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Duas horas mais tarde, Joselito saiu pela mesma falha na cerca
viva pela qual entrara na fortaleza do temível Avlis Cela. Andava
devagar, as pernas arqueadas, coxas separadas; parecia que havia se
borrado novamente. Contudo, a expressão de dor e asco estampada
em seu rosto indicava que não era excremento o que lhe incomodava
sobremaneira.
A uma curta distância dos limites da propriedade, Aldebaran se
deliciava com um cachimbo metálico, expelindo pelas narinas
rosadas uma fumaça cheirosa de erva santa. Fitou o menino que se
aproximava lentamente, analisando atencioso o esgar arraigado na
face do jovem. A principio, o mentor nada disse, aguardando que o
pequeno cabaço se manifestasse. Contudo, Joselito permaneceu em
silêncio e, assim que alcançou a charrete onde Aldebaran o esperava,
apenas levou a mão ao bolso e entregou ao homem um objeto
enrolado em um tecido grosseiro.
— É ele? — indagou o adulto.
— Sim — respondeu o pequeno, de forma seca e desgostosa.
Aldebaran abriu o embrulho e fez revelar um pequeno baú
dourado de brilho jamais visto em qualquer metal existente naquele
mundo ou em outros. Um brilho brilhante que reluzia uma luz
iluminada e reluzente.
— Oh, é ele! O Baú Sagrado das Tretas Milenares. Como
conseguiu?
— Não quero falar sobre isso! — emburrado, Joselito entrou na
carruagem e se sentou.
Assim que o traseiro juvenil do menino tocou o assento, uma dor
incrivelmente intensa tomou seu orifício de assalto. O pequeno
levantou-se em um salto, gritando despudoradamente como uma
galinha nova ao sentir a lâmina da dona do galinheiro roçar-lhe o
pescoço recém-despenado e anunciando seu futuro como canja na
panela da dona de casa que cortar-lhe-ia o pescoço sem penas que
acabara de despenar com a mesma ferramenta do corte futuro.
— Ai, caralho!
— O que é isso, pequeno cabaço. Que grosseria!
— Vai se foder! Não é você que está todo arrombado!
Aldebaran riu-se, até deixou o cachimbo cair ao chão enquanto
curvava-se sobre a barriga escarnecendo prazerosamente do pobre
menino.
— Agora entendi, meu jovem. Acho que não posso mais chamá-lo
de pequeno cabaço.
O homem não conseguia conter o divertimento, o que deixava
Joselito cada vez mais furioso. Se possuísse um membro tão possante
e rijo quanto o do pai, acertaria Aldebaran na cabeça com toda sua
força. Contudo, seu pequeno órgão era inofensivo e nem mesmo
conseguia ficar ereto.
— Não tem graça!
— Calma, meu pequeno, calma. Você conseguiu o primeiro item, e
serás recompensado. A dor que lhe aflige passará.
Joselito olhou nos olhos de Aldebaran, e um ínfimo fio de
esperança tomou seu olhar observador, transmutando-se
rapidamente em algo grande e muito maior do que algo pequeno.
— Como assim, recompensado?
— Ora, pequeno ex-cabaço. A transformação em Menino Dragão
não é feita em um passe de mágica quando se termina a quinta
tarefa. A mutação é gradativa. Agora que conseguiu o Baú, passará
pelo primeiro estágio da transformação.
— Hã?
— Espere e verá.
Com o Baú Sagrado das Tretas Milenares em mãos, Aldebaran se
levantou, retirou a cartola da cabeça e depositou-a no solo.
Murmurou algumas palavras em um idioma ininteligível que o
pequeno Joselito não entendia nem tampouco conseguia
compreender como algo inteligível.
De repente, totalmente inesperado, repentino e imprevisto, uma
luz cor de equino escapulidor emanou de dentro do chapéu, tomando
todo o ambiente e perfazendo um clarão escuro e ensurdecedor. A
terra começou a tremer enquanto a luz ia se dissipando
vagarosamente. Foi então que o pequeno predestinado sentiu.
Uma formigação se apoderou de seu traseiro, seguida de uma
queimação dolorida e gostosa. Joselito sentiu seu órgão excretor se
dilatar, o orifício crescer e esquentar. Queria gritar de dor, mas logo
aquilo se transformou em algo deleitoso, como um cafuné carinhoso
nas madeixas ressecadas de sua cabeça alargada. Sua língua travou,
e foi incapaz de indagar ao seu mentor o que estava acontecendo.
Logo o pequeno sentiu sua carne expandindo e sendo moldada a
partir de seu orifício recém-violado. Era um novo membro! A
formação se alongou, rompendo o calção que vestia e se precipitando
imponente para fora.
