produtos e serviços a outros países.
O Brasil é visto pelo mundo como um país com muito potencial assim como a Índia,
Rússia e China. A política externa adotada pelo Brasil prioriza a aliança entre países
em desenvolvimento para negociar com os países ricos. O Brasil, assim como a
Argentina e a Venezuela vêm mantendo o projeto da ALCA em discussão, apesar das
pressões dos EUA. Existem também iniciativas de integração na América do Sul,
cooperação na economia e nas áreas sociais.
Alguns especialistas em economia, como Peter Gutmann, afirmam que em 2050 o
Brasil irá atingir o padrão de vida verificado em 2005 nos países da Zona Euro.

Economia diversificada

O País responde por três quintos da produção industrial da economia sul-americana e


participa de diversos blocos econômicos, como o Mercosul e o G-22. Seu
desenvolvimento científico e tecnológico, aliado a um parque industrial diversificado e
dinâmico, atrai empreendimentos externos. Os investimentos diretos foram em média
da ordem de US$ 20 bilhões/ano, contra US$ 2 bilhões/ano da década passada.
O Brasil comercializa regularmente com mais de uma centena de países, sendo que
74% dos bens exportados são manufaturas ou semi-manufaturas. Os maiores
parceiros são: União Européia (com 26% do saldo); EUA (24%); Mercosul e América
Latina (21%); e Ásia (12%). Um setor dos mais dinâmicos nessa troca é o de
agronegócio que mantém há duas décadas o Brasil entre os países com maior
produtividade no campo.
Dono de sofisticação tecnológica, o País desenvolve de submarinos a aeronaves, e
também está presente na pesquisa aeroespacial, possui Centro de Lançamento de
Veículos Leves e foi o único país do Hemisfério Sul a integrar a equipe de construção
da Estação Espacial Internacional (ISS). Pioneiro na pesquisa de petróleo em águas
profundas, de onde extrai 73% de suas reservas, foi a primeira economia capitalista a
reunir as dez maiores empresas montadoras de automóvel em seu território.

Evolução do PIB brasileiro nos últimos anos


Em milhões de reais Per capita, em reais Em milhões de Taxa de variação real
Ano
correntes correntes dólares no ano
2001 1.198.736,19 6.896,35 509.796,80 1,31
2002 1.346.027,55 7.630,93 459.379,39 1,93
2003 1.556.182,11 8.694,47 506.784,16 0,54
2004 1.766.621,03 9.728,84 603.993,65 4,94
2005 1.937.598,29 10.519,88 795.924,37 2,30
2006 2.300.133,20 10.052,04 1.067.600,00 2,18
2007 2.558.000,00 13.515,00 1.313.098,52 2,03

Fonte: Banco Central do Brasil

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Artigos

Para onde caminhamos?


por Celso Furtado [*]

Os economistas da nova geração se interrogam


freqüentemente sobre as causas das baixas taxas de
crescimento da economia brasileira no último quarto de
século. Os dados são surpreendentes se temos em
conta que no quarto de século anterior o país
apresentou um dinamismo considerável, colocando-se
entre as duas ou três economias de mais rápido
crescimento em todo o mundo. Os economistas não
parecem ter explicação para essa mutação tão significativa.
Um país dotado de imensas reservas de recursos naturais e de mão-de-obra aplica
uma política que se satisfaz com uma taxa de crescimento próxima de zero. Não é
fácil descobrir as causas desse processo, mas devemos reconhecer que ele tem
origem ou é reforçado pelo chamado Consenso de Washington, que não passou de
um receituário neoliberal a serviço da consolidação da política imperial dos Estados
Unidos.
De acordo com essa nova doutrina, surgida nos anos 90, os Estados nacionais já
não teriam um papel importante na criação de empregos. Essa fórmula, que é o ideal
do neoliberalismo, funcionou muito precariamente ou não funcionou. O Brasil se
endividou desbragadamente, a ponto de comprometer sua governabilidade. Se
persistirmos no caminho de crescente endividamento externo, reverter a situação será
mais e mais difícil. E mesmo se o país tentar alguma forma de negociação com os
credores, não poderemos vislumbrar solução fácil, pois o sistema financeiro
internacional age com rapidez e unidade de comando.
Uma alternativa para escapar a esse quadro de grande vulnerabilidade externa
seria o governo praticar uma punção interna que permitisse triplicar o superávit em
conta corrente. Todavia, esse segundo caminho, se parece lógico em termos
contábeis, é impraticável por suas implicações políticas e por exigir um profundo
reajuste do sistema fiscal visando modificar o perfil da dívida interna.
Quando, nos anos 90, os governantes aderiram ao famoso Consenso de
Washington, adotaram, sem maiores explicações e sem debates com a sociedade, a
doutrina de que era necessário concentrar as atenções nos mercados externos,
condição essencial para recuperar o dinamismo perdido. Contudo, ninguém foi capaz
de explicitar a razão de ser dessa mudança de estratégia, e nem por que ela seria
mais benéfica a um país populoso e continental como o nosso. Aparentemente, a
mudança decorria do fato de que as empresas transnacionais iam controlando
progressivamente os centros de comando das atividades econômicas. Seja como for,
o resultado dessa soma perversa do Consenso de Washington com as taxas de
crescimento em fase de declínio foi a desarticulação do mercado interno e do parque
industrial, acuando alguns milhões de brasileiros a buscar sobrevivência no trabalho
informal. Hoje ainda sofremos as conseqüências desses anos do “consenso”. Se,
inversamente, nos remetemos àqueles anos em que o Brasil apresentou taxas de
crescimento elevadas, ou razoáveis, deparamo-nos com outro problema de igual
gravidade. Refiro-me ao fato de que, historicamente, o dinamismo da economia
brasileira se fez acompanhar de acentuada concentração de renda, o que é uma forma
espúria de geração de poupança.
Alcançamos assim o fundo do problema: a variável que comandou o dinamismo da
economia brasileira dos anos 50 ao fim dos anos 70 apoiou-se no processo de
concentração da renda. Não havia como escapar a essa dura realidade: o sistema
econômico só funcionava de forma regular quando a remuneração do capital atingia

