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“Semiotics and Art History” [Mieke Bal + Norman Bryson] Revisited

Daniela Vieira de Freitas Simões

Paper desenvolvido no âmbito da disciplina de


Metodologias em História da Arte

Docente:
Doutora Joana da Cunha Leal

Janeiro 2011 
“Semiotics and Art History” [de Mieke Bal + Norman Bryson] Revisited 

“Every work of art is an absolute statement. (…) Every work of art is an unique statement.” (1) 

Os autores Bal e Bryson no seu artigo “Semiotics and Art History”, o qual nos propomos agora 
a  reler,  afirmam  que  a  base  da  Semiótica  é  “the  definition  of  the  factors  involved  in  this 
permanent process of signmaking and interpretating and the development of conceptual tools 
that  help  us  to  grasp  that  process  as  it  goes  on  in  the  various  arenas  of  cultural  activity”  (p. 
174).  

Tradicionalmente, a Semiótica é uma disciplina que se ocupa do estudo da teoria dos signos e 
a  sua  interpretação  em  várias  formas  de  comunicação.  Se  considerarmos  a  Arte  como  uma 
forma  de  comunicar  algo,  então,  e  em  teoria,  a  Semiótica  poderá  ser  uma  ferramenta 
extremamente útil na leitura da obra ou na leitura da mensagem ou do algo que a obra visual 
pretende  transmitir.  Os  autores  citados  referem  o  campo  da  Arte  como  uma  das  “arenas de 
actividade cultural” em que portanto se torna óbvio que a Semiótica poderá ser um contributo 
real para o estudo da Arte e portanto, uma metodologia de trabalho na disciplina de História 
da Arte. 

Contudo, e da mesma forma que a História da Arte evoluiu e iniciou novos debates no seu seio 
relativamente aos múltiplos caminhos ou metodologias a seguir e à sua própria evolução nas 
esferas académicas (2), também a Semiótica Moderna se ocupou de outras temáticas para além 
do estudo da teoria dos signos ou da continuação do trabalho iniciado por Peirce e Saussure, 
especialmente, com aplicação à Arte – como são as obras de Panofsky ou Meyer Schapiro. De 
certa forma e conforme Preziosi (1989) refere, a Semiótica sempre fez parte da disciplina ainda 
que  assumindo  outros  contornos  como  o  estudo  da  Iconografia,  Filosofia  da  Estética,  entre 
outros  –  contudo,  e  acompanhando  as  evoluções  no  seio  da  História  da  Arte  Moderna,  a 
Semiótica  (BAL,  BRYSON  1991)  passou  a  ocupar‐se  de  assuntos  como  a  polissemia  de 
significados;  a  problemática  da  autoria;  contexto  e  recepção;  as  implicações  do  estudo  da 
narrativa para o estudo das imagens; a diferente relação entre signos visuais e verbais entre 
sexos ; e ainda, a verdade da interpretação. Neste artigo considerado um dos mais extensos e 
compreensivos  sobre  as  novas  problemáticas  enfrentadas  pela  disciplina,  levantam‐se 
questões que nos propomos a analisar (3). 

Ao longo do seu artigo, Bal e Bryson fazem uma leitura geral em dois momentos: no primeiro, 
focam a forma como a Semiótica desafia algumas práticas essenciais da disciplina de História 
da  Arte  ao  longo  das  três  primeiras  secções  –  1.  Context,  2.  Senders,  3.  Receivers  ‐    e  num 
segundo  momento,  em  duas  secções  do  artigo  –  6.  Psychoanalysis  as  a  Semiotic  Theory,  7. 
Narratology  –  de  que  forma  a  Semiótica  pode  aprofundar  a  análise  procurada  pelos 
historiadores  de  arte.  A  proposta  feita  pelos  autores  é  a  de  que  a  Semiótica  como  teoria 
transdisciplinar,  pode  e  tem  impulsos  a  transmitir  à  disciplina  de  História  de  Arte  não  como 

                                                            
(1)
 Irving Lavin, “The Crisis of «Art History»” in “Art History and Its Theories”,  The Art Bulletin, vol. 78, n.º 1 (Março 
1996): pp. 13‐15 
(2)
 a obra de Donald Preziosi, “Rethinking Art History: Meditations on a Coy Science” (New Haven, 1989) foi uma 
referência importante nesta matéria.  
(3)
 referência feita por Donald Preziosi, “The question of art history” , Critical Inquiry, vol. 18, n.º 2, (Inverno 1992): 
pp.363‐386 
uma  mudança  linguística,  mas  sim  uma  alteração  metodológica  e  operacional  na  mesma, 
criticando o conhecimento posivista e os seus métodos na disciplina (p. 174). 

