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Documentário

Memórias de Aparício Branco

Um homem veterano e pioneiro colonizador da região noroeste


do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil, legou o seu nome a uma
comunidade escolar para encerrar uma história e permanecer como
marco no espírito das gerações descendentes.

Há momentos em que as pessoas devem fazer balanços sobre


a vida diante do tempo, mexer todas as pedras do destino para ver o
passado, mas poucos pensam em avaliar a própria história
percorrida, a maratona de construção de cada espaço durante a
existência.

É difícil olhar e julgar a si mesmo, listar os acertos e erros e


recordar o passado que construiu.

Mais difícil é transformar ou reparar o que não muda mais?

Na história da vida sempre há virtudes, o mérito gratificante que


acumulou as considerações, a glória e a honra daquilo que se
deixou para trás.

Na morte fica só o exemplo, nada se move, não há julgamentos


e nem dor; o futuro apenas pode contar a história da pessoa
durante o seu tempo de vida.

A história que sobra é o silêncio, não dá para dizer nada diante


da morte.

Por essa e outras razões não vale a pena queixar-se da vida,


quem viveu a maior parte de seus dias alegre, mesmo com perdas;
porque os filhos são seres do mundo, representantes imortais da
genética dos pais e donos de suas vidas.

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Cada filho toma conta de si e segue o percurso do seu caminho
transcendente do tempo histórico na sociedade em que vive.

Finalmente poucos percebem que o homem nasce dependente


e fraco, cresce e conquista o mundo, mas morre pobre, nada leva,
este é o enigma predestinado a todos, inevitavelmente.

Na velhice ao voltar no tempo com reflexões sobre o passado,


parece miragem ou ilusão ao olhar os sofrimentos ou os bons frutos
que se construiu; o que fica são as ideias e uma história, se for
registrada.

A partir deste legado tentamos relembrar uma história, a do


nosso pai.

História:

O rio Ijuí afluente do Rio Uruguai é um dos marcos da região


noroeste do Rio Grande do Sul, Brasil, com suas águas naturais,
que banha terras férteis em sua bacia; onde acolhe as cidades
ribeirinhas e arredores com generoso clima agradável das quatro
estações, sendo uma razoável condição dos povos sobreviverem em
suas margens e proximidades, optando pela prosperidade da vida.

Antecedentes:
Por volta da década de 1830, mais propriamente no distrito de
Inconfidência do município de Tupanciretã, estado do Rio Grande do
Sul, a família do casal Joaquim Manoel Branco (1824-1885) e Anna
Holsbach (1828 -1886), construíram uma família com cinco filhos:
João, Olmiro, Abílio, Júlio e Pedro.

Destes, o filho mais velho, João Branco (1886 – 1934) e Maria


José da Conceição (1890-1936), organizaram-se em família próximo
do povoado São Pedro, 2º distrito de Inconfidência criando seis
filhos, sendo: Izidro, Aparício, João de Deus, Pedro, Teodomiro e
uma irmã (falecida aos 5 anos).

Na sequência, o segundo filho de João, Aparício Branco (1911


- 1994 ) e Horizontina Prestes (1923-1999), encontraram-se em
casamente e formaram uma família, onde tiveram oito filhos:
Teobaldo, Pedro, Tereza, Ana, Valmiro, Odemar Helena, Marli e
Lenir (falecida com 08 meses de idade).

As gerações anteriores a Aparício Branco se sustentaram em


família média e grandes onde todos viveram sob um teto e

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trabalharam em prol da vida dos filhos, dando sequência na história
da descendência genética do sobrenome Branco.

Aparício Branco (30/l0/1911 – 08.06.1994),natural do


Povoado São Pedro, distrito de Independência, município de
Tupanciretã, estado do Rio Grande do Sul, Brasil.

Aparício era filho de João Branco e de Maria José da


Conceição, onde cresceu com os pais na mesma localidade e teve
cinco irmãos e uma irmã, esta faleceu aos 5 anos de idade.