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determinados níveis. Essa constatação nos permite entender outro ponto intrigante da
dinâmica da economia brasileira: suas extravagantes taxas de juros.
É inegável que há uma estreita ligação entre o processo de concentração de renda,
o nível das taxas de juros e as taxas de crescimento da economia. Assim, para captar
os paradoxos de nossa economia faz-se necessário ter em conta esses múltiplos
fatores, aparentemente desvinculados.
Em poucas palavras: se as taxas de juros não forem suficientemente altas (e as do
Brasil inscrevem-se entre as mais altas do mundo), os capitais estrangeiros não se
sentem atraídos a investir no país; sem esses investimentos externos (os setores
internos não dão conta das necessidades e acumulam um passivo considerável), o
país tem pouca margem para crescer.
Ora, apelar imoderadamente para os investimentos externos é aumentar de forma
considerável a nossa dívida; da mesma maneira, promover o crescimento sem
critérios sociais tende a agravar fortemente a concentração da renda.
Antes que se diga que se trata da quadratura do círculo, convém lembrar que a
reforma fiscal, tão repetidamente prometida pelos governos recentes, é o instrumento
mais adequado para enfrentar os problemas expostos acima. Essa reforma, contudo,
não tem conseguido o apoio do Congresso Nacional.
A carga fiscal no Brasil é alta mas injusta, pois incide de forma desproporcional
sobre a parte da população de menor poder aquisitivo, já que os impostos indiretos
(essencialmente os de consumo) são relativamente os que mais pesam. Precisamos
de uma reforma que modifique a distribuição da carga fiscal, liberando as camadas de
baixa renda.
Não se trata de onerar mais ainda a classe média que paga Imposto de Renda, mas
de corrigir um quadro de profundas desigualdades, cujo exemplo mais notório é o das
instituições bancárias que, apesar de seus lucros fabulosos, são praticamente isentas
de imposto. A reforma fiscal deverá corrigir essas distorções, mas não só.
Seu objetivo, tal como nos mostraram as reformas similares implantadas em países
da Europa, é também o de criar sociedades mais homogêneas. Certos setores do
sistema produtivo decerto sofrerão baixa de rentabilidade, mas é a sociedade como
um todo que lucrará com o esforço de adaptação que visa dar ao governo os meios de
enfrentar os sérios problemas sociais do país.
Em realidade, uma reforma fiscal pode ir tão longe a ponto de modificar o sistema
de valores das classes dirigentes de determinada sociedade. No nosso caso, já se fez
evidente a fragilidade das estruturas sociais resultantes de tantos decênios de
concentração de renda conjugada com baixo crescimento. Esta é uma problemática
que merece a atenção, não só dos jovens economistas, mas de toda a sociedade, e,
em particular, dos nossos governantes.

[*] Último artigo de Celso Furtado. Publicado pelo Jornal do Brasil no princípio
de Novembro e republicado dia 22/11/2004, após o seu falecimento.

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23/03/06 O Estado de S. Paulo


Brasil levará 100 anos para igualar renda à da Coréia
Estudo da CNI mostra que nos últimos 10 anos o PIB per capita teve um dos piores
desempenhos do mundo

O Brasil está perdendo importância na economia mundial e um dos resultados disso


é o empobrecimento da população. Estudo da Confederação Nacional da Indústria
(CNI) revela que, nos últimos dez anos (de 1996 a 2005), a renda per capita do
Brasil aumentou 0,7% ao ano, ante a média mundial de 2,6%.
"Se o Brasil mantiver o atual ritmo de crescimento econômico, levará um século
para que sua renda per capita dobrar e chegar próximo da sul-coreana ou de
Portugal", afirma o estudo. Em 2004, a renda per capita brasileira era de US$ 8.020,
equivalente a cerca de um quinto da dos Estados Unidos.
Com o baixo ritmo de expansão da economia, o PIB per capita do Brasil teve um
dos piores desempenhos do mundo e cresceu menos até que o de outros países da
América Latina na última década. Na Argentina, que enfrentou uma crise financeira
e política entre 2001 e 2002, o PIB per capita aumentou 2,2%. No México, cresceu
2,1% e no Chile, 2,8%.
No mesmo período, China e Índia lideraram a expansão do PIB per capita. O
rendimento médio dos chineses aumentou 7,7% ao ano entre 1996 e 2005. Caso a
China mantenha esse ritmo, a renda média da população, que era de US$ 5.530 em
2004, dobrará em nove anos e vai superar a dos brasileiros, lembra a CNI. "Mantidas
as condições de crescimento da última década, o futuro do Brasil será ruim", prevê
Paulo Mol, economista da entidade.

BAIXO INVESTIMENTO

Para chegar a estas conclusões, o estudo da CNI levou em conta o fato de que o País
cresceu 2,2% em média ao ano durante os últimos dez anos, enquanto o resto do
mundo teve expansão de 3,8%. Entre 1996 e 2005, o PIB do País aumentou 22,4%.
No mesmo período, o mundo cresceu 45,6%. Ou seja, por 10 anos seguidos, o Brasil
cresceu menos que a média mundial.
Segundo o documento, o baixo desempenho da economia brasileira é conseqüência
da falta de investimentos. "O Brasil investe pouco comparativamente à média
mundial, sobretudo em relação aos países emergentes da Ásia", diz a nota.
De 1995 a 2004, o volume de investimentos no Brasil representou 19,3% do PIB,
inferior aos 32,6% das economias emergentes da Ásia. Por isso, lembram os
técnicos da CNI, os países asiáticos são os que mais crescem. Na média mundial, os
investimentos equivaliam a 22,1% do PIB na última década.
Na avaliação dos técnicos da CNI, além de aumentar os investimentos, o Brasil
precisa enfrentar outros desafios para retomar o crescimento. Mol destaca que a
expansão da economia a taxas compatíveis com a do resto do mundo também
depende de reformas estruturais e da solução de problemas como excesso de
burocracia, rigor das leis trabalhistas, altos custos e falta de acesso ao crédito.

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10/10/2007

Grandes desafios aguardam as economias emergentes


Martin Wolf

Nunca antes as economias emergentes estiveram em tão boa posição para sustentar
a demanda durante uma desaceleração global. Nunca antes, também, isto foi mais
importante para todo o mundo. Mas o fato de uma linha de ação ser viável e desejável
não significa que acontecerá. Os otimistas acreditam que as economias emergentes
finalmente se desvincularam. Mas tal otimismo ainda pode provar ser infundado.
A visão positiva se apóia em duas proposições: primeiro, a desaceleração na
demanda americana se manterá branda; e, segundo, as economias dos mercados
emergentes - e particularmente a maior entre elas - estão fortes o bastante para
responder de forma eficaz. Como resultado, o mundo verá uma passagem do bastão
da demanda pelos Estados Unidos e, conseqüentemente, um ajuste benigno dos
"desequilíbrios globais".
Quanto às perspectivas para os Estados Unidos, a edição de setembro de 2007 da
"Consensus Economics" foi otimista: 2% de crescimento para este ano, seguido de
uma recuperação para 2,4% em 2008. A Goldman Sachs previu um crescimento de
1,8% para 2008. Mas este pessimismo não é universal: o JPMorgan prevê 2,6% em
2008. O que mais interessa é que as perspectivas se tornaram incertas: o impacto do
congelamento do crédito pode ser brando, mas também pode ser severo. Mas os
autores de políticas americanos contam com espaço para manobras: taxas de juros
mais baixas e até mesmo um impulso fiscal se seguiriam a uma fraqueza econômica.

