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Homem e Mulher Ele Os Criou - ENS PDF
Homem e Mulher Ele Os Criou - ENS PDF
HOMEM E MULHER
ELE OS CRIOU
REFLEXÃO CRISTÃ
SOBRE A SEXUALIDADE
1
“A mão de Deus” Auguste Rodin (1840-1917)
Número de inventário S 988 - Mármore esculpido por Soudbinine em 1916 ou 1917 - 94 x 82,5 x 54,9 cm
Ao modelar esta obra audaciosa, Rodin rompe totalmente com toda a espécie de composição
tradicional e adopta uma forma que se dirige directamente à imaginação. A mão que amassa
poderosamente a matéria de onde surge o ser criado é a divindade que do nada faz emergir a
humanidade; é também a imagem simbólica do artista que inventa um mundo. Rodin possuía um
profundo conhecimento da arte da Idade Média e da Renascença.
Foi possível determinar que a Mão de Deus tem origem num estudo de mão utilizado para duas
personagens do grupo Os Burgueses de Calais, cujos gestos evocam o desespero e o adeus. É
um exemplo particularmente interessante da capacidade de Rodin de dar significados completa-
mente diferentes a obras constituídas de elementos comuns.
Extraído do sítio da Internet do Museu Rodin (http://musee-rodin.fr – 77, rue de Varenne – 75007 Paris – Tel.: 0144186110.
2
SUMÁRIO
Introdução .................................................................................................... 5
1. «Por isso um homem deixa seu pai e sua mãe»
(Gn 2, 24) – O encontro cria-nos .................................................................... 9
2. «E eles se tornam uma só carne»
(Gn 2, 24) – Do carnal ao espiritual ................................................................ 19
3. «Deus viu tudo o que tinha feito: e era muito bom»
(Gn 1, 3) – O acto sexual é bom ...................................................................... 29
«O teu desejo te impelirá ao teu marido e ele te dominará»
(Gn 3, 16) – Construir juntos uma sexualidade harmoniosa ........................... 41
5. «O que Deus uniu, o homem não deve separar»
(Mt 19, 6) – Juntos para sempre, a fidelidade ................................................. 51
6. «Cada um de nós prestará contas a Deus de si próprio»
(Rm 14, 12) – A consciência ............................................................................ 63
7. «Sede fecundos»
(Gn 1, 28) – Dar fruto, a fecundidade ............................................................. 73
8. «Glorificai a Deus no vosso corpo»
(1 Cor 6, 20) – O vosso corpo é templo do Espírito Santo .............................. 89
Bibliografia .................................................................................................. 101
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4
INTRODUÇÃO
5
delicadas e tão essenciais, a fim de ultrapassar a problemática do
permitido e do proibido.
Como escrevia o Padre Bernard Olivier, op, na conclusão do
estudo «Evangelizar a sexualidade» 1 realizado em 1991 e 1992
pelas Equipas de Nossa Senhora, impõe-se à Igreja uma das ta-
refas mais importantes: «formar cristãos adultos responsáveis,
capazes de decidir por si próprios no respeito pelos valores mo-
rais». Esta tarefa está no centro da pedagogia do Movimento
das Equipas de Nossa Senhora.
Este tema, a trabalhar em casal e em equipa durante 8 reu-
niões, pretende ser uma aplicação nesta área particular, rico e
sensível, que é o amor conjugal em todas as suas componentes,
particularmente na sua dimensão mais íntima, a sexualidade.
Tudo isto passa, evidentemente, pelo diálogo em casal, que po-
derá tomar a forma de um frutuoso «dever de se sentar».
O percurso proposto é o seguinte:
* Capítulo 1: o encontro cria-nos;
* Capítulo 2: a Palavra interpela-nos acerca da sexualidade;
* Capítulo 3: a beleza do acto sexual;
* Capítulo 4: as dificuldades da sexualidade;
* Capítulo 5: a fidelidade;
* Capítulo 6: a consciência;
* Capítulo 7: a fecundidade;z
* Capítulo 8: a santificação do nosso amor.
Em cada capítulo encontraremos:
- testemunhos;
- elementos de reflexão;
- questões a debater em casal e em equipa;
1
«Evangelizar a sexualidade»: Uma equipa internacional formada por mem-
bros das Equipas de Nossa Senhora reuniu e resumiu as respostas de 11 000
equipistas do mundo inteiro que tinham aceitado estudar este tema proposto pelo
Movimento na linha do Segundo Fôlego, lançado em Lourdes em 1988, e res-
ponder às perguntas formuladas; os equipistas exprimiram-se em verdade, tendo
sido garantido o anonimato das respostas.
6
- uma oração tirada do Cântico dos Cânticos 2 ou do Novo
Testamento;
- um ou vários textos de acompanhamento.
2
Cântico dos Cânticos, tradução do hebraico do Padre José Tolentino Men-
donça. Edições Cotovia Lda., Lisboa, 1997.
No fim do livro, é proposta uma bibliografia não exaustiva, mas cujos elementos poderão
esclarecer nos campos psicológico ou fisiológico ou ainda no que diz respeito à medicina.
7
8
«Por isso um homem deixa seu pai e sua mãe»
(Gn 2, 24)
CAPÍTULO 1
O encontro cria-nos
TESTEMUNHOS
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
1
Poeta metafísico inglês do século XVII.
9
não o individualismo em que cada um faz as suas escolhas sozinho e
por si mas a capacidade de responder pelos seus actos, antes de mais
perante si próprio, mas também perante os outros: a pessoa humana
não pode encontrar em si própria o sentido da vida; tem necessidade
de alimentar o seu desejo de viver, de ser reconhecida, acolhida e
aceite pelos outros. Estamos inseridos num tecido de relações que co-
meça logo no primeiro instante da nossa existência no seio materno.
Nunca estamos sós; mesmo uma pessoa solitária não pode viver sem
contacto com outrem, quanto mais não seja em sonhos, em recorda-
ções, por antecipação … Esse outro «que vem de algures», para nós
que somos cristãos, é o Absolutamente Outro, o próprio Deus.
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Assim, a atracção física não basta para prolongar indefinidamente
o encanto da primeira paixão amorosa, apesar do desejo dos que a
vivem de a fazer durar eternamente. A duração transforma o prazer
de estar apaixonado e, por vezes, corrói-o. Surgem as diferenças. Se a
reciprocidade dos impulsos amorosos é, à partida, fonte de descober-
ta e de enriquecimento, em breve corre o risco de se tornar causa de
desencanto, não só por causa da diferença anatómica dos nossos cor-
pos ou dos defeitos que se revelam mas porque o outro não vive ma-
nifestamente no mesmo planeta. Aqui e agora estamos bem juntos;
mas, ao aprofundarmos o conhecimento do outro, descobrimos os tra-
ços que nos separam, as diferenças e as divergências: o outro não vê
o mundo, os acontecimentos, o futuro e a felicidade com os mesmos
olhos.
As nossas sensibilidades são diferentes, não fomos educados da
mesma maneira. Adão desiludido poderia dizer: «Esta não é osso dos
meus ossos nem carne da minha carne». Irá ele ficar na sua decepção,
ou será que o amor o fará descobrir a capacidade de dar um passo em
frente? Esta é a questão crucial que se põe nesta primeira fase do
encontro amoroso. Estamos ainda longe da escolha responsável que
consiste em reconhecer o outro como estranho, em lhe dar o direito de
fazer as suas próprias escolhas, de ter a sua sensibilidade e os seus
gostos, de ter a sua própria percepção da realidade, de fazer as suas
opções no mundo em que vive.
11
sulta da impossibilidade de eliminar a diferença radical homem-mu-
lher (eu-tu). O desejo de fusão choca com o reconhecimento do ca-
rácter ilusório de uma harmonia total. Estamos prontos a dar na medi-
da em que somos recompensados. Assim que o fascínio dos sentidos
se atenua, já não resta senão a satisfação das necessidades vitais. O
que se procura não é a abertura, o dom a outrem, mas a segurança do
complemento ao que falta: aqui, agora e já. Apesar do sedutor atrac-
tivo da reciprocidade, o medo da perda das fronteiras individuais im-
pede a conivência profunda do casal.
A comunicação amorosa torna-se, então, deficiente: sentimos aquele
que toma lugar na nossa existência ao mesmo tempo como fonte de
prazer e como obstáculo à nossa segurança interior. Para que a rela-
ção progrida, é preciso que quem ama aceite que o ser amado seja
diferente de si próprio.
Por um lado, estou apaixonado e não posso voltar atrás e, por ou-
tro, ainda não estou preparado para ligar para sempre o meu destino
ao de outra pessoa, com medo de perder o que tinha pensado encon-
trar: a segurança e um espaço de liberdade.
12
vação da posse sem medo de perder o domínio sobre o outro. O meu
próximo é aquele que me ajuda a ser eu próprio. Com toda a liberda-
de, um conduz o outro à autonomia: cada um respeita a originalidade
do outro, os seus carismas e os seus privilégios, as suas fraquezas e as
suas carências.
O percurso dos apaixonados suscita a curiosidade de descobrir o
jardim secreto um do outro. Deixando-se cativar como a raposa do
Principezinho 2 , pode-se abandonar o receio de ser explorado; adqui-
re-se a audácia de enfrentar os riscos do imprevisível e do desconhe-
cido. Pode-se renunciar à protecção paterna, deixar a casa dos pais
para ir viver na sua própria geração e alegrar-se com a alteridade do
outro: a sua diferença é já não uma ameaça mas uma fonte de curiosi-
dade e de ternura. Consente-se em que o outro tome a liberdade de
falar na primeira pessoa do singular. Assim, pela sua intervenção e na
ternura, cada um leva o outro a descobrir a sua identidade real, a sua
masculinidade ou a sua feminidade, e a afirmar-se na franqueza dessa
intimidade. «O eu desperta para a graça do tu», diz Marie Balmary 3 .
Como o homem e a mulher se tornaram sujeitos autónomos, «co-
mendo cada um, sem falsos pudores, o seu naco de pão e bebendo da
sua taça» 4 , assumindo e respeitando inteiramente as diferenças, a sua
aliança já não depende das contingências do desejo, de princípios mo-
rais, sofridos ou não integrados, das opções de uma sociedade tec-
nológica plural que tem a forte marca do imperativo de não dar senão
na medida em que se recebe em troca.
2
Antoine de Saint-Exupéry, O Principezinho.
3
Marie Balmary: psicanalista cristã.
4
Khalil Gibran: escritor libanês (1883-1931).
5
Jacques de Bourbon-Busset, membro da Academia Francesa.
13
O amor vivido desta forma permite que o eu venha ao de cima.
Eu posso viver e deixar-te viver, posso fruir os sentidos, mas deixo-
te espaço para desabrochares; tu para mim és precioso(a), porque
te amo. Só nos tornamos realmente nós próprios graças ao amor do
outro.
Nós, cristãos, que referências encontramos na fé para explicar este
processo que permite o crescimento na comunhão de amor de uma
relação de duas pessoas completamente diferentes?
PERGUNTAS
* Apercebo-me todos os dias (talvez várias vezes por dia) que o meu
cônjuge é diferente de mim, ora príncipe(princesa), ora sapo …
Quais são as cadeias que nos impedem de nos voltarmos para o
futuro numa atitude de confiança total? Como conciliamos as
exigências de uma profunda harmonia amorosa com um grande
respeito pelo outro? Como reagimos ao facto de a vida a dois nos
suscitar renúncias, por vezes difíceis, e em que é que o nosso
projecto comum pode ser fonte de plenitude?
14
ORAÇÃO
No dia seguinte, João achava-se lá de novo, com dois dos seus dis-
cípulos. Ao ver Jesus que passava, disse: «Eis o cordeiro de Deus!».
Os dois discípulos ouviram-no falar e seguiram Jesus.