A sua família era de pequenos agricultores que sobrevivia com


a produção diversificada, de produtos para alimentos e de produção
para comercialização que rendia recursos para a estrutura familiar.

Segundo informações, a família plantava boa área de alfafa,


preparava, colhia e enfardava para vender para os fazendeiros da
região, junto tinha outros produtos para comercializar, que era porco
gordo, feijão e mel.

A apicultura não baixava de 200 caixas de abelhas, segundo o


que consta, a produção acumulava estoque de alta quantidade latas
de mel de um ano para outro. Era comentado que na época da
primavera, na entrada do verão os filhos acompanhavam a maratona
da colheita do mel durante três meses. Os filhos alegavam que era
sufocante o trabalho de fazer caixas e pegar enxames de abelhas,
além carregar latas de 20 quilos para o seleiro.

A referida propriedade era próxima do Povoado São Pedro,


distrito de Inconfidência (hoje Joia), município de Tupanciretã/RS.

A área da propriedade era 12 hectares de terra e possuía


parte da área de matas nativa.

Na época não havia recursos de bancos ou auxílios da saúde


pública; não havia comunicações, nem sequer rádio.

O transporte era um automóvel no povoado e outro na sede


do distrito. O transporte efetivo era o cavalo, carroças, jardineiras,
tudo era por conta própria.

As estradas eram conservadas e abertas por moradores locais


através de mutirão. Era uma forma de auxílio gratuito que prestavam
as pessoas uns aos outros entre os membros das comunidades do
interior, em benefício de todos.

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Aparício no povoado São Pedro, distrito de Inconfidência.

Aparício desde sua mocidade acompanhou o modelo cultural


de cada época. Ele foi um contestador rebelde, para não dizer que
buscava através da dialética inovações de investir em nova
modalidade de vida, a partir de seus limites culturais.
Viveu a sua infância no isolamento do conhecimento. A escola
era uma instituição rara, e por outro lado, não houve a inciativa
familiar para conduzi-lo a uma escola, onde cresceu sem frequentar
bancos escolares.

O tempo mudou e ao descobrir o mundo, o destino levou a


força de vontade a buscar nos mecanismos das necessidades em
instâncias adversas a prática de desenvolver a habilidade de
aprender ler e escrever com a escola da vida.

Um componente da vida que levou a dedicar-se ao


aprendizado das letras foi incorporação no exército com 19 anos de
idade.

Depois de 1930, aos 19 anos, ao apresentar-se como


voluntário no 4º RCI – Regimento de Cavalaria Independente de
Santo Ângelo, para servir o exército, permaneceu durante 8 anos,
de 1930 a 1938. Ali como adulto esteve numa classe escolar e viu
seu horizonte clarear e ver o mundo de outra forma.

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Durante o percurso do exército participou da revolução de
1932, liderada pelo gaúcho Getúlio Vargas, passando pelos
sangrentos combates de Itararé, divisa de São Paulo com estado
do Paraná.

Participou ativamente de todas as patrulhas da unidade militar,


incluindo em pelotões especiais em operações de risco, como no
caso da prisão de um grupo de bandoleiro nas matas próximo de
São Paulo.

Os registros informaram que o pelotão de Cangaceiros agia


fazendo assaltos em propriedades, nas vilas e povoações em toda
região. Eles realizavam em determinados momentos invasões totais,
ou parciais, na povoação de Ourinhos, saqueando, roubando e
cometendo arbitrariedades com as pessoas, famílias e instituições
comerciais.

O 4º RCI organizou um pelotão de 20 homens de elite do


exército do qual Aparício esteve presente, onde percorreram 39 km
por dentro das matas no interior por trilhas até chegar ao local onde
se encontrava o líder cangaceiro e seu grupo de homens armados.
Usaram a armadilha da emboscada e prenderam 10 homens e três
mulheres sem disparar um tiro.

O episódio inesquecível foi o julgamento do bandoleiro por um


Conselho de Oficiais, formando por um tribunal do exército.

O líder foi condenado à morte, ato contestado por Aparício e


grande parcela de soldados. A sua execução foi realizada por uma
guarda de 10 homens voluntários, a surpresa foi a apresentação de
muitos soldados para consumar o ato.

