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A liberalização do comércio os direitos humanos: uma trajectória histórica

Por Cláudio Foquiço1

A liberalização do regime global do comércio, investimento e finanças não garante, ipso facto, um
impacto positivo no bem estar da humanidade ou no aprimoramento do desenvolvimento económico em
particular. Nem a tal liberalização leva necessariamente a uma maior protecção e o respeito pelos
2
direitos humanos.

Introdução

O presente artigo tem como objectivo analisar o percurso histórico dos dois regimes,
designadamente, a liberalização do comércio e dos direitos humanos de modo a entender as
suas origens, complexidade, natureza e os seus objectivos. Na verdade, a liberalização do
comércio e os direitos humanos são realidades complexas e controversas. Muitas correntes de
pensamento já argumentaram a favor e contra a relação entre a liberalização do comércio e os
direitos humanos. Independente dos argumentos ora avançados, a realidade mostra que existe
uma relação entre a liberalização do comércio e os direitos humanos, quer seja, do ponto de
vista positivo, quer seja, do ponto de vista negativo. O Alto Comissariado das Nações Unidas
para os Direitos Humanos(ACNUPDH) demonstrou a relação entre o comércio e os direitos
humanos na quintagêsema conferência da Organização Mundial do Comércio em Cancun, no
México. Por exemplo, o respeito pelos direitos humanos e o princípio da não descriminação
poderá promover alteração no plano das relações comerciais e igualidade de oportunidades,
que poderá influenciar positivamente na dinâmica do crescimento económico e na redução da
pobreza.3 É objectivo deste artigo analisar os regimes ora mencionados de uma maneira
pragmática com vista a perceber como é que uma afecta a outra e vice-versa.

1
Licenciado em Direito(Universidade Católica de Moçambique) Mestrado em Direito(Universidade de Pretória)
República da Africa de Sul; endereco electrónico: claudiofoquico@hotmail.com
2
UN Sub-Commission for the Promotion & Protection of Human Rights, Human rights as the primary objective of
international trade , investment and finance policy practice, Working paper submitted by J. Oloka Onyango and D.
st
Udagama, in accordance with Sub-Commission Resolution 1998/12, UN ESCOR, 51 Sess, E/ CN.4/Sub.2/
1999/11,17 June 1999.
3
World Bank World Development Report 2000/2001: Attacking Poverty 2001 56
1. Quadro conceptual: Direitos humanos e a liberalização do comércio

1.1 Direitos Humanos: de previlégio para direitos.

O Conceito de direitos humanos desenvolveu durante muito tempo e pode ser encontrado em
vários escritos, tais como, a filosofia grega e em vários domínios relegiosos. É possivel
perceber o seu iter na Magna Carta Libertatum em 1215 e na Carta de direitos inglês de 1689.
Estes foram os primeiros documentos a introduzir tais direitos com a possibilidades de
reivindição, mas não eram extensivos a todos os indivíduos e apenas poderiam ser exercídos
sob determinadas circunstâncias. Os direitos incorporados nestas cartas, em algum monento,
eram tidos como previlégios. Assim, eram apenas conferidos a indivíduos ou a um determinado
grupo de indivíduos de acordo com o seu estatuto. Com o decurso do tempo, a tal percepção
foi ultrapassado pelos eventos que provocaram vicissitudes nesta maneira de pensar e o
conceito de liberdade veio a ser entendido como um direito extensivo a todos os seres
humanos.

Por exemplo, ‘a Declaração Americana da Independência de 1776 era baseado na assunção


de que todos os seres humanos são iguais.’ Como também, fez referência a alguns direitos
inalienáveis, tais como, o direito a vida, a liberdade, e o prosseguinento da felicidade. O termo
direitos humanos apereceu pela primeira vez mencionado na Declaração francesa dos direitos
dos homens e dos cidadãos em 1789.