Jesus voltou-Se e, vendo que eles O seguiam, disse-lhes: «Que
procurais?». Disseram-Lhe: «Rabi (que, traduzido, significa Mestre),
onde moras?».
Disse-lhes: «Vinde e vede». Então eles foram e viram onde mora-
va, e permaneceram com Ele aquele dia. Era a hora décima, aproxi-
madamente.
André, o irmão de Simão Pedro, era um dos que ouviram as pala-
vras de João e seguiram Jesus. Encontrou primeiramente Simão e
disse-lhe: «Encontrámos o Messias» (que quer dizer Cristo). E con-
duziu-o a Jesus. Fixando-o, disse-lhe Jesus: «Tu és Simão, o filho de
João; chamar-te-ás Cefas» (que significa Pedra).
No dia seguinte, Jesus resolveu partir para a Galileia e encontrou
Filipe. Jesus disse-lhe: «Segue-Me».
Filipe era de Betsaida, a cidade de André e de Pedro. Filipe encon-
trou Natanael e disse-lhe: «Encontrámos Aquele de quem escreveram
Moisés, na Lei, e os Profetas: Jesus, filho de José, de Nazaré».
Perguntou-lhe Natanael: «De Nazaré pode sair algo de bom?».
Filipe disse-lhe: «Vem e vê!».
Jesus viu Natanael vindo até Ele e disse a seu respeito: «Eis um
verdadeiro israelita, em quem não há fraude».
Natanael disse-Lhe: «De onde me conheces?». Respondeu-lhe Je-
sus: «Antes que Filipe te chamasse, Eu vi-te quando estavas sob a
figueira».
Então Natanael exclamou: «Rabi, Tu és o Filho de Deus, Tu és o
Rei de Israel».
Jesus respondeu-lhe: «Crês, só porque te disse: “Vi-te sob a figuei-
ra”? Verás coisas maiores do que essas».
E disse-lhe: «Em verdade, em verdade, vos digo: Vereis o Céu aberto
e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem».
15
TEXTOS DE ACOMPANHAMENTO
16
com a mulher e da mulher para com o homem. Ser Pessoa à imagem
e semelhança de Deus comporta, pois, também um existir em relação,
em referência ao outro «eu». Isto preludia a definitiva auto-revelação
de Deus uno e trino: unidade viva na comunhão do Pai, do Filho e do
Espírito Santo.
No início da Bíblia, não se ouve ainda dizer isto directamente. Todo
o Antigo Testamento é sobretudo a revelação da verdade sobre a uni-
cidade e a unidade de Deus. Nesta verdade fundamental sobre Deus,
o Novo Testamento introduz a revelação do mistério imperscrutável
da vida íntima de Deus. Deus, que Se dá a conhecer aos homens por
meio de Cristo, é unidade na Trindade: é unidade na comunhão. Des-
se modo lança-se uma nova luz também sobre a semelhança e ima-
gem de Deus no homem, de que fala o Livro do Génesis. O facto de o
homem, criado como homem e mulher, ser imagem de Deus não sig-
nifica apenas que cada um deles, individualmente, é semelhante a
Deus, enquanto ser racional e livre; significa também que o homem e
a mulher, criados como «unidade de dois» na sua comum humanida-
de, são chamados a viver uma comunhão de amor e, desse modo, a
reflectir no mundo a comunhão de amor que é própria de Deus, pela
qual as três Pessoas se amam no íntimo mistério da única vida divina.
O Pai, o Filho e o Espírito Santo, um só Deus pela unidade da divin-
dade, existem como pessoas pelas imperscrutáveis relações divinas.
Somente assim se torna compreensível a verdade que Deus em Si
mesmo é amor (cf. 1 Jo 4, 16).
A imagem e semelhança de Deus no homem criado como homem
e mulher (pela analogia que se pode presumir entre o Criador e a
criatura) exprime, portanto, também a «unidade de dois» na sua co-
mum humanidade. Esta «unidade de dois», que é sinal da comunhão
interpessoal, indica que na criação do homem foi inscrita também
uma certa semelhança com a comunhão divina («communio»). Esta
semelhança foi inscrita como qualidade do ser pessoal dos dois, do
homem e da mulher, e, conjuntamente, como uma chamada e um
empenho. Na imagem e semelhança de Deus, que o género humano
traz consigo desde o «princípio», radica o fundamento de todo o
«ethos» humano: o Antigo e o Novo Testamento irão desenvolver esse
«ethos», cujo vértice é o mandamento do amor.
Na «unidade de dois», o homem e a mulher são chamados, desde o
início, não só a existir «um ao lado do outro» ou «juntos», mas tam-
bém a existir reciprocamente «um para outro».
João Paulo II
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Um encontro
Jean Vanier
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«E eles se tornam uma só carne»
(Gn 2, 24)
CAPÍTULO 2
Do carnal ao espiritual
TESTEMUNHOS
19
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
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Assim, para lhe dar consistência e duração, o amor de que aqui se
trata não se baseará no prazer de estarem juntos, na emoção, na infi-
nita repetição do «amo-te, amo-te», mas na submissão à vontade do
outro, na vontade de fazer a sua vontade. Amar será despojar-se da
sua própria vontade para fazer a vontade do outro, despojar-se do seu
desejo para se pôr ao serviço do desejo e da expectativa do outro. E,
como esta concordância das vontades se quebra muitas vezes, o amor
inventa o perdão. É o perdão que dá duração ao amor. Não se trata
necessariamente da reconciliação espectacular depois de rupturas es-
pectaculares, mas do facto de voltar a dar-se de novo e ainda mais do
que antes. O perdão é «re-dom» e «sobre-dom». Face ao que ameaça,
ao que afasta, ao que fere, ao que torna insípido ou arrefece, o perdão
aproxima, trata as feridas, aquece. É a oferta de um novo começo, de
uma nova primavera, mas de uma primavera que é preciso reanimar
continuamente, que não dura senão porque recomeça. (…).
É a partir da realidade deste casal da Aliança que os profetas vão
levar o povo judeu a descobrir o que Deus espera do casamento de um
homem e de uma mulher. A partir deste momento, as duas realidades
estão unidas. É com Deus que o homem vai aprender o que é o casamen-
to. Muito antes de a palavra ter sido inventada, os profetas descobriram
como o casal humano era querido por Deus como sacramento, sinal
visível do seu próprio casal, e como cada casal devia realmente sê-lo
cada vez mais. É que não basta formar um casal para ser semelhante a
Deus; é preciso que esse casal viva à sua imagem: num amor fiel que
se quer para sempre e que, por isso, está sempre pronto a perdoar.
21
não é exactamente o «Façamos o homem à nossa imagem, como nos-
sa semelhança» (Gn 1, 26), porque a semelhança poderia limitar-se a
um domínio sobre a criação semelhante ao de Deus. O homem só
teria que ser criador e senhor ao jeito de Deus. O que destoa é o objec-
to da semelhança: «Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de
Deus Ele o criou, homem e mulher Ele os criou» (Gn 1, 27). A seme-
lhança já não está no domínio da criação, mas na relação de dois seres
diferentes, dos quais nenhum por si é suficiente para assegurar a se-
melhança com Deus. É em conjunto que se assemelham a Deus. O
casal homem-mulher é não já, como nos profetas, imagem da Aliança
de Deus com Israel mas imagem do próprio Ser de Deus. O texto
poderia mesmo deixar entender que o Deus único não é um Deus
solitário, visto que são precisos dois para garantir a semelhança.
Todo o segundo relato vai desenrolar-se na relação homem-mu-
lher. É o centro da história. O homem já não é um elemento de um
conjunto que começa antes dele, a fase de uma história que o prece-
deu e que ele tem o encargo de prosseguir no mesmo sentido. É o
começo. Nada existe antes dele; só quando ele é criado é que apare-
cem a natureza e os animais. Mas nada pode preencher a sua solidão.
O seu domínio torna-o ainda mais solitário. Os seres que domina não
podem ser seus parceiros justamente porque ele é o seu senhor. A
relação só será possível quando o outro for outro como ele próprio,
«osso dos seus ossos e carne da sua carne», alguém da sua raça, da
mesma condição, para não dizer da mesma natureza. Então é possível
a relação, o dom ao outro: «Um homem deixa seu pai e sua mãe, une-
-se à sua mulher, e eles se tornam uma só carne» (Gn 2, 24).
O casamento marca um início: largam-se as amarras. É necessária
uma ruptura para que se possa fazer a unidade. Há separação para
haver união. «E eles se tornam uma só carne». Se é permitido ver aqui
uma alusão à união sexual do casal, o texto ainda diz mais: serão um
único ser. Indica a unidade das pessoas, a comunhão profunda entre
elas. Agora o horizonte é a unidade a fazer para que os dois sejam um
só ser. Há todo um caminho a percorrer para que cada um acabe por
considerar o outro como sua própria carne, como alguém inseparável
de si próprio, da sua história, dos seus projectos. Trata-se não de fu-
são mas de comunhão. Continuam a ser dois, ainda que sejam uma só
carne. Comunidade do casal e comunidade dos corpos andam a par. A
comunidade dos corpos é sacramento da comunidade dos seres, sig-
nifica-a, torna-a palpável e realiza-a.
À imagem da Aliança descrita pelos profetas, trata-se ainda aqui
da aliança de um casal que se constitui, longe da família de onde
22
provém e independentemente da família a que dará origem. É o face a
face de um casal nu, que existe por si mesmo.
Todos os elementos estão devidamente apresentados. O Novo Tes-
tamento só terá que os retomar e deles deduzir todas as consequências.
23
Amar como Cristo amou a Igreja
24
pação deve ser a santificação da sua mulher, a sua completa seme-
lhança ao Deus santo. Trata-se de deixar de se centrar em si para se
centrar nela, de se entregar a ela como Cristo Se entregou. Amai-a
como vos amais a vós mesmos, porque sois uma só carne. Paulo dá
todo o seu peso a esta expressão: uma vez que os dois são uma só
carne, amar a sua mulher é amar-se a si mesmo, é querer o bem do
outro como o seu próprio bem, ter afeição ao outro como se tem a si
próprio. O que é bom para o outro é bom para mim; amar o outro faz
parte do amor por si próprio; é a melhor maneira de se amar a si
próprio. (…).
25
Hesitei muito antes de dizer isto, talvez com receio de fazer S. Pau-
lo dizer demasiado, mas talvez também com receio de escandalizar:
como é que uma realidade tão pouco espiritual, dirão alguns, pode ser
comparada com o mistério do Calvário e da Eucaristia? Mas não será
esta reacção desprezo inconsciente pelo corpo e pela sexualidade, in-
capacidade de acreditar que a união sexual é da ordem do espiritual?
S. Paulo já disse isto nas entrelinhas em 1 Cor 6, 15-17. Depois, des-
cobri que grandes teólogos do passado também tinham pensado o
mesmo. Hincmar de Reims, em pleno século IX, escreveu referindo-
-se a Santo Agostinho e a S. Leão: «As núpcias não têm em si o mis-
tério de Cristo e da Igreja se, como diz Santo Agostinho, não forem
vividas conjugalmente, ou seja, se não houver união sexual. S. Leão
demonstra que assim é dizendo: “A sociedade conjugal foi estabelecida
logo no princípio do mundo para que na conjunção dos sexos fosse
inscrito o mistério de Cristo e da Igreja”» (Carta 22, citada por Mathon,
Le mariage des Chrétiens, T. 1, p. 152). Poderíamos encontrar em
João Paulo II reflexões semelhantes.
Compreende-se, assim, o profundo respeito da Igreja pela união de
amor de um homem e de uma mulher. Se a união dos corpos tem por
vocação significar e actualizar a união de Cristo e da Igreja, já não
pode ser um gesto banal, o contacto rápido de epidermes à procura de
um prazer efémero, ou um gesto de afeição banal entre amigos. É,
pelo contrário, sinal do dom total ao outro. O corpo diz a quem per-
tence o coração: onde está o teu corpo, aí está o teu coração. Só da-
mos o nosso corpo àquele ou àquela com quem tivermos feito aliança.
