Você está na página 1de 12

05<LOCALIZAÇÃO>

09<ARTE>
CIDADE
AMPLIADA

19<MEMORIAL>
PROJETO
E TEORIA
localização

5 6
7 8
<ARTE>
“Constato aterrorizado, caro público, que vocês já estão to-
dos presentes, enquanto não estamos prontos para a abertu-
ra da exposição. Aqui, estamos fazendo ainda a faxina. Isso
não me agrada. Vocês chegaram muito antes da hora. Numa

CIDADE
exposição, os rastros da instalação não deveriam ser mais
perceptíveis. Nada deveria perturbar a impressão do quadro.”
O’DOHERTY, Brian. White Cube. L\espace de la galerie et son
idéologie, Zurich: JRP/Ringier, 2008, p.195-198.

AMPLIADA A arte, desde o seu rompimento com a


moldura, tem sido experimentada de di-
versas formas, porém, as formas de apresentar
essa arte, pouco acompanharam as discussões
que a arte trouxe. São muitos os exemplos de
galerias formais que reproduzem um papel su-
perior dentro da exposição artística. Esses ex-
emplos, no geral, têm sido questionados por
artistas constantemente.

O papel da exposição de arte é considerado


por muitos, numa concepção clássica, o grande
momento da obra. O momento em que a obra
ganha significados nos olhares e interpre-
tações do público. Esse momento foi questio-
nado, mas muito pouco modificado. Isso se dá,
em partes, pelo fato de que o problema talvez
não seja a forma de expor, mas sim o porquê de
se expor um produto para apreciação ou em-

9 10
bate, o destituindo daquilo que entendemos aqui como último se chama A exposição. Ele se interroga sobre sua
basilar: seu mecanismo de processo. própria apresentação, e se expõe ele mesmo.” HUBER,
Thomas. Mesdames et Messierus. Conférences. 1982-
Nesse sentido, cabe discutir o espaço que a parede bran- 2010, Genève: Mamco, 2012.
ca tem numa exposição. Afinal, a parede branca é um es-
paço desocupado, um não-lugar. Um espaço que perde O que Huber evoca é que o mecanismo de produção da
seus significados tectônicos, volumétricos e materiais, arte não é um mecanismo descendente, mas um me-
para permitir que o foco fique apenas na pintura. Thom- canismo que pressupõe outras coisas que o compõe.
as Huber1, é um pintor que também propõe uma tentati- Sua inquietação é próxima a aquela que parte esse pro-
va de quebrar com as faces limites do cubo, explorando jeto. Somos todos, seres de carne e pedra, vivemos e nos
outras espacialidades que deem sentido a uma narrativa. conectamos a um espaço (no geral as cidades) e nele
Como inúmeros quadros, o artista francês, fez a apresen- que estamos sempre tentando lidar com essa relação so-
tação de seu quadro: A exposição2. A narrativa espacial cial de cotidiano e expectativa de algo. Esse é o maior
consistia que, após ter entrado na sala, o espectador se dos processos que o artista lida. Como na collage, ele se
encontrava frente ao chassi, no avesso da tela. Ele tinha posiciona nesses embates ora harmoniosos, ora confli-
que contorna-lo para descobrir o próprio quadro, uma tantes e dele extrai recortes, produtos, inquietações e
fileira de cadeiras e uma mesa ao lado com acessórios questionamentos. A arte, não pode ser exposta nesse
cuja imagem se reencontravam no quadro. Em seu dis- cenário distorcido e sem significados.
curso de abertura, Thomas Huber, apresentou:
E como não lembrarmos de Hélio Oiticica quando trata-
“Senhoras e Senhores, mos da arte na contemporaneidade? Libertar-se do mu-
seu, das instituições, das galerias, voltar-se para trabalhar
O quadro foi findado alguns dias atrás e agora, já é apre-
a arte em lugares comuns, a arte atuando no cotidiano.
sentado aqui, sobre um cavalete, cavalete sobre o qual
Tudo isso nos remete ao anarquista que questionou a
foi pintado e inúmeras vezes inspecionado e verificado.
ideia de que a arte é um produto ‘galérico’. Na década de
De todo jeito, onde é que poderíamos ter pendurado
1960 Hélio Oiticica já anunciara:
esse quadro? As paredes todas são recobertas de rostos.
Não se prestam mesmo a ser lugar para o quadro, este [...] pretendo estender o sentido de “apropriação” às cois-

1 Thomas huber é um artista contemporâneo suíço. as do mundo com que deparo nas ruas, terrenos baldios,
2 Apresentada publicamente em 1994, na Galerie Claire Bur- campos, o mundo ambiente, enfim - coisas que não se-
rus, em Paris.
11 12
riam transportáveis, mas para as quais eu chamaria o
público à participação - seria isso um golpe fatal ao con-
ceito de museu, galeria de arte etc. e ao próprio conceito
de “exposição” - ou nós o modificamos ou continuamos
na mesma. Museu é o mundo; é a experiência cotidiana.
[...] OITICICA, Hélio. Posição e Programa, p.2.

