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TEATRO INFANTIL

COMPLETO
Maria Clara Machado
organizador
Luiz Raul Machado
ilustrações
Rui de Oliveira

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Copyright © MCM — MARIA CLARA MACHADO PRO-
DUÇÕES ARTÍSTICAS LTDA.

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Texto revisto pelo novo Acordo Ortográfico

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

M129t Machado, Maria Clara, 1921-2001


Teatro infantil completo / Maria Clara Machado,
[organização de Luiz Raul Machado ; ilustrações de
Rui de Oliveira]. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira,
2009.
il.

ISBN 978-85-209-2240-8
1. Teatro infantojuvenil brasileiro. I. Título.

CDD: 028.5
CDU: 087.5

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SUMÁRIO

NOTA EDITORIAL 05

INTRODUÇÃO 07

O BOI E O BURRO NO CAMINHO DE BELÉM 13

O RAPTO DAS CEBOLINHAS 43

A BRUXINHA QUE ERA BOA 81

PLUFT, O FANTASMINHA 111

O CHAPEUZINHO VERMELHO 151

O EMBARQUE DE NOÉ 195

O CAVALINHO AZUL 255

A VOLTA DO CAMALEÃO ALFACE 315

MAROQUINHAS FRU-FRU 351

CAMALEÃO NA LUA 401

A GATA BORRALHEIRA 445

A MENINA E O VENTO 505

O DIAMANTE DO GRÃO MOGOL 561

MARIA MINHOCA 621

APRENDIZ DE FEITICEIRO 663

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TRIBOBÓ CITY 707

UM TANGO ARGENTINO 749

O PATINHO FEIO 795

OS CIGARRAS E OS FORMIGAS 823

CAMALEÃO E AS BATATAS MÁGICAS 859

QUEM MATOU O LEÃO? 887

JOÃO E MARIA 933

O DRAGÃO VERDE 963

O GATO DE BOTAS 1001

PASSO A PASSO NO PAÇO 1029

A CORUJA SOFIA 1083

A BELA ADORMECIDA 1115

JONAS E A BALEIA 1143

O ALFAIATE DO REI 1173

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NOTA EDITORIAL

Este Teatro infantil completo de Maria Clara Machado reúne, em ordem cro-
nológica, as vinte e quatro peças que a autora publicou originalmente pela
Editora Agir, em seis volumes, além de A coruja Sofia (cuja primeira edição
saiu em livro separado) e quatro peças inéditas até 2009: A Bela Adormecida,
O Alfaiate do rei, Passo a passo no Paço e Jonas e a baleia.
Nele figura uma peça considerada por alguns críticos para adultos (Um
tango argentino), mas que, segundo a autora, pode ser dirigida a jovens. Esta
categoria (teatro juvenil) foi inaugurada por Maria Clara em 1962, com A
menina e o vento, e retomada em 1983, com O dragão verde. Optou-se por
manter a seleção da autora.
As ilustrações que abrem o texto de cada peça são do artista Rui de
Oliveira.

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INTRODUÇÃO
Luiz Raul Machado

Um conto de fadas real e diferente

Uma família nada comum numa casa original. O pai, mineiro radicado no
Rio, fica viúvo com cinco filhas para criar, a maior com nove anos. Casa-se com a
cunhada e as meninas veem a tia, que já cuidava tanto delas, se transformar numa
jovem e dedicada madrasta. E ainda ganham uma irmã. Aníbal Machado, o pai,
reinava naquela casa feminina: eram seis Marias e mais Selma, a mãedrasta.
Ele, figura chave da cultura brasileira, presidente da Associação Brasileira
de Escritores, organizador do primeiro Congresso de Escritores (1945), autor
de alguns dos mais belos contos da literatura brasileira, passou a vida toda es-
crevendo e reescrevendo um livro que só veio à luz depois de sua morte em
1964. João Ternura é o retrato da alma de Aníbal. Carlos Drummond de Andra-
de, numa comovida Balada em prosa, diz que Aníbal Machado era “uma casa, de
mesa posta e luz acesa, (...) a provar que a cidade não é o labirinto do inferno, se
nela florescem o domingo feérico dentro do domingo, a paciência e o sorriso”.
De fato, aos domingos, a família Machado abria as portas da casa da
rua Visconde de Pirajá 487, em Ipanema, para receber poetas, jornalistas,
intelectuais, atrizes e curiosos para uma tertúlia artística e cultural. Princi-
palmente para um bom papo. As meninas ouviam as conversas e, mais tarde,
participavam delas. A mais atrevida preparava pequenos esquetes de teatro
de bonecos para apresentar.
Surgia ali a mais importante criadora da história do teatro para crianças no
Brasil. Na mesma Balada, evocando a morte de Aníbal, Drummond diz: “e pen-
sávamos nas seis Marias: Celina, Clara, Ana, Luiza, Ethel, Araci; especialmente
em Maria Clara, arte-maior de Aníbal, que lhe passou a vara de prodígios”.

