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zaow2o17 Acérdios STI Process N*Convencional: Relator: Descritores: N* do Document: Data do Acordai Yotasio: ‘Texto Integral: Privacidade: Mei Decisi Sumério : Decisio Texto Integral: ‘Acérdo do Sugremo Tribunal deJustiga Acérdao do Supremo Tribunal de Justiga 04P4208 JSTJO00 HENRIQUES GASPAR ROUBO SEQUESTRO ‘CONCURSO DE INFRACCOE 83200501050042083, 05-01-2005 UNANIMIDADE s 1 REC PENAL. REJEITADO © RECURSO. 1. Entre os crimes de roubo e sequestro existe uma relac&o de concurso aparente (por uma relagdo de subsidiariedade) sempre que a privago da liberdade de locomogio nao ultrapasse a medida naturalmente associada pritica do crime de roubo, como crime-fim; 0 concurso &, pelo contrario, efectivo, quando a privagio da liberdade se prolongue ou se desenvolva para além daquela medida, apresentando-se a violacdo do bem juridico protegido no crime de sequestro (a liberdade ambulatéria) em extensfo ou grau tais que a sua protecedo nao pode considerar-se abrangida pela incriminagdo pelo crime de roubo. 2. Se, sempre sob as ordens do arguido e sob a ameaga da arma que Ihe era apontada, o ofendido conduziu o seu veiculo, circulando durante cerca de 40 minutos, até junto ao ATM de uma dependéncia bancéria, e ai, sob ameaga do arguido, o ofendido, fazendo uso de um dos seus cartes multibanco, que guardava na carteira, efectuou o levantamento da quantia de € 450,00, revela-se impressivamente uma situagdo em que a liberdade de circulagdo do ofendido esteve afectada por acgdo do arguido durante um considerivel lapso de tempo, muito para além do que pode estar associado ou finalisticamente determinado a pratica de um crime de roubo. Acordam na Secgao Criminal do Supremo Tribunal de Justiga: 1. O Ministério Pablico acusou em processo comum e perante tribunal colectivo, A, solteiro, filho de B e de C, natural da freguesia de Lomba, concelho de Gondomar, nascido a 20.08.1954, residente no Lugar de ..., Lomba, Gondomar, actualmente preso no E. P. de Vale de Judeus; imputando-lhe a pratica, em autoria material, com dolo directo e em concurso real, de um crime de roubo agravado p. e p. pelo art® 210 n°s 1 e 2 alinea b), com referéncia ao art® 204, n° 2 alineas a) e f) ¢ 202 b), e um crime de sequestro, p. ep. pelo art® 158° n° 1, todos do C. Penal, devendo a sua responsabilidade ser agravada pela reincidéncia. Na sequéncia do julgamento, 0 tribunal julgou a acusagdo procedente e, consequentemente, condenou 0 arguido A como autor material, com dolo directo de um crime roubo, p. e p. pelos artigos 210° n’s 1 e 2b), 204°, n° 2, a) e 202°, alinea b), do Cédigo Penal em concurso real com um crime de sequestro, p. ep. pelo artigo 158° n° 1 do mesmo diploma legal na pena tinica de 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de prisdo a que correspondem as penas parcelares respectivas de 6 (seis) anos 9 hipitww. dos ps.ns 008087 cbef088025708500428072OpenDacument 16 zaow2o17 petri do Surero riba de Juica (nove) meses de prisio. 2. Nao se conformando com a decisdo, o arguido interpde recurso para o Supremo Tribunal, fundamentado nos termos da motivago que apresentou, e que faz terminar com a formulagio das seguintes conclusbes: 1% Tendo 0 arguido sido condenado, com dolo directo pelo crime de roubo, nio se justificaria a sua condenagao pela pritica do crime de sequestro, porquanto este se consumou naquele. 2. O crime de sequestro consuma-se no crime de roubo, quando 0 mesmo perdura apenas pelo tempo estritamente necessario 4 pratica do crime de roubo. In casu, a intengo provada, em audiéneia de discusso ¢ julgamento, do arguido era a de subtrair ao ofendido os seus bens pessoais, quantias monetérias e o proprio veiculo automével. 