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Caderno Virtual de Turismo

ISSN: 1677-6976 Vol. 8, N° 2 (2008)

Programa de Regionalização do Turismo e sua


aplicação em comunidades autóctones: o caso de
Poço Redondo e Canindé do São Francisco - SE
Luciana Rodrigues de Morais e Silva (lucianatur@globo.com)*
José Roberto de Lima Andrade (roblima@uol.com.br)**

Resumo
O turismo enquanto atividade econômica pode ser considerado como uma alternativa para o
desenvolvimento das localidades detentoras de potencial turístico com baixo índice de desen-
volvimento econômico. No entanto, as políticas públicas direcionadas para a atividade turística
têm deixado à margem à população dos destinos trabalhados. Poço Redondo e Canindé do São
Francisco, municípios no semi-árido sergipano, vêm sofrendo um processo de exploração turística
de modelo não sustentável. O turismo praticado nessa região e comercializado por agências
de turismo em Aracaju, capital sergipana, não atende aos anseios das comunidades aqui es-
tudadas. Buscou-se então, analisar a percepção dos gestores públicos e da comunidade local
acerca das políticas públicas desenvolvidas pelos órgãos responsáveis pela atividade em âmbito
nacional, estadual e local. Para tanto, foram realizadas entrevistas com os respectivos atores
sociais. Obtendo-se os resultados de que os municípios estudados não possuem uma política de
turismo de gestão integrada e participativa, os produtos regionais não estão agregando valor
ao produto turístico, ocasionando o esvaziamento da experiência turística, a renda gerada pelo
turismo encontra-se centralizada. Concluindo-se que a atividade turística tal qual como ocorre
atualmente não gera os benefícios econômicos para as comunidades locais, configurando-se
numa atividade não sustentável com ausência de políticas públicas eficazes.

Palavras-chave: Políticas públicas; sustentabilidade; desenvolvimento turístico.

Abstract
The Tourism while economic activity can be considered as an alternative for the development of
the detector’s localities of tourist potential with low index of economic development. However,
the directed public politics for the tourist activity have left to the edge to the population of the
worked destinations. Well Redondo and Canindé of the San Francisco, cities in the half-barren
sergipano come suffering a process from tourist exploration of not sustainable model. The Tour-
ism practiced in this e region commercialized by Travel agencies in Aracaju, sergipana capital,
does not take care of to the yearnings of the communities studied here. One searched then, to
analyze the perception of the public managers and the local community concerning the public
politics developed by the managing agencies of the activity in national and local scope. For
interviews with the respective social actors had been in such a way carried through. Getting the
results of that the studied cities do not possess one politics of tourism of integrated and participa-
tive management, the regional products are not adding value to the tourist product, causing
the of the tourist experience, the income generated for the tourism meet centered. Concluding
itself that the tourist activity such which I eat occurs currently does not generate the economic
benefits for the local communities, configuring itself in a not sustainable activity with absence of
efficient public politics.

Key-words: Public politics; sustentability; tourist development.

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Introdução e a formarem Roteiros Integrados, ofertando


um conjunto de produtos turísticos.
O turismo enquanto atividade econômica
surge em determinadas localidades de ma- O Plano tem ainda como princípios orienta-

neira desarticulada, sem nenhuma preocupa- dores para o desenvolvimento da atividade o

ção com o seu planejamento, numa atitude aumento da competitividade do setor, o seu

imediatista em busca dos lucros que em curto impacto na melhoria das condições de vida da

prazo a atividade pode gerar. Nesse processo população, a descentralização das decisões e

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de transformação do lugar, onde todo o espa- o respeito ao meio ambiente, obtendo assim,

ço passa a ser consumido como produto, não um crescimento pautado nos padrões éticos e

raro, as comunidades que pertencem a essas nos pressupostos básicos da sustentabilidade.

