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sustentabilidade local
Resumo
Trata-se de uma reflexão crítica sobre os principais elementos do projeto municipal para a favela Dique de
Vila Gilda, na cidade de Santos-SP, Brasil, trabalhados na Tese de Doutorado de Andréa Ribeiro Gomes,
sob a orientação de Khaled Ghoubar, defendida em 2004 na FAUUSP. É um diagnóstico resumido dentro
dos contextos físico-ambiental, social e econômico, formando assim uma base estruturada para as
diretrizes propostas ao exercício de redesenho do projeto original da municipalidade, com o objetivo de
propiciar a sustentabilidade local.
Palavras-chave: Favela; Urbanização de Favelas; Sustentabilidade.
Abstract
The paper is a critical study on the main elements of the "Favela do Dique de Vila Gilda" municipal slum
urbanization project, in the city of Santos, State of Sao Paulo, Brazil, carried out as a doctoratal thesis by
Andréa Ribeiro Gomes under the guidance of professor Khaled Ghoubar, and defended at FAUUSP in
2004. Consisting of a summarized diagnosis which includes the physical, environmental, social and
economics contexts, it forms a structured basis for the propositions in a re-design exercise of the
municipality's original project, aiming to achieve local sustainability.
Vale ressaltar que a consciência da importância da recuperação do manguezal para as gerações futuras,
por ser o resultado de ações implementadas a médio e longo prazo, só conseguirá ser alcançada com um
projeto específico de educação ambiental, que vise modificar os hábitos e os valores da população local,
que apresenta uma atitude não integrada ao meio ambiente natural em que vive. A busca por esta nova
postura visa ainda a sustentabilidade de ocupação de áreas ambientalmente sensíveis, e conseqüente
preservação do meio ambiente natural por uma população mais consciente da importância da natureza
para a sobrevivência dos seres humanos.
Tendo como preocupação maior a degradação do mangue, a Promotoria Pública do Meio Ambiente moveu
uma ação civil contra a Prefeitura e as concessionárias de água e energia elétrica, por terem tolerado ou
contribuído com a ocupação. No entendimento da Promotoria, estes envolvidos são co-responsáveis pela
degradação do mangue. No ano de 2002, a Promotoria do Meio Ambiente, com base num Procedimento
Preparatório de Inquérito Civil (PPIC), solicitou à equipe da COHAB-St “um relatório conclusivo das
dificuldades e possíveis soluções encontradas na área social e técnica para a execução do projeto de
modo a garantir o não crescimento da ocupação irregular e permitir a desocupação para que se possa
construir sobre elas evitando a reocupação de áreas” (Ata da reunião da equipe técnica do dia 31 de
janeiro de 2002). Este relatório originou um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC)
com o comprometimento da COHAB-St de terminar a urbanização da área em 10 anos.
Em relação à tipologia urbana de implantação das quadras, a elaboração do desenho de implantação das
casas apresenta áreas de convivência internas às
quadras, como uma maneira de fazer uma releitura dos
espaços de encontro nos becos e largos da favela. São
áreas semi-públicas que se apresentam como espaços
de uso comunitário, o que, em uma área com alto índice
de violência e atividades ilícitas, podem se configurar
em áreas paradoxalmente protegidas para esses atores
indesejados.
Em algumas das quadras mais antigas, os moradores fizeram um pedido formal à COHAB-St para o
fechamento com muros, na tentativa de se criar uma espécie de condomínio, com acesso controlado de
entrada e saída. Devido a todas as variáveis que incluem uma área condominial, incluindo sua compra por
parte dos moradores, foi resolvido, depois de várias soluções apresentadas, apenas fazer um cercamento
com uma tela de arame, sem portões, com passagens abertas do tamanho de portas, pois esta solução
não caracteriza o espaço interno da quadra como condominial (não está fechado) e procura inibir o acesso
a estranhos. Desnecessário destacar que a estética de tal solução não apresenta resultados positivos em
relação ao conjunto arquitetônico em geral, e que o uso indevido dos espaços internos às quadras
continua acontecendo dentro de um clima de imposição das lideranças do tráfico de drogas.
O acabamento externo das residências não segue um padrão estético em comum, resultando em
fachadas que os técnicos da COHAB-St denominam de “colcha de retalhos” por apresentarem vários tipos
e cores de acabamento em um único bloco.
A incorporação de uso misto às residências, não previsto pelo projeto da Cohab-ST, com comércios de
pequeno porte, é comum, principalmente, nas residências que possuem a frente voltada para a Avenida
Faria Lima, onde há um maior fluxo de veículos.
As casas sobrepostas possuem uma parede cega nas laterais, oferecendo maior liberdade de implantação
pela possibilidade de geminar os blocos. Esta forma possibilita, ainda, uma variação das plantas internas
onde a planta básica de 2 quartos, pode ser adaptada, incorporando um quarto da unidade vizinha,
resultando em uma planta de 3 quartos e outra de um quarto, sem modificação de fachada ou estrutura.