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Agora de volta às economias emergentes. O grupo DBS, com sede em Cingapura,
nota que o crescimento asiático recentemente está acelerando enquanto o
crescimento americano está enfraquecendo. Além disso, acrescentou a Goldman
Sachs, os mercados emergentes estão mais resistentes a choques externos do que
antes. Esta visão é compartilhada nos mercados: veja a ascensão de papéis de
mercados emergentes e o modesto aumento dos spreads nos títulos de mercados
emergentes, apesar dos recentes choques nos mercados de crédito nos Estados
Unidos e outros países ricos.
A evidência da resistência dos mercados emergentes é impressionante: a dívida
externa caiu acentuadamente como percentual do produto interno bruto agregado;
muitos destes países apresentam superávits em conta corrente e têm, em
conseqüência, acumulado vastas reservas de moeda estrangeira; mesmo a América
Latina se tornou credora líquida; a inflação caiu para níveis baixos, apesar do recente
aumento nos preços dos commodities, incluindo o petróleo; e a proporção de
empréstimos irrecuperáveis (non-performing loans) por bancos com base em uma
grande amostra das economias emergentes, segundo a Goldman Sachs, caiu para
apenas 5,8% em 2006, em comparação a 13% em 2002.
Pela primeira vez, os mercados emergentes são um refúgio durante o choque
financeiro global que emana da potência econômica hegemônica no mundo. Como os
tempos mudaram e como os poderosos caíram!
Ironicamente, a força financeira atual das economias emergentes é um espelho da
fraqueza americana. Charles Dumas, da Lombard Street Research, com sede em
Londres, expõe isto em uma análise pela qual tenho grande simpatia.* A balança
global de pagamentos soma zero. Se as economias emergentes optaram por
promover imensos superávits em conta corrente, em parte por contarem com
cicatrizes profundas das crises financeiras dos anos 90 e em parte por desejarem
conservar a renda dos crescentes preços dos commodities que muitas delas
exportam, então alguém está enfrentando déficits.
Nos anos 2000, este alguém é principalmente os Estados Unidos. Isto provocou um
rápido crescimento da dívida interna e do serviço da dívida, principalmente nos lares.
A queda do preço dos imóveis e o problema do "subprime" agora descarrilaram esta
máquina de acúmulo de dívida.
A boa notícia, então, é que o que tornou os Estados Unidos vulneráveis é
precisamente o que tem facilitado para as economias dos mercados emergentes lidar
com o choque provocado pelos Estados Unidos. É verdade que isto não vale para
todas as economias emergentes. A Turquia e vários países da Europa Central (a
Hungria, por exemplo) apresentam grandes déficits em conta corrente e não estão em
posição de expandir a demanda. Estas economias estão, assim, vulneráveis às
mudanças no crédito externo. Mas tais restrições agora são relativamente raras entre
as economias emergentes significativas.
Mas a má notícia é que as economias dos mercados emergentes precisarão se
ajustar, provavelmente de forma agressiva. Parece improvável que o crescimento da
demanda acelerará na Europa Ocidental e no Japão. O oposto é mais provável. Mais
importante é o fato de que o crescente superávit em conta corrente da China, previsto
pelo Banco Mundial para chegar a US$ 380 bilhões em 2007, em comparação a US$
250 bilhões em 2006, está extraindo demanda do restante do mundo em 3/4 % do PIB
agregado deste. A previsão de superávit da China -impressionantes 12% do PIB- é
duas vezes maior, em relação ao PIB, do que o Japão já conseguiu.
A questão analítica é que a compensação de qualquer desaceleração na demanda
americana exigirá um maior crescimento da demanda no restante do mundo. Isto é
ainda mais verdadeiro se, como parece provável (e também desejável), o crescimento
da demanda americana desacelerar, em relação ao crescimento do PIB, e o déficit em
conta corrente americano encolher ainda mais. Neste caso, a demanda do resto do
mundo precisará crescer em relação à sua produção/output e, idealmente, deve
crescer mais rápido que a produção potencial, para assegurar pleno emprego de
recursos. Mas isto é exatamente o oposto do que a China -de longe a economia de
mercado emergente mais importante- está fazendo no momento.

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A conclusão, então, é simples e perturbadora. Sim, as economias emergentes estão,
com poucas exceções, em melhor posição do que antes para compensar uma
desaceleração americana e um aperto nas condições globais de crédito. O problema
que enfrentam é que provavelmente nem a Europa Ocidental como um todo, nem o
Japão, nem ao menos a gigante entre elas ajudarão muito. A China, em particular,
agora está exportando uma grande contração líquida, não uma expansão, na
demanda para o restante do mundo, porque sua oferta está crescendo mais
rapidamente do que sua demanda doméstica. A diferença apenas neste ano é de
2,5% do PIB. Se a demanda americana desacelerar substancialmente e a China,
Japão e a Europa Ocidental permanecerem em seus cursos atuais, a economia
mundial certamente desacelerará bem mais do que os otimistas atualmente esperam.
O que importa em tais momentos são as mudanças na demanda em relação à oferta.
Deste ponto de vista, a atual mistura da China é um desastre. O reequilíbrio na direção
de uma demanda doméstica mais forte e um superávit menor em conta corrente há
muito é domesticamente desejável. Em uma era de demanda americana mais fraca,
ela se tornou uma necessidade global. A China está prestes a ter a liderança
econômica depositada sobre ela. O que acontecerá agora dependerá muito de como a
gigante asiática responderá a este grade desafio.

*The bill from the China shop is arriving, "Monthly Review", Setembro de 2007,
www.lombardstreetresearch.com

Tradução: George El Khouri Andolfato

Créditos de carbono
Lucro para empresas e para o meio ambiente
Em um mercado cada vez mais globalizado e competitivo, Divulgação/Greenpeace

empresas e governos de países em desenvolvimento


encontraram no combate à poluição uma fonte alternativa para
aumentar as suas receitas e reduzir as emissões de gases do
efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento do planeta.

Isto é possível devido ao Protocolo de Kyoto, documento


assinado pela maioria dos países da ONU (Organização das
Nações Unidas), em 1997, como mecanismo de controle da
interferência humana no clima do mundo. O protocolo prevê uma
redução, até 2012, de 5,2% na emissão de gases do efeito estufa,
em relação aos níveis registrados em 1990.
Pelo acordo, os países que não estão dispostos a reduzir a
poluição podem comprar o excedente de outras nações. A
operação de compra e venda é simples: indústrias e países que
não conseguem reduzir a quantidade de poluentes que despejam
no ar precisam adquirir créditos de carbono. Por outro lado, as
Créditos de carbono: para conter a emissão de
empresas e nações que poluem menos do que a cota gases do efeito estufa

estabelecida pelo Protocolo de Kyoto ganham o direito de


negociar a diferença no mercado internacional.

Crédito de carbono
Para facilitar as transações, foi criada uma moeda, o crédito de carbono. Uma tonelada de CO 2
(dióxido de carbono) equivale a um crédito de carbono, que pode ser negociado no mercado
internacional, como qualquer ação de uma empresa.
Em 2006, as transações envolvendo créditos de carbono atingiram US$ 25 bilhões, sendo que
os principais negociadores foram países da Europa e o Japão. A Austrália e os Estados
Unidos, considerado o maior poluidor do mundo, não participam do acordo. Para estes países,
cumprir o Protocolo de Kyoto significa diminuir o desenvolvimento econômico. Além disso, a

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Austrália e Estados Unidos também defendem a inclusão de países poluentes em
desenvolvimento no acordo, como a China.

Bolsa de valores
Na América Latina, o primeiro leilão para a venda de créditos de carbono aconteceu em
setembro de 2007, na Bolsa de Mercadorias e Futuros, no Brasil. O banco belgo-holandês
Fortis pagou à Prefeitura de São Paulo R$ 34 milhões pelas emissões evitadas em um aterro
sanitário.
As empresas interessadas em ingressar nesse mercado precisam desenvolver projetos que
promovam a redução dos gases causadores do efeito estufa e realizar a sua inscrição na Bolsa
de Valores. No pregão eletrônico, as empresas vão repassar os créditos, chamados de
"Reduções Certificadas de Emissões", a outras empresas. Aterros sanitários, usinas de álcool,
indústrias siderúrgicas e centrais hidrelétricas são exemplos de potenciais empresas que
podem realizar transações deste tipo.
Os gases do efeito estufa atuam retendo o calor do sol junto à terra, aumentando a temperatura
global. O principal deles é o dióxido de carbono (CO2), emitido por veículos movidos a petróleo,
usinas termelétricas a carvão, por exemplo.

