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A Guerra Justa Sao Tomas de Aquino e Out
A Guerra Justa Sao Tomas de Aquino e Out
A “Guerra Justa”
8029048
São Paulo
2015
SUMÁRIO
Introdução...........................................................................................3
Os Precursores.....................................................................................7
Agostinho............................................................................................9
Tomás de Aquino...............................................................................13
Conclusão...........................................................................................15
Bibliografia.........................................................................................16
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INTRODUÇÃO
OS PRECURSORES
Só se deveria recorrer à violência quando não fosse possível que as querelas fossem
resolvidas através de diálogo. Para ele haviam duas condições que tornavam a guerra justa:
que ela ocorresse por conta de uma necessidade de reparação e que ela fosse formalmente
declarada. Além disso, defendia que, uma vez proclamada, a guerra deveria ser lutada de
maneira implacável, porém honrosa. Ressaltava a importância de que os tratados fossem
respeitados honestamente e que os derrotados não sofressem crueldades (HARRER, 1918
p.28-30).
Para Cícero a lei natural é a lei eterna que rege todas as coisas e foi instituída por
Deus. O Deus que Cícero menciona é único, e é considerado o arquiteto do universo, autor
soberano de todas as coisas e superior aos deuses comuns do panteão greco-romano; embora
ele tenha nascido e morrido antes do Cristianismo ser criado e não ser adepto de nenhuma
religião monoteísta. Mas para Cícero Deus não tem a função de gerador de virtudes no
homem, que viria a ter posteriormente em Agostinho, nem muito menos tem uma relação
pessoal com ele. A lei natural seria descoberta pela razão, enquanto a lei temporal seria criada
pela razão para o bem comum dos homens em sociedade. Ao contrário da lei natural, que é
imutável e eterna, a lei temporal varia de acordo com tempo e espaço. Mas quanto mais a lei
temporal reflete a lei natural, mais justa ela é e ela só pode ser justa quando se origina da lei
natural.
Ele define dois princípios para que o jus ad bellum, ou seja, a motivação para ir à
guerra seja justa: que houvesse aviso a respeito do impasse (que no caso de Roma era feito
pelos sacerdotes conhecidos como fetiales) e que na impossibilidade de resolução a guerra
fosse formalmente declarada. No sentido de um jus in bello, ou seja, das ações durante uma
guerra, ele defende que a luta seja travada de forma implacável, porém honrosa - sem
crueldade - respeitando honestamente os tratados propostos. Em termos de jus post bellum, o
proceder posterior à guerra, ele defende que os soldados não deveriam ser culpados
individualmente pelos atos que cometeram por ordem de seu governo - ideia que seria
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Ambrósio, bispo de Milão, foi outro percursor da teoria da Guerra Justa. Ele viveu
durante o período de transição em que o cristianismo passou de religião perseguida a religião
oficial do Império Romano. Até então os pensadores cristãos se caracterizavam pelo
pacifismo, mas se fazia necessário saber como o indivíduo cristão se portaria sendo cidadão
romano em uma época de muitos conflitos e invasões bárbaras. Para ele, porém, tirar a vida de
outra pessoa não era intrinsecamente um ato ruim, pois poderia ser justificado em
determinadas circunstâncias. Suas ideias marcaram uma mudança que buscava conciliar o
pensamento cristão com a guerra (MATTOX, 2006, p. 19). Foi Ambrósio quem excomungou
o imperador Teodósio I após o massacre de 7000 pessoas em Tessalônica no ano 390 D.C.,
somente readmitindo-o depois que ele pagou meses de penitência; num episódio que marcou o
início de uma era em que o estado se submeteria à igreja.
O bispo não condenou atos de violência como o de 388 D.C., quando cristãos
incendiaram uma sinagoga, por se tratar de um ato contra infiéis; submetendo a justiça ao fato
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dos agentes pertencerem à igreja (MATTOX, 2006, p. 21). Ele foi um dos primeiros a
diferenciar a doutrina - essencialmente pacifista - apresentada nos evangelhos como sendo
individual; diferente da violência que era perpetrada coletivamente. Ambrósio estabeleceu
que, em termos de justiça, o tratamento de um inimigo deve depender proporcionalmente da
magnitude de sua ofensa - baseando-se no Velho Testamento bíblico - mas favorece que ele
seja tratado com misericórdia. Ele defendia que o clero não deveria lutar, noção que foi
retomada por Agostinho posteriormente. De fato, Ambrósio foi um mentor para Agostinho,
tendo-o batizado em Milão no ano de 387 D.C. e influenciado grandemente suas ideias,
inclusive a respeito da Guerra Justa. Ambrósio reconciliou parcialmente a moral cristã com a
teoria de guerra justa romana, enquanto Agostinho desenvolveu uma síntese total.
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Agostinho nunca separou um espaço específico em sua obra para tratar da Guerra
Justa, nem muito menos organizou sua teoria sistematicamente (MATTOX, 2006, p. 5). Ele
também não pretendia, com seus escritos, lançar bases para nenhum tipo de legislação, mas
sim formular apenas um guia ético para o soldado romano cristão de sua época. As ideias de
Agostinho sobre o assunto, porém, apesar de estarem espalhadas em diversos temas
diferentes, demonstram claramente que apesar de não ter formulado oficialmente uma teoria
sistematizada ele a tinha em sua mente, como sua própria forma de pensar; uma teoria não
escrita que os estudiosos cuidaram de desvendar após sua morte através de seus escritos,
sobretudo em “A Cidade de Deus”. Tão consistente é esta sua teoria que ele passou a ser
considerado tradicionalmente como o pai do que se desenvolveu como a teoria da Guerra
Justa no ocidente (MATTOX, 2006, p.1) e seu principal autor.