Dar o nosso corpo ao outro é o dom supremo. O corpo é aquilo que
damos em último lugar, quando tivermos ido até ao extremo do amor
e tivermos decidido dar-nos para sempre. Como fez Cristo: «tendo le-
vado o seu amor por eles até ao extremo … disse-lhes … Este é o meu
corpo que será entregue … pela nova e eterna aliança».
Para a Igreja, este dom só pode vir em último lugar, quando o casal
tiver decidido que os dois hão-de percorrer juntos até ao fim o cami-
nho que juntos iniciaram. É sinal de um dom total, conclusão de uma
Aliança para sempre; se não, é prematuro, em todas as acepções do
termo (tem lugar demasiado cedo e é imaturo) ou, ainda pior, menti-
ra. Dou o meu corpo mas não me dou: quando muito, empresto-me.
Este dom não compromete em nada. O dom do corpo é, pois, essen-
cial para que o casamento seja verdadeiramente sacramento da Alian-
ça de Cristo e da Igreja. (…). Padre Charles Bonnet 1
1
Superior provincial dos Padres de Saint-Sulpice, Superior do Seminário de Issy-les-
Molineaux, professor de teologia moral.
26
PERGUNTAS
ORAÇÃO
27
Havia ali seis talhas de pedra para a purificação dos judeus, cada
uma contendo de duas a três medidas. Jesus disse-lhes: «Enchei as
talhas de água». Eles encheram-nas até à borda. Então disse-lhes:
«Tirai agora e levai ao mestre-sala».
Eles levaram. Quando o mestre-sala provou a água transformada
em vinho — ele não sabia de onde vinha, mas sabiam os serventes que
haviam retirado a água — chamou o noivo e disse-lhe: «Todo o ho-
mem serve primeiro o vinho bom e, quando os convidados já estão
embriagados, serve o inferior. Tu guardaste o vinho bom até agora!».
Esse princípio dos sinais, fê-lo Jesus em Caná da Galileia e mani-
festou a sua glória e os seus discípulos creram n’Ele.
Depois disso, desceram a Cafarnaúm, Ele, sua mãe, seus irmãos e
seus discípulos, e ali ficaram alguns dias.
Outro texto
28
«Deus viu tudo o que tinha feito: E era muito bom»
(Gn 1, 3)
CAPÍTULO 3
O acto sexual é bom
TESTEMUNHOS
29
quela plenitude. A plenitude sexual abre-nos à contemplação,
ténue antevisão do que havemos de viver sem fim na glória de
Deus».
«Nesse momento em que me realizo plenamente como mu-
lher, sinto uma imensa necessidade de agradecer a Deus tanto
amor e tanta satisfação. Então, sinto o seu amor, a sua bondade.
Ao mesmo tempo, penso em tantos casais que têm graves pro-
blemas de relação, que não encontram aí a sua complementa-
ridade. Penso que essa hora bem vivida nos dá força para todo
o dia porque nos sentimos unidos e receptivos. É por isso que
dou graças a Deus».
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
«Deus viu tudo o que tinha feito: e era muito bom» (Gn 1, 31).
Deus maravilha-Se com toda a criação, é claro, inclusive com a cria-
ção do homem e da mulher, com o seu destino a serem fecundos, o
que supõe a nossa sexualidade. Maravilhemo-nos nós também com a
bondade do acto sexual.
No primeiro capítulo, dirigimos o olhar para a primeira aborda-
gem, o encontro, que nos surpreende, nos deslumbra, nos muda e,
mesmo sem darmos por isso, nos «cria». Deus tem alguma coisa a
dizer a respeito da aventura humana e espiritual desse casal que se vai
criar para sempre. O acto criador do casal (sem o qual o casamento
não existe) será o encontro carnal, etapa fascinante, verdadeiramente
«vertiginosa», de que tratamos neste capítulo.
É normal que todas as formas de reflexão, de representação, de
organização, se tenham apoderado deste acto «incontornável»: for-
mas literárias (poesia, romance, teatro …), formas artísticas (escultu-
ra, pintura …), formas institucionais (Igrejas, administrações …), etc.
Cada um de nós pode ter sido tocado por esta ou aquela forma de
representação, por este ou aquele livro; como nos orientarmos no meio
desta abundância?
Para avançarmos na nossa reflexão, apoiamo-nos em dois docu-
mentos: o primeiro é uma recolha do Padre Joseph Wresinski, já cita-
do; o segundo é um livro de Xavier Lacroix, O corpo e o espírito.
30
Em contacto com os mais desfavorecidos, o Padre Joseph Wresinski
realça a grandeza da sexualidade, que se mantém quaisquer que se-
jam as condições de vida que a possam desfigurar. Reteremos aqui
apenas algumas da suas reflexões:
1
Xavier Lacroix: leigo casado, membro das Equipas de Nossa Senhora, Decano da Facul-
dade de Teologia de Lyon.
31
suspeição. Paralelamente a esta atitude, o autor desenvolve os aspec-
tos mais sensíveis da sexualidade:
32
fundidade. Por isso é, ao mesmo tempo, tentativa de apropria-
ção ou, pelo menos, de domínio, e experiência de que nem o
outro nem o seu corpo estão em meu poder ou na minha posse.
Experiência de despojamento na maior das proximidades. O
corpo do outro, na sua carne, está ali, debaixo da minha mão;
no entanto, ele continua a ser outro, portador de uma vida que
sinto vibrar nele mas que se mantém para sempre fora do meu
poder.
É por isso que a carícia é desejo, ou antes, é a linguagem
própria do desejo. É uma busca que não sabe o que procura,
sem objectivo preciso, sem projecto nem plano. Passeio livre
sobre o corpo-paisagem, com os seus vales, as suas planícies,
as suas colinas. Mas esta paisagem prolonga um rosto, é habi-
tada por alguém que eu não vejo, demasiado perto para ser
visto, mas que tento atingir através da sua própria face escon-
dida, da sua carne, tão próxima, tão tenra e tão consistente, ao
mesmo tempo penetrável e impenetrável. É a acção do desejo
porque é também expectativa (…).
Carícia (caresse) não rima só com ternura (tendresse), mas
também com promessa (promesse). Também se pode perceber a
carícia como domínio dos dois sexos um pelo outro: do homem
pela mulher e da mulher pelo homem».
33
mas de estar de encontro ao outro, “bem contra”, para resisti-
rem juntos dos tormentos da vida».
34
jo muito profundo em cada um, o de ser aconchegado. Esse
desejo mergulha certamente em experiências infantis muito an-
tigas, mas não se pode — como se faz muitas vezes — reduzi-lo
a isso. De facto, o coito não é só a reiteração da infância; como
tal, irredutivelmente, é susceptível de tomar um significado novo.
Voltado para um/a companheiro/a que não a mãe, não proveni-
ente apenas do passado mas, sobretudo, orientado para o futu-
ro, toma um significado de aliança.
É verdade que aqui mal se trata de expressão. O sentido é
subvertido pela sensação. Os movimentos da voluptuosidade
subvertem toda a intenção. Sem desdizer as análises anterio-
res, retenhamos ainda alguns aspectos da diferença entre as
formas masculina e feminina de viver o prazer. Na sua vertente
masculina, este seria vivido sobretudo como descarga, próximo
da violência, mais localizado, mais breve. Na sua vertente fe-
minina, seria vivido sobretudo como irradiação, menos violen-
to, menos localizado, mais lento a vir e a cessar».
35
PERGUNTAS
Para o diálogo em casal
ORAÇÃO
Texto para a oração da equipa (Ef 5, 25-33):
2
Parque dos Príncipes, Paris, 1980.
36
TEXTO DE ACOMPANHAMENTO
És jardim fechado,
minha irmã, minha esposa
um jardim fechado uma fonte selada.
As tuas plantas um bosque de romãzeiras
com frutos deliciosos
com cipros, nardos e açafrão
cálamo e canela
e toda a sorte de árvores de incenso
mirra e aloés
e os bálsamos escolhidos.
A fonte do jardim é cisterna de água viva
que jorra desde o Líbano.
37
Excertos do discurso de Paulo VI às Equipas de Nossa Senhora,
Roma, 4 de Maio de 1970
3
A dimensão esponsal do corpo
3
Discurso de João Paulo II (16 de Janeiro de 1980).
38
no. Esse significado indica, por um lado, uma capacidade particular
de exprimir o amor em que o ser humano se torna dom; por outro
lado, esse ser humano possui a capacidade e a profunda disponibili-
dade para “a afirmação da pessoa”, isto é, literalmente, a capacida-
de de viver o facto de o outro — a mulher para o homem e o homem
para a mulher — ser, através do corpo, alguém que é querido “por si
mesmo” pelo Criador, ou seja, único e singular, alguém que é escolhi-
do pelo Amor eterno».
João Paulo II
4
O abraço
4
Jacques de Bourbon-Busset, Lettre à Laurence.
39
conveniente nesses momentos que transcendem a duração e cintilam
como estrelas na noite do quotidiano. Sabias, pelas tuas entoações e
pelos teus gestos, aliar a ordem e a desordem, o apruno e a paixão, a
altivez e o abandono.
O olhar da amante que sucumbe à vertigem é o de uma morta res-
suscitada, onde a esperança triunfa sobre o medo. No palco do teatro
íntimo, a peça que se representa chama-se morte e ressurreição. Nes-
ses minutos em que a união dos corpos é a união das almas, o corpo
torna-se alma, e a alma torna-se corpo. A exaltação leva ao desfale-
cimento, e o desfalecimento é anúncio de uma nova exaltação. Esta
alternância de tempos fortes e tempos fracos é o próprio mistério do
espírito que conhece, como o coração, a sístole e a diástole. Os movi-
mentos do desejo são os movimentos do espírito. O espírito alimenta-
-se da glória do abraço (…).
Foi sobre esse absoluto do abraço que, dia após dia, construímos a
nossa aventura de união sagrada. Vimos sempre no acto de amor o
sinal de que era possível estabelecer uma relação absoluta com o ab-
soluto. Os ditos grosseiros e o deboche provam negativamente a serie-
dade do abraço. Prestam-lhe uma homenagem indirecta ao procura-
rem reduzir a gestos menospresadores o que o ser humano põe em
jogo.
Passei anos a tentar estabelecer uma ponte entre mística e sexuali-
dade. Muita gente se escandalizou ou sorriu. Por que é que o acto de
amor do homem e da mulher provoca tanto medo, quando em princí-
pio todos os tabus são violentamente rejeitados? A única explicação é
que todos sabem que uma vida sexual feliz é a realização suprema. A
infelicidade sexual de muita gente é a razão desse silêncio amedron-
tado. O abraço abre ao absoluto. O abraço é o infinito abarcado. A
glória do abraço é respirar universo.
O abraço não procura derrubar as fronteiras que separam os se-
res. O abraço é a aliança de dois corpos que se servem da sua diferen-
ça para irem além do convencional, do banal, do medíocre. A repeti-
ção não exclui o excesso, dá-lhe uma estrutura. Durante quarenta
anos, esse excesso estruturado foi a linha orientadora da nossa vida.
Os corpos têm pena das almas e querem ajudá-las a unirem-se a
eles. Há que lhes dar liberdade. O abraço é a mais elevada linguagem
do corpo e da alma».
40
«O teu desejo te impelirá ao teu marido e ele te dominará»
(Gn 3, 16)
CAPÍTULO 4
Construir juntos uma sexualidade harmoniosa
TESTEMUNHOS
41
corpo te procura com demasiada exigência (…). Se tu soubes-
ses, Mulher, que, quando tenho fome de ti, a minha fome ultra-
passa infinitamente o teu corpo: porque para mim tu significas
a inexprimível riqueza do nosso amor total, corpo e alma jun-
tos, obra prima do Criador. (…) A mulher, porém, nem sempre
pode responder, mas isso não é sinal de desamor. “Porquê hoje?
