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‘Separata_Harry Potter O fenémeno Harry Potter e nosso tempo em mutagao Por Nelly Novaes Coelho “A cultura 6 como a atmosfera, néo se vé nao se apalpa e contudo é impossivel viver fora dela e continuar pertencendo 4 humanidade." José Saramago Partimos aqui dessa arguta afirmagao de Saramago —Prémio Nobel de Literatura, para refletirmos sobre 0 grande fenémeno editorial/cultural de nossos dias, que é a série best-seller, Harry Potter, criada por J, K, Rowling’, escritora escocesa radicada na Inglaterra, Desde o primeiro volume, Harry Potter e a Pedra Filosofal, langado na Inglaterra em 1995 (e imediatamente traduzido em 35 idiomas e distribuido em 200 paises), até 0 sétimo e ultimo, Harry Potter e os Talismas da morte (2007), 0 pequeno bruxo Harry e a Escola de Magia Hogwarts (com o maléfico Voldemort, o grande mago Dumbledore, elfos, duendes, dementadores, feitigarias e o continuo duelo entre as forgas do Mal e as do Bem) vém sendo 0 “objeto de desejo" de milhdes de criangas, jovens e adultos em todo o mundo. Sucesso inusitado que, evidentemente, vem suscitando uma avalanche de criticas, pré e contra esse “enfeitigamento” dos leitores, causado por esses volumosos livros, com suas centenas de paginas cobertas de letras, frases longas, nomes dificeis e... sem ilustragées. E isso, em plena Era da Imagem, da Intemet, das siglas como linguagem, e da velocidade cada vez maior da Informagao: engrenagem tecnolégica que, conseqiientemente, vem provocando nas novas geragdes uma inegavel aversao a leitura literaria, que exige tempo vagaroso e concentracao interior. E 0 Tempo da Maquina superando o Tempo Humano, que atua no mundo atual Entretanto sao esses, os leitores de Harry Potter. Qual o mistério desse sucesso? Evidentemente nao ha respostas definitivas, pois como diz o ditado: “Cada cabega, uma sentenga.” A nosso ver, podemos entendé-lo como resultante de duas esferas de experiéncias: uma visivel (a mercadolégica) e outra invisivel (a das idéias hoje em revolugao). A primeira obedece a Lei do Mercado (alids a tinica lei absoluta neste nosso mundo globalizado), a segunda obedece a Lei da Evolugao da Consciéncia Humana (a qual a Autora alude indiretamente quando, ao langar 0 primeiro volume, anunciou que a série teria 7 volumes) E como sabemos, desde os tempos primordiais, 0 numero Sete é visto como um ntimero magico:7 dias da semana, 7 planetas, 7 graus de perfeigéo humana, 7 ramos da arvore do conhecimento, etc. E toda a magia que alimenta 0s volumes ja publicados nos leva a crer que o universo de Harry Potter pretende mostrar os sete estagios evolutivos da Consciéncia Humana (ou do Conhecimento)? Harry Potter e 0 mercado Do ponto de vista do mercado, a série Harry Potter, -literatura destinada as criangas e adolescentes- se tornou o primeiro produto editorial infantiljuvenil a se igualar aos grandes best- sellers “adultos”, Fenémeno resultante de uma gigantesca engrenagem editorial “globalizada’, movida a partir da Inglaterra e EUA, 0 sucesso da série tem inicio com a inteligente e complexa estratégia da tradugdo: cada volume é traduzido, com antecedéncia, em dezenas de idiomas, para ser langado, simultaneamente, em centenas de paises, e em tiragens que chegam a milhdes de exemplares. Os lancamentos séo sempre precedidos de um formidavel marketing: noticias invadem as colunas literdrias da imprensa; detalhes da vida da autora s4o esmiugados; criam-se expectativas quanto ao aparecimento de cada novo titulo da série, devido ao segredo que é mantido sobre ele, até o momento do langamento. Fotografam-se filas de criangas & espera da compra, criam-se concursos que envolvem o livro, etc.