IPCC
O CO2 é um dos gases responsáveis pela manutenção da temperatura terrestre. Porém, o seu
excesso impede a saída de calor da atmosfera, provocando o aquecimento do planeta,
denominado de efeito estufa. Segundo a ONU, o CO 2 emitido pela queima de combustíveis
fósseis representa mais de 80% dos gases do efeito estufa produzidos pelo homem.
A preocupação com o equilíbrio ambiental aumentou depois que o IPCC (Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas), da ONU, divulgou um relatório revelando que, se
a emissão de poluentes seguir no ritmo atual, a temperatura média do Planeta irá aumentar
entre 1,8°C e 4° C, até 2100, o que provocaria danos irreparáveis ao meio ambiente. Com base
nos resultados preliminares do Protocolo de Kyoto, que tem prazo de validade até 2012, os
países já estudam outras fórmulas para reduzir a poluição no mundo.

30/03/2007
O Brasil entra no clube dos países com PIB superior a US$ 1
trilhão
O novo cálculo do PIB revela uma participação diferente dos setores na economia: o de
serviços produz 64% das riquezas, indústria e a agricultura recuaram

Annie Gasnier

Surgiram novos números, novos resultados e novas perspectivas: ao modificar o cálculo do seu
produto interno bruto (PIB) relativo ao período de 1995 a 2006, o Brasil descobriu em 28 de
março de 2007 que nos últimos onze anos a sua economia havia sido subestimada em 10,9%.
Após a correção, o crescimento do PIB para o ano de 2006 alcançou 3,7%.
Esta revisão para cima constitui uma boa notícia para uma economia brasileira que está doente
por causa do seu crescimento fraco demais, principalmente se comparado com a taxa de 10%
observado em outros gigantes emergentes como a Índia e a China.
Daqui para frente, o total das riquezas geradas pelo maior país da América do Sul é superior a
US$ 1 trilhão (R$ 2.070,8 trilhões). "Éramos a décima economia mundial até agora. Em 2005,
nós ocupávamos o oitavo lugar e agora, estamos nos aproximando do sétimo, que é o da
França", comemorou o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Para Alex Agostini, um economista da firma de consultoria Austin Rating citado pela agência de
notícias AFP, o Brasil ainda assim permaneceu, em 2006, a décima economia mundial, em
dólares correntes. "Em 2010 é possível que ele ultrapasse o Canadá e a Espanha para alçar-se
ao oitavo lugar, isso se o crescimento da Rússia não tiver nenhuma aceleração no período",
avalia.
A metodologia de cálculo não havia evoluído desde 1985, o que tornava a "fotografia" da
atividade ultrapassada. Na época, por exemplo, o telefone celular não existia, e hoje existem

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100 milhões de usuários. Os números afinados incorporam a economia "informal", que
emprega sem carteira assinada 40% da população ativa.

As "dúvidas" da oposição
A mudança foi preparada durante cinco anos pelos economistas do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), conforme os critérios das Nações Unidas. Os economistas, de
todas as tendências, receberam a revisão com satisfação, mas parlamentares da oposição
manifestaram as suas "dúvidas". Principalmente porque os anos em que o presidente Fernando
Henrique Cardoso governou o país (1995-2002) foram revistos para baixo, e os quatro últimos
anos, do mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, para cima.
Este PIB revelou uma distribuição diferente por setores: o setor dos serviços produz 64% das
riquezas. Junto com as telecomunicações, as atividades financeiras beneficiaram de uma forte
expansão. A indústria recuou para 27,7%, e a agricultura, campeã das exportações, para 8,3%.
"Nós podemos deduzir dos novos dados que o nosso país se aproxima cada vez mais da
maturidade", declarou Eduardo Pereira Nunes, o presidente do IBGE.
Uma maturidade que parecida conferir ao Brasil o status de país "emergido", diferentemente
dos "emergentes" tais como a China e a Índia, em fase de industrialização, e limitar o seu
crescimento anual, que permanece distante da média mundial de 4,9% em 2006. Os novos
resultados incitaram o governo a assegurar que "o Brasil voltou a se inserir num ciclo de
crescimento duradouro". A dívida segue diminuindo, à custa de um importante esforço fiscal.
Atualmente, a dívida equivale a 45,7% do PIB, contra 52,5% em 2003. O governo espera atingir
o patamar de 30% já em 2010, para seduzir os investidores estrangeiros.
Mas os investimentos permaneceram em níveis reduzidos (16,7% do PIB em 2006). Além
disso, apesar do Programa de Aceleração do Crescimento (que prevê investir US$ 500 bilhões
- R$ 1.035,4 trilhão - ao longo de quatro anos), que foi anunciado no final de janeiro de 2007,
"os investimentos não deveriam ultrapassar 21% em 2010", reconheceu o ministro da
economia.
A educação e a saúde, que são os eternos "parentes pobres" do orçamento, não beneficiam de
nenhum crescimento. Ignorando o piso de 6% recomendado pela Unesco (Organização das
Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura), o Brasil investiu 3,8% do PIB apenas
na sua juventude. As despesas com saúde, por sua vez, diminuem para 1,77%.
Assim como o Estado, os brasileiros gastam muito e a expansão do PIB se deve principalmente
ao consumo. O aumento dos salários, associado à distribuição da "Bolsa Família" para 11
milhões de lares desfavorecidos, incentivou as despesas, entre outros em equipamentos
domésticos.

Tradução: Jean-Yves de Neufville

A maturidade do capitalismo brasileiro


Por Gustavo H.B. Franco
Revista Época – Seção Nossa Economia | Edição nº 472

As multinacionais praticamente não existiam na primeira metade do século XX.


Cinqüenta anos depois, quando o mundo se deslumbrava,
ou se indignava, com a globalização, elas eram
responsáveis por dois terços do comércio mundial –
metade dele se dava e se dá dentro de empresas do mesmo
grupo. A globalização, vista do ângulo industrial, sem
dúvida, é uma criatura das multinacionais e de suas redes
de “produção internacional”.

