Você está na página 1de 10

Afetividade como uma competência educativa

Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos

Afetividade como uma competência


educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos
alunos 1
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos

Unidade 3
Crenças dos professores sobre o
aprendizado dos alunos
Muitos estudos, sob diferentes enfoques, têm abordado a relação entre
variáveis psicológicas e desempenho acadêmico e/ou dificuldades de
aprendizagem de alunos. Dentre esses, os que enfatizam a questão da
percepção assumem diferentes formas. No que diz respeito ao professor, os
estudos têm se centrado na análise de suas percepções, atitudes e
expectativas em relação aos alunos, enquanto que as pesquisas envolvendo
esses últimos têm se preocupado em investigar a questão de seus sentimentos
e crenças, autopercepção, autoconceito, auto-estima e auto-eficácia, por meio
da declaração dos mesmos.
As crenças educacionais são ideias e convicções a respeito de temas
relacionados à Educação que se revelam, conscientemente ou não, nas ações
dos professores. Essas crenças influenciam o processo de ensino-
aprendizagem ao mediarem as decisões pedagógicas e as interações que os
professores estabelecem com seus alunos, funcionando como um filtro que os
leva a interpretar, a valorizar e a reagir de diferentes formas diante dos
progressos e dificuldades dos seus alunos, podendo, inclusive, induzir o
comportamento real destes alunos em direção às suas expectativas.
A esse respeito, em uma investigação sobre crenças docentes, Zohar,
Degani e Vaaknin (2001) constataram que a maior parte dos professores
investigados entendia que os alunos de baixo desempenho acadêmico não

2
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
eram capazes de se envolver em atividades de aprendizagem que exigissem
reflexão e raciocínio mais complexos e que se beneficiariam somente de aulas
do tipo “transmissão de informações”.
Entretanto, essas crenças docentes contrapõem-se às evidências de que
alunos de baixo desempenho acadêmico podem, de fato, obter consideráveis
avanços em programas educacionais com métodos que requerem
processamento cognitivo mais complexo. Resultados semelhantes foram
encontrados em outros estudos, conforme revisão da literatura feita por
Raudenbush, Rowan e Cheong (1993).
No Brasil, as pesquisas sobre este tópico têm chegado a resultados
semelhantes detectando, principalmente, a relação entre o fracasso escolar e
a baixa expectativa do professor quanto ao desempenho acadêmico de seus
alunos, especialmente quando estes são provenientes de classes sociais mais
desfavorecidas.
O que se percebe, portanto, é que dependendo da forma como se
configuram, as crenças educacionais dos professores podem representar
condições reconhecidamente dificultadoras da aprendizagem dos alunos
como, por exemplo, acreditar que o aluno não é capaz de aprender e/ou ter
baixas expectativas quanto ao desempenho escolar do mesmo.
As crenças podem ser entendidas como filtros de realidade, nossas
crenças movem nossas ações e acaba sendo difícil separar uma da outra. Elas
fazem com que interpretemos os eventos a partir da perspectiva do que
acreditamos. Nossas objeções acabam se tornando uma confirmação de
nossas crenças. Negamos o que não acreditamos, dessa forma nossa
realidade é filtrada e construída a partir daquilo que cremos.

