Você está na página 1de 6
tance de olhos sobre Um Lan ce de yaroido de Campos Pados O poema de Mallarmé — Um Dés”, 1897) — nfo se Presta a agent Dadee ‘ 4 J ementacdes. Seu coeso sistema de telagdes, desenvolvendo-se num horizonte Probabilistico (“cette conjonction supréme avec la Probabilité”), através de formas verbais condicionalizantes e de futuros hipotéticos, de ablativos absolutos e de gerindios, vertebrado Pelo eixo epistemolégico — Un Coup de Dés Jamais N’Abolira le Hasard (a que a frase final, “Toute Pensée émet un Coup de Dés”, confere Teversibilidade, da capo, rearmando © problema ad infinitum; a que, ainda, simultaneamente, a “conste- lagao” Tedargdi, num ricochete dialético, acenando com a aboligéo do acaso através da obra, “compte total en formation”) —, é dos que mais dificilmente se Prestariam a amostras inteligiveis de per i A tentativa de amostragem que fazemos tem, portanto, uma tni 5 Nstificativa: incitar, Despertar no eventual leitor a ee es ‘xto original, na sua armadura completa, “spectacle Vee une crise ou aventure intellectuelle”, como eee a Ts ‘ieté, 11), marco decisivo duma evolugao critica de formas nosso tempo. ‘néo 0 considere .O primeiro fragmento-ramificagéo do yur obra aberta, em n ltitor como algo estético, fechado, mas co de Claudel) introduz ento, em équilibre instable na express ae ao “gorro a-alusio Hamlet; a “pluma solitéria pecs 1 ce POE eia-noite” do “principe amargo do seco di Amleto diveatera do autor, instrumento da obra iar ricerca” — aca 5 trume! ie utile Mame). A cide balan, oo i fre #8 aid “ de Letrss, io, eT = DP d q ma fachitilnde criginaimeme no Jornsl PS gmentot’ d° a la 187 Gti”), em “Igitur”, passa a coincidir com o lance de dados da Cria. co. Hamlet, “la pice que je crois celle par excellence” (M, é “Ffamlet”, Oeuvres Completes, Pléiade, p. 299), postula “le suspens dun acte inachevé” (idem, p. 300; ver também Gardner Davies Vers une explication rationnelle du Coup de Dés), 0 que toca 9 cetne da construgéo poemética mallarmaica. Marcado pela brancura rigida da pluma, em contraste com © céu, © heréi do poema opée ao némero absoluto a sua pequena razio viril — que, num certo nivel, a Prépria pluma simboliza — relampago. Notar, também, que a disposicao geral deste fragmento compée sutilmente, de maneira mais topolégica do que pela imposicao defi. nida de uma pictografia exterior — imposigo que ocorre na maioria dos caligramas de Apollinaire — o ideograma-figuracao de um gorro (bloco & direita de quem 1é) ornado de uma pluma (linha isolada “pluma solitdria perdida”, na pagina & esquerda do leitor, onde pre- domina 0 branco; linha esta que parece prender-se ao corpo grafico mais compacto do “gorro” pelo elo da palavra “salvo”, préxima a dobra-divisora-de-Aguas da p4gina). “... le rythme d’une phrase au sujet d’un acte ou méme d’un objet n’a du sens que s'il les imite et, figuré sur le papier, repris par la lettre 4 l’estampe originelle, n’en sait rendre, malgré tout, quelque chose” (Mallarmé, carta a Gide, 1897, apds a primeira impressio ‘do poema na revista Cosmopolis, € a propésito de uma segunda impressdo, mais perfeita, em curso). Augusto de Campos, em “Pontos. Periferia. Poesia Concreta” (1956). ia ae tragada a distingéo entre o pensamento visual de Mallarmé Ca i éia caligramica de Apollinaire: “B certo que se pode indagar aqui do valor sugestivo de uma relacao fisiogndmica entre as palavras £.° objeto Por elas representado, qual o préprio Mallarmé nao teria pis soditsrente, Mas ainda assim, cumpre fazer uma distingéo qua- as ‘a. No poema de Mallarmé as miragens gréficas do naufragio € . miigdeToniee se insinuam ténue, naturalmente, com a mesma ae id © discri¢éo com que apenas dois tracos podem configurar cograma chinés Para a palavra homem. (...) J& em Apollinaire # a iad rageacmente imposta ao poema, exterior as a Reilmeate ie lo recipiente, mas nado sao alteradas Ls eae ati geral'ds us Pipa os do fragmento isolado Per esciiGs do efeito éptiso’ da nd de Dés, nio encontraremos melhor a (0p. cit. p 851) do gage mathématique