O termo direitos humanos é entendido como uma "categoria especial de reivendicação moral"
perante os governos.4 Contudo, para a reivindicação destes direitos é necessário que existam
leis aprovadas e promulgadas pelos respectivos Estados e que confiram os tais direitos como
garantias. Por exemplo, certos direitos humanos estão incorporados nas constituições
modernas, num capítulo ou secção designado por carta de direitos fundamentais dedicado
exclusivamente a enumeração dos referidos direitos que têm a tutela constitucional. Estes
direitos, são previstos em textos constitucionais de vários países e ainda servem de
instrumento de responsabilização política.

No final do século 19 com a industrialização da Europa, as normas de direitos humanos


emergiram para resolver assuntos laborais. Em virtude disso, a Organização Internacional do

4
Viljoen ( n 16 above) 4
Trabalho (OIT) foi fundada em 1919, e os direitos laborais introduzidos.5 ‘ A Convenção de
Berna de 1906 foi uma das convenções multilaterais que visava salvaguar os direitos sociais
proibindo o trabalho nocturo para as mulheres.’

Apesar disso, a protecção dos direitos humanos não era sistemática no direito internacional e,
consequentemente, os indivíduos não eram sujeitos de direito internacional. Somente certas
categorias de pessoas tinham a protecção internacional, tais como, os escravos, grupos
minoritários, estrangeiros, povo indígenas etc. O direito internacional era um domínio exclusivo
dos Estados e, somente, Estados eram sujeitos de direito internacional passíveis de
vinculações normativas, tais como, os tratados, normas costumeiras e determinadas práticas
internacional.6

1.2 – Direitos Humanos: Dimensão Universal?

As atrocidades da segunda Guerra mundial marcaram uma nova era no seio das relações
internacionais, política internacional e, por conseguinte, no direito internacional. A tal situação,
mudou a natureza das relações interestaduais e trouxe os direitos humanos na esfera do direito
internacional através da Carta das Nações Unidas assinada no dia 26 Junho de 1945. Em
1946, assiste­se a criação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos
(ACNDH) e a adopção, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, da Declaração Universal
dos Direitos Humanos (DUDH) no dia 10 de Decembro de 1948 marcou o início da
internacionalização dos direitos humanos. Com efeito, os direitos humanos já não era um
assunto de domínio exclusivo dos Estados no que tange a política interna dos Estados e
tornou-se uma ‘preocupação legítima da comunidade internacional’ e ‘obrigação dos Estados
no direito internacional.’7

De facto, a Declaração Universal foi um marco histórico no percurso dos direitos humanos,
apesar de, não ter força vinculativa e era meramente uma declaração baseda nas aspirações

5
International Federation for Human Rights Understanding Global Trade & Human Rights, Report and Resource
Guide for National Human Rights NGOs in the view of the 2005 WTO Ministerial Conference, Hong Kong(MC6) 3
6
Isa & Feyter International Protection of Human Rights: Achievements and Challenges (2006) 20-22
7
Isa & Feyter (n 32 above) 19
morais dos seres humanos. Em vista a assegurar uma tutela jurídica e sistemática os direitos
prescritos na Declaração Universal, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos
(PISDCP) e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (PIDESC)
foram adoptados em 1966 e os mecanismos de supervisão criados para monitorar o
cumprimentos das disposições dos respectivos instrumentos.

Passado algumas decadas, muitos países se filiaram as Nações Unidas e aceitaram as


obrigações proveniente da Carta das Nações Unidas e da Declaração Universal.Em 1968, vinte
anos após a adopção da Declaração Universal, a primeira conferência internacional sobre os
direitos humanos foi organizada para avaliar os progressos alcançados na promoção e
protecção dos direitos humanos.8

A evolução dos direitos humanos também teve lugar a nível regional.Por exemplo, padrões e
mecanismos de supervisão foram criados na Europa, na América e na África, para assegurar o
monitoramento na implementação das normas de direitos humanos nas respectivas regiões.
Em África, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos(CADHP)9 é o instrumento
principal que prevê os direitos civis e políticos e direitos económicos, sociais e culturais num
único instrumento. A implementação e a consolidação dos direitos humanos não foi um
processo sem sobressaltos, teve os seus próprios desafios e realizações.

