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ISSN 2177-2940
Diálogos (Online)
ISSN 1415-9945
(Impresso)
http://dx.doi.org/10.4025/dialogos.v21i3
Eduardo Cunha, a imprensa, a oposição e grande Para o professor Luís Felipe Miguel,
parte da opinião pública lhe prestou apoio para embora os “quatro poderes” tenham se unido
liderar o impeachment. para desferir o golpe contra o governo de Dilma
Rousseff, ele foi, em primeiro lugar, um golpe
O balcão de negócios do campo político
parlamentar. O respeito superficial às regras do
foi colocado a nu pela Operação Lava Jato e
impeachment não esconde o fato do julgamento
instaurou-se o pânico entre os políticos. Uma
ter sido “político”, como os próprios
nova “operação limpeza” contra o PT foi
parlamentares admitiam em entrevistas, ou seja,
conduzida pelo Ministério Público, Polícia
não importavam as provas. A politização do
Federal e juízes. A inexistência do contraditório
Judiciário precisa ser enfatizada, seus
legitimou ainda mais a narrativa de que o Brasil
vazamentos seletivos e foco nos processos
não funciona porque o PT rouba.
contra petistas.
Após meses de narrativa anti-PT, a
Quanto à imprensa, historicamente
opinião pública favorável ao impeachment
contra as ideologias de esquerda, é possível
estava formada. Uma pesquisa sobre o tema
perceber seu ativismo no ódio atávico ao PT e
precisa considerar a imprensa como parte ativa
do jogo político a favor dos interesses dos explícito preconceito de classe. Os mitos da
imparcialidade e da objetividade foram
conglomerados econômicos que a financiam. A
definitivamente enterrados nos últimos anos. A
manipulação da realidade se dá ao veicular o
grande imprensa cumpriu papel determinante na
projeto ideológico da burguesia como o projeto
imposição de uma agenda neoliberal, excluiu as
de toda a nação. Como os detentores do capital
vozes dissonantes e consolidou uma opinião
temem ser chamados a contribuir mais em
pública contra Dilma e o PT, os únicos
momentos de crise, a imprensa martela a
responsáveis pela corrupção no Brasil.
narrativa da necessidade do corte de direitos
sociais, gastos públicos, “reformas” trabalhista e Mas é o último capítulo, escrito por
previdenciária. Sylvia Moretsohn, que dá foco especial à atuação
da imprensa. Sua tese central é de que a mídia
Na tese da professora, como ao longo de
usou a velha tática de semear diariamente
todo o processo golpista o cidadão comum
acusações contra o PT, martelar que a crise é
jamais foi informado sobre o que tais “reformas”
culpa do governo Dilma, para colher, no final,
e cortes de gastos significavam na prática e nada
uma opinião pública favorável ao impeachment.
lhe foi dito sobre qual seria o programa
O texto destaca a atuação dos jornais, revistas
econômico do novo governo, é possível
semanais e emissoras de televisão na trama que
sustentar que se tratou de um golpe para garantir
acirrou os ânimos no país.
a ascensão da agenda derrotada nas urnas. Na
visão “do mercado”, uma vez que o povo não A imprensa foi fundamental na
soube escolher a “agenda ideal” em 2014, dane- consolidação da narrativa de que tudo foi
se a escolha que o povo fez e se golpeia a perfeitamente constitucional, ignorou os
democracia. A Constituição de 1988 é um ônus argumentos contrários e qualquer crítica ao
que precisa ser “reformada”. Por fim, sustenta golpismo foi rotulada como “narrativa petista”,
que o impeachment por uma simples questão portanto não isenta – enquanto a imprensa se
fiscal foi o meio de disciplinar o Estado segundo dizia isenta – e desqualificada. A professora
os interesses do capital, pois nunca antes um chama atenção para a necessidade de se
governo foi cobrado a cumprir metas fiscais. compreender os anos de deslegitimação que a
Tratou-se de um julgamento de ocasião e imprensa fez dos governos petistas. Como
oportunista para consolidar o Estado mínimo. Gramsci, a autora vê os jornais como “aparelhos
privados de hegemonia”, ou seja, exercem uma
250 CA Guilherme. Diálogos, v.21, n.3, (2017), 247 – 250
Referências
FREIXO, Adriano de e RODRIGUES, Thiago (orgs.).
2016, o ano do golpe. Rio de Janeiro: Oficina Raquel,
2016.