No começo, foram as grandes empresas exportadoras


americanas, “pulando” as barreiras comerciais colocadas
nos países para os quais exportavam, como no caso das
montadoras de automóveis que vieram para o Brasil. Em

Prof. FabioGUSTAVO
Uchôas H.B. FRANCO
de Lima 18
é economista e professor da PUC-Rio e
escreve quinzenalmente em ÉPOCA. Foi
presidente do Banco Central do Brasil.
www.gfranco.com.br
gfranco@edglobo.com.br
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vez de importar, chamamos as multinacionais para produzir aqui. Era a substituição de


importações, um processo que estava longe de ser apenas brasileiro. Na verdade, era
mais europeu. Foi na França que apareceram as reações mais mal-humoradas ao
fenômeno, como no livro clássico de Jean Jacques Servan Schreiber, O Desafio
Americano, que detonou uma torrente de “estudos” atacando as multinacionais. Sempre
a França na vanguarda... Em seguida, no Japão dos anos 1970, as empresas
exportadoras “migraram” para países com menor custo de mão-de-obra e câmbio menos
valorizado para preservar sua competitividade. Os japoneses são pragmáticos: mudaram
as fábricas para a Coréia e a Malásia sem queixumes nacionalistas.
Agora, no Brasil, todas essas motivações aparecem nos anúncios das grandes empresas
exportadoras brasileiras que fazem investimentos diretos no exterior. No começo, foi o
protecionismo no Norte que motivou aquisições, em seguida o offshoring e o
outsourcing – e tantas outras flores do mundo dos consultores – com vista à redução de
custos, inclusive o custo do capital, ou o objetivo de obter “melhor crédito” ou “rating”
que a República. Em alguns casos, já vemos movimentos de consolidação global de
mercados, em que empresas brasileiras transcendem o status de multinacionais e se
tornam globais.
Sim, já temos multinacionais brasileiras – Evo Morales que o diga – e, seguramente, o
movimento não vai parar aí. Estudiosos do assunto observam que o investimento no
exterior, pelas empresas locais, tem a ver com o grau de desenvolvimento. No começo,
o país emergente apenas recebe investimento direto. Com o tempo, suas melhores e
maiores empresas exportadoras começam a investir no exterior pelas razões
mencionadas. O movimento de internacionalização se generaliza, e o país, que já não é
mais propriamente emergente, é “anfitrião” e “investidor” na mesma intensidade. O país
deixa de ter “passivo externo líquido”, uma dessas criaturas que causam pesadelos aos
economistas marxistas.
No Brasil, em 2006, pela primeira vez em nossa história, o investimento direto
brasileiro no exterior (que atingiu US$ 28,2 bilhões) superou significativamente o
investimento direto estrangeiro no Brasil (US$ 18,8 bilhões). Não foi um ano típico.
Pode-se dizer que a aquisição da Inco pela Vale “distorceu” a estatística. Seria um fato
isolado, não estivessem pipocando notícias semelhantes com freqüência cada vez maior.
A combinação de câmbio valorizado, subida de preço das ações (a moeda de compra)
das empresas brasileiras, desejo de relocalizar a produção (ou partes) para reduzir
custos, desejo de garantir acesso e de elevar o porcentual das vendas no exterior para
melhorar o rating corporativo e o custo do capital vai produzir mais internacionalização
de empresas brasileiras.
Vão aparecer os tradicionais porta-vozes do Parque Jurássico, os inimigos do futuro, a
dizer que o Brasil está exportando empregos e indústrias. Lorota. O mundo é um lugar
muito grande, o capitalismo brasileiro amadureceu e se internacionalizou de um jeito
que muita gente não viu, nem mesmo os capitalistas, ou ao menos uma boa parte deles.

24/10/2008 - 08h35

Sarkozy diz que crise põe em perigo futuro da


humanidade

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Pequim, 24 out (Lusa) - O presidente francês, Nicolas Sarkozy, disse nesta sexta-feira,
24/10/2008, que "o mundo está mal" e vive "uma crise sem precedentes".
A persistente crise financeira "põe em perigo o próprio futuro da humanidade", afirmou
Sarkozy na abertura da 7ª edição da ASEM (Encontro Ásia-Europa), que acontece até
sábado em Pequim, capital chinesa, com a participação de 43 países dos dois
continentes.
Sarkozy, que detém a presidência da União Européia até ao final do ano, pediu a
participação na anunciada cúpula internacional sobre a crise financeira global, que
será realizada em Washington, capital norte-americana, em 15 de novembro.
A Europa "vai apresentar-se unida" e "deseja que a Ásia apóie este esforço", disse o
presidente francês.
A resposta da comunidade internacional à crise - afirmou Sarkozy - poderá assinalar
"o momento em que o mundo entrou no século 21".
O presidente da Comissão Européia (braço executivo do bloco europeu), José Manuel
Durão Barroso, que discursou na mesma cerimônia, defendeu também "uma resposta
global" à crise e condenou o protecionismo.
Não podemos enfrentar os desafios atuais fechando a porta e olhar apenas para a
nossa casa (...) Abertura e interdependência são as duas faces da moeda da
globalização", frisou Durão Barroso.
"No globalizado mercado de hoje" -concluiu o presidente da Comissão Européia-
"todos necessitamos de estar envolvidos".

As principais crises da bolsa


Essas são as principais crises das bolsas mundiais ao longo da história.

- 1720: Quebra na Grã-Bretanha em dezembro, depois de uma onda de especulação


que provoca a queda da companhia marítima do Sul e do banco Law.

- 1882: 'Crack" do banco católico francês Union Générale. Bolsas de Lyon e Paris
despencam, França entra em crise econômica.

- 1929: Quinta-feira negra em Wall Street. No dia 24 de outubro, o índice Dow Jones
da bolsa de Nova York perde mais de 22% em suas primeiras horas de sessão,
apesar de se recuperar ao longo do dia e fechar em -2,1%. Em 28 de outubro cai
novamente em 13% e no dia 29, em 12%. Essa crise obriga o fim da especulação da
bolsa e marca o início da grande depressão dos Estados Unidos e de uma crise
mundial que afeta especialmente a Europa.

- 1987: Wall Street desmorona no dia 19 de outubro depois da divulgação de dados


que mostram um importante déficit comercial e um aumento das taxas de juros do
Banco Central alemão. Em um dia, a Dow Jones perde 22,6% e outros índices
registram importantes perdas, mostrando a interdependência dos mercados mundiais.
Trata-se do primeiro "crack" da era da informática.

- 1998: Agosto negro na Rússia. O rublo (moeda do país) perde cerca de 60% do seu
valor em onze dias. A Rússia vive uma crise econômica e monetária vinculada em
parte à crise asiática de 1997.

- 2000: A bolsa eletrônica vive sua primeira grande crise. O índice Nasdaq, que
concentra os valores de internet e de tecnologia, cai 27% nas duas primeiras semanas
de abril e perde 39,3% em um ano. Essa queda repercute em todos os mercados
vinculados à Nova Economia.

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- 2001: Os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos, que deixam mais de
3.000 mortos, provocam o fechamento da bolsa de Nova York durante uma semana.
Em sua reabertura, o índice Dow Jones sofreu a maior perda em pontos de sua
história, de 684,81 pontos.

- 2002: A falsificação das contas da empresa americana Enron e a fraude do grupo de


telecomunicações Wordcom desestabilizam as bolsas do mundo. Os mercados
registram quedas inéditas: Frankfurt perde -43,9%, Paris -33,7% e Londres -24,8%.

- 2008: As conseqüências da crise dos "subprime" (créditos hipotecários de alto risco)


nos Estados Unidos se propagam aos mercados financeiros americanos e mundiais.
Nos nove primeiros meses do ano, os principais índices perdem mais de 25%. A crise
se agrava no início de outubro com quedas de quase 10% em vários mercados
mundiais na segunda-feira 6 de outubro.

