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Plasticos:Artigo_Fabio.

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Meio Ambiente

Plástico
prático?
Ele é um produto de mil utilidades e
agrada muitíssimo ao consumidor
final – mas é também um dos
grandes vilões ambientais
Por Raquel Ribeiro

“S
em sacolinha,
por favor”, peço à
moça no caixa da
farmácia. “Mas é de
graça”, insiste a incrédula
funcionária. Antes fosse... Além dos custos
concretos que representam para os
estabelecimentos, sacolas plásticas custam fortunas
para a natureza. Ainda assim, quem as rejeita é visto com
desconfiança. Em alguns mercados você corre até o risco de
ser intimidado por seguranças ao entrar com a velha e boa
sacola de feira, ou barrado ao sair com as compras soltas dentro
do carrinho. Mas isso precisa mudar.
O plástico representa parte significativa do volume de lixo que
produzimos e se constitui basicamente de embalagens
descartáveis (sacos, invólucros, recipientes, bandejas, copos,
garrafas, etc). Estima-se que, na cidade de São Paulo, sejam
coletados cerca de 700 toneladas/dia de rejeitos plásticos. Ou
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POLÍTICAS PÚBLICAS

A luta contra a “plasticomania”


está sendo encampada por
alguns governos, em especial na
Pessoa e Belo Horizonte. Mas nem
sempre as políticas adotadas são
ecologicamente bem-vindas. Uma é
“ Sempre vamos gerar
impacto de alguma forma,
por isso nossas escolhas

Europa. Na Irlanda, o imposto sobre
uso de sacolas plásticas levou à
particularmente polêmica: o uso da
sacola plástica biodegradável. Seu
são tão importantes
redução de 90% do seu consumo. incentivo pode piorar o problema
A Alemanha e Holanda criaram uma do lixo, pois nos leva a pensar que Elisa Quartim Barbosa, designer
taxa pelo uso de sacolinhas e a tudo bem jogar o plástico fora. Um
maioria dos supermercados usa o saco de plástico biodegradável entre o ponto de coleta e a empresa
papelão. A cidade de Bangladesh, pode levar anos para se desintegrar recicladora pode inviabilizar o
na Índia, optou pelas sacolas de (uma casca de melancia é negócio; separar corretamente os
juta, depois que a poluição chegou biodegradável e leva meses para diversos tipos de plástico gera custos;
a obstruir afluentes do Rio Ganges. sumir!). Ou seja, a aplicação desse as impurezas (gordura, restos
No Brasil algumas cidades seguem tipo de plástico deve se limitar a orgânicos, alças metálicas, grampos
a mesma linha, como Curitiba, casos como na agricultura, que usa e etiquetas) reduzem o preço de
Porto Alegre, Piracicaba, João saquinhos de mudas na terra. venda; e dificilmente se pode garantir
um fornecimento contínuo de
matéria-prima de boa qualidade ao
seja, cada pessoa descarta, em média, 70 gramas de comprador. A saída é, pois, evitar o consumo
lixo plástico por dia. Mesmo sem dados estatísticos, desmedido não apenas de embalagens, como Sacolas
sabemos que a realidade em outras grandes cidades também de objetos. plásticas: já
brasileiras é semelhante. Quantas vezes entramos naquelas lojinhas tipo foram
Segundo o Centro de Produção Industrial 1,99 e levamos brinquedos, enfeites e tranqueiras proibidas ou
Sustentável (CEPIS), embora represente de 4% a 7% que não chegam a durar 24 horas? Quanto plástico sobretaxadas
da massa total, o plástico ocupa de 15% a 20% do vai pro lixo depois de uma festinha de criança? em países
volume do lixo gerado – o que aumenta os custos de Quantas garrafinhas d’água ou copinhos de café europeus
coleta, transporte, manuseio e depósito. Deixado em esvaziamos ao longo do dia? O copo descartável é
lixões, o plástico muitas vezes é queimado um exemplo, digamos, óbvio, do desperdício. Porém
indevidamente, emitindo gases ultratóxicos e todo produto tem um custo ambiental. “Para
comprometendo a saúde das pessoas e do meio determinar qual o melhor material para
ambiente. Em aterros, ele dificulta a compactação do uma embalagem, devemos
lixo e interrompe a decomposição de resíduos observar todo o ciclo de
biodegradáveis, pois ele impermeabiliza as camadas vida do produto.
de material orgânico,
obstruindo a circulação de
gases e líquidos. O único

