Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Introdução: este artigo aborda e problematiza usos dos resultados de avaliações externas no
trabalho pedagógico para melhorar a qualidade do ensino por equipes da gestão escolar no
ensino fundamental. Explora as relações da avaliação externa e da gestão escolar com usos dos
resultados. Método: analisa dados de alunos de quatro escolas do ensino fundamental de uma
rede municipal de ensino do estado de são paulo para exemplificar possibilidades de usos de
resultados. Conclusões: conclui que, para efetivar as funções da gestão escolar, é necessário
evidenciar elementos da realidade escolar que estão disponíveis nos resultados das avaliações
externas e socializá-los com os profissionais da escola para edificar o trabalho coletivo na dire-
ção da concretização de uma escola pública democrática. Destaca a importância da escola não
esgotar a reflexão sobre sua realidade nas avaliações externas e buscar trilhar a trajetória da
avaliação institucional, contemplando a autoavaliação.
Palavras-chave: Gestão pedagógica da escola • Avaliação externa • Qualidade do ensino
Abstract
Avaliação externa
e gestão escolar:
reflexões sobre usos
dos resultados 1
ocente do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade do Vale do Sapucaí - Univás e Doutora
D
Machado C em Educação pela Faculdade de Educação da USP. Participa do GEPAVE (Grupo de Estudos e Pesquisas em
Avaliação Educacional) na Faculdade de Educação da USP.
Introdução na ou interna, quando o objetivo é a ISSN 1982-8632
obtenção de dados para elaborar pro-
Avaliação sempre foi um tema
postas de investimentos e ações para
candente entre os pesquisadores e os
a melhoria da qualidade da educação. Revista
profissionais da educação. Durante
Avaliar é um processo que pode ter @mbienteeducação.
muito tempo o foco dos debates privi- 5(1): 70-82, jan/jun,
como integrante o levantamento siste-
legiou a avaliação que é feita dentro da 2012
mático de informações dos alunos em
escola, a avaliação da aprendizagem.
testes padronizados, mas não se esgo-
No entanto, mais recentemente, a par-
ta nele. A análise dos dados obtidos, a
tir de 1990, ganhou relevância nas
produção de juízos de valor sobre eles
discussões a avaliação externa, que é
e a utilização dos resultados alcança-
aquela gestada fora do ambiente esco-
dos na proposição e direcionamento de
lar.
ações são etapas indissociáveis do ato
Fatores diversos impulsionaram de avaliar.
esse movimento, dentre eles as ini-
No caso das redes públicas de en-
ciativas do governo federal de criação
sino, urge repercutir os resultados das
do Sistema de Avaliação da Educação
avaliações externas de forma a ala-
Básica (Saeb), em 1990, do Exame
vancar o desenvolvimento de proces-
Nacional de Cursos (ENC), em 1995
sos subsequentes por parte de profes-
e do Exame Nacional do Ensino Mé-
sores e equipes gestoras de unidades
dio (Enem), em 1998 tiveram, sem
educacionais, configurando impactos
dúvida, um papel preponderante. Na
desejáveis na escola.
esteira do governo federal alguns go-
vernos estaduais amplificaram esse
O reconhecimento da valorização
movimento com a criação de seus pró-
da etapa inicial da avaliação, o levan-
prios sistemas de avaliação do ensino
tamento, coleta e sistematização de
fundamental, como os pioneiros Cea- 71
informações, em detrimento do estí-
rá (1992), Minas Gerais (1992) e São
mulo e elucidação para a apropriação
Paulo (1996).
das etapas seguintes do processo ava-
liativo ensejaram este artigo. Nele são
O objetivo de fornecer informa-
abordados e problematizados usos dos
ções sobre o desempenho e resultados
resultados de avaliações externas por
dos sistemas educativos para gestores
equipes de gestão escolar de escolas de
educacionais e de ensino, famílias e so-
ensino fundamental, na perspectiva
ciedade aparece, dentre outros, como
de sua utilização no trabalho pedagó-
principal justificativa nos documentos
gico, visando à melhoria da qualidade
oficiais de criação das avaliações ex-
do ensino. São tomados para análise
ternas (Brasil, 1994), expressando a
alguns dados de alunos de quatro es-
importância do levantamento e coleta
colas do ensino fundamental de uma
de dados para subsidiar as ações nos
rede municipal de ensino do estado de
âmbitos da gestão da política educa-
São Paulo. Antecedendo o estudo des-
cional. De modo geral, tais avaliações
ses dados, busca-se explorar relações
concentraram-se em torno da aplica-
da avaliação externa e da gestão esco-
ção de testes para a aferição de compe-
lar com usos dos resultados.
tências e habilidades em língua portu-
guesa e matemática, para obtenção de
Sobre avaliação externa
seus resultados.
Avaliação externa é todo processo
Em que pese sua relevância para
avaliativo do desempenho das escolas Avaliação externa
os processos educacionais, sistema- e gestão escolar:
desencadeado e operacionalizado por
tizar informações sobre os sistemas reflexões sobre usos
sujeitos alheios ao cotidiano escolar. dos resultados
educativos é insuficiente para a cons-
Existem vários arranjos possíveis na
tituição de uma avaliação, seja exter- Machado C
organização dos processos das ava-
ISSN 1982-8632 liações externas e, em algumas expe- tura, e em matemática, com foco na
riências e/ou etapas2, a participação resolução de problemas (Inep, 2012). O
de profissionais das escolas avaliadas diferencial - e aqui está a inflexão - é
Revista pode ser contemplada, mas a decisão o tipo de avaliação, que é amostral na
@mbienteeducação. de implementar uma avaliação do de- Aneb (alguns alunos das séries ava-
5(1): 70-82, jan/jun,
2012
sempenho das escolas é sempre exter- liadas fazem a prova) e censitária na
na a elas. Prova Brasil (todos os alunos das sé-
ries avaliadas fazem a prova).
