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O FEMINISMO DE “SEG CORPO, PRAZER E TRABALHO Joana Maria Per Muiheres eram personagens |-amadas, ressentidas ¢ anti-homens.' Se as mulheres que ci machista? Definit-se como feminista no Brasil era um grande tisco. ‘Apesar dos preconceitos existentes, a partir dos anos 1960, © pais v anto distintos dos que haviam movido as militantes no pas © combate as depreciagdes que tinham como alvos ativistas e simpatiz: © novo feminismo apresentou reivindicacoes para além das relativas direitos politicos, econémicos € educacionais. Ainda que fortemente inspirado pelos movimentos feministas de “Sc gunda Onda” que se multiplicavam no exterior, 0 do Brasil guardou © cificidades por conta da conjuntura politica; © pais v militar’ que colocava grandes obsticulos a liberdade de expressio ¢ lev oposicao ao governo contavam com grande participagio de mulheres também estavam envolvidas nos chamados “movimentos de mulheres feminista. Com isso, no Bra iam forga, com destaque para os assuntos dos a sexvalidade e corpo ¢ & violencia contra a mulher, por exemplo. VISIBILIDADE DAS MULHERES © processo acelerado de urbanizagao® ~ iniciado uma década intensificado a partir dos anos 1970 ~ fez. das mulheres personagens vis em diversos espacos publicos. Entre outros, a presenca feminina au nas universidades e nos empregos formais. Os rostos femininos cram nitidos nas manifestagdes de rua, como comprovam as fotos dl nais da 6poca.’ ‘As mulheres estiveram, por exemplo, nas Marchas da Familia co pela Liberdade,’ de direita, ocorridas antes do Golpe Militar, e na Passe dos 100 Mil, de oposicao ao governo, no Rio de Janeiro, em 26 de 1968. Ao longo das décadas de 1960, 70 ¢ 80, mulheres atuaram i clubes de mies, nos movimentos por creche, nas marchas da “pane’ {ou “panelacos”), nas reivindicacdes por anistia politi perseguidos pelo regime) e no movimento Diretas Ja (por eleigdes ‘Além disso, criaram associagdes femininas especilicas € “casas da mulhe Nos sindicatos, reivindicaram a existéncia de secdes femininas € ex inclusio de mulheres nos cargos de dirctoria; realizaram encontros de tra Ihadoras e participaram ativamente da vida sindical."" Portanto, no Brasil, 0 feminismo de “Segunda Onda” foi contemporiineo de muitos outros movi- mentos que contavam (e contam) com expressiva participacao de mulheres. diferenca esti no fato de o movimento feminista propriamente dito ser 0 jue desenvolve lutas contra a opressito especifica das mulheres ¢ reivindi reitos para elas. Eo movimento feminista que também afirma que as rela- {Ges entre homens ¢ mulheres nao so inscritas na natureza, mas sim fruto cultura e, portanto, passiveis de transformacao. JRUPOS DE CONSCIENCIA OU DE REFLEXAO ‘como em outros paises, o feminismo de “Segunda Onda” primeiros tempos, uma metodologia revolucionaria de di- gacdo de suas ideias: os grupos de consciéncia, também chamacos de Pos de reflex’. Esses grupos eram constituidos apenas por mulheres — diziam que a presenga de homens as inibia — que se reuniam nas cas: is das outras, ou em lugares puiblicos, como cafés, escrit6rios, bares € iotecas, para discutir problemas especificos das mulheres e se contrapor machismo vigente. Para cada reuniio, as componentes deveriam trazer as participantes. Quando o grupo ultrapassasse 24 pessoas, seria divi- , formando noves grupos. A proposta era forjar uma rede, espalhando Ipos desse tipo por diversos lugares. Muitas das integeantes desses grupos nao se diziam feministas, prefe~ lo afirmar que faziam parte do Movimento de Libertagaio da Mulher.” As jintituladas “liberadas” eram as que adotavam explicitamente a postura ‘enfrentar o dominio dos homens nas relagdes sociais e nos relacionamen- particulares. ‘im dos primeiros grupos de que se tem noticia surgiu em 1972 em Sao lo era formado por mulheres intelectualiz Jgumas eram profes Aniversitirias) que tinham entre 30 ¢ 38 anos de idade. Varias delas hi Wiclo viagens aos Estados Unidos ou a