Por que não ontem ou amanhã?”. Não me perguntes, não pode-
ria responder-te. Sei desde o primeiro segundo, desde o primei-
ro instante em que te aproximaste de mim, que não saberia res-
ponder-te hoje. Fica a saber o reverso da medalha: aquela que
vibra como uma corda de uma viola não pode vibrar sempre.
Respeita os seus cansaços, as suas inapetências, essa sede de
paz que se apodera do seu corpo, menos ávido do que o teu.
Deixa-a tranquila».
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
1
Xavier Lacroix, O corpo e o espírito, col. Vida Cristã, p. 33.
2
Filósofa, autora de O pudor, o desejo e o amor humano (cf. Revista Alliance, n.º 96).
42
corpo visto como um objecto, quando ela própria o considera o
“seu” corpo. Ela pode mesmo revoltar-se interiormente contra o
outro e sentir um ódio profundo, como diz Max Scheler, por aquele
que a obriga continuamente à prostituição do seu ser mais profun-
do, e, o que é mais, sob a aparência de um pretenso dever conjugal.
À violência que se exerce sobre ela, tomando-a como objecto, a
mulher pode responder com outra forma de violência, quando pro-
cura vingar-se do homem através da atitude de passividade, ou
com um falso espírito de abnegação que também a faz sofrer. As-
sim, a avidez de um leva ao ressentimento do outro — da mulher
contra o egoísmo e o desejo de domínio do homem, do homem con-
tra o egoísmo e a passividade da mulher. Enquanto o desejo, como
desejo sexual, é profundamente desejo de unidade e apelo ao outro,
a avidez — a “cupidez” do corpo do outro — leva os seres apenas ao
prazer do corpo e ao domínio sobre o outro, e fecha-os na solidão».
Socorramo-nos agora de alguns comentários do Padre d’Heilly, ex-
traídos do seu livro Aimer en actes et en vérité 3:
«A pergunta que se deve fazer é esta: Os nossos gestos carnais
unem-nos? Se há momento em que um homem e uma mulher se
podem sentir a milhas um do outro, esse momento é uma vida car-
nal falhada. Se há momento em que um homem se pode sentir numa
solidão traumatizante, esse momento é uma união carnal em que a
mulher não reage. Deve, pois, ter-se presente esta afirmação: “Os
nossos gestos carnais não nos unem automaticamente”».
E, já que amar é essencialmente perceber o comportamento do outro,
vejamos os três aspectos importantes do comportamento carnal: o com-
portamento do marido, o comportamento da mulher e os problemas
comuns:
* o comportamento do marido: o marido deve ter a preocupação de
preparar o coração da mulher, de preparar o corpo da mulher,
para chegarem à união profunda, de estar atento a procurar o
sincronismo entre os prazeres de cada um.
* O comportamento da mulher deve ser ditado pela confiança em
si própria e no marido, pela simplicidade (saber participar, dese-
jar, exprimir-se …), pela generosidade (ser capaz de dar o pri-
meiro passo, de se oferecer, de não ser passiva, de não fazer do
marido um mendigo).
3
Publicado nas Éditions du St. Paul/CLERC.
43
Com o facto de as escolas serem mistas e de as mulheres acederem
cada vez mais aos mesmos lugares que os homens na vida profissio-
nal, essas diferenças ter-se-ão atenuado? Não deixa de ser verdade
que continua a ser necessário adaptar-se ao comportamento do outro
e ter a preocupação de atingir uma certa simultaneidade do prazer.
Para ambos, «trata-se de exprimir os desejos e as aspirações de cada
um, bem como as suas reticências e as suas revulsões. Ousar dizer
que se existe como pessoa original e autónoma e recusar ser simples
objecto sexual para os fantasmas do outro não será criar as condi-
ções essenciais a um verdadeiro encontro conjugal?» 4.
PERGUNTAS
4
Padre Michel Legrain, Revista Alliance, n.º 96.
5
Cf. testemunhos do capítulo 3.
44
* Emprestei o meu corpo ao meu cônjuge ou dei-lho realmente?
Quais são os sinais que permitem estabelecer a diferença (pensar
noutra coisa, fantasmas, etc ...)?
* Não acolher, não suscitar o desejo do outro, não será exercer vio-
lência sobre ele? Como gerir os desejos sexuais de um para os
conciliar com os do outro?
45
ORAÇÃO
46
TEXTOS DE ACOMPANHAMENTO
47
Excertos da exortação apostólica Familiaris Consortio (n.º 11)
Entregarem-se um ao outro
Para isso, é preciso, antes de mais, que a união sexual seja sempre
um acto de amor. Isto não é evidente. “Fazer amor” pode muito bem
ser exercer violência. Pode ser vontade de possuir, de dominar ou
muito simplesmente uma procura egoísta de prazer. Esquece-se mui-
tas vezes esta frase da Humanae Vitae: “um acto conjugal imposto ao
próprio cônjuge, sem consideração pelas suas condições e pelos seus
desejos legítimos, não é um verdadeiro acto de amor e nega, por isso
mesmo, uma exigência da recta ordem moral, nas relações entre os
esposos. Assim (…) um acto de amor recíproco, que prejudique a dis-
ponibilidade para transmitir a vida (…) está em contradição com o
desígnio constitutivo do casamento …” (n.º 13). Muitas questões se
levantam em torno do segundo membro desta frase; levantar-se-ão
outras tantas em torno do primeiro? Ora, tão importante é um como o
outro. É preciso que nos interroguemos sempre sobre como a nossa
união é vivida. Amar é entregar-se ao outro, é pôr-se ao serviço do
desejo do outro, e até do seu prazer. Amar não é impor-lhe o que será
por ele vivido como degradante, humilhante, mas também aceitar por
amor ir mais longe do que espontaneamente se teria aceite ou procu-
rado. Há toda uma linguagem de amor a encontrar e a valorizar. Deve-
-se sempre procurar juntos como fazer desse acto cada vez mais um
48
acto de amor, de ternura, de confiança, de aceitação do outro, de dom
ao outro.
Aliás, a experiência ensina bem depressa que esse acto será inca-
paz de exprimir por si só o amor, se não se inscrever em toda uma vida
de amor, de dom, de amizade partilhada. Se contradiz o que se passa
no quotidiano da vida do casal, corre o risco de ser mentira ou violên-
cia, e não enganará por muito tempo, pois o corpo não poderá dissi-
mular indefinidamente o que vai no coração.
Padre Charles Bonnet
O corpo traído
6
Jack Dominian, Conferência proferida no Encontro Internacional das Equipas de Nossa
Senhora, em Santiago de Compostela, Setembro de 2000.
49
divina na sexualidade. Isto leva a ter dela uma visão mais positiva e a
situar-se em relação a ela de uma forma mais consciente e conveniente.
Quem gasta todas as suas energias a reprimi-la e a rejeitá-la faz
mal a si mesmo. Faz, muitas vezes, a experiência de não conseguir
reprimi-la completamente. A sexualidade ataca-o, então, em momen-
tos de depressão ou de tensão e exprime-se sob a forma de auto-ero-
tismo ou, por vezes, de comportamentos incontrolados em relação a
menores. Estas pessoas causam a si próprias sofrimentos ainda mai-
ores. Enterram-se continuamente numa vida sexual que querem repri-
mir. Pelo contrário, quem assume pacificamente a sua sexualidade
encontra nela o gosto de viver, experimenta alegria na sua vida cor-
poral, é capaz, em todos os sentidos do termo, de gozar da natureza,
de experimentar Deus em si, e conhece uma espiritualidade viva e
criadora.
É claro que mesmo este caminho está semeado de obstáculos. A se-
xualidade é uma força que não se deixa canalizar tão facilmente como
gostaríamos. Mas é importante que a consideremos como uma ener-
gia que Deus nos deu de presente, como uma força boa e necessária
para a nossa vida (…) e para a nossa espiritualidade. Então, encon-
traremos caminhos que nos hão-de levar a integrá-la na nossa con-
cepção da vida. O celibatário tomará um caminho diferente do das
pessoas casadas. Mas o que é determinante é considerar a sexualida-
de como uma força que vem de Deus e que também nos pode conduzir
a Ele.
Fico sempre aterrorizado ao verificar o sofrimento que provém de
uma sexualidade repelida e reprimida, ao ver todo o mal que as pes-
soas fazem a si próprias porque não interpretam a mensagem bíblica
num sentido místico mas antes a recebem como uma palavra moraliza-
dora. Isto porque separam totalmente Deus e o mundo e porque gos-
tariam de chegar a Deus evitando o mundo; consideram a sua espiri-
tualidade não como um caminho de vida mas como uma estratégia de
limite para evitar as dificuldades inerentes à vida do homem.
Anselm Grün 7
7
Conquérir sa liberté intérieure, Ed. de l’Atelier. Anselm Grün é abade de Münsters-
chwarzach, mosteiro beneditino do sul da Alemanha.
50
«O que Deus uniu, o homem não deve separar»
(Mt 19, 6)
CAPÍTULO 5
Juntos para sempre, a fidelidade
TESTEMUNHOS
51
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
1
Escritor suíço (1878-1947).
52
ção humana. Mas qual é o apaixonado que não tem a convicção ín-
tima de que os sentimentos que experimenta pelo outro resistirão à
erosão do tempo e assegurão a permanência?
A tensão da vida que suscita o nosso desejo e alimenta a nossa ex-
pectativa e a nossa imaginação pode, infelizmente, ser fonte de desen-
canto. A harmonia no casal é corroída pelo tempo e pelas dúvidas: as
experiências apaixonadas e intensas com o outro vão diminuindo, e
ninguém se pode instalar na convicção de que o cônjuge lhe pertence
até ao fim dos seus dias. A partir desta dolorosa verificação, é-se le-
vado a interrogar-se sobre se não se terá feito um erro na escolha do
cônjuge.
A ciência não nos dá remédios fáceis para forjar relações duradou-
ras e fecundas. No entanto, as sondagens revelam que a grande maio-
ria dos casais está satisfeita com a sua vida em comum, apesar das
imperfeições do seu comportamento sexual. «Nunca te esqueças de
que, num bom casal, o mais importante não é a felicidade mas a esta-
bilidade», faz o poeta García Márquez 2 dizer a uma das suas persona-
gens em “O amor no tempo da cólera”. A estabilidade é um factor
bem colocado na escala dos critérios necessários ao êxito de uma vida
de casal.
2
Escritor colombiano, Prémio Nobel da literatura 1982.
3
Poeta francês (1895-1952).
53
A fidelidade conjugal «contra ventos e marés» é uma dimensão
fundamental da nossa humanidade. São muitos os lugares da fidelida-
de: a religião, a família, a amizade, os compromissos … Desde Ho-
mero, ela é cantada pelos poetas em todo o mundo; faz vibrar os cora-
ções e faz correr lágrimas. Tem por objecto homens de todas as idades,
mas não pode ser dissociada do amor.
Se o dicionário descreve a fidelidade como qualidade do que res-
peita compromissos assumidos, o aspecto que aqui nos interessa é o
testemunho de pessoas que cumprem a sua promessa e respeitam os
seus compromissos para com o cônjuge até ao limite do possível. Des-
cobre-se, então, a força dessa fidelidade que é a própria força da fé,
tradução do latim fides: fé no vínculo, fé no outro e, para o crente,
abertura à transcendência, à verdade e à eternidade: Deus.
A fidelidade não está em crise, ela própria é crise, porque inces-
santemente e a todo o instante nos obriga a manter uma decisão, to-
mada no impulso do início, de refazer uma promessa abalada pelos
cantos melodiosos das sereias, de voltar a dar uma palavra enterrada
no esquecimento. Nem a fidelidade nem a infidelidade são fatalida-
des. A fidelidade constrói-se, dia a dia, com perseverança e energia.