* Essa fabulosa engrenagem mercadolégica culminou com a transformagao dos livros em filmes, fato que, além de sua maior divulgagéo entre os leitores, eleva o lucro dado por esse especialissimo produto, a somas astronémicas de milhées de délares. Em lojas e livrarias, sao espalhados outdoors, cartazes coloridos, caldeirdes de papeldo, figuras de feiticeiras e suas vassouras, magos, clones do jovem personagem, fantasias de magos, etc, Em escolas ou oficinas literdrias para a meninada, abrem-se discussdes sobre semelhangas e diferengas entre 0 texto novelesco e sua transformagao nas imagens do filme. Enfim, a série Harry Potter transformou-se numa grande fonte de diversao e de aprendizado. Harry Potter e a critica Claro esta que, diante desse fenémeno, as opinides da critica se dividiram: ha os que negam o valor literdrio & série, pelo simples fato de ela ter sido transformada em best-seller (porque, na verdade, a maioria dos best-selleres é puro produto do marketing e dura apenas os “15 minutos de fama’). Outros, como o severo critico americano Haroldo Bloom, rejeitando a natureza e originalidade da linguagem criada pela Autora, considera a série como “infindavel seqiiéncia de clichés’, e acrescenta: "Nao é Alice no Pais dos Espelhos...& apenas ficgao barata.” (apud H. P. ¢ a Filosofia. SP, Madras, 2004-p. 13) Na mesma linha negativa, a romancista americana A. S, Byatt, em artigo no New York Times (apud Cadero 2-OESP. 12.07.2003), faz uma leitura através de uma dtica realista redutora e afirma: *O mundo magico de Rowling nao tem espaco para o espiritual.” Mas, como veremos adiante (e de acordo com intimeros outros analistas) o “espiritual” 6 uma das chaves para entendermos a saga de Harry Potter. Em suas palavras: “(Harry Potter) é escrito para pessoas cujo imaginario est confinado aos desenhos animados da televisdo e os exagerados (excitantes, mas nao ameagadores) mundos refletidos nas novelas, reality shows e fofocas de celebridades. Seus valores e tudo neles so, como disse Gatsby (personagem de Scott Fitzgerald) de seu préprio mundo, quando a luz de seus sonhos se apagou, “apenas pessoais’. Ninguém esta tentando salvar ou destruir nada além de Harry Potter, seus amigos e sua familia.” Sem duvida, embora lendo através de uma perspectiva equivocada, a escritora americana toca em dois pontos vitais da série Harry Potter: o claro contraste que sua trama estabelece entre o mundo real (alimentado de valores banalizados ou desagregadores, bem semelhantes ao mundo de Gatsby na América pés-guerra 1914) e o atual mundo em mutagao ( 0 das idéias de um Novo Humanismo em formagao). Esclarecendo melhor: a saga de Harry Potter visa, como pibblico-alvo, 0s jovens leitores, hoje “aprisionados” pelas exterioridades do mundo do espetaculo, da performance, do “vale tudo", dos “reality shows", etc., onde ndo hd espaco para o ser interior, para a reflexdo, para o pensar... mundo virtual onde tudo é mostrado como verdade, mas nao passa de encenagées bem montadas (com a sedugao e a beleza da Arte televisiva) pela poderosa industria do entretenimento, que 6 uma das contradigées inevitaveis do nosso tempo: por um lado, movimenta milhdes —fomentando 0 Progresso do mundo globalizado e, por outro, propde modelos ou ideais de vida, que levam os humanos a alienacao ou ao fracasso, porque visam apenas a realizagao do ser exterior (o das aparéncias, o das “celebridades”, o da conquista facil e efémera). Mas, a nosso ver, romancista americana se equivoca ao comparar Gatsby com Harry e interpretar como “apenas pessoais” —restritos a "Harry Potter, seus amigos e familia’, os problemas, desafios, perigos e ambigdes que tecem a complexa trama da série. O egocéntrico Grande Gatsby da América dos anos 20 (a enlouquecida e brilhante “era do jazz", pés-guerra 1914) foi 0 porta-voz da “geragdo perdida’. O solidario “Harry Potter” (mesmo sem que ele o saiba) é 0 porta-voz do “novo homem” em gestagao, neste limiar do século XXI. Outros