3
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
Portanto, pode-se considerar as crenças como verdades que tanto
podem ser individuais ou coletivas, construídas no âmbito social. Essas
“verdades” servirão como condutoras da ação do indivíduo, influenciando não
somente sua ação como também a de outrem.
As crenças são construídas socialmente, mas também individualmente,
sendo dinâmicas, contextuais e paradoxais. Elas são dinâmicas e contextuais
por se modificarem através de um período de tempo ou até mesmo dentro de
uma situação. Crenças são paradoxais por serem amplamente influentes no
processo de ensino-aprendizagem. Elas podem funcionar como obstáculos,
impedindo que o aprendizado aconteça. Para Kudiess (2005, p.43) “a forma de
pensar do professor irá refletir nas suas atitudes e decisões na prática de
ensino”. As crenças e os valores dos professores formam sua “cultura de
ensinar”. Assim, as atitudes do professor em sala de aula são resultados de
suas crenças e acabam se transformando em um tipo de “cultura” adotado e
aplicado no ensino. A autora ainda coloca que “as crenças afetam a tomada de
decisão do professor, influenciam a forma de planejar, as decisões curriculares
e de ensino”.
Barcelos (2004) ressalta a importância de se estudar crenças
sustentando que elas exercem papel fundamental no processo de formação de
professores. A autora diz que “as crenças podem atuar como lentes através das
quais os alunos interpretam as novas informações recebidas durante sua
formação”. Isso mostra a importância de os professores estarem conscientes
de suas crenças, pois elas afetam diretamente suas ações na sala de aula. É
somente por meio da prática reflexiva que essa consciência será adquirida,
levando o professor, a saber, explicar por que ensina como ensina. É somente
por meio do ensino reflexivo que essas crenças poderão ser desmistificadas.

4
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
Deve-se lembrar que, nesse contexto não é somente o professor que deve
refletir sobre sua conduta, mas como agente do processo educativo, o aluno
deve refletir sobre esses aspectos, pois afetam diretamente o aprendizado.
Ensinar é uma função complexa e que implica num sem-número de
obstáculos, revezes, fracassos e frustrações. Fontes de tantos impedimentos
à eficácia do ensino são os próprios alunos, quando desmotivados,
despreparados, com baixo rendimento, por vezes agrupados em turmas
numerosas; são as famílias que não cooperam nem participam; é uma certa
ausência de apoio de colegas; é a própria escola com seus vícios estruturais
inveterados e, por fim, as falhas do próprio sistema em que ela se insere. A
experiência diária de quem atua nesse contexto ou interage com professores e
professoras de qualquer nível de ensino atesta como eles são afetados por
condições objetivas tão adversas. Mesmo dotados de toda a competência
pedagógica exigida e dos conhecimentos pertinentes às suas matérias, eles
sofrem frequentes abalos em sua motivação para continuarem a envidar
esforços em direção às grandes metas educacionais que devem atingir com
suas classes.
Nesse sentido, no que se refere ao professor, a literatura especializada
existente, aponta um número grande de pesquisas que investigaram a
influência de suas percepções, atitudes e expectativas em relação ao
desempenho e/ou comportamento de seus alunos. O marco do primeiro
conjunto de pesquisas sobre os efeitos das expectativas de professores é
representado pela obra de Rosenthal e Jacobson (1968).
A pesquisa foi feita com o objetivo de verificar o efeito das expectativas
dos professores sobre o rendimento dos alunos, especialmente de constatar
se os alunos cujos professores tinham maiores expectativas de rendimento

5
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
eram os que mais realizavam progressos. Para isso, foram apresentadas aos
professores as crianças que tinham maior probabilidade de melhorar seu
desempenho, tendo sido dito a eles que essas foram as crianças que obtiveram
os melhores resultados em um teste de inteligência, quando, na verdade, os
alunos foram selecionados aleatoriamente pelos pesquisadores e por seus
assistentes.
Os resultados revelaram que aquelas crianças que tinham sido indicadas
como prováveis a terem melhor desenvolvimento intelectual mostraram um
contato mais próximo com os professores, além de serem descritas por esses
como as que mais provavelmente teriam sucesso no futuro, como as mais
interessadas, como as que apresentavam maior curiosidade intelectual e como
as mais felizes.
Muitos outros estudos podem ser apresentados corroborando esses
dados, portanto, uma reflexão séria deve ser realizada na prática docente.
Outros estudos referentes às percepções de alunos sobre as expectativas de
professores sobre eles retratam a influência que elas podem exercer sobre o
comportamento e desempenho acadêmico desses últimos. Essas pesquisas
apontaram incisivamente que o comportamento dos professores em sala de
aula marca as diferenças na aprendizagem dos alunos.
A influência das atuações do professor, não somente de suas
expectativas, mas também de suas percepções, crenças e atitudes em relação
aos alunos demonstrada nesses estudos, sugere, apesar das controvérsias,
uma evidência empírica (Schiavoni; Martinelli, 2005).