professada pot Me aa delaire ay Sarai ae oferecida por Marcel Raymond, vatégance d'une épure, d'une fon “le potme se dessine alors avec ! ” fonction mathématique”; descrigéo que sada com as palavras do prépri, cotejad me serait difficile de fomnen $m carta a V.B. Miche yas couvrif le papier de géométrie ot i elque chose on ge let: de ma pensée EB Pensaremos também n, a perpétua dialética, na qual o ar faz as vee dec aa-pagi Ou nessas versdes visuais de 6, © siléncio-branco- fineas da obra de Mallarmé rua algebri tempor (Carola Giedi Plastik des XX. Jahrhunderts, p. 143, nos i lon-Welcker, no sey “optische Darstellung einer algebraischen Fo, i Pe de uma Londres, Science Museum, 1876), Raum ae H. Henrici, (“Die mathematische Denkweise in der Kunst unsere pea Bill importancia andloga, para uma nova Pesquisa de ae it p coats descobrimento da escultura negra teve para os cubistas. Aas ae ° da comparagao, veja-se um exemplo do préprio Max aa 2 vido no plano — nanquim sobre cartéo — “Konstruktion auf der Formel a2 + b? = c®’, de 1937 (cf. Tomas Maldonado, Max Bill, p. 46). Nota-instigagao: Joyce conjuga Hamlet e Mallarmé no episédio do diélogo na Biblioteca Nacional de Dublin, do Ulysses (‘“Scylla and Charybdis”, segundo o organograma famoso de Stuart Gilbert). Mal- larmé € tratado como um decadentista (“France produces the finest flower of corruption in Mallarmé”), e 0 “French point of view” sobre Hamlet (‘Hamlet ou le Distrait / Pitce de Shakespeare”), introduzido por uma citagdo de Mallarmé (“‘il se promeéne, lisant _ livre de lui-méme”), 6 ironizado por Stephen Dedalus, Poe autor: Hamlet, “the absentminded beggar”. Stephen, com ca ary bite of inwit” (‘“remordimento do imod’alma”, —— para numa i arcaizante dessa expressio dX pardfrase, reproduzir a aura saplesa do séc. XIV)» Segundo Stuart Gilbert, é extraida duma obra ia! ap. 48 do tem muito em comum, porém, com 0 drama} Ubsses, ele se refere, mesmo, a seU chapéu - meia-noite at my Hamlet hat”), 0 que lembra © Maite apés 0 t minuit”) do texto de Mallarmé. Por outro 1 de Dés". © bert Greer Cohn, L’Oeuvre de Mallarmé “Gesenvolvew as pret ° de David Hayman, Joyce et Mallarmé, ave sallarmaico levantadas pelo primeiro, as analogias Orr de Dés iz pita, a * 9 joyciano, fico entre o U! strut Wake, tornsranneo in: tanto sob ate os eshem tse anh © Prisma de um parentesco de cosmovisl. 1 ago igualmes igo! la (o “homem-pena”, © escritor) ‘@ da obra cosmogénica, total, (Finnegans Wake, p. 357; a identificagio desta e de outras ao Lance de Dados, na obra maxima de Joyce, dey ee Hayman, op. cit., vol. II, pp. 112-113), Vid O segundo trecho escolhido é © final — ricorso do poema; no branco da pagina, como no céu ficto de um Planetério, a Possibili. dade de uma constelagao se projeta, convergindo para o “céleul total em formagao”, resultado provavel do lance de dados, se este por hipétese, efetivado. A contradi¢ao dialética entre a afirmagio axial de que “um lance de dados jamais abolir4 0 acaso” e © surgimento presumivel da constela¢éo (que envolve o proprio poema como forma nova €, portanto, disciplina controladora do acaso), 44 foi apontada por Maurice Blanchot: “Le hasard est sinon vaincu en cela, du moins attiré dans la rigueur de la parole et élevé a la ferme figure d'une forme od il s’enferme”. E esta contradigao critica que fecunda o poema e recoloca os termos do problema — “symphonique équation” (Mallarmé, op. cit., Pp. 646) — como um “xadrez de estrelas” (para tomarmos de empréstimo a imagem barroca de Vieira), perpetua- mente em progrzsso. A procura do absoluto, fadada por definic’o a faléncia, entrevé um éxito Possivel na conquista relativa sancionada Por um ‘alvez: a obra-constelacdo, evento humano, experiéncia viva © vivificante — véspera de um novo lance (“Toute Pensée émet un Coup de Dés”). Do ponto de vista de uma teoria’da composiga0, a conseqiién- cia duma tal hermenéutica do Un Coup de Dés nio seria a abolicio do acaso, mas a sua incorporagéo, como termo ativo, ao processo criativo. Realmente, um racionalismo da composiga0, como o