A rivalidade política pela hegemonia do poder entre a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) e os Estados Unidos de América (EUA) teve um grande impacto na
estruturação e implementação dos direitos humanos. Por exemplo, as revoluções inglesa,
americana e francesa contribuiram significativamente para a emergência dos direitos civis e
políticos enquanto que a revolução de 1917 na Russia fez emergir os direitos económicos e
sociais.10 Ademais, existe uma outra justificação para a adopção em separado os pactos
referenciados, no sentido de que PISDCP impõe obrigações negativas enquanto que
PISDESC impõe obrigações positivas que requer a intervenção do Estado para a sua

8
Proclamation of Teheran, proclaimed by the International Conference on human rights at Teheran on 13 may
1968.
9
C Heyns & M Killander Compendium of Key Human Rights Documents of the African Union (2007) 29
10
Chandra ( n 5 above) 185
materialização. De facto, este argumento foi aceite de uma maneira generalizada e vários
governos e Estados converteram esses direitos em normas programáticas nas suas
respectivas constituições e nos Programas Directivos das Políticas do Estado. Mas, com a
crescente aceitação e o reconhecimento de que todos os direitos são interelacionados
conforme o previsto na Declaração de Viena.11 A justiciabilidade dos direitos económicos e
sociais está ganhando suporte e já foi demonstrado em várias jurisdições como a África do Sul,
India e Canada.

1.3 Uma nova dinâmica: 1990 até a actualidade.

O fim da guerra fria culminou com algumas mudanças para o progresso dos direitos
humanos na arena internacional e na África, em particular. Por exemplo, testemunhou-se a
transformação política no continente africano nos anos 90, tais como, o fim dos regimes
autoritários e transições democráticas. Apesar disso, levantam-se sérias dúvidas quanto as
transformações ora citadas. A nível regional, passos concretos foram dados para a
institucionalização e a consolidação das normas de direitos humanos.12 Em 1991, o tratado da
Comunidade Económica Africana (CEA) foi adoptado sob os auspícios da União Africana (UA)
em Abuja, na Nigéria. O referido tratado prevê o reconhecimento, promoção e protecção dos
direitos humanos e dos povos em conformidade com a Carta Africana sobre os Direitos
Humanos e dos Povos como um princípio fundamental no sistema económico.13 É evidente
que, antes deste período, o desenvolvimento económico não era entendido no contexto dos
direitos humanos. Nisso, esta mudança de paradigma contribui significativamente para a
reforma dos tratados das comunidades económicas sub-regionais, tais como, o tratado da
Comunidade Africana para o Desenvolvimento da África Austral (CADAA), Comunidade
Económica dos Estados da África do Oeste (CEDEAO) e a Comunidade Económica da África
do Este (CEAE) com vista a englobar as normas dos direitos humanos nos seus mandatos.14‘ A

11
World Conference on Human Rights (1993) UN. Doc.A/CONF.157/23,para 5.
12
J Akokpari & D Zimbler African Human rights architecture (2008) 233
13
Akokpari & Zimbler (n 38 above) 233
14
E L Ngugi ‘The Impact of Globalisation on the Promotion and Protection of Human Rights in Africa’ (2007) 1
Malawi Law Journal 160-161
nível nacional até no ano 2000, pelo menos vinte e quarto países africanos haviam enquadrado
nas suas legislações a Comissão Nacional de Direitos Humanos.’15

2. A Evolução do comércio sob a perspectiva africana

Existe evidências de que o comércio remonta da sociedade antiga onde envolvia troca de bens
baseado no tempo equivalente a mão de obra despendida para a produção do referido bem.
Independentemente disso, o advento da classe dos comerciantes mudou a maneira como o
comércio era realizado. ‘ Os comerciantes eram intermediários que compravam o produto a um
preço baixo dos produtores e vendiam aos consumidores a um preço relativamente alto.’16
Quanto maior fosse a diferença maior era a margem de lucros, provavelmente, o princípio de
vantagem comparativa já era aplicado mesmo antes do reconhecimento científico.