paises da Europa Ociden ue algumas | Igum deles, Retornand 1m o feminismo e propun aditadura, Desse grupo de Sao Paulo, que se chamou Grupo de Con: cao Femi éncia até 1975, pi nomes como Maria Odila Leite da ampaio, Beth Mencles, Nogueira Galvao, Alberti ‘a Suplicy, entre outros.! ra por trés meses de um grupo de reflexio, trouxe para o Rio de Janeiro suis pritica de organizacao. O grupo carioca adotou 0 nome de Grupo de Refle xo e durou até 1973. Conseguiu reunir um ntimero expressivo de mulhe: que, dep em fungio da idade das participantes. grupo das mais velhas se dedicava a ler e discutir literatura feminista, O jovens ~ que func Jor mais tempo — preocupava-se também co questoes de sexualidade, dando espago para depoimentos intimistas,™ c narrado por Branca Moreira Alves: Nos dias de grupo de reflexao em que eu falava: “Eu nunca gozei", a outra bém dizia que nunca tinha gozado € como era isso. E num grupo de reflex aqui no Rio, um: inha me ensinou a tirar a céipula do chuveiro e ¢ se: "Se voce no sabe © que é orgasmo entio vai Itéris e fechou a porta e disse: “Vou fic: la ficou rindo: "E, conseguiu.” Foi uma rev Essa pequena hist6ria, um exemplo dos assuntos disc pode hoje causar espanto: como uma mulher adulta ainda nao le era um orgasmo? A facilidade de obler informagdes que se tem a ¢ sobre o corpo € o prizer sexual ndo existia em meados dos anos 19 nte muito tempo, acredi sentia desejo, nem prazer, poi destinar-se 2 matemic ri enfrentar a ignorincia € © preconceito sexual que mi as (brancas e de camadas médias urbanas) inventai ASSISTAA TTT al ’ ane 0 FM a peten ten aeecasertetenernen tees (Capa da edicao especial da revista Reaidade de janeiro de 1967 proida de circular sob ‘@ alegagao de incentvara “obscenidade”e ofender a “honra da mulher") incia/reflexaio em que discutia ¢ sexualidade. Seu exemplo inspirou mulheres no mundo Jade de debater sobre tais assuntos € de lutar por mudani nento que dessem mais liberdade 2s mulheres foi reconhec também gracas a uma conjuntura favoravel de mudancas. Datam dos anos 1950 a publicacao de grandes pesquisas sobre lidade feitas nos Estados Unidos. Em formato de livro, foram ver sucessos editoriais. Obras como as de Alfred Charles Kinsey, de Master Johnson e de Shere Hite'® divulgaram 0s resultados de estudos sobre 0 « portamento sexual de pessoas comuns nas suas mais diversas manifest No Brasil, as conclusdes dos cientistas ficaram conhecidas principalmen por meio da imprensa, em especial revistas voltadas para as cama dias urbanas. As pesquisas passaram a servir de ponto de referencia pai pessoas pensarem sua propria sexualidade. O assunto sexo deixava de ser tabu para virar tema de conversas €, pouco depois, de reivindic: Desde 0 inicio da década de 1960, estava disponivel no merca método mais seguro de contracepeao, a “pilula’.” A existéncia desse m lar na mentalidade das pessoas a sey lo entre procriagao e sexualicade, com 0 aval das ciéncias médicas. Cc a existéncia da pilula, o prazer das mulheres nas relagdes sexuais tomou: uma questao ainda mais importante. O medicamento que libertava as Iheres da gravidez indesejada levou-as a se preocupar cada vez mais cc que seu desejo fosse levado em consideracao na relacao sexual. Difundi a ideia de que o prazer nao devia, como no pasado, ser apenas prerrog: dos homens. (Esta questao daria o tom de varias reunides dos grupos consciéncia/reflexaio no Brasil.) Além disso, a pilula permitiu as mulhe planejarem com ma se, quando e quantos filhos queriam ( levando em consideracao estilo de vida, carreira profissional e questées nceiras. Puderam, entio, cogitar outros futuros. Emsseus debates, as participantes dos grupos de reflexao/consciénc! tavam uma metodologia chamada “linha da vida” que as levava a falar s vivéncias pessoais. Conversavam sobre como viam 0 proprio corpo « dos homens, contavam sobre a experiéncia da menstruacao ou do abort ravam situacdes em que percebiam terem sido discriminadas por ser mu ‘os homens, diziam