3% Alcangado os seus intentos, "restituiu" o ofendido a sua liberdade ambulatéria, pelo que o crime de sequestro se consumou no crime de roubo, tendo 0 Colectivo de Juizes a quo, em consequéncia feito uma errénea interpretagdo dos factos ao direito, bem como uma errénea interpretagdo do artigo 158° do C. Penal. Pede, em consequéncia, a revogagao do acérdio recorrido, substituindo-o por outro que absolva o arguido da pratica do crime de sequestro, p. ¢ p. pelo artigo 158°, I do C. Penal. O magistrado do Ministério Pablico respondeu a motivagio, considerando que 0 recurso deve ser rejeitado por ser manifesta a sua improcedéncia, 3. Neste Supremo Tribunal, a Exm* Procuradora-Geral Adjunta teve intervengao nos termos do artigo 416° do Codigo de Processo Penal. 4. Colhidos os vistos, 0 processo foi 4 conferéncia, cumprindo apreciar e decidir. O tribunal colcctivo considerou provades os seguintes factos: 1°-No dia 08 de Fevereiro de 2002, pelas 00.00 horas, D conduzia o seu vefculo automével de marca Honda, modelo 52000, de matricula ..., no valor de € 40,000,00 (quarenta mil Euros) na Rua Fernio Mendes Pinto, na cidade do Porto e imobilizou-o junto & entrada da sua residéncia, sita no n° ..daquela artéria, altura em que saiu do veiculo ¢ se dirigiu ao porto da garagem da sua residéncia, com vista a ali aceder com o veiculo. 2°- Nessa altura tal ofendido foi abordado pelo arguido, que se encontrava escondido entre dois veiculos automéveis ali estacionados, a vigiar os seus movimentos, o qual lhe exibiu um objecto nao concretamente identificado mas que o ofendido se convenceu tratar-se de uma arma de fogo que apontou na sua direcgao, enquanto lhe ordenava que voltasse a entrar no seu veiculo de matricula .... 3° Temendo que o arguido atentasse contra a sua vida, designadamente fazendo uso do objecto que empunhava, que aparentava ser real, 0 ofendido sentou-se ao volante do veiculo de matricula ..., tal como Ihe foi ordenado pelo arguido, o qual também entrou no veiculo, ocupando o lugar ao lado do condutor. hipitww. dos ps.ns 008087 cbef088025708500428072OpenDacument zaow2o17 hipitww. dos ps.ns 008087 cbef088025708500428072OpenDacument ‘Acériéo do Sugremo Tribunal de Jstica 4°- Seguidamente, sempre com aquele objecto apontado na direcgao do ofendido, o arguido ordenou-lhe que conduzisse o veiculo em direcgao 4 Ponte de Arrabida, ao que este acedeu. 5° Enquanto tal ¢ no trajecto seguido, 0 arguido cxigiu ao ofendido que Ihe entregasse a sua carteira, enquanto Ihe ia apontando a arma que empunhava e ia dizendo que "queria dinheiro", o ofendido entregou-Ihe entio a sua carteira, da qual o arguido retirou a quantia de € 30,00. 6°- Seguidamente 0 arguido revistou tal ofendido, sempre com a arma ao mesmo apontada, retirando-lhe dos bolsos do casaco um telemével de marca Sony, no valor de € 400,00 e apropriando-se ainda de um outro telemével de marca Nokia, no valor de € 250,00, que encontrou debaixo de um dos tapetes do automével. 7°- O arguido guardou consigo tal quantia monetiria e telemoveis, todos pertencentes ao ofendido, bens que logo integrou no seu patriménio. 8°- Apés, sempre sob as ordens do arguido ¢ sob a ameaga da arma que Ihe era apontada, 0 ofendido conduziu o seu veiculo, atravessando a ponte da Arrbida e, j4 nesta comarca de Vila Nova de Gaia, abandonou o ICI em que circulavam, tomou a direcgaio de Afurada, passando em frente ao Hipermercado Carrefour, apés 0 que voltou a entrar no IC] no sentido Norte Sul, seguindo depois pela antiga estrada nacional no sentido Porto Lisboa, voltando a entrar no ICI, no qual saiu em direcgao a rotunda de Santo Ovideo, que contornou, voltando a aceder ao ICI em direcgao a Sul. 9°- No final do ICI, e apés terem circulado durante cerca de 40 minutos sempre nas circunstancias supra referidas, 0 arguido ordenou ao ofendido que seguisse em direcgdo a localidade dos Carvalhos, acedendo ao IP1. 10°- Chegados a localidade de Vendas de Grij6, nesta comarca de Vila Nova de Gaia, o arguido obrigou o ofendido a imobilizar 0 veiculo junto ao ATM de uma dependéncia bancaria do BPI af existente. Seguidamente o arguido ordenou-lhe que se dirigisse a tal ATM e que, fazendo uso de um dos seus cartdes multibanco, que guardava na carteira, efectuasse o levantamento da quantia de € 450,00. 