localidades são marginalizadas, no sentido de Existe uma necessidade urgente de en-

que, em sua grande maioria, encontram-se contrar alternativas de desenvolvimento local

ausentes das discussões que tratam do de- regional, o turismo, poderá, se bem planejado,

senvolvimento do turismo na localidade que vir a se tornar um vetor desse desenvolvimento,

teoricamente lhes pertence. desencadeando o aproveitamento das forças


locais, provocando o desenvolvimento de
Em 2003, com a criação do Ministério do
dentro para fora e de baixo para cima com a
Turismo – MTUR, foi lançado o Plano Nacional
participação de todos os interessados, comu-
de Turismo – PNT, tendo como um dos objetivos
nidade local, poder público, iniciativa privada
principais reduzir as desigualdades regionais.
e terceiro setor.
Segundo Sansolo & Cruz (2003), “esse novo
Dentro do PNT, foi criado o Programa de
status adquirido pelo turismo na administração
Regionalização do Turismo, que admite:
pública federal nada mais é do que um reflexo
da reconhecida e crescente importância que “O modelo de gestão adotado pelo
tem esta atividade hoje, sobretudo no plano Ministério do Turismo está voltado para
o interior dos municípios do Brasil, para
econômico, por sua capacidade de dinamizar
as suas riquezas ambientais, materiais e
diversos setores produtivos, gerar riqueza, renda patrimoniais, e para as suas populações,
e empregos...” em contraponto aos prejuízos impostos
pela modernização. Esse propósito
O Plano busca ainda, segundo o MTUR, a
pode ser alcançado pela gestão com-
desconcentração da renda por meio da re- partilhada, pelo planejamento nacional
gionalização, interiorização e segmentação construído a partir das especificidades
locais com enfoque no desenvolvimento
da atividade turística, para que o turismo se Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade
regional. Para tanto, devem ser criadas
transforme em um fator de construção da ci-
condições que propiciem a contribuição
dadania e de integração social. Dentre outros e a participação das várias esferas da
objetivos, o Plano pretende transformar o turis- sociedade, de modo a se chegar à ofer-
ta de produtos e serviços diversificados,
mo em fonte geradora de novos empregos e
qualificados e exigidos pelos mercados
ocupações, proporcionando uma distribuição
nacional e internacional”. (MINISTÉRIO
mais justa e melhorando a qualidade de vida DO TURISMO, 2004)
das comunidades. O Programa, que foi lançado em abril de
* Possui mestrado em Desenvolvimento e Como desafio, o MTUR precisa conceber
Meio Ambiente pela Universidade Federal
2004 pelo Governo Federal, está apresentando
de Sergipe e graduação em Turismo pela
Universidade Tiradentes.
um modelo de gestão pública descentrali- novos roteiros turísticos do país e organizando os

** Bacharelado em Economia, mestrado zada e participativa, atingindo o município já existentes, propiciando a ampliação da oferta
em Desenvolvimento Econômico pela
Universidade Federal do Paraná e doutor onde efetivamente o turismo acontece. Para turística brasileira e o desenvolvimento de, no
em Turismo e Lazer pela USP. Professor do
mestrado em Desenvolvimento e Meio tanto, os municípios estão sendo incentivados mínimo, três produtos de qualidade em cada
Ambiente na Universidade Federal de
Sergipe. a criarem os Conselhos Municipais de Turismo estado e no Distrito Federal.

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A roteirização é uma forma de organizar Dentro da política de descentralização surge


e integrar a oferta turística brasileira, possibi- o incentivo para a elaboração de roteiros
litando o aumento das taxas de visitação, de integrados a fim de oferecer um conjunto de
permanência e gasto médio do turista nos produtos turísticos que se complementam den-

destinos brasileiros; gerando assim, uma melhor tro de uma diversidade regional, impulsionando

distribuição de renda, a criação e a ampliação assim o desenvolvimento local e regional de

de postos de trabalho, a promoção da inclusão forma integrada.

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social e a redução das desigualdades regionais O desenvolvimento econômico local é uma
e sociais. estratégia de desenvolvimento pela qual a

Numa tentativa anterior de regionalização comunidade assume novo papel: o de comu-

e descentralização dos projetos turísticos, foi nidade demandante, do qual emerge como

criado em 1992 o Programa Nacional de Mu- agente, protagonista e empreendedora, com

nicipalização do Turismo – PNMT. O referido autonomia e independência.