o que pensavam respeito do desejo sexual edo pr ‘5 mulheres consideravam que a vida privada era fruto da soci “ongulho de ser mulher’, entendendo que isso € que defin feminina”, ¢ nao a biologia como acreditava 0 senso comum. Por negarem a existéncia de lideres ou de porta-vozes e rejeitar rarquias, as participantes preferiam que as reunides nao tomassem predeterminado ou fossem dirigidas. Todas deveriam ter direito 2 pa Toda palavra seria qualificada. Ninguém seria a “dona da verdade”. A balhar de forma coletiva e sem dirigentes, acreditavam recusar qualquer “relacdo competitiva” entre mulheres, Por que tanta preocupagio em dar o diteito & palavra a todas as mu- Iheres? Para entender isso € preciso lembrar que so também deste mesmo periodo os movimentos juvenis (como 0 “Maio de 1968” francés, que re~ percutiu no mundo todo), os pacifistas (contra a guerra do Vieina, contra a corrida armamentista), os movimentos pelos direitos civis dos negros © utras minorias (particularmente nos rua) € os movimentos de resisténcia a govemnos ditatoriais (na América Latina). Todos eles contavam com a parti- cipagio de mulheres. Porém, elas, muitas vezes, eram menosprezadas pelos companheiros ativistas. Queixavam-se de que sua atuacio consistia em da llografar, reproduzir material de divulgacao, distribuir panfletos, fazer café, impar os ambientes, enfim, realizar tarefas consideradas de pouca impor- Hincia, As decisoes politicas eram tomadas pelos homens, pois mesmo as mulheres que participavam das reunides estratégicas tinham suas opinides desqualificadas ou ignoraclas, como se nada tivessem dito. Por essa razo, as mnilitantes sentiram a necessidade de criar “alas femininas’ em varios desses movimentos. Elas passaram a se reunit em separado, formando “grupos de €onsciéncia” no interior dos movimentos sociais; garantindo, assim, que a fila de cada uma fosse assegurada e respeitada. Porém, foram rapidamente acusadas pelos companheiros de dividir a militincia ou de enfraquecé-la om “questées secundarias”, Para as feministas, contudo, a questao do direi- to das mulheres era fundamental VORMANDO REDES Um dos objetivos dos grupos de consciéncia/reflexiio das m Aumentar a solidariedade entre elas e melhorar sua autoestim semelhantes haviam sido utilizados, por exemplo, pelos camponeses na Cl tas queixas levavan pas a compreender que os problemas vividos individualmente cons tufam, em verdade, uma questio coletiva." E possivel acompanhar a reproducao desses grupos de consciéncit flexio em diversos lugares do Brasil, que se comunicavam como numa red Em Florian6polis (Santa Catarina), por exemplo, nos anos 1980, formar: dois grupos feministas: Amdlgama e Vivéncias. © primeiro contava presenca da socisloga Julia Guivant, que tinha participado de um grupc Campinas (Sto Paulo) na época de seu doutorado, Esse grupo de Camp era coordenado por Marisa Correa, Marisa av 1a conheci ‘grupo desses nos Estados Unidos antes de formar o de Campinas. Em } Branco (Acre), outro exemplo, Julia Matias participou do grupo organiza por Teresa Mansur, que viera dle Vitéria (Espirito Santo) ensinara iheres de Rio Branco a trabalhar a partir da metodologia da “linha da vicls Costumavam fazer stias reunides em circulos; dai a preferéncia p mearem seus grupos com as palavras “coletivo” € “circulo”. Varios deles put blicaram periddicos para divulgar suas ideias ¢ atividades. Os titulos publicacdes, em geral, traziam um sentido plural da palavra “mulher exemplo: Nos Muiberes ¢ Mulberio. Fora do Brasil, havia publicagoes fe nistas intituladas Nosotras (no Chile € no México), Nos/Otras (na Espa ‘Noi Donne (na Wilia). Comunicando-se também dessa forma, 0s grupos ‘consciéncia/reflexio de mulheres formavam uma grande rede, uma “6 vidade intemnacion: No Rio de Janeiro, por exemplo, um grupo de reflexto formad inicio dos anos 1970 conheceu, através de Marhel (Maria Helena Darcy ¢ ferninista europeia enviada ao Brasil por uma ¢\ de Marhel exilada na Suica.” Como se pode