Enquanto o plano das coisas terrenas é corruptível e imperfeito, o plano das coisas
espirituais é perfeito e virtuoso. O plano terreno seria a “cidade dos homens”, governado pelas
leis naturais e temporais - assim como em Cícero - e o plano espiritual seria a “cidade de
Deus”, governado pela lei eterna. Por conta da cidade dos homens ser imperfeita,
inevitavelmente existiriam guerras; mas que se feitas por causas justas poderiam ser um ato de
amor: Agostinho compara a Guerra Justa a um pai corrigindo seu filho. O verdadeiro pecado
na guerra não estaria na morte de um inimigo em si, mas sim no amor pela violência,
crueldade vingativa e ganância por poder.
[...] atinge a síntese entre os valores romanos e cristãos associados à guerra de uma forma que
reconhece a guerra como um instrumento legítimo de política nacional que, ainda que inferior
aos ideais perfeitos da cristandade, é um que os cristãos não podem evitar totalmente e com que
eles devem de alguma forma aprender a lidar (Mattox, 2006, tradução nossa1).
A Guerra Justa seria para a restituição não somente material, mas também moral a
uma nação lesada, reiterando a necessidade de uma causa justa em sua famosa definição:
Como regra, guerras justas são apenas aquelas que vingam ofensas, quando uma nação ou
estado contra quem se está sendo feita guerra negligencia a punição de algum malfeito dos
seus cidadãos ou devolver algo que foi tomado de forma errada (AGOSTINHO em
“Resposta a Fausto o Maniqueu” 22.75, NPNF IV 2001, citado em Mattox, 2006, tradução
nossa2).
Embora esta citação seja a primeira nova definição de guerra justa desde Cícero, ela
não engloba todas as justificativas dele. Agostinho considerava que alguns prejuízos não
poderiam ser ressarcidos e portanto a guerra poderia servir como uma punição análoga à da lei
privada - a punição moral. Desta forma ele excede a ideia de Cícero da guerra como apenas
um meio de reestabelecimento do status quo ante bellum. Ainda assim, guerra só deveria ser
feita por necessidade, como última alternativa; tendo sempre como objetivo final a paz - a paz
terrena, que não é perfeita como a paz celestial, mas se trata de uma concordância entre os
homens. Se a paz puder ser obtida sem confrontos armados, melhor ainda (MATTOX, 2006,
p.60).
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As a rule just wars are defined as those which avenge injuries, if some nation or state against whom one is
waging war has neglected to punish a wrong committed by its citizens, or to return something that was
wrongfully taken.
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Baseado nas suas ideias de distinção entre as ações coletivas do estado e as dos
cidadãos individualmente, Agostinho estabelece o seu conceito de distinção no jus in bello. O
poder de um rei, a pena de morte de um juiz, os capuzes dos executores e as armas dos
soldados tem em comum serem deveres que podem ser justificativas legais e morais para tirar
vidas (AGOSTINHO, Carta 156.6.16, citada em Mattox, 2006). Ele condena sem ressalvas a
participação de clérigos e civis em guerras, mas inocenta completamente os soldados da
violência que eles exercem durante elas, como forma de obediência devida ao estado -
contanto que a ação cometida tenha sentido claro em relação ao objetivo final, que é a
restauração da paz; mas ainda assim a misericórdia é preferível.
A ordem natural que conduz à paz entre os mortais demanda que o poder de declarar e
deliberar a respeito da guerra deve estar nas mãos daqueles que detém a autoridade máxima
(Agostinho, Contra Faust, xxii, 75, citado em Summa Theologica, p.1814, tradução nossa3).
Em segundo lugar, é necessária uma causa justa, ou seja, que aqueles que serão
atacados mereçam punição por conta de alguma injúria que cometeram. Uma guerra justa
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The natural order conductive to peace among mortals demands that the power to declare and counsel war
should be in the hands of those who hold the supreme authority.
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seria uma guerra que conserta malfeitos de seus integrantes, quando uma nação precisa ser
punida por se recusar a consertá-los, ou devolver aquilo que foi tomado injustamente. Em
terceiro lugar é necessário que os beligerantes ajam movidos por uma intenção certa,
desejando conseguir o bem e evitar o mal. Tomás novamente retoma palavras de Agostinho
quando este diz que as guerras justas são as que tem como objetivo a paz ao invés de ganância
e crueldade. Ele então condena a má condução no jus in bello de uma guerra, ainda que esta
tenha um jus ad bellum justo tendo sido, por exemplo, declarada por uma autoridade legítima
e por uma causa justa. Ele cita Agostinho condenando a paixão pela violência, pela rebeldia e
a ganância por poder; valorizando o menor uso da violência e a busca pela paz.
CONCLUSÃO
No estudo dos primeiros pensadores da teoria da guerra justa no ocidente cristão fica
evidente a sua importância para a forma com que as nações ocidentais realizaram guerras
desde aqueles tempos até os dias atuais. A obra de Agostinho foi verdadeiramente marcante
quando fez uma síntese dos valores romanos e cristãos numa época em que o cristianismo
ascendia como religião hegemônica do império e o debate entre as ações do estado e os
valores cristãos se intensificava. Sua obra monumental foi um marco do pensamento
filosófico no ocidente, vindo a influenciar muitos pensadores futuros.
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