sxc.hu
destino adequado ao O LIXO DESÁGUA NO MAR
plástico é ser separado e
reutilizado, ou reciclado. Por
todos os motivos
mencionados acima e
Segundo um relatório do
Programa Ambiental da
ONU (Unep), a maior parte do
fulmaros glaciais –
pássaro encontrado no
Mar do Norte – concluiu
camada
flutuante de
plástico com cerca
também por representar lixo marítimo são garrafas, que 95% ingeriram de 1000 km de extensão
economia: objetos sacos, embalagens de comida, plásticos! “O lixo marinho é e atinge uma profundidade de
produzidos com plástico copos e talheres de plástico. A sintomático de um problema cerca de 10 metros. A origem
reciclado são, em média, cada ano, cerca de 10 milhões maior: o desperdício e a dessa e outras manchas?
30% mais baratos do que de toneladas de plástico persistente má administração Simples: toda peça plástica
os fabricados com acabam nos oceanos. Boa parte dos recursos naturais”, disse descartada desde 1862, que
matéria-prima virgem. vai parar no estômago de Achim Steiner, diretor executivo não foi reciclada, está em
Se reciclar é a solução, animais marinhos, que da Unep, em reportagem do algum lugar. Mesmo as que se
podemos continuar confundem o plástico com Greenpeace. “Os sacos decompuseram criam
consumindo essa maravilha moluscos ou medusas. plásticos finos, que só podem problemas: em certas áreas do
dos tempos modernos, Anualmente, milhões de ser usados uma vez e sufocam Pacífico há concentrações de
certo? Negativo. Há mamíferos marinhos, pássaros, a vida marinha, deveriam polímeros até seis vezes mais
escassez de empresas peixes e tartarugas morrem por ser proibidos.” do que o fitoplâncton, base da
interessadas na compra de causa disso. Uma pesquisa com No oceano Pacífico há uma cadeia alimentar marinha.
plástico usado; a distância

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Meio Ambiente

VIDA NOVA

D esenvolvido em 1941, o PET


ficou popular a partir dos
anos 70, quando garrafas
microempresário de Salvador,
descobriu. E não se trata de
barquinho de brinquedo, e, sim, de
começaram a ser fabricadas com caiaques, mini-lanchas,
esse polímero. Hoje é o tipo de catamarãs... Outro destino genial
plástico mais interessante para a para o PET foi dado pelo mecânico