Nesta releitura de Bal e Bryson, vamo‐nos centrar somente na primeira parte do artigo e rever 
as  três  primeiras  secções  do  mesmo  que  abordam  as  temáticas  do  Contexto,  Remetentes  e 
Receptores  (4).  Iniciaremos  esta  abordagem  com  duas  secções  do  artigo  que  esclarecem  as 
principais diferenças entre duas correntes semióticas distintas: teoria de Peirce e a teoria de 
Saussure – secções 4 e 5 do artigo. 

1. Peirce e Saussure – Teorias 

Peirce, citado por Bal (5): “A sign, or representamen, is something which stands to somebody for 
something in some respect or capacity. It addresses somebody, that is, creates in the mind of 
that person an equivalent sign, or perhaps a more developed sign. That sign which it creates I 
call the interpretant of the first sign. The sign stands for something, its object. It stands for that 
object, not in all respects but in reference to a sort of idea, which I have sometimes called the 
ground of the representamen”.  

É assim criada uma trilogia em Objecto – Substituto – Interpretante, sendo que a relação entre 
Objecto e Substituto é totalmente arbitrária. De acordo com Bal, esta definição oferece uma 
base programática de trabalho das obras de arte apartir do momento em que a obra funciona 
como  um  signo,  actuando  sobre  alguém  e  processada  por  essa  pessoa,  traduzindo  um  signo 
como um evento. O que o receptor deste signo‐evento retêm é assim não o objecto, mas uma 
“ideia”  do  objecto,  uma  imagem  mental  “equivalente”  ou  “correspondente”  ao  objecto  ou 
ainda, formula um signo mais evoluído que o signo‐evento – interpretant – resultado de uma 
evolução  e/ou  posicionamento  social  distinto  de  aferição  de  significado  estando  implicita 
assim,  uma  especificação  da  convergência  imagem‐receptor  –  definida  e  limitada  pela 
identidade  social  do  receptor  e  que  a  qualquer  momento  pode  ser  captada  e  analisada, 
conferindo uma perspectiva pragmática à disciplina. Peirce aponta ainda que o signo refere‐se 
ao objecto que não se encontra, ou seja, ao objecto que se encontra ausente, conferindo um 
campo  de  trabalho  semântico  somente  possível  dada  a  ausência  do  objecto  e  sobretudo  do 
significado a partir do qual o signo irá operar e na presença do qual o signo não o pode fazer; 
da mesma forma que se o significado se encontrar totalmente disperso, o signo é incapaz de 
agir  (6).  Para  solucionar  esta  questão,  Peirce  acrescenta  que  o  signo  poderá  representar  o 
objecto  não  na  sua  totalidade  mas  em  relação  com  uma  certa  ideia  do  mesmo  ‐  campo  de 
operação  do  representamen.  A  este  campo,  Bal  chama  código,  uma  espécie  de  regra  que 
permite ligar o signo ao seu significado numa operação objectiva desde que todos os membros 
ou receptores operem sob as mesmas regras, potenciando a comunicação. Da mesma forma 
que a linguagem lentamente se altera, também as regras poderão sofrer alterações permitindo 
de modo generalizado que os códigos relacionem não apenas um signo e o seu significado mas 

                                                            
(4) 
traduções livres dos e que serão usadas no decorrer do trabalho mas sempre em relação com os termos 
inicialmente propostos pelos autores: Context, Senders, Receivers  
(5)
 Mieke Bal, “Signs in Painting” in “Art History and Its Theories”,  The Art Bulletin, vol. 78, n.º1 (Março 1996): pp. 6‐
9, citando Charles Sanders Peirce, “Logic as Semiotic: The Theory of signs” 
(6)
 sobre a presença e significado do objecto e mais profunda discussão, ver Jacques Derrida “Of Grammatology”, 
(Baltimore, 1976)  
grupos  inteiros  de  signos  entre  si,  entre  signos  e  classes  de  significados  potenciando  um 
campo de trabalho para a semiótica, semântica e a síntaxe. 