O papel da exposição e o programa da galeria, nesse sen-


tido, precisa ser questionado e confrontado. O espaço do
trabalho e o espaço expositivo lidam a todo tempo com
questões que se permeiam e se entrelaçam. Formando
uma espécie de rizoma onde não é possível saber onde a
arte começa e nem onde termina.

A exposição deve ser esse novo espaço múltiplo, diver-


sificado e mutável, dando a chance do artista produzir e
reproduzir as artes sem uma certa “legitimação” dada por
um cubo branco.

13 14
a galeria é o
mundo

Exposição “Parangoleando”, em tributo


a Hélio Oiticica, curadoria de Adriano
Guimarães e Fernando Guimarães. Fo-
15 tografia por Ana Paula Osório. 16
a galeria é o mundo

Sambista da escola de samba Vai Vai


(SP) usando parangoles, autoria de-
17 sconhecida. 18
<MEMORIAL>
PROJETO E
TEORIA A problemática principal que o projeto
impõe é buscar espacializar a discussão
complexa da arte contemporânea ao se pro-
jetar espaços expositivos e espaços de pro-
dução artística. Na tentativa de desconstruir a
ideia de galeria, do distanciamento entre pú-
blico-artista que existe no interno espaço de
um cubo branco, encontra-se o que podemos
chamar de coração do projeto, onde a arquite-
tura se enverga e explode para tentar lidar
com as questões da arte, do trabalho e do es-
paço.

A investigação começa na rua da lapa, que con-


tém um ordenamento de lotes que também
existiam no sítio do terreno atual. Essas casas
originalmente se organizavam dessa maneira
para responder a questões estruturais da épo-
ca, com grandes paredes estruturais limitan-
do-as lateralmente.

19 20
Essa organização sugere uma espécie de malha de categorias e discussões. Esse papel demanda um outro
3mx3m que também organiza pátios e programas inter- tipo de espacialidade, uma espacialidade não-restriti-
nos das casa ao redor. Essa malha foi mantida e sobre va as possibilidade de atuação, supondo certo nível de
ela reencontramos as 3 casas que existiram. Cada casa possibilidades privativas para o desenvolvimento do tra-
tem a largura de 6m e a profundidade do terreno. Numa balho. O espaço cresce em níveis, se permite utilizar da
perspectiva contemporânea, o uso da estrutura metálica tectônica para explorar a tridimensionalidade. Se abre
aparente coloca uma nova questão a memória local, fa- para a multiplicidade da atuação artística, seja coletiva
zendo a ponte entre a pré-existência e a contemporanei- ou individual, e também a mera observação de quem
dade da arquitetura e das tecnologias construtivas. está ao redor. Priva pela volumetria espacial e se abre ao
redor pela diferença de alturas penetráveis ao olhar.
Sobre essa malha, organiza-se o projeto, iniciando pelo
térreo que é vazio e se eleva permitindo e instigando O espaço de trabalho ora pode ser utilizado como espaço
a apropriação de outros atores da cidade, criando uma de trabalho, ora como espaço expositivo, o mobiliário
fratura para a recepção de uma sociedade múltipla e atua em todo projeto possibilitando modificar a arquite-
diversificada, que tem no espaço vazio a possibilidade tura sempre que necessário. Esquadrias se articulam
do encontro. Esse vazio é preenchido por um mobiliário tendo um papel crucial nas possibilidades de uso que
móvel, que pode ser usado para sentar, fazer de mesa, esse espaço gera: a grade que fragmenta a luz, o som e
arquibancada ou palco. No caminhar pela arquitetura o vento, e cativa a imaginação a partir do olhar; o vidro
se vê e pode ser visto, o térreo todo funciona como um que pelo contrário, permite o olhar irrestrito. Ambas es-
grande ateliê público, contido das intempéries, porém tão em constante contraste se organizando conforme as
mais conectado com a rua, artistas independentes po- necessidades dos artistas.
dem se reunir e trabalhar, com auxilio de uma oficina e
Ao centro do sítio, coberturas altas possibilitam a circu-
tem a opção um outro ateliê maior onde também po-
lação de ar e também a iluminação indireta para todos
dem acontecer aulas, oficinas e eventos.
os espaços.
É preciso notar que o papel do artista na sociedade hoje
Ao lado esquerdo, no segundo nível, fica a parte de
é de especialista dos lugares, e portanto, é completa-
serviço numa espécie de torre elevada, e sobre ela um
mente dependente das sociabilidades que neles acon-
depósito alimentado por um elevador que conecta toda
tecem. O artista já não é apenas o pintor de telas ou es-
essa torre e a área expositiva formal**. A área expositiva
cultor, mas é também aquele que atua entre disciplinas,
21 22
formal dá vista para todo o projeto e também para os
fundos, que é acessível por uma passarela que conec-
ta com essa grande arquibancada em formato de anfi-
teatro, onde há níveis diferentes que se tornam, quase
que instintivamente mobiliário, e dão vista para a árvore,
onde é possível ter performances e outras atividades
com plateia.

23 24

Você também pode gostar