Crise financeira rompe o idílio entre mercados e


países emergentes
PARIS, 24 Out 2008 (AFP) - Uma nacionalização criticada na Argentina, ataques às
moedas do Leste Europeu, pânico nos mercados russos: a ilusão dos países
emergentes em relação a seu progresso econômico pode cair por terra e privar de vez
os mercados de um de seus apoios mais seguros dos últimos anos.
"Nenhuma região está imune" à crise mundial, resume Christine Li, da agência de
classificação Moody's, comparando a periclitante situação atual à saúde invejável do
mundo emergente no início do ano, cheio de oportunidades para as empresas
ocidentais.
Para Jean-Louis Mourier, da casa Aurel, o vigor das economias asiáticas, européias
do leste e latino-americanas "serviu durante muito tempo como amortecedor das
empresas muito globalizadas", preservando-as das turbulências financeiras.
No entanto, um primeiro alarme soou no último trismetre no mercado das matérias-
primas, coincidindo com o fim dos Jogos Olímpicos de Pequim, gerando temores de
uma desaceleração dos investimentos chineses. Os preços do petróleo e do aço foram
os primeiros a cair.
As ações das poderosas mineradoras BHP Billiton e Rio Tinto, da líder mundial da
siderurgia ArcelorMittal e da gigante americana do alumínio Alcoa, agonizam: em três
meses, perderam, respectivamente, 47% e 55% em Londres, 65% em Paris e 68% em
Nova York.
O pessimismo do Fundo Monetário Internacional (FMI) em suas recentes previsões
sobre o crescimento mundial ampliou os temores dos investidores em relação às
"empresas de infra-estrutura e construção", sustentadas até então por seus contratos
nos países emergentes, segundo Mourier.
A crise financeira foi o último estopim, acentuando "os riscos de suspensão de
pagamentos" para os Estados mais vulneráveis, particularmente "aqueles que se
apoiaram demais nos capitais estrangeiros para financiar seu crescimento", indicou Li,
citando como exemplo os casos de Argentina, países bálticos, Turquia, Hungria e
Ucrânia.
A decisão de Buenos Aires de nacionalizar seu sistema de pensões foi interpretada
como uma tentativa de "lançar mão da poupança dos cidadãos para evitar o que seria
sua segunda moratória em uma década", depois da de 2001, estimou Aaron Smith, da
Moody's.
Julgada hostil por grupos estrangeiros, a nacionalização derrubou nesta semana a
bolsa de Madri, arrastada pelas empresas mais presentes na Argentina, como a
petroleira Repsol e a operadora Telefónica. A francesa Alstom, que tinha entre seus

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projetos a construção, agora congelada, de um trem de alta velocidade na Argentina,
também viu suas ações despencarem em Paris.
A fragilidade financeira de alguns países do Leste, ilustrada pela queda das moedas
húngara e polonesa e pelas advertências da Standard and Poor's sobre a dívida russa,
levou a uma escalada "das preocupações dos bancos expostos nesta região, como (o
francês) Société Génerále", segundo um analista parisiense.
Mas os países com economias mais sólidas e reservas polpudas, como Brasil e
México, também sofreram fortes desvalorizações de suas moedas nas últimas
semanas.
Jean-Paul Pierret, diretor de estratégias da Dexia, classifica, no entanto, como
"absurdos" os reveses indiscriminados sofridos por grupos implantados nos países
emergentes, destacando que "a situação não é homogênea, e a China não é a
Hungria".
"Vamos ter que escolher entre os países que criaram uma dinâmica interna e dispõem
de enormes reservas e aqueles que não souberam reinvestir seus excelentes lucros
procedentes das matérias-primas", argumentou Pierret.
Mas esta reflexão deve demorar ainda, lamenta o analista, "enquanto o mercado
continuar dando a impressão de que

22/10/2008 - 17h36

10 questões para entender o tremor na economia


GUSTAVO PATU
da Folha de S.Paulo

O que era uma onda de calotes no mercado imobiliário dos Estados Unidos se
transformou em uma crise nos mercados de ações, de crédito e de câmbio do planeta
--e os efeitos já começam a chegar ao comércio, aos empregos e ao cotidiano de
todos. As próximas páginas procuram trazer à linguagem comum as origens da crise,
a dinâmica do mundo financeiro e os desafios a serem enfrentados pelo Brasil.
Leia a seguir dez explicações que ajudam a entender a atual crise:

1 - Como um momento de euforia econômica se transforma em pânico financeiro?


2 - Se as autoridades culpam os especuladores, por que a especulação não é coibida?
3 - Por que os bancos quebram? Por que são socorridos?
4 - De onde os bancos centrais tiram dinheiro para injetar nos bancos?
5 - Se as ações não estão diretamente envolvidas na crise, por que as Bolsas
desabam?
6 - Por que o governo não consegue controlar a cotação do dólar?
7 - O que acontece em uma recessão?
8 - Por que o Brasil tende a crescer menos?
9 - Por que as empresas brasileiras que nada têm a ver com as origens da crise
tiveram prejuízos milionários?
10 - Quais são as opções do governo brasileiro para lidar com os efeitos da crise?

1 - Como um momento de euforia econômica se transforma em pânico


financeiro?

Crises especulativas como a atual --documentadas desde o século 17, com dimensões
variadas-- são sempre gestadas em momentos de juros baixos e crédito farto, mais
comuns em fases de prosperidade. E a economia mundial vivia o melhor momento
desde a década de 70.

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O acesso mais fácil ao dinheiro reduz a noção geral de risco. Tanto profissionais do
mercado quanto cidadãos comuns se tornam mais propensos a investimentos
ousados, em busca de lucros mais altos e rápidos.
Nesse cenário, surgem as 'bolhas': um tipo de investimento -sejam ações, moedas,
imóveis, empréstimos ou, em tempos mais remotos, canais, ferrovias e até tulipas- se
torna uma mania e se valoriza muito além das reais possibilidades de retorno. Cria-se
um círculo vicioso: quanto mais gente entra no mercado, mais ele se valoriza; quanto
mais se valoriza, mais gente entra.
No caso atual, a bolha foi criada no mercado imobiliário americano, antes de se
disseminar por outros mercados e países. Casas e apartamentos com preços em alta
serviam de garantia para financiamentos imobiliários que ajudavam a elevar os preços.
A espiral culminou em financiamentos de altíssimo risco para clientes sem capacidade
de pagamento.
Os participantes do mercado sabem que a festa não vai durar para sempre.
Paradoxalmente, isso estimula a corrida à especulação: os investidores querem
aproveitar a oportunidade antes do estouro da bolha.
Como se sabe que a situação é insustentável, o primeiro sinal --quebra de banco,
disparada de uma moeda, moratória-- causa pânico geral, e todos querem fugir ao
mesmo tempo e multiplicam as perdas. Decisões individuais racionais, portanto,
podem levar a comportamentos coletivos irracionais.

2 - Se as autoridades culpam os especuladores, por que a especulação não é


coibida?