Comumente, é também uma ava-
liação em larga escala, abrange contin- Corolário desse diferencial, que
gente considerável de participantes e também contribuiu para essa inflexão,
pode fornecer subsídios para diversas é a geração e divulgação dos resultados
ações e políticas educacionais. Para dos desempenhos na avaliação da Pro-
Freitas (2009, p. 47), essa avaliação va Brasil por município e escola, além
dos dados já produzidos pelo Saeb (re-
é um instrumento de acompanha- sultados dos desempenhos do Brasil,
mento global de redes de ensino com regiões e unidades da Federação), que
o objetivo de traçar séries históricas não possibilitava a identificação de
do desempenho dos sistemas, que
municípios e/ou escolas nos dados dis-
permitam verificar tendências ao
longo do tempo, com a finalidade de ponibilizados pelo INEP. Nas palavras
reorientar políticas públicas. de Sousa e Lopes (2010, p. 55):
Nível Pontos na Escala Percentual (%) 2005 Percentual (%) 2007 Percentual (%) 2009
Nível 8 300 a 325 0,0 0,0 1,0
Nível 7 275 a 300 0,0 4,4 2,8
Nível 6 250 a 275 1,19 7,4 5,6
Nível 5 225 a 250 8,33 16,2 8,4
Nível 4 200 a 225 14,29 23,5 18,7
Nível 3 175 a 200 22,62 25,0 27,1
Avaliação externa
Nível 2 150 a 175 27,38 17,6 18,7 e gestão escolar:
Nível 1 125 a 150 19,05 4,4 11,2 reflexões sobre usos
dos resultados
Nível 0 125 ou menos 7,14 1,5 6,5
Machado C
Fonte: INEP
ISSN 1982-8632 e devem ser cotejadas com os desempe- com os professores, sobre os fatores
nhos dos alunos. Alcançar bons resul- que podem estar associados a essa di-
tados em detrimento da reprovação de versidade de distribuição em níveis de
Revista muitos alunos não pode ser visto como desempenho de um mesmo grupo de
@mbienteeducação. sucesso pelas escolas. Nesse sentido, é alunos que, teoricamente, é submetido
5(1): 70-82, jan/jun,
2012
fundamental a apreciação da dinâmi- ao estudo de um mesmo conteúdo, é
ca das taxas de aprovação das escolas imprescindível. A pesquisa de Franco
em cada série/ano à luz dos desempe- et al., (2007, p. 277) sobre “qualidade e
nhos dos alunos para o desvelamento equidade em educação”, que investiga
das práticas subjacentes a elas. “características escolares promotoras
de eficácia e de equidade intraescolar”,
Algum tempo depois da divulga- pode contribuir com esse desafio.
ção dos resultados do Ideb7, dos dados
da Prova Brasil e das Taxas de Apro- O boletim permite, também, in-
vação, o INEP divulga os boletins com tensificar o estudo dos níveis de de-
os dados consolidados por escola (Bra- sempenho dos alunos. No caso da Es-
sil, 2012). Neles, é possível visualizar cola Tulipa, em matemática, embora a
a distribuição dos alunos da escola nos média esteja concentrada no nível três,
níveis de desempenho alcançados. conforme Quadro 2, uma análise mais
acurada nos dados do Quadro 4, reve-
Na Escola Tulipa, por exemplo, la que a percentagem de alunos que
em matemática, os alunos estão dis- estão abaixo da média é maior do que
tribuídos em mais níveis de desempe- aqueles que estão na média. Enquanto
nho a cada aferição da Prova Brasil, 27,1% dos alunos estão no nível três, os
conforme demonstra o Quadro 4. Os níveis 0, 1 e 2 somados abarcam 36,4%
alunos que estavam no último ano do destes. Considerar apenas a média da
ensino fundamental em 2005 se con- escola no nível de desempenho pode
78 centraram em sete níveis de desempe- escamotear a desoladora realidade de
nho; em 2007 esse número subiu para uma escola que não consegue ensinar
oito e em 2009 para nove. Em que pese a todos os seus alunos.
a análise positiva de que, a cada aferi-
ção, alguns poucos alunos estão apren- Observando os dados do Quadro
dendo mais matemática, é relevante o 5, que retrata a distribuição dos alu-
destaque para a falta de equidade na nos da Escola Tulipa, em língua por-
aprendizagem dos alunos. Nesse sen- tuguesa, vemos a mesma diversidade
tido, uma investigação criteriosa, por de distribuição nos níveis de desempe-
parte da gestão escolar em conjunto nho, com exceção da aferição de 2007,
Quadro 5– D
istribuição, em percentagens, dos alunos dos anos iniciais de ensino funda-
mental em Língua Portuguesa - Escola Tulipa
Referências
82
Avaliação externa
e gestão escolar:
reflexões sobre usos
dos resultados
Machado C