O desenvolvimento do trabalho de Peirce explica como estas operações se processam através 
do  index,  ícone  e  simbolo:  “iconic  is  a  quality  of  the  sign  in  relation  to  its  object;  (...)  a  sign 
capable of evoking nonexistent objects because it proposes to imagine an object similar to sign 
itself  (...).  Peirce’s  description  of  the  index  emphasizes  its  symmetrical  opposition  to  the  icon 
(…);  [the  symbol]  is  dependent  even  more  strongly  than  the  two  other  terms  on  the  act  of 
interpretation that brings it to life (…)” (pp. 189 ‐ 191).  

De acordo com os autores, a teoria de  Peirce é útil  para a arte  porque permite estudá‐la na 


sociedade e na história sem que o historiador se prenda com as intenções do artista enquanto 
simultaneamente  permite  através  da  mistura  entre  iconicidade,  indexicalidade  e  simbolismo 
tornar o visionamento de uma imagem (obra de arte neste caso) numa actividade dinâmica e 
posicionada no tempo ‐ presente. 

Parece‐nos  claro  que  Bal  e  Bryson  salientam  sobretudo  a  recepção  da  obra  no  geral  e  em 
particular em determinado período temporal, propositadamente “recortando” o artista do seu 
papel e destituindo‐lhe qualquer interesse de estudo e investigação. Como veremos adiante a 
posição da disciplina não parece adequar‐se com esta metodologia; Eco refere um aspecto dos 
textos  de  Peirce  que  parece  ser  ignorado  no  artigo  de  Bal  e  Bryson:  “[relativamente  aos 
escritos  de  Peirce]  I  read  this  page  as  the  proposal  of  a  difference  between  a  theory  of 
signification and a theory of communication”  (7)  (ECO 1976:1461). Existindo uma diferença real 
entre as referidas teorias de que forma se irá manisfestar no campo da arte e do seu estudo, 
em particular, da História da Arte? 

Claramente  que  o  desenvolvimento  das  teorias  de  Peirce  com  aplicação  à  História  da  Arte 
produziram já obras de relativo interesse e momentos de reflexão importantes ‐ não podemos, 
por exemplo,  descurar o trabalho de Rosalind Krauss em 1977 (8)  

Saussure 

Citando  Bal  e  Bryson  no  início  da  secção  5,  “If  Peirce’s  view  of  the  way  sings  function  is 
primarily  dynamic,  that  of  Ferdinand  Saussure  involves  far  more  stasis”  (p.  191).  De  facto,  o 
sistema proposto por Saussure por derivar do estudo da linguística, procura definir o conjunto 
global de regras que definem uma linguagem como um todo para isolar essas regras de forma 
a  estudar  as  relações  internas  entre  os  signos  de  uma  linguagem  que  de  acordo  com  a 
proposta de Saussure são determinantes do significado desses signos. Assim, o significado das 
palavras deriva da sua oposição a outros conceitos/palavras.  

O  sistema  de  Saussure  irá  assentar  no  signo  linguístico  que  é  composto  por  duas  unidades 
combinadas que são o significante e o significado sendo que o primeiro opera como a “imagem 
acústica” ou “imagem sonora” do signo; e o segundo remete para o conceito ou conteúdo do 
signo.  Ambos  os  conceitos  articulam‐se  assim  em  relação  com  o  signo  linguístico  como  duas 
                                                            
(7) 
Umberto Eco, “Peirce’s Notion of Interpretant”, MLN, vol. 91, n.º 6 (Dezembro 1976): pp.1457‐1472  
(8)
 Rosalind Krauss, “Notes on the Index: Seventies Art in America”, October, vol. 3 (Primavera 1977): pp.68‐81; e 
ainda, da mesma autora e na continuação do referido artigo, “Notes on the Index: Seventies Art in America. Part 2”, 
October, vol. 4 (Outono 1977): pp.58‐67 
faces de uma moeda, caracterizando‐o e tornando‐se inerentes a este. Saussure define ainda a 
“economia de esforço” na linguagem através da combinação de formas mínimas na linguística 
e  diferencia  a  linguagem  (langue)  da  palavra  (parole)  procurando  estudar  a  primeira  através 
das alterações que se dão (temporal e localmente) na segunda. Por outras palavras, define‐se 
uma  fronteira  na  linguagem  que  é  segmentada  em  unidades  de  estudo  (fonemas,  por 
exemplo) que são mapeados em termos de oposição de sintaxe. 