O chefe foi executado a tiros de fuzil em cima da ponte do Rio


Paranapanema, onde o réu tombou nas águas do rio sendo levado a
desaparecer ficando apenas um fio vermelho nas ondas que sumia
ao longe, do qual Aparício assistiu de longe junto a tropa. (Livro
Memórias de um Soldado, no capitulo, A execução, p. 127 a 175)

Também participou do pelotão que representou o corpo de sua


unidade do exército na posse de Getúlio Vargas, no término do
conflito revolucionário entre estados, quando no palácio do Catete,
no Rio de Janeiro, capital do Brasil foi comemorado a vitória e posse
do presidente da República.

Foram momentos gloriosos na carreira de um soldado e


também como cidadão. Ele permaneceu oito anos no exército e deu
baixa, voltando à vida civil.

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Revisando a história podemos ver ou lembrar as pessoas
como personagens de honra na complexidade histórica de cada
época.

A formação cultural da sociedade sempre seguiu o pensamento


das pessoas da cada época. Assim, Aparício Branco refletiu a
expressão original do pensamento da vida cotidiana do seu tempo.

As lideranças influenciam na condução da vida dos grupos


sociais, sendo inesquecíveis, porque ajudaram abrir estradas no
percurso do destino da sociedade de sua época.

Aparício Branco e Horizontina Prestes

Em 1940 Aparício casou-se com Horizontina Prestes,


(11.02.1922 – 31.03.1999), ela natural do 2º distrito da
Inconfidência, município de pertencente a Santo Ângelo, Estado do
Rio Grande do Sul. Era filha de Manoel Inácio Prestes e de Ana
Leal. Ela faleceu aos 77 anos, em São Miguel do Oeste, estado de
Santa Catarina.

Aparício e Horizontina construíram uma família com oito filhos,


dos quais 04 seguiram a vida de professores, e outros, uma
enfermeira, dois agricultores e uma a vida doméstica.

Aparício e Horizontina cumpriram sua missão terrena, mesmo


com as dificuldades socioeconômica, venceram na vida como
pessoas, como família e conquistaram espaço construindo uma bela
história na vida social.

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A família de Aparício e Horizontina

Em 1941 recém-casado no povoado São Pedro, no distrito de


Inconfidência, (hoje Joia) município de Tupanciretã, com pouca
terra deixado herança dos pais, os 04 irmãos venderam e cada um
pegou seu quinhão e partiram para rumos diferentes.

Aparício e o irmão João de Deus (Jango) com as famílias foram


ao interior de Mauricio Cardozo, zona de matas virgem que estava
sendo colonizada; eles foram os primeiros moradores da localidade.

Lá construíram suas casas, estradas e pontes em mutirão com


os vizinhos para o trânsito da população. Também ajudaram na
instalação da primeira serraria para fornecer madeira beneficiada
aos habitantes da vizinhança para construírem suas casas.

Aparício liderou a convocação dos habitantes para construir a


primeira escola, onde foi o primeiro presidente da entidade, sendo o
primeiro professor José Sikalski.

Também colaborou em mutirões para construir um moinho,


uma ferraria, um salão recreativo, e outros investimento necessários
na localidade, ajudando a transformar o seu meio em um mundo
civilizado.

Em 1951 na localidade de lajeado Santos melhorou o padrão


de vida e preocupado em conseguir área maior de terra, vendeu e
comprou 37 hectares no Lajeado Esquecido, próximo da localidade
de Escola Branca, município de Horizontina, Estado do Rio Grande
do Sul.

Lá também continuou participando dos grupos sociais,


sindicatos, onde foi um dos fundadores, das consideradas primeiras
Cooperativas Rural Agrícola da região, em 1955, que
comercializava os meios de produção de uma vasta população
regional.

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Na área do lazer também assumia liderança nas atividades
esportivas da localidade das quais os filhos participavam e viviam.