Bandeirante

O escotismo e o bandeirantismo, nos anos 40 e 50, foram de uma im-


portância enorme na formação de jovens líderes em diversas áreas. Maria
Clara não fugiu à regra. Numa época especialmente repressiva para as mu-
lheres, ser bandeirante favorecia o exercício da liberdade, do companheiris-
mo e da aventura com responsabilidade. Maria Clara vinha de uma família
especial e tinha um pai amoroso mas também mineiramente rígido, vigilante
em relação às suas seis filhas.
Se a autora teatral e a atriz nasceram na garagem da casa de Ipanema,
a diretora com enorme capacidade de liderar e aglutinar talentos surgiu nos
encontros, acampamentos e viagens das bandeirantes, nas reuniões da So-
ciedade Pestalozzi e no teatrinho do Patronato da Gávea.

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Na sua segunda viagem para fora do país para participar de congressos
bandeirantes nos Estados Unidos da América em 1948, Maria Clara recebeu
do pai uma (dentre muitas) carta que dizia: “Se não me engano, a tua voca-
ção mais acentuada é mesmo para o teatro (...) Não é uma perspectiva que
me pareça absurda para o teu futuro; apenas exige muito trabalho, tenacida-
de e entusiasmo.” Pai profeta, Aníbal não se enganou. Sabia a filha que tinha:
trabalhadora, tenaz e entusiasmada Maria Clara seria a vida toda.
As viagens alargaram a visão da jovem Clara. Por causa dos relaciona-
mentos de Aníbal, ela ficou além do previsto, abrigada em Washington na
casa da família de Cândido Portinari, convivendo com artistas e intelectuais
e dançando e declamando em festas e reuniões.
Na viagem seguinte, à Europa (1949-1950), Maria Clara fez o curso de
teatro criado por Jean-Louis Barrault, viu diversos espetáculos, trocou expe-
riências com mímicos, atrizes e diretores e privou da intimidade da família
de João Cabral de Melo Neto. Anos depois, foi por insistência de Maria Clara
que João Cabral compôs um auto de Natal pernambucano, que viria a ser seu
poema mais cantado e conhecido, Morte e vida severina.

Pioneira

Maria Clara Machado nunca se casou. Mas exerceu plenamente a


maternidade através do filho nascido em 1951: o teatro de amadores Tabla-
do, do qual cuidou amorosamente até o fim da vida, preparando também a
continuidade dele para quando ela não estivesse mais presente. Nunca dei-
xou que ele perdesse a característica de teatro amador. Mais que sua profis-
são ele era a sua vida e vida é para ser amada. Todos os depoimentos sobre
o Tablado, que abrangem mais de meio século de trabalho ininterrupto,
apontam-na como uma administradora assídua, irônica e bem-humorada,
uma diretora exigente e provocadora de criação, uma descobridora de ta-
lentos, uma dramaturga que experimentava cada fala no dia a dia dos en-
saios até alcançar uma estrutura satisfatória para a peça e uma perfeição
possível nos diálogos. Sabia o que queria da cenografia, dos figurinos e da
trilha sonora.
Nunca antes uma artista do palco se dedicara tão integralmente ao teatro
para crianças no Brasil. Com as peças criadas por Maria Clara e pelos va-
lentes tabladianos, foi inaugurado um novo patamar de qualidade no teatro
infantil. A criança levada a sério: só apresentar aos pequenos espectadores
o melhor. Nada de teatrinho tatibitate, nada de correrias, delação dos vilões
e gritaria. Nada de diminutivos depreciativos e cenas melosas recheadas de
falsa poesia. Nada de cenários aproveitados das peças adultas do horário nobre.
Uma plateia formada no teatro de Maria Clara troca energia com os
atores, se detém nos detalhes do cenário, da música, da luz. Se envolve com a
trama da peça e descobre sutilezas nos personagens. Participa não com gritos
mas com o silêncio emocionado. Plateia formada, sim: as crianças pediam
para voltar e rever, se alegravam a cada estreia de peça nova. E os pais, avós,
tios não reclamavam do programa. Maria Clara se encantava especialmente
quando recebia pais que viram o Pluft ou o Cavalinho na infância trazendo seus
filhos para assistirem a novas montagens. Gerações formadas no bom teatro,