Apesar  de  não  aparentar  evidente  relação  ou  utilidade  para  o  estudo  da  Arte,  o  trabalho  de 
Saussure  lançará  uma  corrente  de  estudo  no  século  XX  empenhada  em  estudar  a  realidade 
social como um conjunto de relações e que se chamará Estruturalismo. 

Um dos exemplos perseguidos por Bal e Bryson em relação a Saussure e aos estruturalistas na 
Arte é o de Edmund Leach cujo estudo sobre os painéis da Capela Sistina definem uma base 
operacional  de  avaliação  “saussuriana”  em  relação  com  o  estruturalismo:  Leach  define  uma 
fronteira  em  redor  de  um  distinto  corpus,  segmenta  o  corpus  em  unidades  de  significado  e 
finalmente as unidades segmentadas são relacionadas através de uma lógica de transformação 
e  condensação.  Igualmente  o  trabalho  de  Derrida  marcará  a  lógica  de  Saussure  em 
conformidade  com  o  Estruturalismo,  com  a  sua  obra  “La  Verité  en  Peinture”  (Paris,  1978)  e 
portanto  com  o  estudo  da  arte  visual  introduzindo  um  sistema  menos  estático  que  o 
“saussuriano” com as relações interior/exterior da obra e de “framing” propostas e largamente 
explicadas por Bal e Bryson nesta secção. 

Contudo, e não descurando os importantes trabalhos desenvolvidos apoiando‐se nesta teoria 
de signos que pretende acima de tudo explicar a lógica e organização interna de uma estrutura 
complexa (linguagem ou a obra de arte) – como são a obra de Michel Foucault em 1973 (9) ou a 
de  Derrida,  de  modo  geral  –  até  que  ponto  esta  persecussão  pela  explicação  da  organização 
interna da obra pode ser transposta de campos em que foi trabalhada inicialmente – como na 
literatura  por  Barthes  e  Derrida;  na  psicologia  com  Lacan  e  Piaget;  ou  ainda  Foucault  na 
epistemologia  –  para  os  campos  da  arte  e  sobretudo  da  História  da  Arte  se  sabemos  como 
investigadores  que  a  verdade  da  obra  não  é  linear  e  objectiva?  E  para  mais  quando 
compreendemos que as palavras são restritivas demais sobretudo quando comparadas com a 
obra  de  arte  pictórica?  Não  se  abre  um  leque  demasiado  vasto  de  opções  de  interpretação 
(signos:  significantes  +  significados)  quando  se  transpões  esta  teoria  “saussuriana”  da 
linguística para a pictórica?  

2. Contexto (pp. 176 ‐ 180) 

Entrando  no  artigo  propriamente  dito,  Bal  e  Bryson  começam  por  delinear  os  referidos 
instrumentos  a  implementar  na  História  da  Arte  com  a  questão  do  contexto  como  texto  a 
interpretar  (p.  175)  sendo  portanto  impossível  produzir  uma  contextualização/contexto 
exaustivo dado que este é informado pelo tempo, local e personalidade do historiador de arte 
que o constrói (pp. 175; 187; 207). 

Antes de mais, a tarefa do historiador de arte não pode ser mais que aferir e avaliar antes ou 
em  lugar  mesmo  de  concluir.  Para  interpretar  ‐  questão  que  será  recorrente  nos  processos 
descritos pelos autores – é antes de mais necessário analisar, circunscrever factos e evidências 
                                                            
 Michel Foucault, “Ceci n’est pas une pipe”, (Paris, Fata Morgana, 1973)  
(9)
para posteriormente poder interpretar e aí sim, concluir. Da mesma forma que se impossibilita 
a interpretação sem aferição, o culminar expectável da primeira será alcançar uma conclusão. 

Ora bem, hoje em dia, o historiador de arte depara‐se com uma certeza somente: as prováveis 
hipoteses conclusivas que lança ou coloca em cima da mesa, não podem esperar ser mais que 
fundamentadas fortes probabilidades de aferição correcta, um bom resultado de investigação 
científica  cuidada  e  não  a  absoluta  verdade  sobre  ou  da  obra.  O  historiador  de  arte 
contemporâneo  debate‐se  e  enfrenta  o  desafio  de  que  a  sua  pesquisa  a  qualquer  momento 
poderá  ser  suplantada  por  qualquer  novo  facto  até  então  desconhecido  ou  enriquecida  (ou 
destruida) por uma nova técnica de aferição científica.  