criticos véem na série Harry Potter uma trama feita de clichés e de “gente conhecida’, habitantes dos contos de fada. Na verdade é desse hiimus arcaico que a sua _matéria novelesca se alimenta e os tais “clichés” so, na realidade, arquétipos, modelos de pensamento e acao, preexistentes na alma humana e que Jung, ao descobrir e analisar, mostrou-os como ‘componentes do que ele chamou de Inconsciente Coletivo, -estruturas psiquicas quase universais. Espécie de consciéncia coletiva, e que se exprimem em uma linguagem simbdlica de grande poder energético, que une o individual ao universal. Sao érfaos que sofrem humilhagdes no meio familiar (como a Gata Borralheira), Sdo personagens-animais (Principe Sapo, o Fera...) que ao fim de um processo de transformacdo interior, através do Amor, revelam sua natureza superior (principe, rei...), Ou ainda, so personagens de origem desconhecida, vitimas do Mal e que acabam se revelando como de superior grandeza. Simbolicamente, essas histérias arcaicas apontam para o processo de amadurecimento interior, pelo qual o ser humano deve passar para revelar sua verdadeira personalidade. Ou ainda, ha o arquétipo da viagem no encalco de um ideal e durante a qual o herdi passa por varios perigos, mas é ajudado por mediadores magicos. Enfim, a leitura do significado simbdlico das aventuras/desventuras de Harry Potter pode revelé-las como uma verdadeira viagem inicidtica Entre acertos e equivocos, a popularidade da série comega a atrair também a atengdo de estudiosos do meio académico. Uma das primeiras grandes reuniées universitarias, dedicadas a sua andlise, realizou-se em Orlando, na Flérida: o “Simpésio Harry Potter — Nimbus 2003”, no qual se sucederam debates acerca de questdes de justica, desenvolvimento moral, o papel da mulher, © heroismo, etc. O Simpdsio Nimbus-2004 aconteceu no Canada. Nessa ordem de interesses, varios estudos foram publicados. Entre eles esto: Harry Potter: as razdes de um sucesso (SP, Contraponto, 2004) de Isabelle Samdja; Harry Potter e a Filosofia (SP, Madras, 2004) coletanea de ensaios, de varios autores, com a Coordenagao de William Inwin; Harry Potter: O perigo oculto no menino-bruxo (CCC Edigées, 2001); Almanaque de Harry Potter ¢ outros bruxos (Panda Books, 2005); Além da plataforma nove e meia (UPF Ed. 2005) coleténea de ensaios de varios autores, Org, Sissa Jacoby/Miguel Rettenmaier. Assaga de Harry Potter ‘Ao buscar uma classificagao de género literdrio para a série Harry Potter, optamos por defini-la como saga, na medida em que sua matéria novelesca narra a “aventura maravilhosa” de um heréi fundador. Nao de um mundo jé acontecido, como o das saga arcaicas, mas de um mundo que surgiré no futuro, criado pelo novo homem hoje em gestagao e do qual Harry Potter seria uma alegoria, Entendemos ainda essa série novelesca como saga, devido ao seu aparente parentesco com as antigas lendas célticas/nérdicas ou baladas anglo-saxénicas que, milénios antes de Cristo, eram cantadas pelos bardos, contando os feitos dos herdis fundadores de povos, e transformando- 08 em Mitos (cf. 0 anglo-saxao Beowulf, 0 sueco Heldenbuch e outros que se difundiram por todo o Ocidente, como as Aventuras do Rei Arthur e seus Doze Cavaleiros em busca do Graal, o Calice que guardava o sangue de Cristo) Nessa ordem de idéias, vemos a série novelesca de Harry Potter como um inteligente amalgama de herancas dos tempos primordiais (mitos, arquétipos, processos de iniciacdo ao saber oculto, processos de magia, mistérios da alquimia, etc. que permanecem no Inconsciente Coletivo), fundidas com dados reais do nosso mundo atual (tecnolégico, informatico, ciberético, com suas “magias” inventadas pela Ciéncia...). Fruto dessa fusdo, a série Harry Potter se oferece como uma pequena obra prima de construgao literdria, pela arte da escrita de