sxc.hu
indústria da reciclagem. Pode ser Alfredo Moser, de Uberaba, MG.
reciclado várias vezes com Além de reutilizar o plástico, ele
qualidade e com ele se faz desde economiza luz: bolou um “lustre” passaram a incentivar a redução do consumo de
enchimento de almofadas até de PET, feito com uma garrafa de plástico. A rede Pão de Açúcar saiu na frente ao
tecido, carpete, lâmina, garrafa dois litros cheia de água (com vender, com preço camarada, sacolas de pano com
para produto não alimentício, pouquinho de água sanitária), estampas da SOS Mata Atlântica. E o exemplo vem
corda, fio de costura e... barco! encaixada no teto da casa. Para sendo seguido. Em junho, o Ministério do Meio
Foi o que o Lucivaldo Gomes, conferir, veja os vídeos no YouTube. Ambiente lançou a campanha nacional com o seguinte
slogan: “Saco é um saco. Para nós, para a cidade,
para o planeta e para o futuro”. Com apoio da rede de
Sempre vamos gerar impacto de alguma forma, por supermercados Wal-Mart, a iniciativa pretende trabalhar
isso nossas escolhas são tão importantes, seja da na conscientização das pessoas. A meta da Wal-Mart é
embalagem ou do que comemos”, diz Elisa Quartim reduzir pela metade o uso de sacolas plásticas em
Barbosa, designer gráfica e autora do site suas lojas até 2013. Hoje você ganha um desconto
www.embalagemsustentavel.wordpress.com. Ela faz simbólico por cada por sacola plástica que deixa de
parte do Instituto de Design para o Desenvolvimento usar nas lojas da empresa.
Sustentável, que segue as regras estabelecidas pela Segundo a Associação Brasileira de
Agenda 21 e tem por objetivo oferecer ao mercado Supermercados, o Brasil consome 12 bilhões de
produtos inovadores, cíclicos e evolutivos, onde, por sacolas plásticas por ano. Descartadas incorretamente,
exemplo, a matéria-prima também pode ser nutriente entopem bueiros, poluem rios, emporcalham as
– e não apenas resíduo – ao final de sua vida útil. cidades e ameaçam os seres do mar. Dados do
“Muita coisa está vindo para o Brasil e existem várias Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
pesquisas nacionais, mas ainda falta indicam que resíduos de sacolas plásticas
interesse dos fabricantes em materiais frequentemente chegam até paraísos ecológicos
alternativos, diz Elisa. distantes e supostamente bem controlados.
Vale dizer que “falta Quem já se habituou a rejeitar as tais sacolinhas, a
interesse” porque falta reutilizar o plástico que não deu para evitar, a separar e
pressão dos órgãos enviar corretamente para a reciclagem está “fazendo
governamentais e do sua parte”, sim. Mas acontece que dá para fazer mais.
consumidor. O bom é que o
perfil do consumidor brasileiro
está, aos poucos, mudando.
SAIBA IDENTIFICAR OS TIPOS
Segundo pesquisa do Instituto
Akatu, cresceu em sete pontos DE PLÁSTICOS
percentuais – de 36% em 2005 para
43% em 2006 – a proporção de RECICLÁVEIS POSSIVELMENTE
consumidores que usam seu poder de RECICLÁVEIS
ü Tampas
compra e de comunicação para premiar
ü Potes de alimentos ü Isopor tem reciclagem
empresas que tenham práticas adequadas em algumas localidades
ü Garrafas de água
de responsabilidade social e ambiental.
mineral
“Isso mostra que não apenas os
tradicionais critérios de preço, qualidade,
ü Recipientes de limpeza NÃO RECICLÁVEIS
inovação e design são levados em conta. ü Sacos plásticos ü Cabo de panela
Este cenário indica uma clara tendência a ü Brinquedos ü Tomadas
uma atenção crescente às questões ü PET ü Adesivos
ü Higiene ü Espuma
Fonte: www.lixo.com.br

ambientais e sociais pelos consumidores”, diz


Ana Carolina Evangelista, do Instituto Akatu. ü PVC ü Teclados de computador
Por pressão de consumidores conscientes e ü Baldes ü Acrílicos
entidades ambientalistas, algumas empresas

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“ Temos que aprender a viver