Ele era um homem preocupado com o desenvolvimento social


e cultural, o que levou a encaminhar os filhos para estudos, em
internatos e ginásios da época, para se orientarem e conseguir
segurança de como buscar o melhor caminho na vida.

Em 1964 com a ditadura militar as movimentações dos órgãos


associativos foram comprometidas com a legislação do governo de
continuarem atuando livremente, houve uma paralisia nos
movimentos institucionais que tivesse aspiração política.

Aparício era um homem simples, mas sempre fora obstinado


em suas ações, sempre agiu dessa forma, tanto no trabalho, como
no cumprimento do seu dever; não recuava, era um lutador rústico,
mas astucioso em sua vida.

Nunca foi presenciado que ele cometesse uma injustiça com


quem quer que seja, nem com animais; era uma pessoa que
apresentava-se como homem sereno, consciente e justo.

No seu mundo sertanejo tosco ele assumia o que prometia,


mesmo com simplicidade. Era severo consigo mesmo, pois com
esforço aprendeu ler e escrever, observando as metas da cultura,
ele não abria mão de sua integridade e honra, assim ele era.

Nessa residência, na localidade de Escola Branca viveu


momentos de ascensão econômica com o aumento dos meios de
produção, sendo investido na suinocultura, arroz de água e
produção de soja, entre outros produtos de sustentação alimentar da
família.

Devido ao intenso trabalho em sua propriedade e


compromissos sociais com a comunidade gastou em excesso suas
energias tornando vulnerável a sua imunidade física.
Consequentemente a sua saúde foi abalada impedindo de dar
sequência em suas exaustivas atividades de costume.

O cotidiano da vida sofreu um revés com altos custos médicos


tudo por conta própria, além de diminuir a produção da renda da
família. Começou certa decadência obrigando a vender parte de
sua propriedade para salvar-se. Assim o fez.

Em março de 1970 vendeu sua propriedade em Horizontina e


comprou outra de 19 hectares no município de Braga, estado do Rio
Grande do Sul, na localidade de Barra do Gravatá. Já com idade de
tempo avançado limitou-se a viver a vida em colaboração com a
vizinhança e comunidade mais próxima.

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O Aparício continuou colaborando com escolas, sociedades
comunitárias, ele era procurado pela comunidade por ser pessoa
honesta, íntegra, justa e acessível. Dentro das possibilidades
ajudava a todos sem distinção, lutava pelos menos favorecidos,
pela sorte dos mais pobres, às vezes sacrificava-se para ajudar aos
outros.

Ao chegar à Barra do Gravatá, município de Braga/RS,


atendeu uma necessidade da Escola Estadual da Barra do Gravatá,
regularizando a situação da mesma, com a escrituração de um
hectare de terra, em forma de doação.

Durante 18 anos permaneceu na localidade de Barra do


Gravatá, somente colheu amizades e bem querência com a
população do município. Sem citar nomes levou muitas lembranças
saudáveis de pessoas e famílias do município de Braga, assim como
em todos os meios sociais que conviveu no percurso da sua vida.

Em 1989 para acompanhar três filhas que trabalhavam na


cidade de São Miguel do Oeste, estado de santa Catarina, ele na
aposentadoria vendeu a propriedade e comprou casa e passou a
residir na mesma cidade.
A história da vida que aconteceu no passado vai se
distanciando, ficando longe, muito distante, que se perde da
memória no tempo.

Em 08 de junho de 1994 fechou o livro existencial com seu


falecimento aos 82 anos, na cidade de São Miguel do Oeste estado
de Santa Catarina, restando apenas a sua história deixada aos seus
descendentes e pessoas de sua memória.

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Os filhos agradecem encarecidamente todos os que lembraram
imortalizar seu nome como símbolo guardião do tempo o nome de
uma biblioteca escolar, agradecimentos aos:

- Autoridades do município de Braga.


- Direção da escola Estadual de Barra do Gravatá.
- Professores, alunos e Pais.
- A comunidade

O passado longínquo da vida constitui o mito da morte e o


nome fica para sempre na imortalidade da alma dos filhos, no sol da
eternidade da história.

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