Estaremos prontos a pagar esse preço por um ideal em que se funda-
mentam a história das nossas comunidades e o futuro do nosso casal?
A construção da fidelidade no casal assenta em quatro pilares:
54
* A fidelidade desenvolve-se no tempo, e isto pode ser interpreta-
do como um desafio lançado ao tempo. O tempo é irreversível.
Não é um longo rio tranquilo. Quantos meios é preciso pôr em
acção para passar do imaginário ao real, da nostalgia do passado
às previsões do futuro! O tempo é uma oportunidade para a cons-
trução de uma relação. Permite que a vida seja criativa. O tempo
não é só desgaste, é também impulso vital. O amor, sobretudo,
amadurece: pode melhorar como o vinho. A harmonia que se es-
tabelece com o tempo é certamente menos apaixonada e menos
passional do que a do início, mas torna-se mais real. Já não es-
tamos sozinhos a correr o permanente risco inerente a essa rela-
ção paradoxal de entrega de si a outro/a, de oferenda ao outro do
que nos é mais caro: nós próprios. O risco já não é solitário: a fi-
delidade vive-se com outra pessoa, é caminho de descoberta de
si e do outro que passou a ser a pessoa mais próxima. Qualquer
que seja o futuro que tivermos imaginado, ele nunca se realiza
sem que tenhamos sido secretamente desiludidos. A fidelidade,
tal como a ternura, tem incessantemente necessidade de palavras
para se dizer, se partilhar, se construir, se recompor.
* A fidelidade passa pelo perdão. Para o diálogo e para a escuta
no respeito é preciso explorar as alegrias e as provações, as trai-
ções e as decepções que correm o risco de levar ao desencanto.
Por vezes, fazem-se ouvir os apelos dissimulados da tentação:
por que será preciso renunciar? O diálogo é indispensável à cons-
trução de uma relação, ao passo que o silêncio lhe é funesto.
Quando surgem divergências profundas que provocam rupturas
ou traições, a frágil fidelidade humana precisa de ser rodeada de
tacto e de solicitude. Ela não está inscrita nos nossos genes. Po-
demos aprender palavra a palavra e passo a passo a atravessar na
paciência essas obscuridades quando já não sentimos nada, quando
já não compreendemos nada. Toda a falta pode ser perdoada, desde
que se queira. O perdão está no centro da aventura conjugal e,
para lá dos conflitos, é preciso acreditar na reconciliação possí-
vel. Quem ama verdadeiramente é levado a perdoar. Estender a
mão e deixar que nos dêem a mão: eis o segredo do perdão, que
não é resignação mas fonte de fecundidade e de liberdade. O
perdão restitui a paz, enquanto o perdão recusado asfixia.
* A fidelidade é uma arte de viver. Não é uma ascese. Há que
sublinhar a importância do acto sexual, profunda e ligeira ao mes-
mo tempo, e levar a sério a atracção dos sentidos, os seus aspec-
tos de gratuitidade, de poesia e até de desordem. Nos nossos dias,
55
já não é possível silenciar o papel positivo do prazer carnal sobre
o qual se constrói a estabilidade do casal e que não deve ser asfi-
xiado sob o peso das regras morais. A fidelidade deve ser inven-
tiva, não se deve tornar monótona nem enfadonha. Os cônjuges
são chamados a reajustar constantemente a sua vida em comum
a novas referências, a cultivar o prazer de estarem juntos de modo
a que bastem poucas palavras e poucos gestos de ternura para
responder às expectativas do outro. Isto supõe uma grande dispo-
nibilidade e uma grande exigência, pessoal e recíproca. E quan-
do tudo vai tão bem que já não têm vontade de se separar, é pre-
ciso poderem suportar a separação, deslocarem-se para espaços
diferentes, criar lugares de solidão possível. Compete a cada um
descobrir o seu espaço interior e a capacidade de nele se manter
e de o cultivar; isto implica que também se respeitará o jardim
secreto do outro, que nunca se lhe forçará a porta. O amor procu-
ra penetrar os segredos íntimos do ser amado, todavia «o verda-
deiro amor contorna os segredos da solidão do ser amado e per-
mite que ele os guarde para si» (cf. John Merton).
Para concluir:
A fidelidade é uma atitude responsável quotidiana que nos volta
para o infinito, abrindo-nos a uma história imprevisível. Este apelo é
um convite a dar e a receber; precisamos de aceder a questões que
sabemos serem vitais, um desafio “contra todos os riscos” ao desgas-
te do tempo. A fidelidade não é uma palavra, é um sinal. A nossa fi-
delidade pode apoiar-se com segurança na fidelidade de Deus. A fide-
lidade é o atributo mais importante de Deus e está associada à sua
bondade paternal: Ele é o “rochedo” de Israel, nome que simboliza a
sua fidelidade imutável, a verdade das suas palavras, a solidez das
suas promessas. Pelo sacramento do matrimónio, Deus consagra a
nossa fidelidade conjugal através do “Sim” que nos compromete para
sempre.
Não será presunçoso fazer esta afirmação quando se fez a expe-
riência do silêncio de Deus no sofrimento e na aflição? Onde está
Deus no fracasso? Temos a plena revelação disto em Jesus Cristo,
cuja Paixão não é só a partilha zdessa experiência de abandono, mas
é também fundadora de sentido, fazendo dela um caminho de ressur-
reição. Em Jesus Cristo manifesta-se a fidelidade de Deus que vai
além de todas as promessas da Aliança. É um sinal que revela, tor-
nando visível aos olhos dos homens o amor de Cristo pela sua Igreja.
A fidelidade de Deus reclama a nossa. Convida-nos a estar atentos à
56
sua presença, não para esquecer a de um ser amado mas para subir até
à fonte desse amor. «Que, no meio das mudanças do mundo, os nos-
sos corações se fixem onde estão as verdadeiras alegrias» (cf. Missal
Romano).
PERGUNTAS
* Como ser sinal da felicidade de ser fiel numa cultura que não
encoraja a fidelidade?
57
ORAÇÃO
TEXTO DE ACOMPANHAMENTO
Textos bíblicos
Única é minha pomba
58
Quem é essa que desponta como a aurora
bela como a lua
fulgurante como o sol
terrível como as coisas insignes?
Malaquias 2, 15
Provérbios 5, 18b-19
Oseias, 2, 21-22
59
Outros textos
A confiança mútua
Lembras-te, mulher?
Lembras-te, mulher?
não tínhamos nada para começar, tudo estava por fazer.
Foi depois,
— lembras-te? —
foi só depois que a vida começou.
Vêm os filhos,
é preciso alimentá-los, vesti-los, educá-los;
nunca mais acaba.
60
Também acontece ficarem doentes;
tu ficavas de pé toda a noite;
eu trabalhava de manhã à noite.
Há alturas em que desesperamos;
e os anos passam e não avançamos.
Parece que voltamos para trás.
Lembras-te, mulher?
Todas aquelas preocupações, toda aquela confusão.
Só que tu estavas ali.
Charles-Ferdinand RAMUZ
4
Excerto de Richard M. Hogan e John M. Levoir, Covenant of love, Pope John Paul II on
sexuality, marriage and family in the modern world, Ignatius Press, p. 80.
61
pre por uma fidelidade perfeita. O amor humano, por ser reflexo
do amor de Deus, também deve ser fiel para sempre. Deus é sem-
pre fiel no seu amor, pois qualquer grau menor de amor não seria
dom total de si mesmo. Um dom, quando é total, não é limitado
nem por graus nem no tempo!
Charles Péguy
62
«Cada um de nós prestará contas a Deus de si próprio»
(Rm 14, 12)
CAPÍTULO 6
A consciência
TESTEMUNHOS
63
disponibilidade para a mudança … Não se pode “normalizar”
a consciência: ela é própria de cada indivíduo e, no matrimó-
nio, do casal. Diversos casais que se prepararam no mesmo es-
pírito de verdade podem ter comportamentos diferentes e tomar
decisões diferentes face aos mesmos problemas».
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
64
- A minha mulher e eu (25 anos) descobrimos, depois do nascimen-
to de um filho nado-morto, gravemente anormal, que os exames
do nosso capital genético nos davam duas probabilidades em três
de pôr no mundo crianças altamente deficientes. Mas queremos
ter filhos. Deveremos seguir o parecer do nosso médico, que acon-
selha um aborto terapêutico em caso de grave anomalia detecta-
da na ecografia? Se não, que fazer?
As linhas que se seguem não dão respostas feitas, mas uma “ilumi-
nação” que deveria ajudar cada um a aprender a decidir-se no seu caso
particular único. Não falaremos aqui da consciência psicológica, que
se assemelha ao simples conhecimento (tem-se consciência da ternu-
ra de uma mãe, da iminência de uma tempestade …), mas da consciên-
cia moral, que ultrapassa esse simples conhecimento, dando-lhe um
valor de bem ou de mal que nos compromete pessoalmente.
Na Declaração Dignitatis Humanae do Concílio Vaticano II (n.º 3c),
lê-se: «O homem ouve e reconhece os ditames da lei divina por meio
da consciência, que ele deve seguir fielmente em toda a sua activida-
de, para chegar ao seu fim, que é Deus. Não deve, portanto, ser forçado
a agir contra a própria consciência. Nem deve também ser impedido
de actuar segundo ela». Notemos, já agora, que a Igreja não é a única
a interessar-se pela consciência: em 1948, a Declaração Universal
dos Direitos Humanos, no seu número 18, afirma: «Toda a pessoa tem
direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião».
Na Constituição Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II (n.º 16)
encontramos uma longa exposição sobre a consciência, que vai servir
de fio condutor para a nossa reflexão:
65
§ 3. Graças à consciência, revela-se de modo admirável aquela
lei que se realiza no amor de Deus e do próximo.
§ 4. Pela fidelidade à voz da consciência, os cristãos estão uni-
dos aos demais homens no dever de buscar a verdade e de nela
resolver tantos problemas morais que surgem na vida individual e
social. Quanto mais, portanto, prevalecer a recta consciência, tan-
to mais as pessoas e os grupos estarão longe da arbitrariedade cega
e procurarão conformar-se com as normas objectivas da moralidade.
§ 5. Não raro, porém, acontece que a consciência erra, por igno-
rância invencível, sem por isso perder a própria dignidade.
§ 6. Outro tanto não se pode dizer quando o homem se descuida
de procurar a verdade e o bem e quando a consciência se vai pro-
gressivamente cegando, com o hábito do pecado».
66
da nossa vida. «No mais íntimo de si próprio, o homem experimenta
a irradiação da verdade de Deus no seu ser. É isso a lei. Não é prima-
riamente a percepção de um interdito exterior a si. Não é uma realida-
de fria e impessoal. Trata-se de uma luz, de uma atracção, de uma
revelação pessoal».
O § 4 põe a tónica na necessidade da formação de uma «consciên-
cia recta»; trata-se não de uma «consciência tranquila», como se diz
em linguagem corrente, que seria uma satisfação fácil e sem demasi-
ada reflexão, mas de uma procura clarificada do verdadeiro bem; no
fundo, «ter uma consciência recta é ser recto para com a própria cons-
ciência». Trata-se de esclarecer bem a consciência e de ser responsá-
vel não só «perante» a sua consciência mas também «pela» sua cons-
ciência. «A consciência», escreve o Cardeal Pierre Eyt 1, «não é um
oráculo, mas um órgão que se exercita, se informa, se forma, se ilu-
mina, se desenvolve, se afina».