Programa propunha a conciliação do cresci- Segundo análise do Plano de Desenvolvi-

mento econômico com a preservação e con- mento Integrado do Turismo Sustentável – PDITS

servação do patrimônio ambiental, histórico e (2005) −, desde 2001 a estratégia de desen-

cultural, assim como a participação e gestão volvimento do turismo no estado de Sergipe

da comunidade no Plano Municipal de Desen- está centrada na regionalização, buscando a

volvimento do Turismo Sustentável – PDTUR. A adoção de um modelo de gestão de política

falta de êxito em algumas localidades sem que pública descentralizada, coordenada e inte-

as metas fossem inteiramente cumpridas foram grada, baseada nos princípios da flexibilidade,

assim explicitadas por Silveira (1999): articulação, mobilização, cooperação interse-


torial e institucional e sinergia de decisões.
“...a questão da descentralização já
suscitou muitas críticas de alguns espe- Com vários pontos em comum com o PNT
cialistas, no que diz respeito a outros e com o Programa de Regionalização do Turis-
programas da administração pública, mo, o Plano Estratégico do Turismo em Sergipe
como na educação, na saúde e outros.
pretende ainda: qualificar o produto turístico;
A crítica principal recai sobre o caráter
estruturar os destinos turísticos; aumentar a taxa
mecânico e aleatório da descentraliza-
ção, ao não levar em conta a hetero- de permanência e gasto médio do turista.
geneidade social, cultural e econômica Para fins de planejamento, Sergipe foi divi-
do território nacional, um dos motivos
dido em cinco regiões turísticas denominadas
que dificultaria o estabelecimento de
pólos, que foram assim estabelecidos: Pólo Cos-
Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade
critérios para articular a descentralização
de recursos e de poder”. ta dos Coqueirais, Pólo do Velho Chico, Pólo
Entre Rios, Pólo das Serras e Pólo dos Tabuleiros.
Programa de Regionalização e Cada pólo foi identificado e estabelecido à
Desenvolvimento Turístico Local sua vocação turística.
em Sergipe Com o objetivo de identificar a efetiva atua-
Dentro da proposta do Plano Nacional, fica ção e possíveis mudanças no cenário turístico
caracterizada a busca pela desconcentração da região dos Lagos de Xingó, ocasionadas
de renda, da regionalização do turismo, a pela atuação do MTUR, através do PNT e do
busca pela melhoria da qualidade de vida Programa de Regionalização do Turismo e
das comunidades receptoras, valorizando a ainda numa esfera regional o Plano Estratégico
identidade cultural das mesmas, assim como do Turismo em Sergipe, buscou-se através da
efetivar as parcerias entre agentes públicos e realização de pesquisa junto às comunidades
privados baseado na gestão descentralizada. dos municípios de Poço Redondo e Canindé

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do São Francisco, estes inseridos na região dos a história do cangaço, hoje conhecida inter-
Lagos de Xingó e no Pólo do Velho Chico, o nacionalmente, tem presença marcante na
reflexo das ações dos referidos Planos. localidade. A Grota do Angico, local de morte

Poço Redondo está localizado no semi-árido de Lampião e seu bando, tem recebido visitas

do Nordeste, especificamente na micro-região de estudiosos, pesquisadores e admiradores

do sertão do São Francisco, na mesorregião do de todo o mundo, principalmente no dia 28

sertão sergipano, distante 186 km da capital de julho, data da celebração da missa pela
morte dos cangaceiros supracitados.

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sergipana, Aracaju.

O município no Alto Sertão sergipano tem Canindé do São Francisco, distante 23 km de

se revelado um rico e promissor celeiro de ar- Poço Redondo, está localizado na microrregião

tistas populares, especialmente no campo do do sertão do São Francisco e na mesorregião

artesanato. Além das tradicionais rendeiras de do sertão sergipano, distante 213 km da capital

bilro, bordadeiras em ponto-de-cruz, exímias Aracaju.

doceiras que transformam cabeças-de-frade Entre os municípios do estado de Sergipe,


em apetitosas cocadas, existe ainda o trabalho além da capital, Canindé é o que recebe o
de mestres que confeccionam em couro e maior número de turistas (Tabela 1), visto sua di-
madeira finos artefatos. versidade e riqueza natural, histórica e arqueo-