Cabe ao historiador ser o mais rigoroso possível na construção do contexto da obra antes de 
retirar conclusões sobre o mesmo com repercussões na obra de arte – o acto de concluir ou 
a(s)  conclusão(ões),  sendo  uma  consequência  da  interpretação,  está  assim  sujeita  a  um 
referente  logo,  à  posição  relativa  do  receptor  da  comunicação  provocada  pela 
contextualização:  esse  receptor,  neste  caso  o  historiador,  é  contituído  pelo  tempo,  espaço, 
meio  em  que  se  situa  (o  presente)  conduzindo  assim  a  introduzir  inputs  seus  nas  suas 
conclusões. Logo, para além do presente actuar sobre o passado – na pessoa do historiador – o 
passado  poderá  ainda  actuar  sobre  o  tempo  presente  ao  produzir  um  facto  até  então 
desconhecido. 

Acrescente‐se que tal como Panofsky  (10) defendia já em 1940, o texto ou contexto necessitam 
de  pré‐selecção  uma  vez  que  o  documento  que  “acompanha”  a  obra  poderá  ser  tão 
enigmático e indecifrável quanto a obra em si. Desta forma, apesar de tentarem desconstruir o 
conceito de contexto ou de “colocar a obra em contexto” (p. 176) através de uma perspectiva 
dita semiótica, Bal e Bryson acabam por reforçar a prática já estabelecida no seio da disciplina 
apesar de iniciarem o artigo com o ataque bastante directo ao conhecimento dito “positivista” 
e  as  suas  ramificações  no  seio  da  disciplina.  Ao  contrário  do  que  se  propõem  a  realizar,  os 
autores  que  criticam  a  interpretação  e  o  papel  que  assume  presentemente  no  trabalho  do 
historiador,  concluem  que  a  mesma  é  necessária  para  a  aferição  do  que  é  admissível  no 
contexto ou mesmo no texto que suporta, “emoldura” a obra de arte. 

Adiante no mesmo artigo, os autores referem: “context can always be extended; it is subject to 
the  same  process  of  mobility  that  is  at  work  in  the  semiosis  of  the  text  or  artwork  that 
«context» is supposed to delimit and control” (p. 177). Já Panofsky na obra referida afirmava a 
dificuldade  de  “fechar”  um  contexto  pelas  questões  ja  referidas  assim  como  o  facto  de  na 
construção  de  uma  retórica  na  disciplina  o  posicionamento  do  historiador  no  presente  e 
reflectido  nas  conclusões  que  retira  da  sua  investigação.  Apesar  de  se  esforçarem  por 
demonstrar  que  o  conceito  de  contexto  é  amplo,  por  vezes  não  totalmente  apreensível  e 
seguramente  impossível  de  totalitarizar  –  um  contexto  globalizante  –  dentro  de  uma 
perspectiva  inovadora  da  semiótica  contemporânea  recorrendo  ao  conceito  do  perpetuum 
mobile  (p. 177), outros autores anteriormente ja o tinham demonstrado dentro da disciplina 
de  Historia  de  Arte  reforçando  a  necessidade  da  construção  do  Contexto  mas  balizado  por 
objectivos que deverão ser explanados pelo historiador.  

                                                            
(10)
 Edwind Panofsky, “The History of Art as a Humanistic Discipline” (1940) in “Meaning in the Visual Arts” (1955)  
3. Remetentes (pp. 180 ‐ 184) 

“Authorship is given not produced; what counts as authorship is determined by interpretative 
strategies” (p. 181) (11). 

Os autores socorrendo‐se de Culler, defendem a separação entre o autor‐artista (da obra de 
arte)  e  o  autor‐pessoa‐que‐habitou‐o‐mundo  na  tentativa  de  defenderem  que  o  conceito  de 
autor  para  além  de  divergente  é  ainda  parte  de  um  “exclutionary  move”  (p.181).  Assim, 
defendem que o historiador deverá recorrer a manobras interpretativas para decifrar o que é 
um corpus ou arquivo autorizado do autor‐artista e trabalhar somente nesse campo de acção. 
Contudo, tendencialmente o artista ergue‐se dos seus trabalhos e da documentação possível 
não apenas como remetente da obra para o mundo mas como homem no mundo real. Se por 
um lado a crítica centra‐se ainda na ambiguidade do termo autor para os vários meios em que 
é  utilizado  (narração,  propriedade  intelectual,  no  museu  ou  galeria,  como  sujeito  criativo) 
também se protagoniza e parece ser esse o cerne da necessidade de afastar o autor‐homem 
do autor‐artista: a multiplicidade de monografias que no âmbito da disciplina se centram num 
somatório  de  factos  da  vida  quotidiana  dos  artistas  sem  qualquer  confronto,  avaliação  ou 
mais‐valia neste estudo em relação com a obra. 