6
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos

Referências bibliográficas:

ALMEIDA, Ana Rita Silva. A afetividade no desenvolvimento da criança -


Contribuições de Henri Wallon. Inter-Ação - Revista da Faculdade de Educação
da UFG, Goiás, 2008, v. 33, n. 2, p. 115-129, jul. 2008.
Disponível em: http://www.revistas.ufg.br. Acesso em: 02 out. 2016.
ALMEIDA, Leandro S. Facilitar a aprendizagem: ajudar aos alunos a
aprender e a pensar. Psicologia escolar educacional. Campinas, v. 6, n. 2, p.
155-165, dez, 2002.
Disponível em
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
85572002000200006&lng=pt&nrm=iso. Acessos em 28 set. 2016.
BARCELOS, Ana Maria Ferreira. Metodologia de Pesquisa das Crenças
sobre Aprendizagem de Línguas: Estado da Arte. Revista Brasileira de
Linguística Aplicada. V.1.n.1. 2001
HABERMAS, J. Agir comunicativo e razão destranscendentalizada.
Tradução de: Lúcia Aragão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002.
__________. A inclusão do outro: Estudos de Teoria Política. São Paulo:
Loyola, 2002.
__________. Comentários à ética do discurso. Tradução de: Gilda Lopes.
Encarnação. Lisboa: Instituto Piaget, 1999.
KUDIESS, Elisabeth. As crenças e os sistemas de crenças do professor
de inglês sobre o ensino e a aprendizagem de língua estrangeira no sul do
Brasil: sistemas, origens e mudanças. Linguagem e Ensino, vol. 8, n.2, 2005.

7
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
LIBÂNEO, J. C. Pedagogia e pedagogos, para que? 5. ed. São Paulo:
Cortez, 2002.
MAHONEY, A. A.; ALMEIDA, L. R. DE. Henri Wallon: psicologia e
educação. Coleção Educação Personalizada. São Paulo: Edições Loyola, 2003.
MOREIRA, M. A.; MASINI, E. F. S. Aprendizagem significativa: a teoria de
David Ausubel. São Paulo: Centauro, 2001.
MORTIMER, E. F.; SMOLKA, A. L. B. (Orgs.). Linguagem, cultura e
cognição: reflexões para o ensino e a sala de aula. Belo Horizonte: Autêntica,
2001.
ROSENTHAL, R. & JACOBSON, L. Pygmalion in the classroom: teacher
expectation and pupil’s intellectual development. New York: Holt, Rhinehat &
Winston, 1968.
SCHIAVONI, Andreza; MARTINELLI, Selma de Cássia. Percepção de
alunos sobre as expectativas do professor acerca do seu desempenho: um
estudo comparativo entre alunos com e sem dificuldades de aprendizagem.
Interação em Psicologia, dez. 2005.
Disponível em:
http://revistas.ufpr.br/psicologia/article/view/4785/3673 Acesso em: 14 out.
2016.
SMOLKA, Ana L. B., GOES, M. C. R. (Orgs.). A linguagem e o outro no
espaço escolar. Vygotsky e a construção do conhecimento. Campinas: Papirus,
1993.
VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem.
Tradução: Paulo Bezerra. 2ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.
VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. São Paulo: Martins
Fontes, 1989.

8
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
WALLON, H. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições 70, 1968.
WALLON, H. (1989). Origens do pensamento na crianza. S. Paulo:
Manole, 1989.

9
Afetividade como uma competência educativa
Crenças dos professores sobre o aprendizado dos alunos

10

Você também pode gostar