Boletim Operário é uma publicação semanal de caráter histórico que objetiva resgatar fragmentos de fatos relacionados ao Movimento Operário Brasileiro, notadamente antes de 1930.
Boletim Operário é uma publicação semanal de caráter histórico que objetiva resgatar fragmentos de fatos relacionados ao Movimento Operário Brasileiro, notadamente antes de 1930.
Boletim Operário é uma publicação semanal de caráter histórico que objetiva resgatar fragmentos de fatos relacionados ao Movimento Operário Brasileiro, notadamente antes de 1930.
No fcil ver, atravs das apreciaes apaixonadas, o significado verdadeiro dos recentes acontecimentos no Rio. Travou-se combate nas ruas, levantaram-se barricadas que valentemente resisitiram fria policialesca, centenas de mortos e feridos juncaram o solo, e os alunos duma escola militar insubordinaram-se, sob o comando de um General. Gastou-se, enfim, uma boa soma de energia. Para que? Temos razes para crer na sinceridade, na boa-f da grande maioria dos rebeldes. Houve talvez entre eles, como a afirmam, homens movidos pelo simples amor ao motim, vivendo num meio que lhes d um permanente exemplo de violncia e do qual receberam apenas a misria e a ignorncia; homens pagos pelos especuladores polticos, indo luta exatamente como os seus rivais fardados e armados, s ordens e a soldo dos que, estando em cima, defendem as suas posies: por dinheiro. Mas podemos facilmente admitir que no queriam trepar sobre os outros a maior parte dos que souberam afrontar a morte. Estaria, porm, por traz deles, personagens cujo empenho seria salvar a ptria, colocando-se abnegadamente nos altos postos da governana? A interveno de altas personalidades polticas e militares e de alguns ambiciosos com popularidade, o pronunciamento chefiado por um general, e o estado dos espritos, no evoludos, respondem afirmativamente. Tratava-se provavelmente de proclamar a ditadura, de pr em cima Pedro em vez de Paulo. Para enganar, apresentou-se um pretexto, fizeram-se promessas naturalmente. Por cima dos bandos em luta, pairavam outros dois, menos numerosos, ambos igualmente desdenhosos da vida alheia: um defendia ferozmente o seu lugar, e para isso vangloriava-se como defensor da ordem e da lei; o outro procurava abocar a presa, e dava como isca uma liberdade a conquistar!
possvel que deste movimento nem tudo resulte
perdido. O governo pode mostrar-se mais benigno, por exemplo, na questo da vacina obrigatria. Pode afetar uma certa magnanimidade para tirar o pretexto a novas manifestaes da rua: todas as concesses foradas so para tirar o pretexto a perigosos movimentos. Cedamos os nossos direitos feudais para tirar todos pretexto a esses deplorveis excessos proclamavam generosamente padres e nobres, na noite de 4 de agosto de 1789, isto , quando j o incndio dos castelos e outros excessos tinham abolido de fato semelhantes direitos, que eles, alis, procuraram depois reaver. Tiremos o pretexto aos tumultos deplorveis da Armentires, dizia no h muito um deputado francs. E o caso que sem essas coisas deplorveis, ningum se lembraria de tirar pretextos.... Quando os poderes constitudos no permitem pela violncia o uso de certas liberdades, modo eficaz de conquist-las ou reconquistar efetivamente a agitao da praa, ou mesmo, quando h um passado revolucionrio, a simples ameaa de insurreio. O governo est acima de todas as liberdades escritas na lei, permanente a suspenso de garantias, o estado de stio, quando nos governados no h o freio de uma resistncia ativa. Mas para que perdure uma conquista necessrio ter conscincia dela, saber o seu valor, sentir a sua necessidade: saber querer. Do contrrio ser uma promessa vaga, num sonho vo, uma mentira, ou uma realidade magra e passageira. Ora ns receamos bem que, mais do que a conscincia ou ainda uma intuio do fim a que miravam, guiava os revoltosos o bimbalhar sonoro de discursos e artigos enganadores. Em vez de afirmar, como um fato, o seu direito em frente de todo poder, prestavam os ombros escalada do mando supremo, queriam substituir os salvadores por outros salvadores, passar a outros a sua confiana! Trabalhar por um novo governo consolid-lo, dar-lhe fora. Ele poderia, chegado ao poder, cumprir com aparato e iluso certas promessas sem valor; o seu prestgio aumentaria, e a! Do povo que tem um governo prestigioso! Est exposto todos os golpes de Estado, preparado por todas as tiranias, fecha os olhos a tudo. Cada um dos que o ergueram no quer depois confessar o seu engano, quer defender a sua obra, surdo e cego; uma energia morta, um conservador. No contra um governo, mas contra todos, sem favorecer nem consolidar nenhum, que devemos lutar; porque o governo por natureza conservador da ordem das coisas que lhe d vida, criador duma classe privilegiada que o mantenha. Curaivos dos chefes, dizemos ns aos homens; salvai-vos vs mesmos.
Aos ingnuos, aos sinceros do movimento, ns
dizemos: queries mudar a forma, deixando intacta a substncia; a opinio, o estado dos espritos cheios de confiana, a educao messinica do povo, que espera e confia. Monarquia, repblica, ditadura, tudo vale o mesmo se o povo se deixa governar confiadamente e espera a salvao dada por um messias, se a sua educao poltica permanece a mesma. Querer entregar a um ditador a salvao de todos enfocar uma triste mentalidade de crente de uma providncia, do carneiro que facilmente conduzido. A revoluo verdadeira, dando resultados reais, prepara-se nas conscincias, isto , no h revoluo sem evoluo precedente. E no evoluo nas leis, mas nas mentes e nos fatos. Um melhoramento inaplicvel por meio da lei quando no est j nas ideias e na vida; e se est, a lei ento intil. Que faz um governo? Leis e nada mais. E s pode ensinar o respeito autoridade, a esperana, o abandono da inciativa. Procura viver; eis tudo. No nos dirijamos a chefes, porque eles nada podem! . Preparemos ns mesmos a evoluo, procurando firmar com todos os que tm uma liberdade a conquistar, um pacto de solidariedade, de auxlio mtuo, de vantagens comuns e equivalentes. No queremos decerto uma simples evoluo nas ideias, uma exclusiva propaganda de teorias: onde havamos de parar? Haveria sempre que aprender, e deste modo nunca teramos fatos. O fato histrico produzido pela atividade permanente, pela ao contnua dos indivduos e dos grupos. O exemplo educa mais do que a palavra. No basta dizer, preciso fazer; preciso realizar, apenas haja fora para isso, as transformaes de que temos conscincia s estas, porque a fora neutra, nada realiza de per si e tanto serve para destruir um obstculo que se ope marcha do progresso, como para forjar novas cadeias, levantar novo dolo sobre as runas de uma tirania aniquilada. A obra do verdadeiro revolucionrio, que pretende transformar realmente o meio social, e no apenas mudar as aparncias, , ao lado do professor emancipado, do sbio sincero, do artista, do inventor, do produtor, dirigir-se aos indivduos, desenvolver o esprito de iniciativa e de solidariedade, destruir a esperana num amo, agir e levar a agir solidariamente, e no para proveito de poucos. E assim, tendo partido do indivduo, tendo-se expandido at ganhar fora para se tornar fato, a evoluo far-se- revoluo, transformando o ambiente, no na forma exterior, mas no seu intimo, nas suas partes, para vantagem de todos, e dando origem a novas evolues. O Amigo do Povo So Paulo, 26 de novembro de 1904.