Quando o processo chegou ao fim, tudo se aquietou, um silêncio
tranquilo e silenciosamente calmo tomou conta do ambiente. Joselito
girou o pescoço e fitou sua nova forma. De seu traseiro saía uma
cauda grossa e comprida, que se afunilava até uma ponta em forma
de seta, tão dura quanto metal ou quanto o instrumento procriador
de seu pai. Era verde e coberta por escamas brilhantes e resistentes.
O pequeno se assustou ao perceber que aquele novo órgão de seu
corpo era articulado, podendo enrolar-se, esticar-se e atacar com
força sobrenatural.
Extasiado, Joselito correu até a árvore mais próxima e desferiu
um golpe certeiro com sua nova cauda. O tronco partiu-se ao meio, e
a copa desabou ruidosa sobre o solo, levantando poeira e espalhando
folhas ressequidas pelo ar. O menino sorriu, pulou, bateu palmas
como um cabeleireiro homossexual ao atender um cliente espadaúdo
de dotes apetitosos.
— Isso é incrível! — gritou o pequeno, que já não sentia mais o
orifício arder. Na verdade, tinha um novo orifício sob a cauda,
escamoso e durinho, que podia ser usado para diversos fins sem lhe
infligir dor alguma.
— Que bom que gostou. Agora vamos entrar no veículo, pois há
um longo caminho pela frente. Ainda temos quatro tarefas a cumprir,
meu pequeno, e não há tempo a desperdiçar.
Com um sorriso espontâneo e largo no rosto, Joselito enrolou seu
novo membro ao redor da própria cintura e entrou na carruagem, tão
feliz quanto uma prostituta quando atende um idoso sem sangue a
bombear seu esquecido órgão reprodutor que só quer brincar com o
par de seios redondos e gostosos da mulher trepadeira.
— E para onde vamos agora, mestre? — indagou a criança,
alegremente e com uma expressão tão imbecil quanto a de um
participante de um reality show apresentado por um jornalista que
acha que os participantes são inteligentes quando não são
inteligentes nem por decreto.
— Agora, meu caro ex-cabaço, vamos visitar uma terra onde o sol
não bate e onde os passarinhos não piam. Vamos para o Mundo Sem
Sol de Lano.
— E qual será minha tarefa?
— Tudo ao seu tempo, criança. Agora descanse para sua próxima
tarefa, na hora certa saberá dos detalhes.
Tomado por uma esfuziante alegria infantil, Joselito apenas
assentiu. Abraçou sua longa cauda como quem se agarra a um pau
de sebo cujo cume ostenta notas de 100 reais e logo adormeceu
como um homem que acaba de ser abusado por 70 virgens
ninfomaníacas.
E aquele descanso era mais que merecido.
*
Quando acordou, o futuro Menino Dragão não encontrou
Aldebaran à sua frente. A carruagem estava parada, e pelas janelas o
pequeno só enxergava uma densa, profunda e plena escuridão.
A criança desenrolou a cauda que envolvia seu corpinho mirrado
e abriu lentamente a porta. As sombras eram tão densas que mal
enxergava um palmo à frente do órgão nasal. Caminhou por alguns
metros praticamente às cegas, apenas tateando o solo com sua cauda
dura e rija. Mas de nada adiantou, pois alguns metros à frente, bateu
de frente com uma árvore que aparentemente não estava ali 1
segundo antes.
— Ai! — o menino levou a mão à testa, sentindo o inchaço recém-
formado.
— Oh, você está aqui — o pequeno reconheceu a voz de
Aldebaran.
— Por que está tão escuro aqui?
— Chegamos ao Mundo Sem Sol de Lano.
— E não podemos ao menos acender uma lamparina?
— Não! Ainda não. Pois Lano, O Guerreiro de Petróleo, pode nos
encontrar antes da hora.
— Quem é esse Lano? E o que terei que fazer nesse lugar escuro
que nem o inferno.
— Não diga bobagens crianças, o Inferno jamais foi escuro. Lá os
rabos queimam incessantemente e as chamas flamejantes iluminam
até no lugar do corpo onde o sol não bate. Vamos voltar à carruagem,
então te explicarei o que deverá ser feito por aqui.
Os dois voltaram lentamente até o veículo. Joselito tropeçou na
própria cauda duas ou três vezes, ainda não se acostumara
plenamente à nova parte de seu corpo. Assim que entraram na
carruagem, o mentor do futuro Menino Dragão cerrou as janelas e
acendeu um tímido lampião. Fez silêncio por alguns minutos,
enquanto o pequeno ex-virgem aguardava ansiosamente pelas
explicações que ansiava.