Durante este período, dois eventos significantes influenciaram a África: (1) a expansão e a
consolidação do islão e (2) a dispersão do povo Bantu, que fez com que originassem muitos
reinos e impérios.17 Desde então, vários acontecimentos tiveram lugar e implicaram na
mudança das transações comerciais. O primeiro contacto Europeu com a África foi
estabelecido por Portugal nos séculos quinze e dezasseis e ainda Inglaterra, França e outros
nos séculos dezasete e dezoito. Assim, se implantou o comércio triangular que consistia em:
(1) importar os bens manufacturados da Europa a África, (2) o envio dos escravos as Américas
e (3) Importação dos produtos produzidos pelos escravos nas grandes plantações, tais como,
algodão, açucar, tabaco, etc. Este cenário estava relacionado com a industrialização na Europa
e a sua necessidade de mão de obra. Volvidos vários anos de tráfico de escravos assiste-se a
abolição do tráfico de escravos e a corrida para a partilha de África marca o início de uma nova
era – a colonização – que teve mudanças dramáticas em toda a esfera de vida do povo
africano.

3. O Acordo Geral de Comércio e Tarifas e a liberalização do comércio internacional

15
Unpublished: A J Osogo ‘Oval Slide in triangular spaces? Anchoring Human Rights Institutions in ‘tripartite’
Commonwealth Africa’ unpublished LLM thesis, University of Pretoria, 2006 2
16
F Manji & P Burnett ‘From the slave trade to free trade, How trade undermines democracy and justice in Africa’
(2005) 1
17
http://africanhistory.about.com ( accessed 8 August 2009)
Antes de introduzirmos o conecito de liberalização do comércio é importante entender o
conceito de comércio e os seus propósitos. Então, só por via disso, iremos introduzir o conceito
de liberalização do comércio. ‘O termo comércio refere-se as transações comerciais que
envolvem compra e venda de bens, serviços ou informação.’18 A teoria económica sugere que
a internacionalização do comércio é impulsionado pelo princípio da vantagem económica
devido a abundância e diferentes produtos em diferentes países. O ratio do princípio da
vantagem comparativa assenta no valor que um determinado bem possui num determinado
país e influencia no seu custo naquele mercado.19

A liberalização do comércio e a remoção ou a simplificação dos procedimentos comerciais com


vista a permitir a livre circulação de bens e serviços de um país para o outro. Esta inclui o
desmantelamento das tarifas (tais como, as imposições aduaneiras, subsídios de exportação)
bem como as barreiras não tarifárias(tais como as licenças, regulamentos, quotas, etc).20 Isto
faz parte do processo de globalização económica onde é crescente a interdependência
económica, simplificação dos procedimentos e a predominância do sistema de económia de
mercado.21

A internacionalização da económica que por sua vez impulsionou a liberalização do comércio


foi devido a dois eventos significativos.22 Primeiro, a crise económica de 1929 nos Estados
Unidos da América. Segundo, o fim da segunda guerra mundial, impulsionou os Estados
Unidos a tornar-se um novo líder mundial na economia internacional. Portanto, Para fazer face
aos novos desafios criou as instituições do Bretton Wood, O Banco Mundial e o Fundo
Monetário Internacional (FMI) para regular os investimentos internacional e resolver as
questões ligadas com a balança de pagamentos respectivamente, e ainda a Organização
Mundial do Comércio (OMC) para regular o comércio internacional. Infelizmente, a OMC não
entrou em operacionalidade imediatamente por razões políticas. Assim, O Acordo Geral de

18
http://www.businessdictionary.com/definition/trade.html (accessed 20 August 2009).
19
Values is determined by demand in the market unless is undermined by centralization. For further details see
Samson ( n 1 above) 3
20
Samson ( n 1 above) 4
21
Shelton (n 4 above) 274
22
International Economics deals with economic interdependence among nations. Generally, it analyses the flow of
goods, services, and payment between a nation and the rest of the world, the policies directed at regulating this flow,
and their effect on the nation welfare. See. Salvatore International Economics (1995) 6
Comércio e Tarifas, adoptado em 1947, tornou-se no príncipal mecanismo regulador do
comércio internacional.23