Os especuladores, tratados no coletivo e no anonimato, são bodes expiatórios


convenientes quando as crises explodem. Evoca-se a antipatia dedicada aos
gananciosos que desejam enriquecer sem produzir, deixando em segundo plano os
questionamentos à política econômica ou à atuação dos órgãos reguladores.
Propostas para restringir a especulação são antigas e periodicamente lembradas. A
mais famosa, do economista americano James Tobin, é a de criar um imposto sobre
todas as transações financeiras, uma espécie de CPMF global, para tornar mais lentos
e mais caros os movimentos do mercado. Nas palavras de seu idealizador, jogar 'um
pouco de areia' nas engrenagens do sistema.
Passadas as crises, no entanto, as ameaças e limites impostos aos especuladores são
esquecidos ou contornados. Em parte porque o setor financeiro é influente no mundo
das idéias e da política, mas, principalmente, porque a especulação é um dos motores
da economia de mercado.
Os especuladores --aqueles unicamente interessados em comprar e vender com lucro-
viabilizam e expandem os mercados de ações, de moedas e de títulos. Se não fosse a
especulação, só compraria ações, por exemplo, uma meia dúzia de fato interessada
em se tornar sócia de uma empresa.
A riqueza financeira se distancia cada vez mais dos valores que enxergamos
diariamente. Em 1980, o volume de dinheiro aplicado no mercado financeiro era 20%
superior à riqueza produzida no mundo. Em 2006, mais de 200%.
O Produto Interno Bruto global, no período, quase quintuplicou, de US$ 10 trilhões
para US$ 48 trilhões. Mais espantoso foi o salto do volume de dinheiro aplicado nos
bancos, em títulos e ações, que foi de US$ 12 trilhões para US$ 167 trilhões. Mais
dinheiro no mercado significa mais possibilidades de investimento e crescimento -e
mais riscos também.

3 - Por que os bancos quebram? Por que são socorridos?

Uma pessoa ou uma empresa quebrada é a que não consegue pagar suas dívidas.
Um banco quebrado é o que emprestou dinheiro a quem não conseguiu pagar as
dívidas, como mutuários do subprime americano.

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O papel do sistema financeiro é intermediar o encontro entre os que desejam poupar e
os que desejam investir. Sua tarefa é selecionar pessoas e empresas mais aptas a
progredir e a conseguir pagar com juros o dinheiro recebido. Os menos aptos pagam
juros maiores para compensar o risco.
Nos financiamentos imobiliários tradicionais, o banco empresta recursos da poupança.
Para os mutuários sem emprego, sem documentos e sem garantias dos EUA, a
operação foi muito mais sofisticada.
Os empréstimos serviram de base para títulos que proporcionavam a seus
compradores os superjuros cobrados nos financiamentos imobiliários. De pequeno
valor unitário e livremente negociáveis, títulos permitem que os credores se tornem
múltiplos e anônimos.
Os títulos, por sua vez, serviram de base para derivativos, ou seja, contratos em que
as partes perdem ou ganham a partir da variação de um ativo financeiro, muito
semelhante a uma aposta num cassino.
A sofisticação não removeu o obstáculo mais prosaico e previsível: os pobres-coitados
que habitam a economia real não puderam mais pagar as dívidas.
Administradores de poupança pública, os bancos podem provocar perdas
generalizadas ao quebrar. E, quanto maior o erro, maior a chance de socorro por
governos que querem evitar ou atenuar uma onda de falências e desemprego.

4 - De onde os bancos centrais tiram dinheiro para injetar nos bancos?

Os bancos centrais, mesmo os que estão formalmente subordinados a governos,


como o brasileiro, têm poder de decisão para movimentar diariamente enormes
quantias, necessárias para a execução da política monetária, ou seja, de controle do
volume de dinheiro e crédito na economia.
Dos seus superpoderes, o mais usual e importante são as operações de mercado
aberto, em que se negociam títulos com bancos. Quando querem elevar a oferta de
moeda e reduzir juros, os bancos centrais compram títulos --como fizeram na semana
passada os seis principais BCs do mundo.
Quando se deseja um aperto monetário, como o BC brasileiro vem fazendo para
conter a inflação, vendem-se títulos, e há menos dinheiro na praça. Os juros dessas
operações servem de base para as demais operações da economia e, por isso, são
chamados de "taxa básica".
Para regular a oferta de crédito, os bancos centrais recolhem parte dos depósitos em
contas correntes e aplicações financeiras. Nos últimos dias, o BC brasileiro liberou
mais de R$ 100 bilhões desse recolhimento compulsório para tentar conter queda do
volume de empréstimos e financiamentos.
Por fim, os bancos centrais têm o papel de atender, a seu critério, bancos que não
conseguem obter no mercado recursos para operações diárias. Por maiores que
sejam, esses empréstimos à base de emissão de moeda só resolvem problemas
momentâneos de liquidez.
Se o banco tem problemas patrimoniais, ou seja, se o dinheiro dos devedores for
insuficiente para saldar compromissos, seus donos têm de entrar com mais capital. Se
não têm dinheiro, a solução do momento é achar um sócio --o governo, ou, mais
exatamente, dinheiro dos contribuintes.

5 - Se as ações não estão diretamente envolvidas na crise, por que as Bolsas


desabam?

Quem compra ações se torna sócio de uma empresa e, portanto, espera lucros com a
expectativa de crescimento futuro da economia. Se as expectativas para os próximos
meses e anos se tornam sombrias, os investidores se desfazem das ações, e o
movimento de venda em massa derruba os preços.
Ainda que a maior parte dos participantes do mercado não queira relações duradouras
com as empresas, mas apenas comprar e vender com vantagem suas participações, a

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valorização das ações depende das perspectivas para a empresa em particular e para
o mercado em geral.
Ações de empresas diretamente envolvidas na crise, como as de bancos que se
aventuraram no crédito arriscado ou nos derivativos a ele atrelados, tendem a cair
mais, mas as demais tampouco estão a salvo.
Os mercados financeiros são interligados em todo o mundo. Um investidor que teve
prejuízo com derivativos no Japão, por exemplo, pode ser obrigado a vender ações no
Brasil para cobrir as perdas.
Ações são o que se chama de investimento de renda variável. Diferentemente de
quem aplica na poupança ou em um CDB, os compradores de ações não sabem
quanto nem quando vão ganhar. Sabem apenas que pretendem ganhar mais do que
oferecem as opções conservadoras de renda fixa.
Não por acaso, há uma sucessão frenética de compras e vendas nas Bolsas, o que
faz o índice geral das ações alternar altas e baixas em questão de minutos. O
mercado brasileiro, com grande presença de capital estrangeiro e concentrado nas
ações de poucas empresas grandes, como a Petrobras e a Vale do Rio Doce, tende a
ser ainda mais volátil --ou seja, apresentar percentuais mais elevados de alta ou de
baixa- do que a média das Bolsas de Valores do mundo.
Emoções à parte, quando se observa o comportamento do mercado em períodos mais
longos, medidos em décadas, a tendência geral é sempre de alta -porque, afinal,
também assim funciona, aos trancos e barrancos, o capitalismo.

6 - Por que o governo não consegue controlar a cotação do dólar?

