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Centro Universitário Vila Velha (UVV) 

MBA em Comunicação Integrada e Novas Mídias 
 

Disciplina: Redes de Comunicação e Sociabilidade 
Professor: Orlando Lopes 
Aluna: Ariani Caetano 
 

O aspecto relacional das interações na Web 2.0 
(Alex Primo) 

PRIMO,  Alex.  O  aspecto  relacional  das  interações  na  Web  2.0.  In:  ANTOUN,  Henrique  (Org.). 
Web 2.0: participação e vigilância na era da comunicação distribuída. Rio de Janeiro: Mauad, 
2008. 

Introdução à Web 2.0 

“A  proposta  de  estudo  que  será  apresentada  parte  de  uma  preocupação  com  a  aplicação 
acrítica de muitos métodos e conceitos da Análise de Redes Sociais (SNA) na investigação de 
fenômenos da Web 2.0. Apesar do poder das métricas dessa tradição, o uso apressado de tais 
procedimentos  e  o  deslumbre  com  as  ilustrações  de  redes  sociais  muitas  vezes  acabam  por 
trivializar o fenômeno social, deixando de lado tudo o que se refere à cultura, ao discurso, às 
ideologias e, curiosamente, aos aspectos relacionais que supostamente estão em estudo. Em 
virtude  desse  problema,  a  SNA,  não  raro,  é  criticada  como  um  método  em  busca  de  uma 
teoria.” (p. 102) 

“As relações de poder entre os atores sociais são também reduzidas ao número de links que 
uma  pessoa  recebe.  Diante  de  tal  perspectiva,  pode‐se  perguntar:  quando  alguém  interage 
com muitas pessoas de forma recorrente, ela adquire alto poder persuasivo? E em virtude da 
interação  diária,  aquela  primeira  pessoa  transformar‐se‐á  em  amigo  íntimo  das  outras?  Para 
utilizar  o  jargão  da  Ciência  das  Redes,  tais  questões  poderiam  ser  reformuladas  da  seguinte 
forma:  um  nó  com  muitos  links  deve  ser  considerado  um  poderoso  influenciador  na  rede? 
Links recíprocos e recorrentes revelam laços fortes?” (p. 103) 

“O ideal de quantificar qualquer fenômeno, segundo Felinto (2007, online)1, é característico do 
imaginário  cibercultural:  ‘A  cibercultura  promoveu  uma  radical  informatização  do  mundo  – 
uma visão na qual toda a natureza, incluindo a subjetividade humana, pode ser compreendida 
como  padrões  informacionais  passíveis  de  digitalização  em  sistemas  computadorizados’.”  (p. 
103‐104) 
                                                            
1
 FELINTO, Erick. Os computadores também sonham? Para uma teoria da cibercultura como imaginário. 
InTexto, v. 5, 2006. Disponível em: http://www.intexto.ufrgs.br/intexto15.html>. Acesso em: 4 ago. 
2008. 
“[As críticas aqui apontadas] visam alertar que muitos postulados de estudos contemporâneos 
sobre redes sociais online trivializam o fenômeno social, reduzindo a historicidade relacional, a 
subjetividade, o processo discursivo e as relações de poder ao número de links apontados.” (p. 
104) 

Interações na Web 2.0 quanto a sua forma relacional: uma proposta de análise 

“Uma rede social não é qualquer rede. Conforme Garton, Haythornthwaite e Wellman (1997, 
online)2, 

quando uma rede de computadores conecta pessoas ou organizações, ele é 
uma  rede  social.  Da  mesma  forma  que  uma  rede  de  computadores  é  um 
conjunto de máquinas conectadas por cabos, uma rede social é um conjunto 
de  pessoas  (ou  organizações  ou  outras  entidades  sociais)  conectadas  por 
relações  sociais,  como  amizades,  trabalho  conjunto  ou  intercâmbio  de 
informações. 