O Acordo Geral de Comércio e Tarifas requer que os Estados eliminem as quotas nas
importações e os acordos de comércio preferenciais com vista a estabelecer o mercado livre. 24
O Acordo Geral de Comércio e Tarifas é uma instituição flexível com oportunidades relevantes
para os países ‘optarem’ por disciplinas específicas.25 Apesar deste acordo, os Estados Unidos
apoiou a criação da Comunidade Europeia em 1957 com vista a facilitar uma maior integração
económica dos países do ocidente.26 Os interesses geo-poliítico entre os Estados Unidos e a
antiga União Soviética esteve na base do tal apoio. Esta por sua vez, teve impacto nos países
em desenvolvimento (Movimento não alinhados) que pretendiam seguir a sua agenda
económica sem influência dos blocos do ocidente ou do leste.

Conforme Rolland se referiu, as estratégias dos países em via de desenvolvimento no Acordo


Geral do Comércio e Tarifas deverá ser analisada no contexto das actividades do órgão das
Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (NUCD). Dentro da NUCD, os países em
desenvolvimento criaram uma coligação, designada G-77. O G-77 adoptou uma declaração na
primeira conferência da NUCD em 1964 que fazia referência aos problemas comuns dos
países em via de desenvlovimento. Eventualmente, este teria sido o primeiro passo para uma
maior cooperação do comércio internacional e solucionar os problemas particulares dos países
em via de desenvolvimento. Por exemplo, insuficiência na transferência de tecnologias,
elevada protecção dos mercados dos países desenvolvidos, elevado protecionismo nos
produtos agrícolas .27 As actividades do G-77 e da NUCD culminaram com a implementação do
Sistema Generalizado de Preferências que institui o tratamento preferencial entre os países em
via de desenvolvimento, a não reciprocidade, e o comércio preferencial sul-sul.28

23
A T Guzman ‘Global Governance and WTO’ (2004) 1 Harvard International Law Journal 45
24
Akokpari & Zimbler (n 38 above) 4
25
B. Hoekman ‘The WTO: Functions and Basic Principles’ in Hoekman et al (n 20 above) 46
26
Chandra ( n 5 above) 185
27
S E Roland ‘Developing countries coalition at the WTO: in Search of Legal Support’ (2007) 48 Harvard
International Law Journal 487-488
28
Roland ( n 53 above) 488
No contexto Africano, desde os primórdios do processo de descolonização nos anos 60, a
criação das comunidades económicas sub-regionais constituiram uma parte significativa da
estratégia africana para o desenvolvimento. Durante este período, sob os auspícios da
Organização da Unidade Africana (OUA) actualmente União Africana (UA), vários acordos de
desenvolvimento foram adoptados.29 Por exemplo, a Declaração Africana para Cooperação,
Desenvolvimento e a Interdependência Económica, acordos revisto sobre os Princípios para
a Implementação de uma nova Ordem Económica adoptados em1973 e 1976
30
respectivamente. Esta tendência culminou com a adopção do Plano de Acção de Lagos para
a implementação da Estatégia de Monrovia para o Desenvolvimento Económico de África. O
Plano de Lagos visava a reorganização das economias africana assente em duas premissas
fundamentais: (1) Auto-suficiente que consistia na mudança do foco de produção de produtos
de primeira necessidade para os produtos manufacturados, e (2) Auto-sustentável que
consistia numa maior integração e cooperação comercial entre os Estados Africanos.31
Infelizmente, este plano não foi implementado devido a conflitos de agendas e interesses
devergentes entre os doadores e os líderes africanos.