O câmbio é o preço mais importante da economia, mais ainda em países, como o


Brasil, cujas moedas não são aceitas como pagamento de importações ou pagamento
de dívidas com o exterior.
O preço do dólar afeta o comércio, a inflação, as contas do governo, o crescimento
econômico e a popularidade dos governantes.
Ainda assim, o governo passou os últimos anos tentando, sem sucesso, segurar a
valorização do real -e as últimas semanas tentando, também inutilmente, deter a
disparada do dólar. Devido a essa incapacidade, proclama-se oficialmente, desde
1999, que o câmbio é livre no Brasil.
Não é difícil entender: o mercado de câmbio é o maior dos mercados financeiros, com
movimento diário de US$ 3 trilhões a US$ 4 trilhões que podem ir de um extremo a
outro do planeta em alguns segundos.
Mesmo as nada desprezíveis reservas de US$ 200 bilhões acumuladas pelo Banco
Central poderiam virar farelo se o governo tentasse, como no passado, administrar sua
taxa de câmbio em um cenário de livre fluxo de capitais.
Para manter o câmbio, o governo precisa atender aos movimentos de compra e venda
do mercado: se falta dólar, precisa vender suas reservas para ampliar a oferta e evitar
uma disparada das cotações; se sobra, compra o excesso para manter o preço
estável.
Nos últimos meses de câmbio administrado, o país precisava paralisar sua economia
com juros de 40% ao ano na tentativa de atrair os dólares necessários.
Mas esse não é um caso de incompetência nacional. Os Estados Unidos e o Japão
adotaram o câmbio flutuante na década de 70, e a Europa, nos 90.
Onde houve liberdade, o fluxo de capitais derrubou o sistema de cotações que havia
sido acertado entre os países na conferência de Bretton Woods, em 1944 -a última
iniciativa de controle das finanças globais, sempre lembrada em tempos de crise e
esquecida logo depois.

7 - O que acontece em uma recessão?

Uma recessão começa quando investidores acreditam que a hora não é boa para
investir e consumidores crêem que a hora não é boa para consumir. E, na tentativa de
protegerem sua riqueza, todos empobrecem.

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O desalento não é um mero estado de espírito. Empresas e famílias afetadas pela
crise perderam efetivamente condições de investir e consumir, como os donos de
ações e imóveis que perderam valor. Não se trata de um caso em que uns perdem e
outros ganham, num jogo de soma zero: essa riqueza simplesmente desapareceu.
Quando não se confia no futuro, o medo toma o lugar da ganância. Evita-se emprestar
dinheiro e procura-se poupar para dias difíceis. Mas, com a retração de investimento e
consumo, empresas vendem menos; com a queda nos lucros, há mais demissões;
com menos renda, as famílias cortam o consumo, e o ciclo recomeça.
Tecnicamente, os economistas consideram que há uma recessão quando o PIB
(Produto Interno Bruto) cai por dois ou três trimestres consecutivos. Quando se
imagina uma queda profunda e prolongada do PIB, fala-se, mais dramaticamente, em
depressão --mas, após a década de 30, nenhum período da história econômica
mundial chegou a merecer o termo.
Recessões mundiais são raras: na história recente, não há casos de anos em que o
PIB global tenha terminado menor do que começou. Em 1982, em meio à crise da
onda de calotes do Terceiro Mundo, a economia mundial cresceu 0,9%, e desde então
não houve resultado pior. No Brasil, a pior recessão ocorreu em 1990, quando o Plano
Collor confiscou depósitos bancários e o PIB caiu 4,4%.

8 - Por que o Brasil tende a crescer menos?

Depois de dois anos seguidos de expansão econômica na casa dos 5%, o governo já
decretava que fazia parte do passado a comparação entre o crescimento brasileiro e
um vôo de galinha. Agora, a galinha está prestes a pousar mais uma vez.
Não há, até o momento, previsões de recessão, mas é consensual que os percentuais
de crescimento serão mais modestos em 2009. Andar mais devagar não é tão ruim
quanto andar para trás, mas os efeitos econômicos e políticos são da mesma
natureza.
O Brasil já sofre com a retração mundial do crédito. Boa parte do dinheiro emprestado
aqui dentro é obtida lá fora. Com recessão nos Estados Unidos e na Europa, encolhe
o mercado para as exportações brasileiras, que também cairão de preço.
Multinacionais tendem a cancelar ou adiar planos de expansão no país.
Outra ameaça é a recente disparada do dólar, que não se sabe onde ou quando vai
parar. Se o dólar se mantiver alto, importações ficarão mais caras e a inflação tenderá
a subir. Nesse caso, o Banco Central, na contramão do resto do mundo, poderá optar
por subir ainda mais os juros e conter o consumo, o investimento, o crescimento e os
preços.

9 - Por que as empresas brasileiras que nada têm a ver com as origens da crise
tiveram prejuízos milionários?

Empresas entram no mercado de derivativos para se protegerem de perdas, enquanto


os especuladores assumem os riscos para ganhar. Sadia, Aracruz e Votorantim --entre
muitas outras, teme-se-- acabaram participando de uma tentativa de fazer as duas
coisas.
Embora o nome cause estranheza, derivativos fazem parte do cotidiano de quem faz,
por exemplo, o seguro de um automóvel. O dono do carro não quer sair mais rico do
negócio; quer simplesmente uma operação que, se for preciso, renderá dinheiro
suficiente para cobrir possíveis prejuízos de sua atividade de motorista. É o que se
chama de hedge.

Na outra ponta da operação, está um especulador apostando que o carro não será
batido nem roubado, a seguradora. Se a aposta estiver correta, ela ficará com o
prêmio pago pelo dono do carro.
Os demais derivativos podem ser mais complexos, mas seguem os mesmos
princípios. Empresas exportadoras, com receita em dólar, buscam se proteger de uma
desvalorização vendendo a moeda americana no mercado futuro por uma cotação

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considerada razoável. Se o dólar mudar de patamar, a perda em receita será
compensada pelo derivativo.
Como o dólar caía sem parar, os bancos passaram a oferecer às empresas operações
que prometiam ganhos superiores ao necessário para cobrir riscos de perdas. O que
era hedge virou especulação. E dava lucro, até a crise provocar uma alta inesperada
do dólar -que, se não for revertida, poderá revelar mais empresas no jogo e perdas
maiores.

10 - Quais são as opções do governo brasileiro para lidar com os efeitos da


crise?

A primeira reação do governo tem sido tentar evitar ou atenuar a secura de crédito,
cuja expansão foi um dos motores da economia brasileira nos últimos anos, embora
retórica oficial prefira dar mérito ao PAC.
Mas, como aconteceu em todas as crises recentes, o país pode ser obrigado a
escolher entre crescimento e inflação --sacrificar o primeiro para evitar a segunda ou,
na alternativa menos conservadora, tentar acelerar um correndo o risco de impulsionar
a outra.
No primeiro caso, a receita é conhecida: os juros são mantidos ou até elevados, e o
mesmo é feito com a meta de superávit primário (a parcela da arrecadação tributária
destinada ao abatimento da dívida pública). As medidas reduzem o consumo público e
privado, esfriam a economia e ajudam a impedir que a alta do dólar se transforme em
aumento da inflação.
Esse era o cenário traçado antes do agravamento da crise, quando as atenções do
governo se voltavam para a rápida piora da balança comercial, efeito colateral do
consumo em alta. O projeto de Orçamento de 2009 já contempla a possibilidade de
aumentar superávit primário.
Mas a perspectiva de contração econômica acima do esperado levou setores menos
ortodoxos da equipe econômica a falar, até aqui no anonimato, em medidas pró-
crescimento, de mais gastos públicos, menos impostos e menos juros. É o que os
economistas chamam de política anticíclica: quando a economia vai bem, o governo
faz mais economia; quando vai mal, gasta-se. No caso brasileiro, já não há mais
tempo para a primeira parte do plano.

Referências Bibliográficas
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