com muito menos do que se vive
hoje nos países e nos setores

ricos do planeta
Pedro de Assis Ribeiro de Oliveira, sociólogo

uma frustração, mas optar por não ser rico é uma


NÃO SOMOS DE libertação. Trata-se de escolher um padrão de vida
simples compatível com os recursos naturais.” Copinhos de
PLÁSTICO Segundo o professor, as pequenas iniciativas água e de
individuais são as sementes dessa nova consciência café: no
“Não sois máquinas! Homens é que sois!”, diz planetária: “Se não exigirem uma nova ordem trabalho
Carlitos, personagem de Charles Chaplin, em clássico política, não florescerão, mas se conseguirem podem ser
discurso no filme O Grande Ditador, para acordar as fundamentar um movimento social, elas certamente substuídos
pessoas anestesiadas pelo fascismo. Hoje, o mundo darão origem a uma nova forma de vida econômica por canecas
é dominado por outro “ismo”, o consumismo, pedra e política”. E aí entrarão em cena novamente de cerâmica
fundamental na base da sociedade capitalista. bonecos de pano, brinquedos de madeira, roupas
Precisamos ser chacoalhados para sair dessa de algodão, grãos vendidos a granel, objetos de
engrenagem de exclusão social e destruição bambu, de cerâmica, de palha – e a indústria vai
ambiental. Quem viu o curta-metragem de animação voltar a produzir bens efetivamente duráveis.
A História das Coisas sabe do que estamos falando.
Quem não viu, que trate de ver! Estamos consumindo
muito mais recursos do que seria sensato extrair da
Terra. Apesar de nossa dívida ecológica crescer DO CAFEZINHO ÀS COMPRAS
assustadoramente, poucos estão dispostos a colocar
o pé no freio. E dá-lhe compras, cada uma delas
devidamente embrulhada em saquinho plástico,
dentro de uma sacola do mesmo material.
A invenção do inglês Alexander
Parkes, de 1862, é fantástica:
tem durabilidade, estabilidade e
“superembalados”; especialmente
se tiver isopor.

“Ainda estamos longe de uma era do ‘consumo grande resistência à desintegração. ü Cada mulher é responsável por
consciente’, porque assumimos o padrão O problema é que são justamente nove a onze mil absorventes
estadunidense de consumo, e não o europeu. Desde essas “vantagens” que fazem do descartados ao longo da sua vida
o momento em que o mercado deixou de ser somente plástico um dos maiores vilões fértil. No Brasil há duas opções
um sistema de circulação de bens e serviços para ser ambientais. Seja, pois, um saudáveis e ecológicas: o copo
também, a partir do século 18, fonte de lucro para o consumidor consciente: menstrual e o bioabsorvente.
capital, ele foi tomado pela lógica produtivista: ou Confira na web: http://lunasbio
produz cada vez mais e mais rápido ou desanda. É ü Use o mínimo de embalagem: absorventes.blogspot.com
como andar de bicicleta: quanto mais movimento, ela é sinônimo de desperdício de
mais o equilíbrio. Essa exigência de um mercado água, combustível e recursos ü Reduza a quantidade de lixo que
regido pelo capital leva, entre outras consequências, à naturais. Embrulhe presentes com produz em casa. Assim, precisará
exploração ilimitada dos recursos naturais da Terra, sacolinhas de pano, amarradas de menos sacos plásticos para
que são limitados”, diz o sociólogo Pedro de Assis com fita; carregue na bolsa, sem descartá-lo. Planeje suas compras,
Ribeiro de Oliveira, professor da PUC de Belo embalagem, as pequenas compras; evite desperdício de alimentos,
Horizonte. Ele não duvida que esse sistema levará a no supermercado, guarde as coisas reaproveite as sobras das refeições
humanidade para a própria extinção, pois “o mercado em caixas de papelão e evite as e, se possível, faça compostagem
não pode parar de crescer e o planeta não suportará sacolinhas finas. do lixo orgânico.
mais esse crescimento”. Qual a saída? Nos livrar do Veja:  http://www.hotelbuhler.
ideal de progresso, surgido com a Revolução ü Deixe na mesa de trabalho uma com.br/secundarias/lixo.asp
Industrial, e substituí-lo por um ideal de “harmonia da caneca e um copo. Ao longo de um
comunidade de vida”: viver em paz com a Terra e ano serão centenas de copinhos ü Se no seu prédio não tem
todas as suas espécies vivas. “Temos que aprender a plásticos economizados. coleta seletiva, leve o lixo até um
viver com muito menos do que se vive hoje nos posto de coleta. Lembre-se: o
países e nos setores ricos do planeta. Já se fala de ü Não compre produtos material reciclável deve estar limpo.
‘decrescimento’ como política econômica. Ser pobre é

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