Nos meados dos anos 80, as instituções do Bretton Wood, Banco Mundial e o FMI,
implementaram o Programa de Ajustamento Estrutural (PAE) que serviu de base para a
reforma dos países africanos, a nível individual, iniciaram o processo de liberalização do
comércio. Esta perspectiva contribui significativamente para a mudança de foco na agenda de
desenvolvimento.32 Porém, a perspectiva regional para o desenvolvimento ainda é um
instrumento crucial para o desenvolvimento do continente Africano. Por exemplo, o tratado da
CEA adoptado em 1991.33 Este tratado prevê o reconhecimento, promoção e a protecção dos
direitos humanos em conformidade com a Carta Africana como um princípio do sistema
económico.34

29
UNCTAD Economic Development in Africa Strengthening Regional Integration for Africa’ Development (2009) 8
30
C Ake Democracy and Development in Africa (2004) 22
31
Ake (n 56 above) 22-23
32
Samson ( n 1 above) 9
33
The treaty establishing the AEC was adopted in Abuja, Nigeria, in 1991 and entered into force in 1994, which the
AEC form an integral part of the Organization of Africa Union (OAU). For the text of AEC treaty, see www.africa-
union.org ( accessed 7 May 2009)
34
Musungu ( n 24 above) 91
4. A Organização Mundial do Comércio e o regime de liberalização do comércio
internacional

A OMC foi craida em 1995 e a sua função principal e de administrar os acordos comerciais
negociados pelos países membros, incluindo o Acordo Geral de Comércio e Tarifas, Acordo
Geral de Comércio e Serviços, e o Acordo sobre a Propriedade Intelectual e Aspectos
Conexos. A criação da OMC é um dos resultados das negociações multilateais da Ronda de
Uruguai em 1998.35 Neste sentido, a OMC é o forum principal para a cooperação internacional
nos aspectos relacionados com as políticas do comércio internacional. Diferentemente da sua
predecessora o Acordo Geral de Comércio e Tarifas, as regras da OMC são aplicáveis a todos
os membros.36

Princípios básicos

A OMC orienta-se pelos seguintes princípios básicos: não descriminação, reciprocidade,


obrigadoriedade e compromissos vinculativos e ainda a transparência. Estes princípios são
extremamente fundamentais, no sentido de, orientarem as políticas comerciais.

Não descriminação (artigos I and III do Acordo Geral de Comércio e Tarifas)

O princípio da não descriminação assegura que os membros da OMC tratem todos os


membros de igual modo aos membros e não membros da OMC. Sob este princípio, existe duas
grandes componentes:primeiro, Nações mais favorecidas requer que os Estados membros
garantam o mesmo tratamento aos produtos manufacturados pelos Estados não membros.
Segundo, o Princípio do Tratamento Nacional requer que os productos extrangeiros ‘uma vez
observadas todas as imposições aduaneiras, benificie do mesmo tratamento que os productos
nacionais.’37

Reciprocidade

35
Hoekman ( n 51 above) 41
36
Hoekman (n 51 above) 41
37
Chandra ( n 25 above) 43
Reciprocidade é um princípio fundamental que orienta as negociações entre os Estados
membros. Isto representa correspondências e concessões mútuas de previlégios e vantagens
nas relações comerciais entre os Estados representando o comércio livre através do acesso ao
mercado.38

Obrigatoriedade e compromissos vinculativos

Este princípio se apoia no princípio da não descriminação no sentido de que os compromissos


para o acesso aos mercados são de carácter vinculativos e assenta no tratamento igual a todos
os intervenientes, independentemente, de ser ou não ser membro da OMC. Por exemplo, os
compromissos estabelecidos entre os membros da OMC nos acordos multilaterais, são
enumerados na lista de concessões em conformidade com o artigo II do Acordo Geral de
Comércio e Tarifas.39 Uma vez que estes são compromissos vinculativos, não há espaço para
outras medidas. No caso de incumprimento, o Estado ofendido considera o facto como uma
práctica prejudicial, e neste sentido, o Estado ofendido poderá levar o assunto a atenção do
governo do respectivo Estado com vista a resolver a situação. Se, eventualmente, o referido
Estado não se pronunciar legitima a que o Estado ofendido refira este caso ao painel de
resolução de conflito da OMC para adjudicar o assunto.40

Transparência

Transparência é um princípio fundamental na OMC e esta previsto nos artigos X do Acordo


Geral do Comércio e Tarifas e II do Acordo Geral de Serviços e Tarifas.41 Os membros da OMC
são legalmente obrigados a publicar suas leis e regulamentos comerciais com vista a permitir a
fiscalização através do órgão responsável pela revisão das decisões administrativas que
afectam a actividade comercial, notifica-lo em casos de alteração da legislação e de políticas
comerciais aos seus pares, etc.