A Encíclica Veritatis Splendor do Papa João Paulo II apela a «for-
mar a consciência e a fazer dela objecto de uma conversão permanen-
te à verdade e ao bem». A procura de uma consciência é um caminho
de conversão para toda a vida, e quem diz «caminho» diz também
«caminhada», «progressão», «gradualidade». A iluminação da cons-
ciência pode ser orientada:
- pelos acontecimentos (ainda que a sua interpretação nem sempre
seja simples);
- pela reflexão (o exercício da inteligência que se instrói, racioci-
na, argumenta);
- pela oração e pela vida sacramental (eucaristia, reconciliação);
- pela mediação de outras pessoas - pais, educadores, amigos;
- pelo Magistério, essa «memória da Igreja que actualiza as exi-
gências dos apóstolos» (e, por conseguinte, de Cristo), que não
tem que acrescentar leis mas que explicita e precisa o que signi-
fica amar Cristo e segui-l’O.
1
Arcebispo de Bordéus, França, falecido em 2001.
67
eco implica uma voz; uma voz, alguém que fala; aquele que fala é
aquele que amo e venero».
Os § 5 e 6 apresentam-nos dois tipos de «consciência errónea». Só
uma é digna: a que erra em consequência de uma ignorância inelutá-
vel. A ignorância inelutável é a ignorância de uma pessoa que, tendo
feito tudo o que estava ao seu alcance para procurar a verdade (oração,
leituras, conversas …), não chegou a perceber a razão de tal atitude
moral proposta pela Igreja. Continuando a prestar atenção, continuan-
do a manter em alerta o seu “radar” para o caso de alcançar uma per-
cepção maior, é dever de cada um obedecer definitivamente à sua cons-
ciência. S. Tomás de Aquino considerará mesmo obrigação obedecer à
sua consciência sob pena de pecado. Porque o nosso dever é ir até onde
a nossa consciência viu que se encontrava o bem. Com efeito, uma
velha máxima da escolástica recorda-nos que nunca é permitido esco-
lher deliberadamente o que em consciência julgamos ser mal.
O § 6, por sua vez, evoca também a realidade da ignorância, mas
aqui trata-se de uma ignorância que é fruto de uma «consciência pre-
guiçosa»; não se fizeram os esforços que poderiam ser feitos; a pes-
soa fechou-se num certo número de certezas mais ou menos confortá-
veis e desligou o seu radar. Esta situação é particularmente grave. O
Catecismo da Igreja Católica não hesita em afirmar que «a ignorân-
cia simulada e o endurecimento do coração não diminuem, antes au-
mentam, o carácter voluntário do pecado» (n.º 1859).
Estas reflexões acerca da consciência devem deixar-nos cheios de
confiança e de serenidade. É claro que, como referimos no início des-
te capítulo, não trazem soluções feitas, mas a nossa «boa vontade»,
com a graça de Deus e o apoio da sua misericórdia, far-nos-á desco-
brir como formar uma «consciência recta», e então poderemos tender
ao «ideal que», como diz Marcel Domergue 2, «consiste em a voz de
Deus se nos tornar interior e agir em nós como o nosso próprio dina-
mismo».
PERGUNTAS
2
Padre Jesuíta francês.
68
* Que esperamos um do outro para nos ajudarmos mutuamente a
formar a nossa consciência? A minha consciência preocupa-se
com o desabrochar do meu cônjuge, com o seu desejo, com o
meu, com as suas repugnâncias, com as minhas?
ORAÇÃO
69
O vento sopra onde quer e ouves o seu ruído, mas não sabes de
onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que
nasceu do Espírito».
TEXTOS DE ACOMPANHAMENTO
A consciência
70
de uma criança; só o padre lá entra como médico das almas e como
ministro do sacramento da penitência. Mas nem por isso a consciên-
cia deixa de ser um santuário zelosamente guardado cujo segredo o
próprio Deus quer que seja preservado sob o selo do mais sagrado dos
silêncios».
Pio XII
Texto citado pelo Padre Bruguès
Ousar a liberdade
Charles Singer
71
3
Celebrar o ano 2000 !
3
Reflexões sobre Jesus, o Espírito Santo e o Pai. Textos do Papa João Paulo II, escolhidos
e apresentados por Paul Thigpen.
4
Excerto de Celebrate 2000!, p. 153.
72
«Sede fecundos»
(Gn 1, 28)
CAPÍTULO 7
Dar frutos, a fecundidade
TESTEMUNHOS
73
Depois, a intensa alegria transformou-se numa enorme espe-
rança, num desejo, em projectos para os filhos; estes são do do-
mínio do sonho. Os nossos filhos ensinaram-nos outra forma de
amor: humildade, escuta, atenção, paciência, disponibilidade».
«Transmitir a vida ultrapassa-nos, faz-nos tocar o mistério
da vida. É um dom de Deus, uma parcela do poder de Deus, uma
grande fonte de alegria. O mistério da vida é uma coisa fantás-
tica. Da felicidade e do amor de um casal, dessa união física
surge um novo ser. Uma nova pessoa. Tão misteriosa e tão dife-
rente de todas as que já existem! E foi a nós, um casal entre
tantos outros, que foi dado ser instrumento da mão divina do
Criador. Ele permite-nos ser criadores, possuir em nós mesmos
os elementos capazes de dar origem à vida. Absurdamente fan-
tástico, divino e real!».
«Maternidade e paternidade responsáveis: este é o ponto crí-
tico; e, sem cessar, levanta-se em nós essa interrogação: onde
está a fronteira entre os nossos cálculos e o projecto de Deus?
Na base de uma estabilidade de casal, há a responsabilidade
comum pelo projecto de fecundidade biológica».
«O importante não é o método em si, mas o comportamento
dos esposos face à sua própria vida e à vida dos filhos; a esco-
lha do método vem a seguir …».
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
A fecundidade é um dom de Deus
1
Jacques de Longeaux, padre de Paris, em Amour, mariage et sexualité, Ed. Mame/Cerf, p. 7.
74
A questão da fecundidade do casal não pode ser reduzida à da re-
gulação da natalidade. O dinamismo do amor leva-o para além do
instante presente e até mesmo para além da pessoa amada. Se permite
habitar o presente, o amor não se contenta em se fechar no presente.
Se se experimenta e se recebe como um dom, o amor é portador do
desejo de que esse dom se prolongue, se redobre, tenha repercussões
dando frutos, encarnando em vidas que ultrapassam as das pessoas
que se amam. Isto já se experimenta no próprio amor carnal: o desejo
tende para a unidade, ao passo que o prazer é vivido como uma verti-
gem em que o sentimento dos limites individuais parece momentane-
amente abolido. “O homem une-se à sua mulher, e eles tornam-se
uma só carne” (Gn 2, 24). Tudo se passa como se, no momento em
que os amantes têm o sentimento de “cair um no outro”, tivessem a
intuição confusa de que a sua unidade só se pode realizar para além
deles próprios, numa terceira vida que sobreviverá àquela união pas-
sageira e em que se misturarão os seus traços, os seus sangues, os
seus patrimónios genéticos. Esta aspiração muito profunda é uma das
causas de sofrimento dos casais que não podem ter filhos. De facto, o
sofrimento é o reverso desse grande desejo; essa impossibilidade é
vivida como uma falta, uma provação.
E se, como todos sabemos, muitos casais privados de fecundidade
biológica se mantêm, é porque, muitas vezes, depois de terem ultra-
passado essas dificuldades específicas, descobriram outras formas de
fecundidade. Porque a fecundidade carnal através da vinda do filho,
sendo muito valiosa, não é a única forma de fecundidade; outras for-
mas são dadas a viver a todo e qualquer casal, seja ele quem for.
75
ciativa, política ou eclesial. Aquilo com que um casal contribui está
profundamente ancorado no que ele vive no mais íntimo de si mesmo,
nesse permanente intercâmbio bipolar masculino-feminino. Aliás, pelo
testemunho da sua fidelidade, o casal contribui com uma nota de esta-
bilidade num ambiente por vezes muito instável.
- A fecundidade é também, e talvez sobretudo, espiritual. A pa-
ternidade e a maternidade autenticamente vividas são, em primeiro
lugar, espirituais: ligam almas que passam por Deus, mediador e fon-
te de toda a fecundidade. A paternidade e a maternidade espirituais
geram uma relação em que uma pessoa permite à outra descobrir uma
parte de si mesma, comunicando-lhe não apenas um saber ou um sa-
ber-fazer mas, para além disso, uma vida.
Casar-se é, pois, comprometer-se a construir um lugar em que pos-
sam acontecer e crescer vidas novas. Querer viver as fecundidades de
um casal é ter em vista mais do que o casal, é ter em vista a realização
de uma comunidade, a integração desta numa comunidade mais am-
pla, tomar consciência de que o casal apaixonado é chamado a dar
origem a algo maior do que ele, a uma família, a um ambiente famili-
ar, a um lugar de intercâmbios e de crescimento.
2
Reflexões extraídas do seu livro Repères éthiques pour un monde nouveau, Ed. Salvator,
1982, pp. 79-83.
76
co»; facilmente se concordará com este ponto: não se trata, bem en-
tendido, de evitar em todos os casos a vinda de um filho, mesmo que
o casal tenha todas as razões para assim esperar.
«Todo o método exige um diálogo regular e profundo entre os dois
cônjuges»; cada um deve sentir-se implicado na escolha fundadora do
lar, e o diálogo deve ser retomado com a mesma seriedade quando a
situação do casal tiver evoluído. Além disso, «um método ideal de re-
gulação deveria satisfazer as seguintes condições:
3
Neste contexto, “natural” significa que respeita a natureza do acto e não perturba o
ritmo da natureza. É melhor falar de “métodos de auto-observação” do que de “méto-
dos naturais”.
77
rais comporta a aceitação do ritmo biológico, e com isto também a
aceitação do diálogo, do respeito recíproco da responsabilidade co-
mum, do domínio de si. Aceitar o tempo e o diálogo significa reconhe-
cer o carácter conjuntamente espiritual e corpóreo da comunhão con-
jugal, como também viver o amor pessoal na sua exigência de
fidelidade” (Familiaris Consortio, 32). Os cristãos são, pois, convida-
dos pelo Papa a reconhecer que o ensinamento de Paulo VI na encíclica
Humanae Vitae constitui uma “normativa para o exercício da sexua-
lidade” (ibid., 34)».
«Mas é importante compreender bem qual é o papel da norma na
vida quotidiana. Uma norma não é uma receita. Tem por função indi-
car o caminho mais usual de humanização. É para cada pessoa como
que uma referência que obriga a sair das suas impressões imediatas
para avaliar o que realmente está em jogo nos seus comportamen-
tos. É o fruto de uma reflexão sobre a experiência humana e cristã
que teve em conta todas as dimensões do agir, inclusive as suas di-
mensões sócio-colectivas, e as suas repercussões a longo prazo. A
norma é o que faz ver a acção à luz do objectivo último a atingir e
perceber o crescimento em nós da imagem de Deus. Em resumo, cada
norma é um desafio à reflexão para ver se se está a acolher o Reino de
Deus».
«Todavia, há que considerar dois factos: em primeiro lugar, nem
todas as normas são observáveis simultaneamente. Por exemplo, é
frequente a norma “não recusarás a fecundidade” estar em confli-
to com a norma “velarás pelo desabrochar do teu cônjuge”. Em se-
gundo lugar, cada norma nem sempre é aplicável aqui e agora por de-
terminada pessoa, em virtude de dificuldades pessoais ou sociais
incontornáveis. Por exemplo, há mulheres com um ciclo tão irregular
que lhes é impossível recorrer a métodos contraceptivos “naturais”.
Para tomar consciência destes dois factos, João Paulo II introduz,
na sua exortação apostólica, a noção de “lei da gradualidade”, que é
um convite a caminhar com mais amor, tendo bem em conta as situa-
ções na sua complexidade».
«Concretamente, um casal cristão que escolhe um método deve
deixar-se interpelar pelo Magistério e ver se, para si, um método na-
tural não será realmente possível. Se o recurso a um método “artifi-
cial” se revelar indispensável, o casal cristão pode então considerar
que a recomendação do Magistério não é para ele uma norma a ob-
servar imediatamente. (…)».