Como se vê, uma rede social online não se forma pela simples conexão de terminais. Trata‐se 
de  um  processo  emergente  que  mantém  sua  existência  através  de  interações  entre  os 
envolvidos. Essa proposta metodológica, porém, focar‐se‐á não nos participantes individuais, e 
sim  no  ‘entre’  (interação  =  ação  entre).  Isto  é,  busca‐se  evitar  uma  visão  polarizada  da 
comunicação, que opõe emissão e recepção e se foca em uma ou noutra instância. Uma rede 
social não pode ser explicada isolando‐se suas partes ou por suas condições iniciais. Tampouco 
pode  sua  evolução  ser  prevista  com  exatidão.  Como  fenômeno  sistêmico,  sua  melhor 
explicação é seu estado atual.” (p. 105) 

“As  características  primárias  da  comunicação  interpessoal  referem‐se  à  interação  em  termos 
de eventos. Têm como propósito avaliar o encadeamento das ações no tempo e seu impacto 
no próprio relacionamento. São elas: 

a) Descontinuidade: as interações entre duas pessoas podem ocorrer com intervalos no 
tempo.  Mesmo  os  parceiros  de  relacionamentos  duradouros  não  estão  sempre 
interagindo entre si. 

b) Recorrência: conforme Fischer e Adams (1994)3, a repetição de processos interativos 
subsidia  ações  futuras  em  situações  com  alguma  semelhança.  É  preciso  destacar, 
porém,  que  encontros  recorrentes  não  são  suficientes  para  o  desenvolvimento  de 
maior  intimidade.  Essa  característica  primária  da  interação  não  pode,  por  si  só, 
transformar laços fracos em laços fortes. 

c) Sincronia: refere‐se aos padrões interacionais desenvolvidos no tempo que permitem 
que  cada  interagente  consiga  prever,  com  chances  maior  que  o  acaso,  como  seu 
                                                            
2
 GARTON, Laura; HAYTHORNTHWAITE, Caroline; WELLMAN, Barry. Studying online social networks. 
Journal of Computer Mediated Communication, v. 3, n. 1. 1997. Disponível em: 
<http://jcmc.indiana.edu/vol3/issue1/garton.html>. Acesso em: 4 ago. 2008. 
3
 FISHER, B. Aubrey; ADAMS, Katherine. Interpersonal communication: pragmatics of human 
relationships. Nova Iorque: McGraw Hill, 1994. 
parceiro irá reagir. Ou seja, existe uma alta porcentagem de acerto na antecipação das 
ações do outro. Além disso, a competência em compreender que comportamentos são 
mais  apropriados  em  diferentes  situações  é  própria  de  relacionamentos  de  alta 
sincronia. 

d) Reciprocidade: quando um interagente reage à ação do outro de forma equivalente, 
diz‐se haver uma interação recíproca. Mais do que isso, os participantes percebem seu 
relacionamento  de  maneira  congruente:  tanto  se  amando,  por  exemplo,  quanto  se 
odiando reciprocamente. 

As características secundárias da comunicação interpessoal decorrem daquelas primárias e se 
referem a sentimentos que um parceiro tem pelo outro: 

a) Intensidade:  trata‐se,  segundo  Fisher  e  Adams  (1994),  da  força  ou  potência  de  um 
relacionamento. 

b) Intimidade: busca‐se observar quão próximos são os interagentes e que familiaridade 
existe entre eles. 

c) Confiança: pode ser abordada avaliando‐se quando cada parceiro aceita correr riscos 
em virtude do outro. Como lembram Fisher e Adams (1994), os relacionamentos são 
dinâmicos  e  envolventes  e,  portanto,  frágeis.  Existe  sempre  o  risco  de  que  o  outro 
possa não corresponder às expectativas acordadas. Nesse sentido, a confiança emerge 
a  partir  do  conhecimento  de  tal  possibilidade.  Quanto  à  reciprocidade,  é  preciso 
salientar que a confiança pode ser muito recíproca (João confia em Maria, que confia 
nele)  ou  apresentar  baixo  grau  de  reciprocidade  (João  confia  em  Maria  que,  pelo 
contrário, não confia nele). 

d) Compromisso:  trata‐se  da  dedicação  de  cada  interagente  ao  relacionamento 


compartilhado e a sua própria continuidade. O que demonstra uma identificação dos 
sujeitos  com  o  relacionamento  mantido.  Fisher  e  Adams  comentam,  contudo,  que  o 
compromisso mútuo não garante necessariamente alta intimidade.” (p. 106‐108) 