Por  outro  lado  o  “exclutionary  move”  que  é  referido  parece  apresentar  algumas  fragilidades 
como  argumento.  É  necessário  compreender  a  vida  do  artista  no  mundo  real  pois  dessas 
vivências (ou contexto, por exemplo) podem decorrer factos e consequências de relevo para a 
pesquisa. Isto não significa que devam no trabalho final do historiador (a sua comunicação) ser 
focados  com  demasiada  ou  alguma  incidência  até.  Na  mesma  medida,  todos  os  rascunhos  e 
gatafunhos  de  um  artista  podem  e  devem  ser  incluídos  no  corpus  antes  de  poderem  ser 
retirados.  Estes  contínuos  loops  entre  admissão  de  tudo  e  selecção  de  pouco  permitem  ao 
historiador  absorver  o  máximo  de  factos  de  forma  a  poder  analisá‐los,  interpretá‐los  e 
somente então concluir quais os relevantes e os insignificantes. Estão colocadas em relação a 
este “instrumento de trabalho” as mesma reticências e dúvidas que em relação à secção que o 
antecedia  num  paralelo  que  também  autores  explicitam:  as  semelhanças  de  conceitos  ‐  
Contexto+Remetentes. 

Contudo,  as  dúvidas  aumentam  quando  na  aferição  da  autoria,  Bal  e  Bryson  admitem  dois 
momentos alegadamente distintos. Num primeiro, recorrendo a todas as estratégias forenses 
de aferição da veracidade da autoria da obra (técnicas de “Connoisseurship”, Método de Zadig) 
no seguimento das pistas lançadas anteriormente por autores como Taine ou Morelli referidos 
por  Preziosi  (1989)  e  contemporâneos  de  Peirce.  Mas  num  segundo  momento  dá‐se  uma 
alteração  de  estratégia  do  conhecimento  experimental  para  a  avaliação  subjectiva  da 
qualidade e uniformidade estilística da obra – entrando em contradição não só com as práticas 
estabelecidas na disciplina, a sustentabilidade das ciências exactas mas também e sobretudo 
consigo  mesmos  pois  referem‐nas  como  importantes  num  primeiro  momento.  A  dualidade 
aqui situa‐se no facto que se a autoria de uma obra é atribuida a artista X por meios de estudo 
das “pequenas coisas”, dos detalhes aparentemente insignificantes ou de marcas autográficas 
na  obra  (onde  reside  a  originalidade  e  sagacidade  do  artista),  como  será  que  um  método 

                                                            
(11)
  os autores parafraseando Jonathan Culler, “Framing the Sign: Criticism and Its Institutions”, (Norman, Okla., and 
London, 1988) 
puramente  subjectivo,  quiçá,  estético,  poderá  algo  mais  que  somente  corroborar  a  primeira 
avaliação? E se assim é, qual a mais‐valia desta análise subjectiva aparentemente semiótica se 
a primeira distancia‐se mais do erro? 

Ainda na matéria da autoria/autor, Bal e Bryson referem: “the author is not an origin, but just 
one link in the chain” (p. 183). A frase é compreensível à luz do título do artigo – Remetentes – 
e se, de facto, o autor‐artista‐autor‐homem fosse possível de encarar como um veículo ou um 
meio através do qual a obra encontrou o seu caminho para o mundo. Mas os artistas não são 
invólucros  secundários  nesta  equação  nem  as  obras  são  entidades  portadoras  de  uma 
essência‐autónoma antes de serem executadas logo, não são independentes do artista, não o 
povoam (como invólucro), co‐habitam‐no. 