ver, as redes brasileira que « tavam se constituindo e se consolidando nesse perfodo tinham ligacoes « varios tipos com 0 que ocorria em outros paises. A CRIAGAO DE CENTROS DA MULHER Foi uma componente de um desses grupos, Mariska Ribeiro, conseguiu patrocinio da onu®” para realizar 0 encontro em 1975, Associagao Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro, que seria encontro orga na realidade bi Brasileira (co), recursos conseguidos pela femi do cv, estavam 0 “estudo, a reflexio, pesquisa e andli mulher e a “criagio de um departamento de acdo comunitaria para t camadas populates. ‘Aos pouces, porém, 0 Centro acabou sendo controlado por militante do rcs (Partido Comunista Brasileiro), 0 que desagradou a muitas ativistas separou-se, formando 0 Col 1980, em que explicitaram sua pauta de reivindicagdes, declararam: “Quere- aborto livre e gratuito. Precisamos da democracia pelo direito basico patroes € assim por diante [. ‘As ativistas do Coletivo de Mulheres no eram as Gnicas a levantar a indeira do “aborto livre e gratuito”, Fla fazia parte feminismo internacional. Desde que 0s métodos contraceptives passaram a enfocar o organismo feminino,* as mulheres comecaram a exigir um con- {role maior sobre seu proprio corpo. E 0 direito 2 interrupgio da gravidex Indesejada passou a fazer parte da pauta feminista, “Um filho se eu quiser, quando eu quiser” € “Nosso corpo nos pertence” eram palavras de ordem essa €pocs entretanto, a reivindicagto do direito ao aborto en- fontraya muitos obsticulos para se fazer ouvir, ja que, tendo em vista o fontexto da ditadura, as mulheres ativistas tinham que buscar diferentes Mllados, até mesmo na Igreja Catdlica, sendo obrigadas a fazer concessoes ‘exiratégicas para manté-los. im outubro de 1975, por exemplo, ocorreu na CA ‘0 Encontro para 0 Diagnéstico da Mulher Paulist Fentro de Informacao da oxu € pela Giiria Metropolitana. Desse encor ssenvolvimento Wulher Brasileira (cous) com o objetivo de ser um centro, com sed feslatutos, de estudos ¢ reflexiio voltados para o desenvolvimento ‘onsciéncia nacional da condi¢ao da mulher’ Duraria até 1979. © SURGIMENTO DOS PERIODICOS Data de 9 de outubro de 1975 a publicagio do mtimero zero do jor Brasil Mulber. Impresso em Londrina, no Parand, era ligado a0 cows de Sa lo. Com oito pi tinha Joana Lopes 2 frente da editoria. Este jor ngou 20 edigdes. Sua periodicidade dependeu dos recursos que as ativis- las conseguiram arrecadar com vendas e doagdes. O ntimero 1 saiu em de- zembro, trazendo um balango do Ano Internacional da Mulher. © ntimero 2, publicado no inicio de 1976, empregou, pela primeira vez, a palavra femi rnismo. Porém, essa palavra incomoda a editoria do jornal, pois o periédico vi lo que as quest0es feministas propriamer a do Brasil Muther era formada por pessoas ligadas ao PCd na. (Aga0 Popular Marxista Leninista) © que, apesar de se dizerem distantes da “militancia pol em grande parte, ex-exiladas pertencentes 2 vertente Debate.” objetiv desse jornal era privilegiar o tema “mulher” e, j4 no primeiro ntimero, prc ante toda sua existéncia (circulou até 1978), ma ve com o periédico Brasil Mulber uma relacio de disputas ¢ solidariedades. Progressivamente, o jornal Brasil Mulber incorporou tematicas espe cas do feminism e © Nés Mulberes, em varios momentos, comprometeu-s com a luta pela democracia e discutiu a questio Brasil Mulber e Nés Mulberes, além de divulgarem as ideias dos grupos quais pertenciam, também eram usados na busca de novas adeptas. itante Maria Amélia de Almeida Teles, por exemplo, levava exemp! do Brasil Muther para bairros da periferia de Sao Paulo onde havia clubes ¢ mies e discutia seus artigos em 18 desses clubes, formando grupos de re xo. A feminista Maria Lygia Quartim de Moraes também usava o periéd Nas Mulberes em discussdes que promovia em clubes de mies em Sao Pa Na década de 1980, surgiram intimeros periédicos autoproclamados istas, tais como: Mulher Liberta Muther (1980), Mulberio e Chana Gom Chana (ambos de 1981). Todos esses tiveram vida bem curta, com exce¢ de Mulherio, que circulou até 1987. CONVIVENDO COM AS CRITICAS As criticas aos grupos de consciéncia/reflexio forat de muitos lugares, inclusive de muitas feministas. No n acusados de ser inécuos. A falta de hierarquias, tao decantada em sua 1 argumentavam outras. Varias ativistas entendiam que o nec lizar manifestagoes de rua ou criar centros de ajuda as vi doméstica ou de cuidados com a satide da mulher. Algumas, por sua ve. defendiam que a transformacao real da sociedade machista viria somente com mudangas na Ao. Certas militantes dliziam que a sexualidade nao era relevante ¢ que 0 mais importante era tratar da questio “mulher e tra balho”, Havia mesmo participantes dos grupos de consciéncia/reflexiio que tinham dificuldades em assumir que o faziam, por vergonha, especialmente dos assuntos intimos que erim debaticlos. Alem de to criticas, formuladas pelas proprias colegas de femi- mulheres envolvidas em grupos ce reflexito enfrentavam o forte pre- existente na sociedade brasileira contra o feminismo. Esse preconceito também atingia as m nos Centros da Mu- Iher, na elaboracao de periddicos € nas reunides com mulheres de bairros populares. Nao foram poucas as vezes que as feministas se viram constran- 10 eram “contra os homens”."" Muitas ativistas também achavam importante deixar claro m lésbicas (epiteto frequen temente atribuido as femi €poca), Além disso, embora, no inte 6 icavam com s feminismo estivesse expressa em ou as mulberes, e no ao feminismo:* & auséncia de referéncias expli 40 feminismo nos titulos € significativa. De fato, o antifeminismo e1 forte na sociedade brasileira dos anos 1970 e 1980. GRUPOS NO EX{LIO rem presas, torturadas, assassinadas. No exilio, participaram de gr consciéncia feministas. Sao conhecidlos pelo menos cinco grupos que cc , coordenado por Danda Prado (que pul perio ido Nosotras); um grupo coordenado por Zuleika Al © Circulo de Mulheres de Paris, responsavel pelo periddico Agora é que sao :m Lisboa, um grupo de reflexio (estudos € consciéncia) se reunia no Moreira Alves. Desses grupos de exiladas, apenas Alambert (que preferiam ser apenas “grupo de Regina (codinome), s brasileiras exiladas na Franca nessa época, explica como se deu, para ela ¢ muitas outras, a identificacio com o Femi nismo, que acabaria por tragarIhe novos rumos de vida Para a maioria de nds, Franga, porque existe um mov no ponto de referén: cia. Foi todo um processo coletivo de troca de experiéncias com outras mulhe- res. Antes, no Brasil, a gente tinha um profundo desprezo pelas mulheres. por exemplo, queria ser homem como os outros companheiros, subes as companheiras, 1 las, nunca trocaria minhas experiéncias com ficagao coletiva, que criava um sentimento de “immandade”, Esse sentimento, entretanto, era ameacado dentro dos préprios grupos por causa do precon- ceito de algumas integrantes contra o lest ouvida pelas feministas de que todas seriam s fazia com que algumas quisessem a todo custo se afastar desse r6tulo, 0 que causava sérias divisoes nos grupos de mulheres. Havia dentre elas, inclusive, as que acusavam as ‘companheiras realmente Iésbicas de serem “pessoas doentes”. Em contrapar- tida, como forma de reagao, Iésbicas perguntaram, num dos © TRABALHO DOMESTICO EM QUESTAO, Direitos ligados ao corpo ¢ & sexualidade, liberdade de expressio, parti- iio no mercado de trabalho © educacao igualitirias na i do feminismo de “Segunda Onda”. 0 trabalho doméstico histo- ino também passou a ser 0s afazeres domésticos e, mais, que 0 Estado fizesse sua parte const creches nas quais as criancas pudessem ficar enquanto elas ¢ eles restaurantes populares para nao precisarem fazer a ntar em casa todos os dias. Nos jomais Nés Mulberes © Brasil Mulber, por exemplo, eram comu reportagens e charges criticando muito frequente no es; doméstico: marido © mi nbando para a poltrona e se instalando na frente da jornada de Estado, permanece, pois ainda nao foi atend téma sorte de contar com a participagio do companheito nas tare! Mesmo as que recebem tal colaboracao (considerada uma “ajuda”), sent se as principais res veis pela organizagio € boa administracio do [As cidades sto carentes de equipamentos garantidos com recursos puiblicos grande peso para as brasileiras. FEMINISMO A BRASILEIRA Como vimos, viver sob uma ditadura fez muita diferenca p: hismo que se constituiu no Brasil. Na Franca, por exemplo, 0 1 das feministas era 0 patriarcado.