Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Pode acontecer que numa ou noutra situação tenhamos que sofrer a calúnia
ou a difamação por sermos verazes, por sermos fiéis à verdade; noutras, as
nossas palavras ou as nossas acções serão talvez mal interpretadas. Em
qualquer caso, o Senhor espera de nós, seus discípulos, que falemos sempre
com clareza, abertamente: O que vos digo às escuras, dizei- o à luz do dia; e o
que escutastes ao ouvido, proclamai- o sobre os telhados.
Alguns pensam, por táctica ou por covardia, que a vida dos cristãos e a sua
concepção do mundo, do homem e da sociedade, devem passar inadvertidas
quando as circunstâncias são adversas ou comprometedoras. Esses cristãos
ficariam então como que “emboscados” no meio de uma sociedade orientada
para objectivos radicalmente diferentes; e não teria nenhuma ressonância o
fato de serem homens e mulheres que olham para Cristo como o ideal
supremo. Essa não é a doutrina do Senhor.
O que vos digo às escuras, dizei- o à luz do dia... O Senhor dirige-se com
essas palavras a cada um de nós, pois são muitos os inimigos de Deus e da
verdade que pretendem e se empenham em conseguir que os cristãos não
sejam nem sal nem luz no meio das tarefas que os ocupam.
Mas eles não lhe dão a sua opinião autêntica, a sua opinião em consciência.
Analisam antes as consequências das suas possíveis respostas, procurando a
mais conveniente para a situação em que se encontram: “Se dissermos do céu
– pensam –, dirá: Por que não crestes nele? Mas se dissermos que o baptismo
do Precursor era dos homens, a multidão nos apedrejará”, porque todos tinham
João por um verdadeiro profeta.
Acontece o mesmo todos os dias. “A pessoa cuja vida não se rege pela
sinceridade, por uma disposição habitual de encarar a verdade ou os ditames
da consciência – por mais incómodos ou duros que sejam –, afasta-se
rotundamente de toda a possibilidade de comunicação divina. Quem tem medo
de olhar de frente a sua consciência tem medo de olhar de frente para Deus, e
só os que se dispõem a estar cara a cara com Deus podem ter verdadeiro trato
de amizade com Ele”5. Não é possível encontrar a Deus sem este amor radical
pela verdade. Como também não é possível entender-se com os homens e
conviver com eles.
Não se trata de saber até que ponto se podem dizer coisas falsas sem
incorrer em falta grave. Trata-se de detestar a mentira em todas as suas
formas, de dizer a verdade total; e quando por prudência ou caridade não seja
possível fazê-lo, então devemos ficar calados, mas não inventar recursos
formalistas que tranquilizem falsamente a consciência9. Devemos amar a
verdade em si mesma e por si mesma, e não apenas pelas suas
consequências em relação ao próximo. Devemos detestar a mentira como
coisa torpe e vil, seja qual for o fim com que lancemos mão dela. Devemos
detestá-la porque é uma ofensa a Deus, suma Verdade.
(1) Mt 10, 24-33; (2) São Josemaría Escrivá, Sulco, n. 50; (3) Mc, 11 27-33; (4) C. Burke,
Consciencia y libertad, Rialp, Madrid, 1976, pág. 51, nota 7; (5) ib.; (6) São Josemaría Escrivá,
op. cit., n. 337; (7) Paulo VI, Alocução, 17-II-1965; (8) Santo Agostinho, Contra a mentira, 3, 4;
(9) cfr. São Francisco de Sales, Introdução à vida devota, III, 30; (10) Liturgia das Horas,
Oração de Laudes da 2ª semana.