Se uma obra de arte é uma comunicação de uma ideia, um sistema ou um signo, um momento 
capaz  de  se  inscrever  no  âmbito  da  Semiótica,  como  pode  ser  que  a  disciplina  proponha 
encarar  o  Artista  como  um  Remetente?  Transparente,  passivo,  totalmente  secundário.  Não 
estará  totalmente  errado  propor  uma  secundarização  da  vida  do  artista  face  à  obra  mas 
admitir  uma  total  abstração  (ou  transparência)  do  artista  seria  negar  o  facto  de  a  obra  ser 
consequência  de  uma  intenção  comunicativa  do  Artista  que  de  entre  ziliões  de  opções  de 
imagens escolheu determinada, executou‐a conforme a  visualizou e estudou (cosa mentale), 
permitindo o trânsito de uma ideia, existente num local vago no interior do artista (12) para um 
suporte físico real, respeitando uma paleta de cores pelo Artista escolhida, e com qualidades 
que a distinguem como obra de arte. Admitir que o artista é “um homem sem qualidades” é 
negar a primordial importância e contributo do Artista na Obra e negar a inter‐relação entre a 
qualidade da Obra e a qualidade do Artista – “theoretical structures risked limiting the range 
and depth of individual creativity, or even collective creativity in the case of regional or period 
styles.” (LAVIN 1996:13) 

4. Receptores (pp. 184 ‐ 188) 

Primeiramente  os  autores  vão  rapidamente  definer  a  obra  de  arte  como  um  “work  of  the 
sign”. Coloca‐se então a questão: a obra de arte é de facto um trabalho DO signo, um sistema 
DE signo(S), uma relação ENTRE signos? Poderá ser que existem obras de arte em que o signo 
não  é  o  elemento  principal  e  elementar  da  mesma?  Admitindo  essa  possibilidade  qual  é  o 
contributo que a Semiótica poderá trazer na compreensão dessa obra? 

Reduzir a obra de arte a um signo e afirmar que os signos são repetíveis implica a dedução que 
a obra de arte é então também ela repetível. A um mesmo enunciado numa escola de Belas‐
Artes, por exemplo, de uma disciplina criativa (artística) os alunos oferecem as suas respostas 
com  os  seus  trabalhos;  à  partida  nenhum  trabalho  será  igual  ao  outro  contudo  todos 
responderam ao mesmo enunciado. Como texto que enquadra o trabalho mas também como 
sistema de signos aos quais são associados outros signos e construções mentais deste dada a 
sua ausência e que a partir de então actua como um referente desses novos trabalhos – logo 
signos. 

                                                            
(12) 
sobre o assunto, reler Bart Verschaffel,”Essais sur les Genres de La Peiture”, (La Lettre Volée, 2007), em 
particular o capítulo “Le Monde du Paysage”, pp. 73‐94 
Neste  constante  ciclo  de  referências  e  signos,  as  regras  e  códigos  teriam  que  ser  iguais  em 
todos  os  períodos,  desde  a  primeira  obra  de  arte  até  hoje,  para  as  compreendermos?  O 
carácter  independente  da  obra  de  arte,  a  sua  especificidade,  a  sua  verdade,  permanece 
transversal  á  recepção.  Obviamente  que  de  acordo  com  os  diferentes  receptores  no  tempo, 
espaço,  género,  a  recepção  da  obra  é  diferente  contudo  não  podemos  ignorar  o  facto  do 
carácter  único  de  algumas  obras  que  lhes  permite  atravessarem  o  tempo  intocadas  e 
inalteradas  na  sua  recepção.  Por  exemplo,  quem  não  se  identifica  ou  compreende  a 
mensagem  de  dor  da  perda  e  o  sofrimento  de  uma  mãe  que  a  Pietà  do  Vaticano  (Miguel 
Ângelo, 1499) transmite? Intemporal. Esta característica da obra não pode ser reduzida a um 
simples trabalho do signo ainda que os autores o procurem fazer.  

Na apresentação deste instrumento de trabalho – a recepção ou o Receptor – não fica claro de 
que forma “the work of art becomes what it is being transversed by flows of signification that 
cut  across  the  boundary  making  the  image  part  of  a  general  circulation  of  signs  and  codes 
within the social formation as a whole” (p. 193). 

Sem uma aplicação real (ou um exemplo) do conceito ou da teoria por detrás desta secção não 
fica claro de que forma este é um instrumento realizável ou aplicável na disciplina da História 
da Arte, a metodologia não se manifesta como apreensível ou aplicável. 