78
«Depois de uma reflexão comum feita com todo o cuidado que exi-
ge a grandeza da sua vocação conjugal, os esposos optarão por outro
tipo de método, mantendo “o coração disponível ao apelo de Deus,
atentos a toda a nova possibilidade que ponha em causa a sua escolha
ou o seu comportamento de hoje”» 4.
- os espermicidas;
- os preservativos;
4
Comentário dos bispos franceses à encíclica de Paulo VI Humanae Vitae sobre a regulação
da natalidade.
79
- os contraceptivos (a pílula), que bloqueiam a ovulação, ou, não
a bloqueando, tornam o muco cervical infértil, o que respeita
mais o ciclo hormonal da mulher.
* Outros métodos:
80
PERGUNTAS
81
* «A vida humana é sagrada, pois desde a origem requer a acção
criadora de Deus» 5. Estamos aqui na linha directa do Decálogo:
«não matarás». Procuramos formar a nossa consciência neste
aspecto, procurando, por exemplo, conhecer os movimentos que
trabalham em prol do respeito pela vida ou lendo a encíclica Evan-
gelium Vitae?
ORAÇÃO
5
João XXIII, Encíclica Mater et Magistra.
82
TEXTOS DE ACOMPANHAMENTO
83
desencorajar pelos fracassos, por viver em verdade as profundas exi-
gências de um amor santificado que as regras morais lhes recordam,
estas deixam de ser rejeitadas como um entrave e passam a ser reco-
nhecidas como um poderoso auxílio».
Extraído do Catecismo da Igreja Católica 6
Discernir o essencial
os
6
N. 2360 a 2379.
84
Se «qualquer acto matrimonial deve permanecer aberto à trans-
missão da vida», poderá um casal escolher unir-se apenas durante os
períodos estéreis? Claro que sim, se não se tratar de uma recusa abso-
luta à vida. É preciso formular esta pergunta: por que recusamos ter
filhos de momento? Por egoísmo? Por amor ao conforto? Para con-
servar a nossa liberdade (carro, casa, viagem)? Ou por amor (bem-
estar dos filhos que já existem, saúde da mãe)? Um motivo egoísta
não justifica nenhum método, mesmo aprovado pelo Papa. É, em pri-
meiro lugar, no coração que é preciso manter-se aberto à vida.
Poderá um casal unir-se impedindo voluntariamente que esse acto
transmita a vida? É aqui que intervém a recusa da Humanae Vitae: «É
de excluir toda a acção que, ou em previsão do acto conjugal, ou
durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento das
suas consequências naturais, se proponha, como fim ou como meio,
tornar impossível a procriação» (n.º 14). É com um acto que não tenha
sido voluntariamente privado da sua capacidade de transmitir a vida
que um casal deve amar-se. Se o casal quiser unir-se e não ter filhos, é
preciso que isso seja feito com um gesto da mesma natureza que aquele
que teria permitido ter filhos noutra altura. Caso contrário, perde-se a
intenção inicial: já não é com um gesto que poderia dar vida que eu
manifesto o meu amor. É isto que a Humanae Vitae explica: há uma
«conexão inseparável que Deus quis e que o homem não pode alterar
por sua iniciativa entre os dois significados do acto conjugal: o signi-
ficado unitivo e o significado procriador … Salvaguardando estes dois
aspectos essenciais, unitivo e procriador, o acto conjugal conserva
integralmente o sentido de amor mútuo e verdadeiro e a sua ordena-
ção para a altíssima vocação do homem para a paternidade» (n.º 12).
A Igreja acredita que a sexualidade se desvaloriza se se separar o
amor da abertura ao filho. Ninguém contesta isso. A discussão tem a
ver com o facto de se saber se essa abertura diz respeito apenas ao co-
ração ou se deve ter necessariamente um significado físico e corporal
em cada acto. Se um casal recusa os filhos para o bem dos filhos que
já existem ou prefere esperar para acolher o filho em melhores cir-
cunstâncias, poderá dizer-se que essa recusa da vida agora é uma re-
cusa total da vida? A recusa da fecundidade hoje não é fechar-se à
vida, mas consequência do acolhimento de ontem à vida ou da dispo-
nibilidade para a acolher amanhã. Esta abertura de toda a vida não
será suficiente? A abertura a nível do coração não bastará sem ser
necessário significá-la sempre ao nível do corpo? Era esta a opinião
da maioria dos teólogos consultados por Paulo VI, mas o Papa res-
85
pondeu categoricamente: é também na estrutura física de cada acto
de união que isso se deve manifestar. É a verdadeira forma de mani-
festar a união dos dois aspectos indissociáveis da sexualidade.
É verdade que o desejável era que cada acto pudesse unir os dois.
Os casais que viveram tranquilamente esta forma de regulação po-
dem dizer quanto isso foi benéfico para eles. Experiências de infor-
mação e de sensibilização mostram que esta regulação é mais fácil de
concretizar do que se diz. Seria mesmo desejável do mero ponto de
vista humano ou médico. O método de contracepção menos pesado
do ponto de vista humano, o que tem menos consequências nefastas,
é certamente a abstinência periódica. Esta contracepção sem violên-
cia, em que se vive em harmonia com os ritmos do corpo, aproveitan-
do os seus períodos estéreis, é certamente menos perigosa para o cor-
po do que os métodos que o agridem, tais como as pílulas utilizadas
durante longos períodos, já para não falar do dispositivo intra-uterino
ou dos «mini-abortos» repetidos.
Curiosamente são hoje os ecologistas, preocupados com as agres-
sões que as técnicas modernas infligem à natureza, que reconhecem
que havia sabedoria nas palavras do Papa. Se se tivesse despendido
bastante dinheiro para afinar indicadores fiáveis para anunciar a
iminência da ovulação e, logo, reduzir ao mínimo a abstinência ga-
rantindo a segurança, ter-se-ia talvez trabalhado num caminho mais
prometedor. Se um casal pode, sem dificuldade, garantir assim uma
regulação eficaz da natalidade, é com certeza dessa forma que se deve
agir. Algumas pessoas decidiram talvez demasiado depressa que não
havia nada a procurar por este lado.
Isto é desejável, mas nem sempre realizável. Pode acontecer que
alguns casais devam ou queiram legitimamente evitar um novo nasci-
mento e não tenham outros meios senão o recurso a contraceptivos
para garantir eficazmente essa regulação. A adesão ao pensamento do
Papa não deve levar a afirmar demasiado depressa que quem elimina
artificialmente a possibilidade de conceber um filho reduz a união
conjugal a uma ocasião para satisfazer o egoísmo de cada um. Isso
seria admitir que, de cada vez que a concepção não é possível, o acto
de união não passa de um acto de egoísmo. É que se podem utilizar
os meios artificiais com muito amor no coração pela mulher e pelos
filhos. É porque um homem ama a mulher que não quer lhe impor
cargas demasiado pesadas para ela, para a sua saúde e para a famí-
lia, e porque, neste caso particular, não se encontraram outros meios
eficazes.
86
Era o que diziam os bispos franceses em 1968: «Ninguém ignora
as angústias espirituais com que se debatem os esposos sinceros, no-
meadamente quando a observância dos ritmos naturais não consegue
dar uma base suficientemente segura à regulação da natalidade. Por
um lado, têm consciência do dever de respeitarem a abertura à vida
de todo o acto conjugal; por outro lado julgam, em consciência, dever
evitar ou adiar um novo nascimento e não podem confiar nos ritmos
biológicos.
Por outro lado, no que lhes diz respeito, não vêem como renunciar
à expressão física do seu amor sem que a estabilidade do seu lar seja
ameaçada. A este propósito, lembraremos apenas o ensino constante
da moral: quando se está perante uma alternativa de deveres em que,
qualquer que seja a decisão tomada, não se pode evitar um mal, a
sabedoria tradicional prevê que se procure diante de Deus qual é o
dever maior no caso presente. Os esposos decidir-se-ão após uma
reflexão comum feita com todo o cuidado que a grandeza da sua voca-
ção conjugal exige». Não havia aqui desprezo algum pela palavra do
Papa. Como tudo o que é importante não é simultaneamente possível,
há que salvaguardar o que é mais importante. E o que é mais impor-
tante é a sobrevivência do casal.
Havia quem estivesse pronto a dizer aos casais: «Nesse caso, só há
uma solução: abster-se enquanto essa situação durar». Mas o casal
tem tanta necessidade de amor como de filhos. Por que é que os espo-
sos deveriam esperar por ser definitivamente infecundos para de novo
expressarem fisicamente o seu amor? Por que é que os que têm a
sorte de ser fecundos haviam de ser penalizados em relação aos que o
não são? Se estes podem usar a sexualidade «para exprimir e conso-
lidar a sua união», como reconhece a Humanae Vitae, não terão aqueles
a mesma necessidade? E poder-se-á pedir aos casais que se abste-
nham tanto tempo, correndo o risco de esquecer a resposta de S. Pau-
lo a quem lhe perguntava se seria bom que o homem se abstivesse da
sua mulher: «Não vos recuseis um ao outro, a não ser de mútuo acor-
do e por algum tempo, para vos dedicardes à oração; depois, voltai de
novo um para o outro, para que Satanás não vos tente» (1 Cor 7, 5)
Será S. Paulo menos actual hoje do que outrora?
Eis o que está em jogo. Compete a cada casal decidir o que deve
fazer procurando o que é mais importante e mais urgente a seus olhos.
Porque é sempre à consciência que compete decidir em última instân-
cia. A consciência não pretende determinar o que em si é bem ou mal,
mas tem a missão de escolher o que se deve fazer numa situação
87
concreta para salvaguardar o essencial, tendo em conta os apelos es-
cutados, as obrigações e o que é possível. Nunca ninguém o pode fa-
zer em seu lugar. Apesar de tudo, será sempre necessário recordar
que estas questões de métodos contraceptivos, por mais importantes
que sejam, não são nem o todo da sexualidade nem tudo da vida do
casal. Nem toda a vida cristã se joga aí.
O essencial continuará sempre a ser a orientação espiritual profun-
da da vida do casal. Se um casal coloca toda a sua vida sob o signo do
amor, de uma profunda união ao Senhor e de um dom autêntico aos
outros, tanto na família como no conjunto das suas relações, esse ca-
sal saberá encontrar o seu caminho, mesmo nas situações mais difí-
ceis. Pode hesitar ou enganar-se, pode mesmo conhecer fraquezas,
mas nunca se perderá por muito tempo. Não há melhor garante para
discernir diante de Deus o que é verdadeiramente essencial.
88
«Glorificai a Deus no vosso corpo»
(1 Cor 6, 20)
CAPÍTULO 8
O vosso corpo é templo do Espírito Santo
TESTEMUNHOS
Jean Mouroux 2
ELEMENTOS DE REFLEXÃO
Introdução
1
Escritor e filósofo francês.
2
Teólogo francês.
89
das e de teorias mais ou menos bonitas e talvez utópicas, mas da nos-
sa realidade concreta de casais cristãos que vivem um sacramento da
Igreja. Temos que integrar os dados de que falámos nos capítulos an-
teriores e procurar fazer a sua síntese, uma recapitulação que possa
dar-nos uma visão de conjunto de toda a nossa procura e de todos os
dados da nossa experiência.
Com efeito, é intenção deste último capítulo encontrar a chave que
possa abrir-nos à convicção de que a nossa vida de casal se baseia
numa vontade muito explícita do Deus Criador, e que, a todos os ní-
veis da nossa vida a dois, essa vontade se explicita através de uma
descoberta da nossa dimensão transcendente. Passar, como sugere o
título do capítulo, do corpo à pessoa, do carnal ao espiritual, numa
palavra, acreditar na extraordinária possibilidade da santificação do
nosso amor, em todos os domínios da nossa relação conjugal.