postu- lado por Edgar Allan Poe, e mais tarde por Mallarmé, nao implica, afinal, a elisio do acaso (desejo de absoluto que, se esbocado, é cerceado logo a altura de um jamais), mas, sim, a disciplinagao deste. A inteligéncia ordenadora delimita o campo de escolha; o feixe dé Possibilidades € engendrado pelas Préprias necessidades da estrutura Poemética pensada: a opcfo criadora significa liberdade de escolha, mas também — © sobretudo — liberdade vigiada por uma 3 Cia seletiva e critica. Isto queria dizer Décio Pignatari (“Nova poesia: Tuto. favi1956), quando escreveu: “Renunciando a disputa do abs » Neamos no campo ma; ético do relativo perene A Srometragem do acaso. , ,» Este ° rome Gus spent? constr tivo — sensivel, nao Cientifico, pois labora sobre os dados da sensibi- i (no mesmo sentido Poderiam ) — que tracamos em “Da an te pematica da composic&o” (1957) 1, Es . OMos estética conlemporaneamente atuante ry Pa el como lema as palavras de Greer Cohn: *5p allan t étre temporairement utile comme préiugé ¢ antirationalisme ant que doctrine théorique a aia na Staten, iles ; gerivains compris” (op. cit, p. 27, nota 1g), ” PM ‘Out le monde, Voltando ao segundo exemplo apresenta . di i nivel visual, a série gerundial vigiando — dues po ee brilhando ¢ meditando —, completada pelas formas tute dlp ¢ sagre, fixa o grafico estelar da Constelacio (Gardner Davies call nessas palavras-pontos-de-luz, as sete estrelas da Ursa Maior, dena de cintilagoes”; também os pontos Negros na face branca dos dados que rolam sao evocados, numa espécie de. fusio cinematografica de imagens). A “constelagdo” j4 vinha se escandindo desde o alto da pagina, de EXCETO a um local e de em direcdo (vers) a Norte. Nota-instigagdo; Nao teria sido por mera coincidéncia que, no Doktor Faustus, Thomas Mann tenha recorrido a idéia de “constela- sao” (“Die Konstellation”), para definir, pela boca de seu persona- gem Adrian Leverkiihn, o principio schoenberguiano da composic4o serial (Reihenkomposition). As afinidades da problematica da misica moderna com o mundo mental mallarmaico encontram @ mais oa evidéncia na admiracdo que um jovem compositor da importincia = Pierre Boulez devota ao Un Coup de Dés (quase todas as apemd G8es te6ricas de Boulez revelam essa admiracao; Pte wah Plo: “Hommage & Webern”, Domaine Musical, 1, io one 0 recente “Alga”, La Nouvelle NRF, nov. 1957, PP. ne Quanto a poesia, Eugen Gomringer, slegando # ‘Konstlaton - Categoria do novo fazer pottico (“Von re irale, 0.0 5, 1955; Ver Zweck und Form einer neuen Dichtung’ fungdo ¢ forma de = Noss; « telagio — ’@ traducfo, “Do verso a constelag: Brasil, 17-3-57), © Salers poesia”, Suplemento do Jornal do Bras” Te py Concretos Slices por seu lado, bea cujo quadrant © ‘mir as conseqiiéncias de uma tra . e Haroldo de Sie He 1) On artigos citados, de Déio, Piensterregs (Sie PH fe noe, cltadon, de Deena Comer oon arts se na 41 0 9193), 101 Mallarmé (Un Coup de Dés) — Pound — Joyce — © indicio de que, passado mais de meio século, Um continua a ser o vetor para o futuro. Palavras de i “Devant ce poéme, nous éprouvons combien ee es doeuvre et d'art répondent mal a toutes les possibilités a venir ae dissimulent. La peinture nous fait souvent Pressentir aujourd’hg : c@ qu’elle cherche a créer, ses “productions” ne Peuvent plus pe des oeuvres, mais voudraient répondre A quelque chose pour fries Nous n’avons pas encore de nom. Il en est de méme Pour Ia littérature, Ce vers quoi nous allons n’est peut-étre aucunement ce que l'avenir réel nous donnera. Mais ce vers quoi nous allons est Pauvre et riche d'un avenir que nous ne devons pas figer dans la tradition de nos vieilles structures” (Le Livre a venir). “Poesia, Es- texto original, havia uma referéncia exemplificativa sos artigos . treme we upocma™ iGcogrema', de Augusto de Campos, Didrio de Séo Pee os 3-55; “Poesia ¢ Faraiso Perdido” e “A Obra de Arte Aberta”, de Haroldo de Cami, tdem, 5-6 € 3-7-55. Todos foram incluidos na Teoria da Poesia Concrete, cit. Prumeiros encontram-se no presente Apénc

Você também pode gostar