5. Overviews 

Semiótica  vista  como    trans‐,  intra‐  e  supra‐disciplinar  no  campo  da  História  da  Arte  e  como 
remate da leitura de Bal e Bryson parece não oferecer (para já) de forma metodológica e algo 
científica  a  acreditação  necessária  para  redefinir  a  disciplina,  parecendo  ainda  demasiado 
sustentada  pela  sua  capacidade  analítica  e  conclusiva  orientada  para  a  recepção  da  obra  de 
arte. Ainda a lidar com questões como o estatuto do objecto e a aplicabilidade dos conceitos 
esquiçados  para  objectos  de  estatuto  diferente  –  demonstra  ainda  alguma  fragilidade  na 
aplicabilidade  de  uma  disiciplina  cujo  desenvolvimento  surge  relacionado  com  o  estudo  da 
linguagem (Saussure) ou da lógica (Peirce) falhando ainda nas relações a estabelecer no campo 
da arte e da obra de arte visual.  

De  modo  geral,  o  enquadramento  histórico  das  origens  da  disciplina  (Semiótica)  é  sintético 
demais  já  que  Preziosi  (1989)  define  na  sua  obra  em  vasto  capítulo  grande  parte  das 
influências  e  trabalhos  antecessores  e  conducentes  às  teoria  tanto  de  Peirce  como  de 
Saussure. 

É inegável que o contributo poderá ser enorme e substancialmente relevante mas não poderá 
ser  de  ânimo  leve  que  poderemos  considerar  a  Semiótica  como  uma  nova  via  operacional  e 
exclusiva  da  disciplina  sendo  que  tanto  quanto  é  possível  concluir,  ainda  se  está  a  adaptar  à 
realidade da Arte – seja na impossibilidade de um sistema de signos infinito culminando num 
signo‐momento que raporta a um hábito (ECO 1972); seja na busca de uma realidade, de uma 
verdade da obra de arte [pictórica] única (DAMISCH 1974); seja na definição dos instrumentos 
de  trabalho  da  disciplina  em  relação  com  a  Semiótica,  um  esforça  adaptativo  a  realizar  para 
transitar a(s) teoria(s) do signo e os códigos para o medium que é a Arte (13), para o objecto que 
é  a  Obra  de  Arte  e  em  relação  (talvez  promíscua)  entre  o  executor  da  obra  ou  Artista,  e  o 
receptor da mesma – seja o Encomendador ou o Público. 

 “(...)  as  a  discipline,  art  history  has  traditionally  encompassed  both  perspectives,  two 
antithetical notions of signification and representation” (PREZIOSI 1989:107) 

                                                            
(13)
 neste campo gostariamos de destacar a obra de Donald Preziosi,  “The Semiotics of the Built Environment. An 
introduction to Architectonic Analysis” (Indiana University Press, 1979) como um exemplo desse esforço de 
adaptação da Semiótica à realidade da disciplina  
Bibliografia 

BAL, Mieke, BRYSON, Norman, “Semiotics and Art History”, The Art Bulletin, vol. 73, n.º 2 Junho 
1991: pp. 174‐208 

BAL,  Mieke,  BOIS,  Yve‐Alan,  LAVIN,  Irving,  POLLOCK,  Griselda,  WOOD,  Christopher  S.,  “Art 
History and Its Theories”, The Art Bulletin, vol. 78, n.º 1 Março 1996: pp. 6‐25 

DAMISCH, Hubert, “Huit thèses pour (ou contre?) une semiologie de la peiture”, comunicação 
apresentada no I Congresso da Associação Internacional de Semiótica, Milão, 2‐6 Junho 1974 

DERRIDA, Jacques, “Signature Événement Contexte”, in, “Marges de la Philosophie”, Paris,


Les éditions de Minuit, 1972, pp. 363-393

ECO, Umberto, “Peirce’s Notion of Interpretant”, MLN, vol. 91, n.º 6, Dezembro 1976: pp.1457‐
1472
 
MARIN,  Louis,  “Puss‐in  Boots:  Power  of  Signs.  Signs  of  Power”,  Diacritics,  vol.  7,  n.º  2,  Verão 
1977: pp. 54‐63 

PREZIOSI,  Donald,  “Rethinking  Art  History:  Meditations  on  a  Coy  Science”,  New  Haven, 
Connecticut, 1989  

PREZIOSI,  Donald,  “The  question  of  art  history”,  Critical  Inquiry,  vol.  18,  n.º  2,  Inverno  1992, 
pp.363‐386 

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