* No Brasil, com tantas mazelas » havia muito mais a fazer para além de combater 0 ma- » ou defender a liberdade sexual da mulher, por exemplo. Aqui as S se posicionam contra © patriarcado, mas também foram impelidas l6gico das ativistas ficou centraliza tas gerais” (contra a ditadura, por mudancas sociais ou pelo socialismo, por exemplo) e as “lutas especificas” das mulheres ( feministas bras : lutas gerais” eram sempre de Nos Mulberes, de agosto/setembro de politicos que estavam na clan- destinidade, por exemplo, estranharam a emergéncia do novo feminismo. cdo" que os grupos feministas pudessem atuar como um movimento auténomo, Diziam que estes eram uma espéci s cinco” de mulheres ricas ¢ ociosas, “uma terapia io de tempo que poderia ser m destinado a luta “maior” € “geral”. As faccdes p ar consicleravam os grupos cas das mulheres como “desvio pequeno-burgues" a0 invés de somar esforgos, estariam promovendo a discrdia nas familias ¢ no campo da esquerda. Além de tentar desqualifi- car as reivindicaées feministas, partidos politicos e determinados grupos de esquerda tentaram cooptar ¢ aparelhar nao 86.0 movimento feminist mas também todas as ramificagdes auténomas do movimento de mulhe- res." Foi bastante comum, principalmente apés 1975, 0 envio de mulheres itantes de partidos para os grupos de mulheres com a “missiio” de fazer proselitismo € conquistar pessoas para as causas que consideravam “real: mente importantes”. Porém, muitas dessas enviadas acabaram por se tort verdadeiramente feministas, contradizendo a intengao inicial de quando s garam aos movimentos de mulheres. Por outro lado, a presenca de mulheres em grupos de esquerda chegou is vezes a configurar uma “dupla militincia”, j4 que elas levavam pai pos ideias extrafcas do movimento feminista. COSMOVISAO 6 - VOZES O pensamento€ a reivindcagoes iscaidos nos Typos feministas foram cinigados em peridicas, is, gas de teatro € programas de tv. (Capa do i sta Heloncida Studart lancado em 1974.) questo de ¢ ial a pa lar especial atenga Iher trabalhadora. Assim, enquanto nos Estados Unidos, por exemplo, mente “siirio igual, por trabalho i ndicatos, pelos direitos das empregadas domésticas, pela nca clas mulheres no trabalho e contra o assédio sexual de chefes e col PARA ALEM DOS GRUPOS E DOS PERIODICOS © pensamento € as reivindicacdes origin: cia/reflexio seriam divulgados em ou teatro e a televisio, Cidinlia Campos, Mar 6 atrizes levaram-nos para o es pago cénico na pega Homem ndo entra, esci Rose je Muraro € Heloneida Studart. A acto da peca passava-se na plate nao no palco. Somente mulheres F; os homens podiam es: perd-las fora do teatro € as ¢ los de outtas pessoas. No decorrer do espeticulo, o piblico tr ‘em urna espécie de “grupo de reflexao”: as mulheres contavamn suas vidas € faziam suas queixas. A peca foi acusada de sexismo € pela ditadura. Homem ndo entra era, em grande parte, inspirad Ensler, Mondlogos da vagina, que, dese os Est dos Unidos, tr 0 teatro as discussdes sobre a condigdo feminina, A pest de todos 0s obsticul mais e mais mutheres foram se ineressando por questoes feministas no Brasil, mesmo sem se dar con ta de que eram feministas. Observando o grande potencial mercadolégi emissoras de televisio passaram a incorporar le de programacao. Em 1980, por exemplo, program TV Muiber, da Rede Globo, no qual informava e discutia assuntos, wer, orgasmo, sexualidade, masturbacao, chegando a dar conselhos priticos:" © TV Mulberera exibido no periodo da manha e seu pii eram