De acordo com Vieira (2000, p.67), “o lógica. São 56 sítios arqueológicos, sendo 48 a

patrimônio histórico e cultural, bem como o céu aberto e 19 de registro gráfico, perfazendo

natural de Poço Redondo é diversificado e um universo de aproximadamente 32 mil pe-

o aproveitamento do seu potencial como ças classificadas em cerâmica, líticos, ossos

atrativo turístico merece atenção, de maneira faunísticos, blocos de fogueiras, esqueletos,

especial por se constituírem, também, em po- ossos humanos e dentes (SEBRAE, 2002). Entre

tencialidades de geração de emprego e renda os principais atrativos turísticos do município,

para uma população predominantemente destacam-se o Museu Arqueológico de Xingó

muito pobre”. − MAX, a Hidrelétrica de Xingó, o Projeto de

O turismo em uma comunidade se ca- Irrigação Califórnia, a Trilha do Cangaço, as

racteriza pela oferta de pelo menos cinco pinturas rupestres na Fazenda Mundo Novo e

elementos: atrativos, serviços, infra-estrutura, o Cânion do São Francisco.

comunidades e turistas, que atuam de forma Ao represar o rio São Francisco e utilizar a
interrelacionada, objetivando gerar os be- força hídrica para mover as turbinas e gerar
nefícios desejados. Dentro da comunidade energia, a Usina Hidrelétrica de Xingó – a ter- Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade

incluem-se vários segmentos da sociedade ceira maior do país, responsável pelo abasteci-
que podem beneficiar-se do turismo. Os mais mento de 10 milhões de habitantes no Nordeste
envolvidos, e também responsáveis pelo seu – gerou diversos impactos ao meio ambiente
sucesso, são os moradores locais (quando in- e às populações ribeirinhas. Porém, acabou
seridos no processo), os proprietários (de terras criando uma imensidão de águas verdes e
e estabelecimentos comerciais) e o governo cristalinas, e agora, além de produzir energia,
local. Todos possuem diferentes formas de agir desencadeou o surgimento da atividade tu-
para o desenvolvimento do turismo e diferentes rística que poderá abrir perspectivas de dias
formas de se beneficiar dele. Porém, o principal melhores para aquela região.
benefício de comum alcance é a melhoria da O marco de início da atividade turística na
qualidade de vida da comunidade. região dos lagos de Xingó foi a instalação de
O município de Poço Redondo possui um um restaurante flutuante na beira da represa,
potencial turístico cultural de grande valor, há 10 anos, servindo iguarias regionais como

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Tabela 1 − Roteiros turísticos no estado de Sergipe e volume de visitantes, 2002-2005.

ORDEM DE VISITANTES 20011 VISITANTES 20052


PREFERÊNCIA
DESTINO % sobre total % sobre total
Pessoas Pessoas
turista pacote turista pacote
2002 2005 ano3 ano3
Aracaju Aracaju

1 2 Mangue Seco 35 14.000 30 36.000

2 4 Foz do rio S. Fco 20 8.000 20 24.000

1 Xingó 20 8.000 35 42.000

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3 5 Costa dos manguezais 15 6.000 5 6.000

4 3 Cidades Históricas 10 4.000 10 12.000

* 2002: SETUR
** 2005: Agências Receptivas em Aracaju
*** Valores estimados.
Fonte: Relatório PDITS – 2005.

o pitu (crustáceo característico das águas do em feiras e eventos de natureza turística ou


rio São Francisco). A reboque do restaurante, não em outras localidades, raramente em
surgiu a primeira embarcação (catamarã) seus municípios, o que conota a não gera-
para realizar passeios com os turistas no lago ção de renda e não circulação da moeda
de Xingó. Hoje, já são dois catamarãs e uma indo de encontro às premissas do Programa
escuna, com capacidade entre 60 e 190 pas- de Regionalização;
sageiros cada. Após a conclusão das obras • As comunidades estudadas identificam a
da Hidrelétrica, a Companhia Hidrelétrica do necessidade da implantação de um centro
São Francisco − CHESF − começou a promover cultural onde possam expor seu artesanato
alternativas para incentivar o desenvolvimento e suas manifestações artísticas e culturais,
econômico e compensar os impactos causa- sendo essa uma solução em curto prazo
dos à localidade. para problemas pré-existentes como a
Diante do exposto, surge a questão norte- falta de circulação de moeda e a falta
adora deste estudo, como as políticas públi- de envolvimento da comunidade com a
cas nas esferas federal, estadual e municipal atividade turística;
estão trabalhando no desenvolvimento da • O grau de conhecimento dessas duas co-
atividade turística nesses dois municípios. Para munidades com relação ao Programa de
tanto, foram realizadas visitas in loco, estudos Regionalização do Turismo é ínfimo, não Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade

de documentos que pudessem trazer a luz à refletindo o discurso e os princípios que


realidade turística dos municípios pesquisados, regem o Plano Nacional de Turismo e o
entrevistas com moradores dos municípios, próprio Programa de Regionalização; a falta
bem como com gestores públicos e privados de conhecimento com relação às políticas
a fim de identificar os reflexos dessas políticas públicas voltadas para a atividade turística
nestes destinos. é notória, tendo em vista que nem mesmo o
Em primeira instância, pode-se observar, de gestor público de Poço Redondo conhece
acordo com os dados adquiridos na pesquisa, o Programa;
que: • Já em Canindé a gestão pública encontra-
• Os benefícios advindos da atividade turística se mais envolvida com as ações do MTUR e,
atingem um número incipiente de mora- conseqüentemente, com o Programa de
dores dos dois municípios; esses benefícios Regionalização, tendo enviado propostas
surgem com a venda de peças artesanais que seguem os pressupostos do Programa.

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A população de Canindé encontra-se no pesquisa a fim de quantificar e qualificar os


mesmo patamar da população de Poço turistas que visitam a região, dificultando a
Redondo, não possuindo conhecimento identificação da demanda turística;
a respeito deste Programa, configurando- • Os Conselhos Municipais de Turismo são
se na marginalização das populações no inexistentes nos dois municípios, configu-
tocante à tomada de decisões em ações rando-se o não atendimento às demandas
voltadas para o desenvolvimento da ati- do Programa de Regionalização do MTUR,
vidade nos espaços já comercializados

Programa de Regionalização do Turismo e sua aplicação em comunidades autóctones: o caso de Poço Redondo e Canindé do São Francisco - SE
distanciando as localidades do desenvol-
turisticamente; vimento integrado sustentável, premissa
• A falta de estrutura dos dois municípios para básica do referido Programa;
atrair e manter os turistas nas localidades
aparece como maior dificultador para o Considerações finais
desenvolvimento da atividade: falta sinaliza- O modelo de exploração turística tal como
ção, melhoria das rodovias de acesso, falta ocorre atualmente na área em estudo não
de mão-de-obra qualificada, ausência de contempla os princípios da sustentabilidade
interesse para a integração do roteiro com principalmente econômica e cultural dos mu-
os municípios formadores do Pólo do Velho nicípios de Poço Redondo e Canindé do São
Chico, falta de material informativo, postos
Francisco. O turismo ocorre nessas localidades
de informações;
de forma pontual na Grota do Angico e no
• Em Canindé, nos últimos 3 anos, o cresci- Cânion do São Francisco, respectivamente. Os
mento do fluxo turístico (no cânion de Xingó) turistas, em seu maior número, não permane-
foi de quase 300%, passando de 20 mil em cem na região, hospedando-se em Aracaju,
2003 para 50 mil visitantes em 2006. Porém, utilizando-se dos serviços das agências de
o crescimento da demanda não está sendo receptivo da capital, o que ocasiona a não
acompanhado pelo aumento da oferta de circulação da receita do turismo para as co-
empregos e nem pela circulação da renda munidades locais.
no município, ferindo o princípio do Progra-
Para que o turismo se transforme em um
ma, que rege a melhoria da qualidade de
instrumento facilitador para a melhoria da
vida da população local;
qualidade de vida da população, torna-se
• A cultura e os produtos locais não estão necessário a implementação de alternativas
agregando valor ao produto turístico, tendo para que o turista aumente o tempo médio
em vista a baixa permanência dos turistas de permanência na localidade, ocasionando Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade

