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A reaproximação entre Cuba e os EUA contém um paradoxo e uma lição geopolítica, sobretudo
para os países que se propõem subir na escada internacional do poder.
“O Brasil terá que descobrir um novo caminho de afirmação da sua liderança e do seu poder
internacional, dentro e fora de sua zona de influência imediata. Um caminho que não siga o
mesmo roteiro das grandes potências do passado, e que não utilize a mesma arrogância e a
mesma violência que utilizaram os europeus e os norte-americanos para conquistar suas
colônias e protetorados”
Esta geografia extremamente difícil explica a existência de enormes espaços vazios dentro do
território brasileiro e nas suas zonas fronteiriças, e sua escassa relação econômica com seus
vizinhos, durante quase todo o século XX, quando o Brasil não conseguiu – nem mesmo –
estabelecer um sistema eficiente de comunicação e integração bioceânica, como aconteceu
com os Estados Unidos, já na segunda metade do século XIX, depois da sua conquista da
Califórnia e do Oregon, que se transformou num passo decisivo do seu desenvolvimento
econômico, e da projeção do poder global dos Estados Unidos.
Todas estas barreiras e dificuldades geográficas, entretanto, adquiriram uma nova dimensão e
gravidade, no início do século XXI,
graças: i) a transformação da China, do sudeste asiático, e da Bacia do Pacífico, no espaço
mais dinâmico da economia mundial; ii) sua transformação simultânea, e no tabuleiro
geopolítico mais relevante para o futuro do sistema mundial no transcurso do século XXI; iii) a
consequente, “chegada’ econômica da China ao continente sul-americano, e ao Caribe e
América Central, sobretudo depois do anúncio da construção do novo Canal Interoceânico da
Nicarágua, financiado e construído pelos chineses, a um custo previsto de 40 bilhões de
dólares; iv) a consequente revalorização geopolítica e geoeconômica do Caribe e da América
do Sul, como tabuleiros relevantes da competição global entre os Estados Unidos e a China, e
da competição regional destes dois países, com o Brasil.
Desta perspectiva, o recente reatamento das relações diplomáticas dos EUA com Cuba,
explicita e aprofunda esta disputa pela supremacia regional. Foi uma vitória política indiscutível
de Cuba e da América Latina, e também, do “internacionalismo liberal” de Barack Obama, que
luta para sobreviver ao seu atropelamento pelo ultraconservadorismo dos republicanos, e de
muitos dos seus próprios partidários democratas. Mas ao mesmo tempo, esta reaproximação é
inseparável da expansão econômica chinesa no Caribe e na América Central, e do anúncio do
novo “Canal da Nicarágua”, com 278 km de extensão, bem maior e mais complexo do que o
Canal do Panamá, e com a obra programada para começar em dezembro de 2014. Uma
disputa que começa no Mar do Caribe, mas se projeta e prolonga na luta pela liderança
política, econômica e estratégica da América do Sul.
Neste sentido, a reaproximação entre Cuba e os EUA contém um paradoxo e uma lição
geopolítica, sobretudo para os países que se propõem subir na escada internacional do poder
e da riqueza: uma vitória parcial, em qualquer tabuleiro do sistema provoca sempre o
aparecimento de um novo desafio estratégico ainda mais complexo do que o anterior. Neste
caso, foi uma vitória dos “povos latinos” e de certa maneira, da própria política externa
brasileira, mas esta mesma vitória aumenta a urgência do Brasil abrir seus canais de
comunicação e transporte com o Mar do Caribe e com a Bacia do Pacífico, a qualquer preço, e
por mais criticada que seja a rentabilidade econômica imediata do projeto.