38
J M Finger & L A Winters ‘Reciprocity in the WTO’ in B Hoekman et al (n 20 above) 50-51
39
UNCTAD ( n 55 above) 43
40
UNCTAD (n 55 above) 43
41
UNCTAD (n 55 above) 43
Apesar de, se assinalar avanços positivos na OMC inerentes a regulamentação das actividades
comerciais, a organização foi alvo de críticas pelo facto de não considerar assuntos não
relacionados com o comércio mas que são afectados pelas actividades comerciais. Várias
correntes de pensamento sugeriram que a OMC deveria expandir o seu mandato para
incorporar assuntos não comerciais com vista a dar cobertura assuntos como a política
ambiental, direitos humanos, aspectos laborais e as políticas de concorrências.42 A crescente
manifestação com o modus operandi da OMC resultou no boicote da conferência ministerial da
OMC em 1999 em Seattle.

2.2.4 –Declarações Doha

A conferência Ministerial designada Doha que foi lançada em 2001 com o objectivo de
redimensionar as assimetrias no sistema do comércio internacional, dando o tratamento
preferencial aos problemas dos países em via de desenvolvimento através da adopção das
declarações Doha.43 Estas declarações compreendem os acordos sobre a Propriedade
Intelectual e Aspectos Conexos, saúde pública, decisões na implementação de assuntos
particulares aos países em via de desenvolvimento, acordo sobre a agricultura, medidas
relacionadas com investimentos. Eventualmente, as maiores contribuições para expansão do
mandato da OMC veio do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos em
forma de relatórios sequenciados e relacionados com a liberalização da agricultura e o direito a
alimentação,44 a liberalização do comércio e serviços,45 liberalização dos investimentos.46

No contexo africano, alguns desenvolvimentos interessantes tiveram lugar em 2001, incluindo a


mudança do acto constitutivo da OUA para a UA e a adopção da Nova Perceria para o
Desenvolvimento da África (NEPAD) como uma iniciativa que representava o renascimento

42
UNCTAD (n 55 above) 304
43
WTO Doha Declarations, Doha Development Agenda in Ministerial Conference, Fourth Session- Doha, 9-14
November (2001)
44
High Commissioner for Human Rights, Globalisation and its impact on full enjoyment of Human Rights, Report of
the High Commissioner for Human Rights, submitted in Accordance with Commission Human Rights resolution
2001/32, delivered to the Sub-commission on the Promotion and the Protection of Human Rights UN
Doc.e/CN4/Sub2/2001/54 (January 15, 2002).
45
High Commissioner for Human Rights, Liberalization of Trade in Services and Human Rights, Report of the High
Commissioner for Human Rights, delivered to the Sub-commission on the Promotion and the Protection of Human
Rights UN Doc.e/CN4/Sub2/2002/9 (June 25, 2002).
46
High Commissioner for Human Rights, Human Rights, Trade and Investment, Report of the High Commissioner
for Human Rights, delivered to the Sub-commission on the Promotion and the Protection of Human Rights UN
Doc.e/CN4/Sub2/2003/9 (July 2, 2003).
africano. NEPAD centra-se na provisão de bens públicos regionais, tais como transporte,
energia, água, informação e tecnologias de comunicação, eradicação de doenças, preservação
do meio ambiente, como também, promoção do comércio e investimentos intercontinental.47 A
razão era de identificar projectos e programas comuns dos Estados membros e harmonizá-los
através de políticas económicas e de investimentos e ainda prácticas com vista a consolidar o
programas de desenvolvimento regional.

47
UNCTAD (n 55 above) 9

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