nas localidades, onde persiste o turismo o aumento do gasto desse turista, agregando
do bate-volta, contrariando o Programa, os produtos locais, como artesanato, culinária
que diz que os produtos turísticos comer- e cultura ao produto turístico, evitando assim o
cializados deverão valorizar a identidade esvaziamento da experiência turística.
cultural;
O turismo, para ser qualificado como sus-
• A renda encontra-se concentrada com tentável, necessita ter sustentabilidade eco-
alguns empresários residentes em Canindé nômica, política, social, cultural e ambiental. O
e com as Agências de Turismo Receptivo que foi observado e constatado neste estudo
em Aracaju; os empregos gerados pela no decorrer da pesquisa de campo, é que o
atividade não correspondem à expectativa turismo não atende a nenhum dos requisitos
das comunidades, configurando-se na cen- acima mencionados, pois a renda não circula
tralização da renda gerada pelo turismo; nos municípios, não existe uma política centra-
• Os municípios não realizam nenhum tipo de da na integração dos roteiros para que haja um

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melhor aproveitamento das potencialidades, renda para a localidade. O município de Poço


as comunidades encontram-se à margem dos Redondo conta com um Departamento de
processos decisórios, e por falta de alternativas Turismo, que tem em seu quadro de funcioná-
terminam por explorar o meio ambiente de rios apenas a própria diretora; a estrutura física
maneira inadequada para sobreviver. de funcionamento desta diretoria é precária.

O planejamento da atividade turística para Não existem postos de informações turísticas e

regiões sensíveis como o semi-árido sergipano nem um centro onde os artesãos do município
possam expor e comercializar os seus produtos.

Programa de Regionalização do Turismo e sua aplicação em comunidades autóctones: o caso de Poço Redondo e Canindé do São Francisco - SE
torna-se de fundamental importância, tendo
em vista que esta pode ser uma solução para Em Canindé, a estrutura de funcionamento da

os vários problemas que a população tem em Secretaria de Turismo encontra-se em melho-

decorrência das fortes secas que atingem a res condições. Existe um prédio destinado ao

região. Através da utilização de suas potencia- funcionamento dessa secretaria e o quadro

lidades com ações planejadas e integradas, funcional conta com 27 pessoas, que traba-

o sertão sergipano será capaz de vencer suas lham com a cultura e o turismo da localidade.

limitações socioculturais e ambientais, alcan- A Secretaria está em maior integração com

çando melhores níveis de qualidade de vida a realidade da Política Nacional de Turismo,

para a população. configuradas em 15 propostas enviadas para o


MTUR, dentro do Programa de Regionalização
Fica evidenciada a vocação turística nos
para melhorias da infra-estrutura do município.
dois municípios estudados, cada um com suas
O material de divulgação é composto por
particularidades. Poço Redondo, detentor de
folders, cartões postais, cartazes e banners.
uma riqueza cultural, com sua história entrela-
Canindé tem participado de feiras e eventos
çada com a história do cangaço, suas crenças,
nacionais e internacionais.
sua cultura, a culinária e o artesanato, com
presença marcante em todo o município. Tem Apesar da região dos Lagos de Xingó, que

como atrativo principal a Grota do Angico, envolve os municípios de Poço Redondo e

que vem sendo explorado pelos municípios Canindé, receber um número considerável

vizinhos, Piranhas em Alagoas e Canindé em de turistas e aparecer como o primeiro des-

Sergipe. Canindé, que possui uma estrutura tino mais procurado do estado de Sergipe, a

mais desenvolvida, contando com atrativos comunidade local não tem recebido os bene-

naturais e artificiais que, ao longo dos últimos 10 fícios que o turismo é capaz de gerar. Um dos

anos, têm atraído pessoas de todos os lugares principais motivos é a falta de permanência

do mundo, também tem em sua história fatos do turista na região, praticando o turismo de Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade

marcantes com a passagem dos cangaceiros “bate-volta”; o mesmo não tem oportunidade
pela região. Considerando-se esse potencial, de entrar em contato com os costumes locais e
trabalhando-o de forma integrada entre esses consumir o que a comunidade tem para ofere-
dois municípios de acordo com o que rege o cer, a exemplo do artesanato que é bastante
Programa de Regionalização do MTUR, os ga- encontrado na região. A comunidade percebe
nhos para a comunidade de um modo geral a movimentação turística, identifica quais as
seriam mais significativos, tendo em vista a épocas em que mais chegam visitantes, mas
maior permanência do turista na localidade. não tira nenhum proveito desse movimento,