11°- O ofendido saiu do veiculo ¢ dirigiu-se a ATM no qual tentou efectuar o levantamento em causa, o qual nao se mostrou possivel, jé que as operagdes de levantamento de tal ATM se encontravam indisponiveis. Enquanto tal o arguido permaneceu no interior do veiculo, ocupando agora o lugar do condutor, e apontando sempre 0 teferido objecto ao ofendido, a uma distancia de cerca de 2 a 3 metros, de modo a controlar todos os seus movimentos. 12°- Perante a impossibilidade de levantamento de qualquer quantia, naquela ATM, o arguido ordenou ao ofendido que se dirigisse sozinho a qualquer um dos terminais ATM existentes nas imediagées, de molde a efectuar o levantamento em causa, dizendo-lhe que esperaria por si naquele mesma via do IP1, cerca de 2 Km 4 frente, na direcgao Norte- Sul, pelo que deveria tomar um taxi para ali chegar . 13°. Apés, 0 arguido colocou-se em fuga, na posse do veiculo automével em causa, que conduzia, da quantia monetéria de € 30,00 zaow2o17 hipitww. dos ps.ns 008087 cbef088025708500428072OpenDacument ctx do Suremo Tribunal deus dos dois teleméveis supra mencionados, ¢ ainda de uma parka de marca Melka, de cor verde clara, que se encontrava no interior do veiculo, tudo pertencente ao ofendido D, bens dos quais 0 arguido assim se apropriou fazendo deles coisa sua, passando a dispor dos mesmos em proveito proprio, bem sabendo que os mesmos nio Ihe pertenciam e que actuava contra a vontade do seu legitimo proprictario, o qual permaneceu naquele local, permitindo que o arguido agisse como descrito e abandonasse o local na posse de tais bens por temer que este atentasse contra a sua vida com a arma que empunhava. 14°- Em consequéncia da descrita actuagiio do arguido 0 ofendido D viu-se obrigado a acompanhar o arguido durante cerca de 45 minutos e a obedecer a todas as suas ordens, periodo em que esteve privado da sua liberdade ambulatéria, contrariado e sem possibilidade de reagir, face a ameaga que era vitima. 15°- O arguido agiu como descrito com o intuito, plenamente concretizado de fazer seus o veiculo e demais bens mencionados que sabia nao lhe pertencerem, bem sabendo que com tal conduta contrariava a vontade do seu legitimo proprietario. Queria ainda apropriar-se da quantia que o ofendido lograsse levantar no terminal ATM mencionado, objectivo apenas nao alcangado porque tal terminal nao tinha disponivel o sistema de levantamentos bancérios. 16°- Para tanto, nao se coibiu de intimidar o ofendido com um objecto que aparentava ser uma arma de fogo, objecto que sabia apto a ser considerado um meio letal de agressio, ciente que este era susceptivel de causar ao ofendido sério receio pela sua integridade fisica e pela propria vida, de modo a impossibilitar qualquer capacidade de reacgao. 17°- Agiu ainda com 0 intuito, concretizado, de privar 0 ofendido D da sua liberdade de movimentos, obrigando-o a acompanhé-lo nos termos descritos, bem sabendo que o fazia contra a vontade daquele. Actuou sempre de forma livre, voluntaria e consciente, bem sabendo 0 seu comportamento contrario a lei 18°- Mercé da intervengao das autoridades policiais 0 veiculo em causa foi encontrado no dia 12 de Fevereiro, pelas 12.30 horas, na E.N. 222, localidade de Inha, Canedo, em Santa Maria da Feira, acidentado, apresentando diversos danos designadamente no para choques frontal, na jante frontal direita, no retrovisor exterior esquerdo, no sistema de air bag, no para brisas e na ignigao, faltando-Ihe ainda o cinzeiro ea caixa de CD's, sendo assim recuperado e entregue ao seu legitimo proprietario. Os danos mencionados determinaram um prejuizo no valor de € 8.700,00. No interior do veiculo foi ainda encontrada a parka de marca Melka, 19°- Por Acérdio de 31.10.1996, transitado em julgado, proferido no processo comum colectivo no 275/95, do 2° Juizo Criminal deste Tribunal de Vila Nova de Gaia, foi o arguido condenado, em ciimulo juridico, na pena imica de 10 anos de prisao. Em tal cimulo foram englobadas as seguintes penas parcelares: - a pena de trés anos de prisdo pela pratica de um crime de furto qualificado p.p. pelos art’s 296° ¢ 