Abordagens
3
Documentação católica - Questões actuais, n.º 8 «A sexualidade um dom de Deus».
90
* Assim entendida, a sexualidade não pode confundir-se com a
genitalidade, conceito mais restrito que diz respeito às expressões fí-
sicas da sexualidade orientadas para a união genital. O contexto par-
ticular do casamento é necessário na suprema expressão física da
sexualidade, para servir o amor humano e a vida humana com gene-
rosidade, sem a ilusão que constituem as relações antes do casamento
e fora dele. A complementaridade da sexualidade (homem e mulher)
e o seu dinamismo ardente orientado para a união reflectem em ter-
mos humanos a unidade dinâmica que existe no Deus Trino. Assim, a
diferença entre os sexos é visivelmente boa e querida por Deus desde
o princípio como parte integrante da sua própria revelação. E também
se percebe a necessidade de integridade simultaneamente física e psí-
quica no acto da união sexual, pela qual os esposos se exprimem e se
realizam.
«O homem tornou-se “imagem e semelhança de Deus” não só me-
diante a própria própria humanidade, mas ainda mediante a comunhão
de pessoas que o homem e a mulher formam desde o princípio … O
homem torna-se imagem de Deus não tanto no momento da solidão
mas principalmente no momento da comunhão. Ele, de facto é desde
“o princípio” não só imagem em que se espelha a solidão de uma
Pessoa que governa o mundo, mas também e essencialmente imagem
de uma imperscrutável comunhão divina de Pessoas» (entre aspas: o
pensamento de João Paulo II nas suas alocuções; ver L’Osservatore
Romano de 18 de Novembro de 1979 4).
«Precisamente a função do sexo que é, em certo sentido, “constitu-
tivo da pessoa” (não apenas “atributo da pessoa”), mostra quão pro-
fundamente o ser humano, com toda a sua solidão espiritual, com a
unicidade e irrepetibilidade própria da pessoa, é constituído pelo cor-
po como “ele” e como “ela”. A presença do elemento feminino, ao
lado do masculino e juntamente com ele, tem o significado de um
enriquecimento para o homem em toda a perspectiva da sua história,
incluindo a história da salvação» (Ibid., 25 de Novembro de 1979).
«O homem e a mulher constituem quase dois modos diversos do
humano “ser corpo”, na unidade daquela imagem [de Deus]» (Ibid., 6
de Janeiro de 1980). «O corpo humano, com o seu sexo, e a sua mascu-
linidade e feminidade, visto no mistério mesmo da criação, é não só
fonte de fecundidade e de procriação, como em toda a ordem natural,
4
Citações transcritas da edição semanal portuguesa de L’Osservatore Romano, cujas da-
tas são referidas (N. do T.).
91
mas encerra desde “o princípio” o atributo “esponsal”, isto é, a capa-
cidade de exprimir o amor: exactamente aquele amor em que o ho-
mem-pessoa se torna dom e — mediante esse dom — pratica o senti-
do mesmo do seu ser e existir» (Ibid., 20 de Janeiro de 1980).
«A consciência do significado do corpo que dela deriva — em par-
ticular do seu significado “esponsal” — constitui o elemento funda-
mental da existência humana no mundo … O corpo tem significado
“esponsal” porque o homem-pessoa, como diz o Concílio, é criatura
que Deus quis por si mesma, a qual, ao mesmo tempo, não pode en-
contrar-se plenamente senão mediante o dom de si mesma» (Ibid., 20
de Janeiro de 1980).
5
O homem, imagem do Deus amor
5
Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 11.
92
maneira verdadeiramente humana se é parte integral do amor com o
qual homem e mulher se comprometem totalmente um para com o
outro até à morte. A doação física total seria falsa se não fosse sinal e
fruto da doação pessoal total, na qual toda a pessoa, mesmo na sua
dimensão temporal, está presente. Se a pessoa se reservasse alguma
coisa ou a possibilidade de decidir de modo diferente no futuro, só
por isso já não seria uma doação total.
Esta totalidade, pedida pelo amor conjugal, corresponde também
às exigências da fecundidade responsável: orientada como está para a
geração de um ser humano, supera, por sua própria natureza, a ordem
puramente biológica, e abarca um conjunto de valores pessoais, cujo cres-
cimento harmonioso exige dos pais contributo permanente e concorde.
O «lugar» único, que torna possível esta doação segundo toda a
verdade, é o matrimónio, isto é, o pacto de amor conjugal ou escolha
consciente e livre, pela qual o homem e a mulher aceitam a comuni-
dade íntima de vida e de amor, querida pelo próprio Deus (Gaudium
et Spes, 48), que só a esta luz manifesta o seu verdadeiro significado.
A instituição matrimonial não é uma ingerência indevida da socieda-
de ou da autoridade, nem a imposição extrínseca de uma forma, mas
uma exigência interior do pacto de amor conjugal que publicamente
se afirma como único e exclusivo, para que seja vivida assim a plena
fidelidade ao desígnio de Deus Criador. Longe de diminuir a liberda-
de da pessoa, esta fidelidade protege-a contra o subjectivismo e relati-
vismo e fá-la participante da Sabedoria Criadora.
6
O matrimónio e a comunhão entre Deus e os homens
6
Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 12.
93
para com o seu Deus: a idolatria é prostituição (cf. Ez 16, 25), a infide-
lidade é adultério, a desobediência à lei é abandono do amor nupcial
para com o Senhor. Mas a infidelidade de Israel não destrói a fideli-
dade eterna do Senhor. Por isso, o amor sempre fiel de Deus é apre-
sentado como modelo das relações do amor fiel que devem existir en-
tre os esposos (cf. Os 3).
7
Jesus Cristo, esposo da Igreja, e o sacramento do matrimónio
7
Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 13.
94
Acolhendo e meditando fielmente a Palavra de Deus, a Igreja tem
solenemente ensinado e ensina que o matrimónio dos baptizados é
um dos sete sacramento da Nova Aliança (Concílio de Trento, Ses-
sio XXIV).
De facto, mediante o baptismo, o homem e a mulher estão defini-
tivamente inseridos na Nova e Eterna Aliança, na Aliança nupcial de
Cristo com a Igreja. E é em razão desta indestrutível inserção que a
íntima comunidade de vida e de amor conjugal, fundada pelo Criador
(cf. Gaudium et Spes, 48), é elevada e assumida pela caridade nupcial
de Cristo, sustentada e enriquecida pela sua força redentora.
Em virtude da sacramentalidade do seu matrimónio, os esposos
estão unidos um ao outro da maneira mais profundamente indissolúvel.
Pertencendo um ao outro, representam realmente, através do sinal
sacramental, a relação de Cristo com a Igreja.
Os esposos são, portanto, para a Igreja a recordação permanente
do que aconteceu sobre a Cruz. São um para o outro, e para os filhos,
testemunhas da salvação da qual o sacramento os torna participantes.
Deste acontecimento de salvação, o matrimónio, como cada um dos
sacramentos, é memorial, actualização e profecia: «Enquanto me-
morial, o sacramento dá-lhes a graça e o dever de recordar as grandes
obras de Deus e de as testemunhar aos filhos; enquanto actualização,
dá-lhes a graça e o dever de realizar no presente, um para com o outro
e para com os filhos, as exigências do amor que perdoa e que redime;
enquanto profecia, dá-lhes a graça e o dever de viver e de testemu-
nhar a esperança do futuro encontro com Cristo» 8.
Como cada um dos sete sacramentos, também o matrimónio é sím-
bolo real do acontecimento da salvação, mas de um modo próprio.
«Os esposos participam nele enquanto esposos, a dois como casal, a
tal ponto que o efeito primeiro e imediato do matrimónio (res et sacra-
mentum) não é propriamente a graça sacramental, mas o vínculo con-
jugal cristão, comunhão a dois tipicamente cristã porque representa o
mistério da encarnação de Cristo e o seu Mistério de Aliança. O con-
teúdo da participação na vida de Cristo é também específico: o amor
conjugal comporta uma totalidade na qual entram todos os compo-
nentes da pessoa — chamamento do corpo e do instinto, força do sen-
timento e da afectividade, aspiração do espírito e da vontade. O amor
conjugal tem por fim uma unidade profunda pessoal, aquela que, para
8
João Paulo II, discurso aos delegados do «Centre de Liaison des Equipes de Recherche»
(3 de Novembro de 1979).
95
além da união numa só carne, conduz a um só coração e a uma só
alma; exige a indissolubilidade e a fidelidade da doação recíproca de-
finitiva e abre-se à fecundidade (cf. encíclica Humanae Vitae, 9). Numa
palavra, trata-se de características normais do amor conjugal natural,
mas com um significado novo que não só as purifica e as consolida
mas as eleva a ponto de as tornar expressão dos valores propriamente
cristãos» 9.
A nossa reflexão
Texto de apoio
9
João Paulo II, discurso aos delegados do «Centre de Liaison des Equipes de Recherche»
(3 de Novembro de 1979).
10
Escritor austríaco.
96
O Novo Testamento …
Caríssimos,
se Deus assim nos amou,
devemos, nós também, amar-nos uns aos outros.
Ninguém jamais contemplou a Deus.
Se nos amarmos uns aos outros,
Deus permanece em nós,
e o seu amor em nós é elevado à perfeição …
Deus é amor:
aquele que permanece no amor
permanece em Deus e Deus permanece nele.
(1 Jo 4)
PERGUNTAS
97
* Reflectir com profundidade no sentido espiritual do sacramento
e na necessidade de dar testemunho dele.
ORAÇÃO
Digo isto para confusão vossa. Não se encontra entre vós alguém
suficientemente sábio para poder julgar entre os seus irmãos? No en-
tanto, acontece que um irmão entra em litígio contra seu irmão, e isto
diante de infiéis! De qualquer modo, já é para vós uma falta a existên-
cia de litígios entre vós. Por que não preferis, antes, padecer uma in-
justiça? Por que não vos deixais, antes, defraudar? Entretanto, ao
contrário, sois vós que cometeis a injustiça e defraudais - e isto con-
tra os vossos irmãos!
Então não sabeis que os injustos não herdarão o Reino de Deus?
Não vos iludais! Nem os impudicos, nem os idólatras, nem os adúlte-
ros, nem os depravados, nem os enfeminados, nem os sodomitas, nem
os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os injuriosos her-
darão o Reino de Deus. Eis o que vós fostes, ao menos alguns. Mas
vós lavastes-vos, mas fostes santificados, mas fostes justificados em
nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito do nosso Deus.
«Tudo me é permitido», mas nem tudo convém. «Tudo me é permi-
tido», mas não me deixarei escravizar por coisa alguma. Os alimen-
tos são para o ventre e o ventre para os alimentos, e Deus destruirá
aqueles e este. Mas o corpo não é para a fornicação, e, sim, para o
Senhor, e o Senhor é para o corpo. Ora, Deus, que ressuscitou o Se-
nhor, ressuscitar-nos-á também a nós, pelo seu poder.
Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo? Tomarei
então os membros de Cristo para fazê-los membros de uma prostitu-
ta? Por certo, não!
98
TEXTOS DE ACOMPANHAMENTO
Os dois sacramentos
99
Um outro olhar sobre o homem
11
Un autre regard sur l’homme, edição Le Sarment – Fayard, p. 78, 299.
100
BIBLIOGRAFIA
Publicações
101
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JOÃO PAULO II - Discurso aquando da viagem a Ste Anne d’Auray.
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mento. Quarto Mundo. Edições S. Paulo, 1967.
Periódicos
Alliança (bimestral) n.os 33-34, 69-70, 71, 96, 106-107, 112-113, 120
e 127.
Amor e família (bimensal) CLER - Estabelecimento de Informação
da Educação e de Conselho Conjugal e Familiar.
102
MAGNIFICAT
103