“Tendo em vista o exposto até o momento, o método a ser apresentado a seguir defende que 
o estudo da Web 2.0 deve levar em conta não apenas os aspectos tecnológico e de conteúdo, 
mas também as interações sociais quanto a sua forma: o aspecto relacional.” (p. 108) 

Eu, tu (vós), ele (eles), it, nós, nós/todos 

“O  interagente  eu  pode  ser  um  blogueiro,  um  redator  na  Wikipédia,  um  fotógrafo  no  Flickr, 
etc. Quando eu conversa diretamente com que já mantém um relacionamento próximo, este 
segundo ator será chamado de tu (ou vós, no caso de um grupo de ‘tus’). Porém, quando eu 
mantém algum tipo de interação com um ou mais interagentes que ainda não conhece ou com 
quem mantém um relacionamento distante, sem intimidade, estes serão aqui referidos por ele 
ou eles. 
Este artigo utilizará o pronome neutro it para referir‐se a programas com os quais eu interage 
e  a  pessoas  ou  mecanismos  que  enviam  mensagens  ‘massivas’,  como  spam  e  vírus,  e  cujas 
respostas  de  eu  são  normalmente  ignoradas  ou  resultam  no  disparar  automático  de  um 
software ‘maligno’ ou de um website.” (p. 109) 

“Chamar‐se‐á  de  nós  o  grupo  formado  por  eu  e  vós.  Neste  relacionamento,  todos  os 
participantes  se  conhecem;  em  virtude  do  relacionamento  próximo,  reconhecem‐se  como 
parte  de  um  mesmo  grupo  que  compartilha  não  apenas  interesses,  mas  também  afetos  de 
maior intensidade; a conversação pode ser conduzida levando‐se em conta a singularidade dos 
outros  com  quem  se  fala.  Porém,  quando  eu  interage  em  um  grupo  no  qual  nem  todos  se 
reconhecem  ou  mantêm  um  relacionamento  próximo,  dir‐se‐á  que  faz  parte  de  nós/todos. 
Trata‐se  de  um  grupo  de  menor  coesão  cujos  limites  são  criados,  basicamente,  em  torno  de 
interesses. Neste caso, a afetividade não tem o mesmo impacto no ingresso e na permanência 
no  grupo  que  teria  entre  nós.  Finalmente,  existe  um  ‘macroingrediente’  com  quem  eu  pode 
interagir,  ao  mesmo  tempo  que  o  compõe,  que  será  denominado  coletividade.  Esta  é 
constituída  por  vós,  eles,  pelo  próprio  eu  e  pela  estrutura  informática  de  interconexão  e 
estoque.” (p. 109‐110) 

Relacionamento e recursividade 

“A interação social é caracterizada não apenas pelas mensagens trocadas (o conteúdo) e pelos 
interagentes  que  se  encontram  em  um  dado  contexto  (geográfico,  social  político,  temporal), 
mas também pelo relacionamento que existe entre eles. Portanto, para estudar um processo 
de comunicação em uma interação social não basta olhar para um lado (eu) ou para o outro 
(tu,  por  exemplo).  É  preciso  atentar  para  o  ‘entre’:  o  relacionamento.  Trata‐se  de  uma 
construção  coletiva,  inventada  pelos  interagentes  durante  o  processo,  que  não  pode  ser 
manipulada unilateralmente nem predeterminada.” (p. 111) 

“Em virtude da recorrência das interações (mesmo que descontínuas), através da qual alguns 
padrões interativos vão sendo desenvolvidos entre os parceiros, a sincronia entre eu e tu (ou 
vós)  pode  ser  percebida:  os  interagentes  podem  antecipar,  com  cada  vez  mais  sucesso,  que 
ações são apropriadas em dado momento, o que pode ofender e quando. Tal relacionamento 
apresenta  reciprocidade,  intensidade  e  intimidade.  O  relacionamento  entre  eu  e  tu  pode, 
ainda,  ser  caracterizado  em  virtude  dos  graus  de  confiança  e  compromisso  em  cena.  É  claro 
que tais características citadas variam constantemente durante o tempo, em função dos atos 
interativos  investidos.  A  partir  disso,  a  forma  com  que  cada  interagente  define  seu 
relacionamento com o outro pode flutuar. Durante o processo, o relacionamento pode tanto 
se fortalecer quanto perder intensidade, chegando até o limite de seu rompimento.” (p. 111‐
112) 