J. K. Rowling. Arte-fusdo de uma ampla cultura histérico-mitico-literéria (de que 6 t4o rico o imaginario anglo-saxdo), transfigurada pela imaginacao incomum da Autora. Fusao que engendra uma original e complexa trama novelesca (que tem muito de intriga policial), através de um estilo narrativo sui-generis. Os acontecimentos banais ou fantasticos que se sucedem ininterruptamente (em cenas curtas, como as das histérias-em-quadrinhos), e expressos numa linguagem coloquial, IUdica, que cria imediata intimidade com o leitor e o arrasta atras de si num ritmo acelerado, que faz lembrar o tempo veloz dos video-games e dos multimeios de comunicagao. Ritmo ao qual as criangas, os jovens e adultos de hoje j4 estao acostumados, pois é o ritmo dominante em nosso mundo “globalizado’, em acelerada mutacdo de vivéncias e costumes. Sem duivida, esse estilo moto-continuo é um dos “ganchos" que, de imediato, prende o leitor A leitura e 0 leva a seguir atento, divertido ou ansioso as mil e uma aventuras/desventuras vividas pelo pequeno bruxo Harry e seus amigos ou inimigos, na Escola de Magia Hogwarts. Aventuras, cujo oculto elo de unidade é o confronto entre as forgas do Bem e as do Mal; da Luz e das Trevas; Razao e Fantasia, Aparéncia e Esséncia...simultaneamente com o confronto entre 0 mundo dos “trouxas” (0s ndo-bruxos ou os alienados deste nosso mundo real-cadtico) e os “bruxos” (0s conscientes dos poderes do Homem para reordenar o atual caos). E ainda de se notar que, embora tais aventuras se desenrolem em sucessivos volumes, a trama novelesca de cada um é¢ habilmente construida pela grande arte da Autora, no sentido de que cada um deles possa ser lido e compreendido, independente da leitura dos demais. Todas as informagées indispensaveis para a compreensao da série, so dadas em meio aos acontecimentos de cada volume, de modo absolutamente natural..fazendo parte da nova trama. Assim a leitura da série pode comegar por qualquer dos volumes e o essencial seré perfeitamente conhecido e compreendido. 0 fenémeno Harry Potter e o nosso tempo em mutagao Em 1970, 0 filésofo americano, Thomas Hanna, escrevia em seu livro, Corpos em revolta: “Atualmente, os corpos humanos esto em estado de rebeliao cultural, Da complexidade crescente das sociedades tecnolégicas emerge hoje em dia nova espécie de ser humano: o mutante, que aumentard pouco a pouco o seu dominio na sociedade e criard, ao mesmo tempo, uma nova cultura para ela." © extraordindrio sucesso da Série Harry Potter (para além das mil e uma causas que o justificariam) estaria, a nosso ver, ligado substancialmente a nova corrente de pensamento, analisada por Thomas Hanna, -a da Cultura somatica. A que descobre o ser humano como “soma’, fusdo corpo/espirito, que em nossa época passa por novo estagio de evolugao: os chamados mutantes. “Soma” é "..matéria em continua pulsagao, agdo, fluéncia, sintese & relaxamento —alternando com o medo e a raiva, a fome e a sensualidade. /.... O soma é tudo que vocé é, pulsando dentro dessa membrana fragil que muda, cresce e morre, e que foi separada do cordao umbilical que unia vocé —até o momento da separagao- a milhdes de anos de historia genética e organica dentro do cosmos. /.../ Somas somos eu e voce, nesse lugar onde estamos, seres cuja histéria evolutiva conduzia ao momento revolucionério da percepgao de que o novo mundo a ser explorado pelo século XI é 0 imenso labirinto do soma, da experiéncia corporal e viva dos individuos" em pleno processo de adaptagao ao belo/horrivel cyberspace (mundo da tecnologia) em que nos cumpre viver. Alids, essa “cultura somatica” identifica-se com varias outras correntes de pensamento, hoje atuantes e que surgem no século XX, colocando o Ser no centro da “revolugdo” que esté em proceso no mundo globalizado. Correntes como a da Fenomenologia de Husserl, a do Existencialismo