297°, n° 1 al. a) en 2d) eh) do C. zaow2o17 petri do Surero riba de Juica Penal de 1982, ocorrido em 07.02.1995 ea pena de trés anos de prisdo pela pratica de um crime de falsificagio p.p. pelo art? 228°, n° 1 al. a) e n° 2, 229°, no 3 do C. Penal de 1982, ocorrido em 07.02.1995, ambas aplicadas por Acérdio de 10.05.1996, proferido no processo comum colectivo n° 275/95, do 2° Juizo Criminal deste Tribunal de Vila Nova de Gaia; - a pena de sete anos de prisdo pela pratica de um crime de roubo p.p. pelos art’s 306°, n° 1 al. a) eb) e n° 3b), 297°, no Lal. a)en® 2h) do C. Penal de 1982 ea pena de sete meses de prisio pela pratica de um crime de detengao de arma proibida p.p. pelo art? 260°, do C. Penal de 1982, ambos ocorridos em 13.02.1995, aplicadas por Acérdao de 06.07.1995, proferido no processo comum no 87/95, do 2° Juizo Criminal do Tribunal de Santa Maria da Feira; - a pena de sete anos de prisio pela pratica de um crime de trifico de estupefacientes p.p. pelo art? 21°, n° 1 do Dec. Lei no 15/93 de 22.01, ocorrido em 14.10.1992, aplicada por Acérdao de 10.11.1995, proferido no processo comum colectivo no 1708, do 2° Juizo Criminal do Tribunal de Vila Nova de Gaia. O arguido esteve preso a ordem dos processos cujas penas parcelares foram incluidos em tal ciimulo juridico desde 13.02.1995 a 30.10.1999 ¢ desde 08.05.2000 a 26.09.1001, sempre ininterruptamente, sendo que desde 26.09.2001 se encontrava evadido do E. P. de Vale Judeus, apenas retomando 0 cumprimento de tal pena por ter sido recapturado em 12.02.2002, na sequéncia da pratica dos factos que ora lhe sio imputados. 20°- O arguido tem dois filhos menores que vivem com a respectiva mie em Espanha. Tem 0 6° ano de escolaridade e trabalha no interior do EP. 21°- Para além dos crimes referidos supra em 19° o arguido, a data dos factos em aprego, ja havia sido condenado em tribunal pela pratica de outros crimes contra o patriménio Actuou sempre de forma livre, voluntéria ¢ consciente, bem sabendo 0 seu comportamento contrario & lei. 5. O recorrente define ao objecto do recurso apenas a questo relativa & relagdo que no caso intercede entre os crimes de roubo ¢ sequestro, entendendo que se verifica uma relagdo de concurso aparente. Como é jurisprudéncia assente deste Supremo Tribunal, entre os crimes de roubo ¢ sequestro existe uma relagdio de concurso aparente (por uma relagao de subsidiariedade) sempre que a privagdo da liberdade de locomogao nao ultrapasse a medida naturalmente associada a pratica do crime de roubo, como crime-fim; 0 concurso é, pelo contrario, efectivo, quando a privagao da liberdade se prolongue ou se desenvolva para além daquela medida, apresentando-se a violagdo do bem juridico protegido no crime se sequestro (a liberdade ambulatéria) em extensio ou grau tais que a sua protecgdo nao pode considerar-se abrangida pela incriminagao pelo crime de roubo (v. g., ac STJ de 22 de Novembro de 2000; proc. n° 2942/2000-3). factos provados, especificamente os referidos nos pontos 8° e 9°da matéria de facto, revelam impressivamente uma situagdo em que a iptv. dos pls.ns 08087 cbef0=80257085004280727OpenDacument zaow2o17 hipitww. dos ps.ns 008087 cbef088025708500428072OpenDacument petri do Surero riba de Juica liberdade de circulagao do ofendido esteve afectada por acgo do recorrente durante um consideravel lapso de tempo, muito para além do que pode estar associado ou finalisticamente determinado a pratica de um crime de roubo. Existe, assim, concurso real entre os crimes de roubo e sequestro, tal como decidiu 0 acérdio recorrido. Vistas, assim, as coisas, o recurso e a sua fundaments manifestamente improcedentes. A manifesta improcedéncia determina a rejeigdo do recurso (artigo 420°, n° 1 do Cédigo de Processo penal). Jo apresentam-se 6. Nestes termos, rejeita-se 0 recurso O recorrente pagaré 3 UCS (artigo 421°, n° 4 do Cédigo de Processo Penal). ‘Taxa de justiga: 2 UCs. Lisboa, 5 de Janeiro de 2005 Henriques Gaspar Antunes Grancho Polibio Flor

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