“Portanto, eu e tu mantêm contato repetido, recursivo e íntimo. (...) A interação entre eu e tu 
não é atomizada. (...) Os interagentes constroem entre si um relacionamento.” (p. 112) 

“Sendo uma interação social, o relacionamento entre eu e ele tem também evolução recursiva, 
mas apresenta pouca intimidade e menor sincronia. Isso não quer dizer que não possa existir 
confiança  entre  aqueles  interagentes.  O  relacionamento  pode,  inclusive,  apresentar  grande 
reciprocidade:  ambos  preferem  manter  o  relativo  distanciamento  e  a  roteirização  das  ações. 
Com o tempo, ele pode se tornar tu, em virtude da evolução dos atos interativos que passam a 
dar novo significado para a natureza do relacionamento construído.” (p. 112) 

A coletividade 

“É preciso esclarecer, contudo, que nós/todos e coletividade não são equivalentes. Nós/todos 
podem manter uma conversação do tipo um‐um (em que cada falante direciona sua atenção a 
outro específico, enquanto todos os outros participantes podem testemunhar o diálogo), um‐
todos  e  todos‐todos.  Já  entre  eu  e  a  coletividade  não  existe  um  processo  rigorosamente 
conversacional.  (...)  O  trabalho  coletivo,  a  produção  e  a  circulação  de  bens  públicos  podem 
produzir  efeitos  em  rede,  mas  não  se  pode  confundir  esse  processo  com  uma  conversação 
entre nós/todos.” (p. 112‐113) 

“Apesar  de  tais  esclarecimentos,  pode‐se  ainda  perguntar:  que  tipo  de  relacionamento  é 
mantido entre eu e a coletividade? (...) Ora, não existe qualquer laço entre eu e a coletividade, 
apesar de estarem participando de um processo social.” (p. 114) 

“Se  nas  interações  entre  nós/todos  o  aspecto  relacional  tem  um  impacto  na  produção  e 
interpretação dos enunciados (aspecto de conteúdo), isso não ocorre nos intercâmbios entre 
eu  e  a  coletividade.  Eu  pode,  inclusive,  demonstrar  algum  tipo  de  emoção  pela  coletividade, 
mas a coletividade não o reconhece.” (p. 115) 

“E  como  fica  a  questão  da  confiança  nessa  última  forma  interacional?  Não  há  garantias  de 
disponibilização e atualização de bens específicos nem que ocorram a todo momento. Ciente 
disto,  eu  sabe  que  não  pode  confiar  que  a  coletividade  lhe  assegurará  qualquer  oferta  que 
espera encontrar.” (p. 115) 

“(...)  a  coletividade  não  pode  ser  prevista  nem  rigidamente  determinada.  Nem  eu,  nem  tu, 
tampouco  ele,  podem  determinar  como  a  coletividade  reagirá.  Em  outras  palavras,  não  se 
pode  impor  como  deve  ser:  a  coletividade  apenas  é.  Apesar  de  ser  uma  criação  coletiva,  a 
coletividade desenvolve uma relativa autonomia. Eu, vós, eles e outros sujeitos desconhecidos 
de  eu  inventam  a  atualizam  a  coletividade,  mas  também  são,  em  certa  medida,  inventados 
pela coletividade.” (p. 116) 

“A  coletividade  não  é  composta  apenas  de  altruístas.  Não  se  pode  associar  a  ela  um  certo 
padrão  moral  necessário  nem  supor  que  sua  produção  seja  sempre  valiosa  ou  precisa.  Por 
outro  lado,  seria  incorreto  concluir  que  os  processos  comunais  acabam  com  qualquer 
hierarquia ou relação de poder, ou, invariavelmente, que estas sejam uma ameaça fatal para 
aqueles.” (p. 117) 

“Enfim,  a  coletividade  não  é  apenas  um  mecanismo  tecnológico  e  um  estoque  digital.  O 
conteúdo oferecido pela coletividade é, em sua maior parte, produzido por eu, vós, eles e por 
outros com quem eu nunca interagiu.” (p. 117) 

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