de Heidegger ou a do Pensamento Complexo de Edgar Morin. Todas elas, de diferentes maneiras, convergindo para a formagao de um Novo Homem. Ou melhor, uma Nova Mente, Dentro desse contexto, 0 universo novelesco criado na saga Harry Potter, -universo global formado pelo mundo dos trouxas e pelo mundo dos magos, pode ser lido como uma grande e fantdstica alegoria do Mundo Ocidental e sua organizacao sécio-politico-econémica, hoje em pleno processo de mutagdo, com sua Légica, suas certezas absolutas, seus fundamentos cristéos- liberais, desafiados pelo Mistério de um mundo ao qual a Ciéncia roubou 0 seu centro sagrado (Deus), mas nao conseguiu explicar 0 Mistério da Vida e do Homem . Ao leitor jovem, ao qual essa série se destina, evidentemente, esse possivel significado simbélico ou alegérico nao tem o menor interesse em ser conhecido. O prazer da leitura Ihe basta, muito embora 0 esteja influenciando subliminarmente e passando-Ihe a sua “mensagem". Ja com 0 leitor adulto sera diferente. Fazendo a sua leitura através dessa ética (ou através dessas novas correntes de pensamento) a fascinante/prazerosa Aventura do mago Harry Potter revela sua essencial sintonia com este nosso tempo em mutagao, e prefigura, alegoricamente, o “mutante”, a nova mente em acelerada e cadtica formagao, entre uma civilizagéo em declinio (a crista-liberal- burguesa) e uma nova cultura que vem emergindo do caos atual. Quais sero os fundamentos definitivos dessa Nova Cultura que, por sua vez, engendrard a Nova Civilizagao que ha de chegar um dia, ninguém ainda o pode prever. O que parece inegavel é que o seu centro gerador é 0 Homem, o Ser Humano e a expansdo de suas potencialidade latentes, ainda inexploradas. Dai que a Magia, as metamorfoses, feitigarias, visées, bruxarias ou as mil formas do Ocultismo ou do Esoterismo, estejam sendo a matéria prima dos mais recentes best-sellers, sintonizados com este nosso tempo em mutagdo: tais como: Histéria sem fim (1979) do germanico Michael Ende; O mundo de Sofia (1991); e 0 Vendedor de histérias (2001) do noruegués Jostein Gaarder, A Profecia Celestina, (1993) do americano James Redfield; ou ainda a Biblioteca Magica de Bibi Bokken (1999) de Jostein Gaarder & Kalus Hagerup. Todos eles sao verdadeiros “romances de aprendizagem” que, em lugar de se debrugarem, como os de ontem, sobre as relagdes do Individuo com a Sociedade, onde ele devia se realizar (vencendo os obstaculos que ela Ihe ‘opunha), agora se debruca, essencialmente, sobre o proprio Individuo, sobre o seu Ser, porque é Ele 0 territério desconhecido a ser explorado. Essa ¢ a grande chave que, a nosso Ver, pode “abrir” para 0 leitor adulto, alguns dos sentidos ocultos dessa insdlita, enfeitigada e divertida trama novelesca do bruxo Harry Potter e de seus amigos bruxos ¢ nao-bruxos, Trama que vem conquistando leitores mirins (os mutantes) de todas as partes do mundo, onde a série vem sendo traduzida. E como toda literatura auténtica, sua leitura estard agindo de forma subliminar na formagao de suas mentes imaturas, para atuarem no mundo em transformagao que os espera, ao crescerem. Notas 1. Joanne Kathleen Rowling nasceu na Escécia em 1965, Adolescente, passa a viver em Londres. Formada em Letras, vai lecionar Lingua Inglesa no Porto, onde em 1992 casa-se com 0 portugués, Jorge Arantes, com o qual teve uma filha, em 1993. No mesmo ano, o marido deixa-a e ela volta a viver em Londres. Comegou a escrever o primeiro livro da série Harry Potter, em 1990, época em que se mudara para Portugal, tornando-se professora de Lingua e Literatura Inglesa. Em 1995, terminou Harry Potter e a Pedra Filosofal, vendendo os Direitos Autorais por 4 mil délares, Tratava-se, entretanto, do projeto de uma série de 7 volumes que, a medida que foram sendo escritos (até 0 momento, inicio de 2005, jd sairam 5 