Os gestores públicos de Poço Redondo por não estar inserida nas tomadas de decisões

são conhecedores do potencial turístico do inerentes ao setor.

seu município; não existe, porém, uma polí- As dificuldades apontadas pelo MTUR quan-
tica direcionada para um desenvolvimento do realizou o diagnóstico sobre os avanços ob-
sustentável do turismo, gerando ocupação e tidos pelo turismo no Brasil, revelam problemas

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que atingem todas as regiões do país: ausência Referências bibliográficas


de avaliação de resultados, insuficiência de
MTUR. Plano Nacional de Turismo: diretrizes,
dados e pesquisas sobre turismo, mão-de-obra
metas e programas 2003-2007. Brasília, 2004.
não qualificada, baixo controle de qualidade
Disponível em: <http://www.embratur.gov.
na prestação dos serviços, oferta de crédito
br>. Acesso em: 12 nov. 2006.
insuficiente para o setor, deficiência na ges-
PDITS. Plano de Desenvolvimento Integrado
tão e operacionalização da infra-estrutura,
do Turismo Sustentável. PRODETUR, Sergipe,
pouca diversidade de produtos e falta de

Programa de Regionalização do Turismo e sua aplicação em comunidades autóctones: o caso de Poço Redondo e Canindé do São Francisco - SE
2005.
articulação na promoção e comercialização
SANSOLO, D.G.; CRUZ, R.C.A. Plano Nacional
do produto turístico brasileiro. Tais problemas
de Turismo: uma análise crítica. In: Cader-
se apresentam como os maiores limitadores
no Virtual de Turismo, n.10, ISSN 1677-6976,
para o desenvolvimento do turismo no Brasil.
dez. 2003. Disponível em: <http://www.ivt-
Esta realidade pode ser facilmente identificada
rj.net/caderno/anteriores/10>. Acesso em:
na área estudada com as dificuldades encon-
20 out. 2006.
tradas, que se repetem, com o agravante da
SEBRAE – Serviço de Apoio às Micro e Peque-
distância que a região se encontra dos grandes
nas Empresas. Diagnóstico Local Integrado
centros, de onde partem importantes decisões
Sustentável – DLIS (Projeto SEBRAE/XINGÓ),
para melhorias do setor.
Aracaju, 2002.
A Região dos Lagos de Xingó só irá se SILVEIRA, M.A.T. Planejamento Territorial de
transformar em um roteiro turístico consolida- Dinâmica Local. In: RODRIGUES, A.B. (org.).
do nacionalmente, aumentando o tempo de Turismo e desenvolvimento local. 3ed. São
permanência e gasto do turista na localidade, Paulo: Hucitec, 1999.
quando os gestores públicos se conscientiza- VIEIRA, L.V.L. Turismo como alternativa de
rem de que a regionalização aliada ao apro- desenvolvimento no município de Poço
veitamento do potencial humano existente nas Redondo. São Cristóvão − SE. Dissertação
localidades é que irá, de fato, atrair mais turistas (mestrado em Desenvolvimento e Meio
e conduzir o desenvolvimento do turismo pelo Ambiente), UFS-NESSA. Aracaju, 2000.
caminho da sustentabilidade, através da prá-
tica do turismo de base comunitária em que
Cronologia do processo editorial:
as decisões partem de dentro para fora e de
Recebimento do artigo: 29-mai-2007
baixo para cima, em um processo participativo Envio ao parecerista: 21-jul-2007
Recebimento do parecer: 25-jul-2007
de gestão descentralizada. Envio para revisão do autor: 25-jul-2007
Recebimento do artigo revisado: 30-mar-2008
Luciana Rodrigues de Morais e Silva e José Roberto de Lima Andrade

Aceite: 22-mai-2008

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