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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS

GRADUAÇÃO EM LETRAS

RESENHA – OS DESAFIOS DA ESCRITA: A MEDIAÇÃO EDITORIAL

Resenha do capítulo A mediação editorial, do livro Os desafios


da escrita, de Roger Chartier. Apresentada ao curso de Letras do
CEFET-MG na disciplina Oficina de textos acadêmicos e
comunicação científica.

Professora: Bárbara Marques

Por

Natália Silva Soares

Belo Horizonte
2018
CHARTIER, Roger. Os desafios da escrita. São Paulo: Unesp, 2002.

Resenhado por Natália Silva Soares 1

Dono de uma rica e variada bibliografia sobre a história da escrita, Roger Chartier nos
apresenta em “A mediação editorial”, um dos seis capítulos do seu livro “Os desafios da
escrita”, a relação da escrita com o autor, leitor e os diversos atores envolvidos na produção,
publicação e distribuição dos textos. Leitura obrigatória para qualquer estudante de Letras que
se interesse por edição, pois aborda todo o processo editorial de uma obra.
Nesse capítulo, Chartier afirma que as formas que permitem a leitura, audição ou visão
de um texto estão diretamente ligadas à construção de seus significados. Um mesmo texto
pode variar de sentido, caso os dispositivos de sua escrita e comunicação sejam alterados.
Dessa forma, na interpretação de um texto é preciso levar em consideração dois fatores: a
época e o local de sua publicação. Ademais, também é preciso observar o suporte utilizado
para sua transmissão.
O autor ressalta que cada época possui sua própria prática de edição e, sendo assim, a
relação dos atores implicados no processo era variável e se modificou com o passar do tempo.
Ele fala das edições antigas, datadas entre a metade do século XV e início do século XIX, e
como funcionava a composição gráfica dessas obras. Os hábitos e preferências dos operários
que trabalhavam nas obras, tais como: compositores, impressores, corretores, escrivães e
professores, influenciavam o resultado final do manuscrito. Chartier destaca, ainda, o papel
importante e decisivo dos corretores, que realizam intervenções em diversos momentos no
processo editorial.
Segundo Chartier, o editor, geralmente, intervém pouco em relação às mediações
referentes ao texto. Essa tarefa fica a cargo de outros atores, considerados essenciais nessa
fase: o autor, copistas, corretores e tipógrafos. O autor menciona que no antigo regime
tipográfico, as intervenções editoriais não se dão na composição gráfica do texto, mas nas
escolhas realizadas mediante o público alvo, que designam, por exemplo, o formato do papel,
dos caracteres e das ilustrações.
Um dos casos citados nesse capítulo, que ilustram esse fato, é o do chamado “livro
azul”, que surgiu na França entre os séculos XVI e XVII. Suas características gráficas tinham
como objetivo diminuir seu custo, inclusive na forma como capítulos e parágrafos eram

1
Graduanda do curso de Letras do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Belo Horizonte,
Minas Gerais.
ordenados. Tal forma de diagramação planejava atingir um determinado público e esses livros
ficaram conhecidos por sua forma material (muitos deles eram encapados de papel azul), não
pelo seu conteúdo. “(...) Empregando caracteres usados, utilizando novamente madeiras
gravadas que haviam sido abandonadas com o triunfo do talho-doce, imprimindo num papel
ordinário, fabricado pelos papeleiros de Champagne, publicam livros e brochuras de baixo
preço, designados como ‘livros azuis’.” (CHARTIER, 2002, p. 68).
Os corretores que trabalhavam para os editores da Champagne realizavam uma série
de transformações gráficas nos livros. Algumas intervenções editoriais encurtavam o texto,
excluíam fragmentos considerados inúteis, comprimiam frases, suprimiam adjetivos e
advérbios. Desse modo, o texto era censurado “de acordo com as normas da decência e da
religião propostas pela Reforma católica” (CHARTIER, 2002, p. 70).
De acordo com Chartier, esse trabalho de adaptação pode acarretar incoerências, se
feito apressadamente e sem cuidado. Muitas vezes, as dificuldades de compreensão existem
justamente por causa das operações que visam deixar sua leitura mais fácil. Tal contradição é
apresentada devido às necessidades da edição de custos baixos que, consequentemente, têm
poucas exigências na revisão do texto.
No fim do capítulo, o autor evidencia o papel do editor que, até então, não tinha sido
muito abordado. Para ele, os editores desempenharam no início do século XIX, e
desempenham até hoje, um papel essencial na mediação cultural, pois criam as fórmulas
capazes de combinar o repertório textual e a capacidade produtiva. Uma das maiores
preocupações das pessoas da primeira modernidade (final do século XV e início do século
XIX) era salvaguardar o patrimônio escrito da humanidade. “Os editores desempenharam um
papel nessa tarefa, transformando, graças à imprensa, em objetos duráveis, multiplicados,
difundidos, o que os outros suportes do escrito não podiam salvar do efêmero” (CHARTIER,
2002, p. 76). Portanto, somente os editores podem garantir a constituição de um mercado dos
textos, bem como dos julgamentos.
“A mediação editorial” é um capítulo essencial para compreender o processo editorial
de uma obra, principalmente por se tratar da história da mediação editorial. A escrita de Roger
Chartier é repleta de detalhes, por isso requer bastante atenção por parte do leitor. Este livro é
indispensável para quem deseja seguir carreira no campo editorial.

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