— Veja bem, pequena criança. Vou te contar tudo o que precisa
saber, e espero que sua coragem não se esvaia após meu relato.
— Vou até o fim — afirmou o pequeno, como se fosse grande
coisa.
— Certo, então escute o que eu tenho a dizer, e não me
interrompa ou sou capaz de fazer minhas necessidades nesse seu
rabo verde que não para de balançar.
— Ok.
— Lano é o último de uma dinastia muito antiga. Por séculos viveu
com seus irmãos do clã dos Kurumins da Tia Carla. Contudo, aos
poucos todos morreram, e apenas Lano sobrou. Desde então, esta
região, onde ele nasceu e sempre viveu, perdeu gradativamente toda
e qualquer fonte de luz, até se tornar escura como o orifício mais
oculto no traseiro de um gorila marchador. Com a perda da Família,
Lano ficou amargurado, se tornando impiedoso e cruel. Para
conservar sua juventude, se alimenta de viajantes incautos que,
desavisados, atravessam por essas terras inférteis.
“Mas Lano tem uma fraqueza: adora comer doce de chuchu.
Então, tudo o que deve fazer é persuadi-lo a lhe entregar sua espada
de osso de lombo de smurf vermelho. Pegue isso — disse o homem,
tirando um embrulho prateado do bolso. — É uma barra do mais puro
e saboroso doce de chuchu de todo o mundo. Mas não deixe que o
Guerreiro de Petróleo lhe tome o doce sem antes ter a espada em
mãos. Caso contrário, ele usará em ti a força dos círculos Kurumins,
e nem mesmo se dispondo a ser sodomizado irá escapar da pujança
viril de Lano.”
Joselito engoliu em seco, fitando o próprio rabo que tremia mais
que vara verde no vendaval do dia do vento na terra das ventanias
ventosas do outro lado do mundo a oeste do lado leste do mundo.
— Como vou encontrá-lo? Eu nem mesmo sei como ele se parece!
— disse o menino, buscando coragem nos orifícios mais úmidos de
sua intimidade espírito-emocional.
— Você deverá levar este lampião — disse Aldebaran, apontando
para o lampião acesso ao seu lado, mas que há pouco não estava
acesso, pois estava apagado, assim, não emitindo qualquer tipo de
luz iluminadora que impedisse a escuridão de tomar todo o ambiente
tornando-o escuro e sem luz. — Mas só poderá acendê-lo quando
alcançar a Clareira dos Quatro.
— Como? — Joselito entendeu tanto quanto você entende as letras
das músicas daquela banda liderada por um sujeito chamado João e
de sobrenome Gordo.
— Eu apontarei a direção, então andarás por 12 quilômetros em
linha reta, sem parar para descansar ou se alimentar. Só assim
alcançará a Clareira dos Quatro. Quando lá chegar, acenda a
lamparina e se aproxime confiante e cuidadoso de Lano.
— Como saberei que é ele?
— Bem, Lano é um ser bem peculiar. Não usa roupas, tem o corpo
de músculos definidos e torneados, pele negra como churrasco bem
passado e não tem aquilo que Adão tinha mas Eva não tinha. Seu
nariz se resume a orifícios pequeninos abaixo dos olhos, que são
brancos como a neve, onde pupilas igualmente brancas como a neve
dão a impressão de que não existem, deixando ver apenas dois
globos brancos como a neve, mas que não são de neve, e podem te
enxergar muito bem, pequeno descabaçado.
— E se ele tentar me matar? Se Lano não quiser me ouvir?
— Seja rápido e mencione o doce de chuchu antes que ele lhe
parta em dois com suas espadas sagradas de osso cortante.
O pequeno engoliu em seco, como se algo desprovido de umidade
descesse por sua garganta sem ajuda de um liquido a lubrificar as
mucosas ressecadas.
— Se estiver em perigo, cante uma canção de amor, talvez ele
durma. Agora, pegue o doce a lamparina e vá. O tempo urge, e todo
segundo é como barras de ouro: vale mais que dinheiro.
Joselito fechou os olhos e fez uma oração silenciosa sem fazer
barulho, ou seja, totalmente em silêncio. Feito isso, apanhou os itens
que lhe serviriam nessa assustadora jornada e saiu da carruagem,
enrolando a nova cauda no corpo e seguindo em frente como quem
busca o fim do infinito num dia escuro de sol de domingo.