as donas de casa. © quadro apresentado por Marta Suplicy sofreu va- rios ataques de grupos organizados e de individuos conservadores, que se manifestvam através de cartas € abaixo-assinados. Entretanto, foi mantido ‘até 1986, quando todo o programa TV Mulber foi retirado do at. lavia também outras iniciativas gar reivindicacdes feministas: este era o caso dos episédios do seri Mulber, que foram ao ar na Rede Globo entre maio de 1979 ¢ deze de 1980 € retratavam a vicla de uma mulher divorciada e presenca dos artigos da psicéloga feminista Carmen da Silva na rev minina Claudia, desde os anos 1960; de diversas reportagens e entrevist em revistas como Realidade e Veja ¢ em jornais como a Folba de §.Paul entre outros. ‘Também passaram a dar visibi is feministas as manifestag do Dia 8 de marco; as campanhas para prevenir a violéncia contra asm res, como a que divulgou o famoso slogan “Quem ama nao mata’; as ofer- tas de cursos, palestras e encontros em tomo dos problemas das mulheres. ‘As feministas, aos poucos, também diversificaram sua atuac2o com instituicio de nticleos de estudos sobre mulher e género em universidades (cho de oxes (organizacdes no governamentais) ea construcao de mais casas para abrigar mulheres vitimas da violencia, por exemplo. Depois da Abertura Politica istas, assim como outros movimentos sociai puderam atuar mais abertamente, o que contribuiu para que suas reivind ices ficassem mais conhecidas, ¢ varias delas z no pats. mpo participando de assox ideres comunitirias no Brasil. Dentre elas, algumas (ainda poucas) m a obter cargos no setor public de eleicdes. a pressiio do feminismo organizado, mudancas importantes ocorreram no Brasil, por exemplo, as garantidas pela Constituigaio de 1988 ou a famosa Lei Maria da Pen! ara coibir a violéncia contra as mulheres. Se, hoje, 0 assunto sexo mais o tabu de antigamente ou se 8 brasileiros convivem 1 ia de mulheres em cargos de chefia, devemos reconhecer, nessas cong) cia das lutas feministas. VOCE E FEMINISTA? Atualmente, nao se fazem mais grupos de consciéncia/reflexio. to sentido, podemos dizer que se transformaram em ‘oficinas”, reu ganizadas e desenvolvidas por ones, conduzidas por “especialistas” Je. Também nao ocorrem is com tanta frequéncia manifestagdes de rua em forma de pa lizacda agora mais pelo movimento gay, como os desfiles do Orgulho Gay). Mas as redes feministas continuam a existir. Entre divulgagao de ideias, ocupam, de forma expressiva, a net € suas redes sociais, onde continuam a debater, protestar € reivin- As ativistas no Brasil sabem que as poucas conquistas obtidas para as mulheres nunca est2o asseguradas € que muito ainda ha por fazer num pais em que mulheres continuam morrendo em abortos clandestinos ¢ um ontingente enorme é alvo da violencia doméstica, por exet Embora ainda exista preconceito contra a palav feminista, um nimero muito maior de mulheres, e até de homens, se dizem feministas. M no ndo assumindo o nome, hoje ji € comum mulheres homens aceitarem que a mulher é capaz de constituir familia ao mesmo tempo que investe na profissAo € mantém um relacionamento equilibrado tisfat6rio com © parceiro, Também é muito frequente a indign: da violéncia que tem a mulher como alvo ou das mulheres sobre seu proprio corpo. Talvez.a maior conquista das jovens feminis muitas vezes desconhecida das novas geracdes ~ s existéncia de outras maneiras de ser uma mulher, para além das fungdes alizadas de esposa, mie e dona de casa. Até meados do século xxx, aque- Is que queriam se dedicar a uma profiss’io, por exemplo, eram levadas a \creditar que deveriam abdicar do casamento € da matemnidade. Hoje, 0 pensamento € outro. E voce, como se situa em tudo isso? Ainda acha que nao é feminista? Te Ite Report 18 (1969-1979), ‘Catia de Si haviam vivid, a ies europea Ver Rose M Op. © sta campanha surgiu apd de Angela Din. ¥ ‘enstia e pelo retormo lento ds li ineredo Neves para a presdéncta da Republi

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