Contexto social
Em relação ao perfil dos moradores
É importante destacar que a origem dos moradores da área da Favela do Dique é, quase em sua maioria,
descendente ou migrante do estado de Pernambuco, caracterizando uma forte ligação com a cultura
nordestina em todos os seus aspectos.
Nos bolsões de maior pobreza, a renda das famílias varia entre 0 a 3 salários mínimos, sendo que as
famílias que afirmam não possuir renda vive de trabalhos temporários muito ocasionais e de favores da
comunidade. Os principais locais de trabalho se situam nas cidades de Santos e São Vicente, ficando a
área sobre a linha de divisa desses municípios.
Na área mais consolidada, ao longo da “rua de crista”, a renda dos moradores é maior, como também o
tempo de moradia na área, que em sua maioria já passa de duas gerações.
O nível escolar dos adultos é muito baixo, mas existe um esforço de manter as crianças nas escolas,
sendo baixo o número de crianças que são forçadas a trabalhar em período integral para ajudarem suas
famílias.
São equivalentes os números relativos à divisão dos sexos, sendo que a metade da população estava
em 2002 na faixa etária abaixo dos 18 anos.
Apenas 7% dos imóveis possuem uso misto comprovado, sendo que não foram levantados, em nenhuma
pesquisa, os imóveis que possuem algum tipo de geração de renda interna à residência.
Contexto econômico
Em relação ao poder aquisitivo dos moradores
A falta de poder aquisitivo da população fica explicitada quando se detalham os dois últimos
levantamentos cadastrais de 1999 e 2002:
Tab. 3.1 - Renda familiar da população Tab. 3.2 -Renda familiar da população
moradora da favela, em 1999 atendida pelo projeto, em 2002
Total de 3135 famílias Total de 349 famílias
Até 1 sm 23 % Até 1 sm 26 %
sem renda e sem informação sem renda e sem
De 1 a 3 sm 34 %
informação
De 3 a 5 sm 24 %
De 1 a 3 sm 31 %
De 5 a 10 sm 17 %
De 3 a 5 sm 24 %
Acima de 10 sm 2%
De 5 a 10 sm 16 %
Acima de 10 sm 3%
Tabelas comparativas das rendas familiares dos moradores da Favela do Dique de Vila Gilda (Santos/SP)
Através dos dados obtidos acima, conclui-se que a maioria da população, 81 %, moradora da área em
questão possui uma renda familiar de até 5 salários mínimos; variando de16 a 17 % para as famílias com
rendas entre 5 e 10 sm; e de 2 a 3 % para as famílias que recebem mais de 10 salários mínimos. Este
perfil explica em parte o fato de apenas 53 % estarem com as prestações em dia, e porque somente 66 %
do total dos moradores continuam sendo os mutuários originais.
Esta dinâmica de venda ou transferência de 34 % das habitações do projeto acontece devido a
diferentes fatores:
1- aumento das despesas com a habitação, incluindo a prestação da casa própria acrescido dos serviços
de infra-estrutura como água e luz;
2- possibilidade de um ganho rápido de capital criando uma ilusão temporária de riqueza;
3- transação de compra e venda facilitada pelos cartórios por meio do denominado “contrato de gaveta”;
4- falta de controle jurídico sobre os mutuários originais; e
5- falta de oferta de moradia para aquisição da população de classe imediatamente superior, classe
média baixa, que paga aluguel.
Considerações finais
Com o objetivo de propiciar às famílias efetivamente uma geração de renda, principal ou extraordinária, foi
que se propôs uma tese de intervenção no projeto da municipalidade, para mostrar o quanto de
potencialidade ali estava sendo desperdiçada pela ótica imediatista, limitada e conservadora que
lamentavelmente e regularmente alimenta a gestão pública dos projetos para os espaços de maior
carência social. O redesenho de todo o projeto, poderá ser incorporado nas próximas etapas do projeto
original da municipalidade, como também orientar as intervenções em áreas novas, que tem como linhas
gerais as seguintes características:
1. Os canais do manguezal, que circundam a área, não podem ser desprezados na sua potencialidade
de permitirem o transporte de produtos de pesca, induzindo assim a montagem de uma cooperativa de
pesca.
2. Maior adensamento pela verticalização da implantação, na área interna da perimetral do conjunto de
edifícios de apartamentos com 4 pavimentos sobre pilotis e 4 apartamentos por pavimento, e de
casas assobradadas na periférica Av. Faria Lima;
3. Os apartamentos têm todas as divisórias internas removíveis, com exceção do bloco do banheiro,
comportando o programa de uma sala, 2 dormitórios, lavanderia e cozinha-oficina, sendo que nesta,
através de um balcão linear que se estende por quase todo o comprimento do apartamento, se cria
um espaço adequado à produção, manuseio e estocagem de mercadorias. O pilotis permite a
previsão de espaços para o abrigo de carros, carrinhos de venda e carroças de coleta de sucata em
geral;
4. As casas assobradadas, com um programa convencional de 2 dormitórios, têm o espaço para
geração de renda, através do salão do pavimento térreo, para abrigar lojas e oficinas em geral, para
se valerem do benefício da via urbana representada pela Av. Faria Lima;
Bibliografia:
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