volumes), tornam-se um dos maiores best-sellers internacionais. Em principio programada para a meninada adolescente, a série acabou conquistando um grande ptiblico de todas as idades. Os milhdes de exemplares vendidos em todo o mundo tomaram a Autora uma das mulheres mais ricas do Reino Unido, neste inicio do século XX! 2. Por diferentes que sejam as denominagées ou explicagées dadas pelas religi6es, povos ou doutrinas esotéricas, as fases de evolugao da consciéncia ou do espirito, todas tem em comum ntimero Sete. E todas partem do corporal para o espiritual. Partem da descoberta do préprio eu ‘em relagao ao outro, como a primeira etapa. A esta, sucedem-se as demais sempre aprofundando a visdo e o conhecimento do Eu em relagao ao que transcende as aparéncias do que ele vé, até chegar a Sabedoria Suprema, que Teilhard Chardin chama de Noosfera. Entre 0s Dogons na Africa, 0 ntimero Sete é a insignia do Mestre da Palavra. E a sétima etapa da evolugao, que corresponde a Perfeicao, consiste na uniao dos contrarios, na resolugao do dualismo. Nos contos e lendas que vém da origem dos tempos, a_realizacéo do herdi passa por sete etapas: 1° - consciéncia do eu fisico; 2a..- consciéncia da emogao (impulsos que misturam sentimentos e imaginagao); 3a. -consciéncia da inteligéncia (capacidade de descobrir, classificar e racionar sobre ‘0 mundo a sua volta); 4a. —consciéncia da intuigdo (percepedo do Inconsciente); 5a. —consciéncia da espiritualidade (distanciamento da vida material); 6a. —consciéncia da Vontade (a que determina a Escolha e faz passar do Saber a Ago) e 7a. -conhecimento da Vida Plena (0 enigma que dirige toda a atividade vital humana e universal). (in Chevalier & Gheebrant) 3. E de se notar que, entre nés, em relagdo 4 literatura infantil, esse processo mercadolégico é absoluta excegao, pois 0 processo normalmente adotado € 0 do investimento direto das editoras nas escolas, junto aos professores, isto é, trabalhando diretamente com 0 provavel ptiblico-alvo, sem depender da intermediagao das livrarias. Dai o fato de, por um lado, nao haver necessidade de marketing nos multimeios de comunicagao, para a venda dos livros, ¢ por outro, tal auséncia de publicidade, acaba por impedir que os nossos excelentes livros de Literatura Infantil/Juvenil (fora as exceges de sempre) se tornem conhecidos do grande ptiblico. Na verdade, o Brasil pode se igualar, em qualidade literdria e em quantidade de excelentes escritores e ilustradores desse género, com os melhores dos demais paises. E 0 que o mostram as Feiras Internacionais do Livro Infantil, entretanto, para a maioria do ptiblico brasileiro, isso totalmente desconhecido. 4. Uma da razées que nos parece legitimar essa classificagao —saga- (em lugar de romance ou novela folhetinesca/fantastica) é 0 fato de a autora ser escocesa e, portante, ser herdeira do amdigama de raizes histérico-fantasticas (célticas, escocesas, irlandesas, goticas, bretds...), que sem diivida ela deveria conhecer bem. Raizes que foram se fundindo durante os séculos medievais e que resultaram no atual Reino Unido da Gra-Bretanha. Raizes que fundem a Realidade e um Imagindrio mdgico-fantdstico, tal como podem ser detectadas no mundo novelesco criado, no séc. XIX, pela grande figura do Romantismo na Inglaterra: a do escocés Walter Scott (1771-1832). Escritor que, conforme registro histérico, foi o primeiro a se tornar best- seller no mundo ocidental industrializado, e se tornar milionario, com a comercializagéo de sua vastissima obra. (in O. Matia Carpeaux. Histéria da Literatura Ocidental-IV. p.1725) A anglo- escocesa, J. K. Rowling teria nele um precursor, em matéria de sucesso e de revivescéncia das fontes medievais. Publicado por Google Drive — Denunciar abuso — SAtualizado automaticamente a cada minutos

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