Os primeiros quilômetros foram os mais difíceis; desprovido de
calçados para não denunciar sua presença com ruídos de passadas, o
infante teve as solas perfuradas por diversos corpos estranhos, e
sentiu mais dor do que quando fora deflorado pelo gigante da
fortaleza. Com o avançar, seus pés foram ficando dormentes, e o
sangue parou de verter vertinosamente de seus pequenos membros
de cinco dedos a tocarem o solo áspero e obstaculoso. A escuridão
que lhe fazia quase perder o controle do próprio esfíncter, agora se
fazia menos incômoda, visto que os olhos se acostumaram à falta de
iluminação e já vislumbravam formas disformes em forma de
silhuetas borradas como borrões de silhuetas sem forma definida,
contudo bem formadas e distinguíveis tanto a olho nu quanto sem
utilização de aparelhos auditivos que auxiliassem o sentido visionário
dos olhos videntes.
Foi quando a calma ocasionada pela monotonia do movimento
retilíneo uniforme de sua caminhada dissipou-se, dando lugar a um
temor que fazia sua bexiga ansiar por liberar o líquido impuro
contido em seu interior molhado. Joselito avistara a Clareira dos
Quatro.
O pequeno se precipitou vagarosamente clareira adentro, com as
pernas a tremer e o pirulito a encolher. Apanhou os fósforos e, com
dificuldade e relutância, acendeu a lamparina entregue por seu
mentor. A visão lhe emudeceu, e a voz que nada dizia passou a não
dizer nada. Ao seu redor, quatro grandes árvores centenárias
ornavam a clareira de forma sombria e assustadora. Eram de copas
altas e galhos retorcidos, como monstros oriundos de intestinos de
orcs cristalizados em formas rígidas e muito feias. As folhas eram
escassas e ostentavam uma coloração fosca e amarronzada,
características de fezes tardiamente expelidas por sistemas
digestivos de pouca eficácia.
O silêncio era cortante, tão incômodo como seria se a Xuxa
cantasse uma canção da Anita em dupla com Dado Dollabela.
Contudo, a calmaria melindrosa não durou muito tempo, e logo uma
voz surpreendente irrompeu o clima sombrio de banheiro
abandonado de rodoviária do interior.
— Que és tú, estúpido idiota, que adentra meus domínios e ousa
trazer a luz ao meu reino sombrio?
— Doce de chuchu! — gritou o pequeno, expelindo por entre os
lábios tremelicantes as únicas palavras que seu pouco desenvolvido
cérebro prejudicado pelo cagaço1 que dominava seu corpo como um
macho viril domina a fêmea no cio.
— O que disseste, caro atrevido invasor forasteiro?
— Eu tenho doce de chuchu, o melhor de todo o reino. Só quero
fazer negócio com vossa santidade e já me vou embora rumo ao meu
destino distante que não é aqui.
— Quem disse que gosto de doce de chuchu?! — o guerreiro de
petróleo gritou, deixando sua voz anasalada e com um sotaque
irritante da capital carioca. — Vai pagar caro por sua ousadia,
pequeno filho de meretrizes baratas! Irei parti-lo em pedacinhos e
cozinhá-lo com pimenta do reino.
— Não, por favor... — Joselito tentou implorar, mas o guerreiro,
que até então estava oculto sob a sombra da quatro árvores anciãs,
revelou-se no cento da clareira, gritando:
— Cale a boca, criança irritante! Sua hora chegou, vou matá-lo e
depois torturá-lo até a morte! E o farei quantas vezes for preciso até
que você morra!
Joselito tremeu, o intestino trabalhou fora de hora e a bexiga
esvaziou-se como bexiga em festa de criança. O cheiro bateu nas
narinas e a mente fervilhou em temores de morte e dor.
Mãezinha, o que vou fazer?, pensava o pequeno, enquanto
tentava conter a torrente que descia ligeira abaixo na cauda. Foi
quando a mente se clareou e o ex-casto lembrou-se das orientações
de seu excêntrico mentor.
Se estiver em perigo, cante uma canção de amor, talvez ele
durma.
As palavras de Aldebaran ecoaram em sua mente e, tentando
abstrair o medo que lhe borrava as calças, pensou na música mais
1
Sinônimo de “medo do caralho”.
romântica que já ouvira. Limpou a garganta como pôde e emitiu um
gralhar irritante que insistia em acreditar tratar-se de música:
Ai modeuso,
Manda logo aí de riba, um caminhão de ripa na cacunda dela
Tomara que ela pegue tifo, pela vida sifu, e que quebre a
espinhela;
Ai modeuso,
Manda logo esse castigo, ela brigou comigo, e não mais me quer
eu
Tomara que a negócia dela encha de pereba, pra não dar
pr’outros homem o que anteonte era meu.