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experiências levadas para o resto da vida. O teatro de Maria Clara Machado
provou, ao longo dos anos, que também era eterno.
Como autora, Maria Clara alimenta sua inspiração com temas bíbli-
cos, contos de fada e reinventa gêneros. Nas suas mãos, a história policial, o
suspense e o musical ganham cara nova. Sua linguagem teatral tem frescor
e novidade. Pioneira, sempre, ela busca a dosagem certa de emoção e hu-
mor. A finura psicológica traz à cena um fantasminha com medo de gente.
Obra-primíssima. A poesia rompe fronteiras entre o real e o imaginário,
viaja-se no vento e descobre-se que um cavalo pode ser azul. Maria Clara
mostra cenicamente que o imaginário é real.
Antes dela, houve alguns autores importantes, mas, pelo seu pioneirismo,
pela quantidade e qualidade de uma obra excepcional, abrindo caminhos e rom-
pendo limites — a ponto de se poder falar em antes e depois —, Maria Clara
Machado pode ser chamada, sem sombra de dúvida, de a “Monteira Lobata” do
teatro infantil brasileiro.
Era assim que eu queria terminar a introdução ao Teatro infantil completo.
Achava que era uma sacada interessante e verdadeira, descoberta em várias aulas
de literatura infantil para professores. No entanto, na pesquisa feita no acervo
do Tablado, descobri que o meu achado já havia sido escrito, trinta e tantos anos
antes, por Austregésilo de Athayde e que alguns depoimentos por ocasião do en-
terro de Maria Clara em 2001 voltavam a comparar sua obra à do fundador da
literatura para crianças no Brasil. Menos mal. A tirada não era arroubo de admi-
rador confesso e sim a pura verdade. Se Monteiro Lobato é reconhecidamente o
pai da literatura infantil, Maria Clara Machado é a mãe do teatro voltado para a
criançada no Brasil.

Prestígio continuado

As principais peças de Maria Clara correram o mundo. Traduções se su-


cediam. Pluft namorou Maribel em espanhol, o Cavalinho provou ser azul em
alemão, até montagem na Índia aconteceu. Mas é no interior do Brasil, em pátios
de escolas, em pequenos auditórios, em varandas de casas que os personagens de
Maria Clara ganham vida comovedora.
Além das diversas montagens teatrais ao longo de sua longa vida, Pluft já
teve versões para a televisão e para o cinema, com a atuação inesquecível de
Dirce Migliaccio. (Há uma tradição, inaugurada pela própria Maria Clara, de que
Pluft seja vivido por atrizes. Como para dizer que fantasminhas, como os anjos,
não têm sexo — será? Uma vez se deu a um ator garoto o papel: Luiz Carlos Tou-
rinho, cria do Tablado, que ficou eternizado como Piupiu).
O filme, dirigido por Romain Lessage, mereceu avaliação discreta da
autora. Mas, entre cenas bonitas e divertidas, uma deve ter feito Maria Clara
rir muito e se sentir lisonjeada. No antro do Perna de Pau, um bar imundo
reúne nove piratas terríveis. São eles: Vinicius de Moraes, Tom Jobim, Lucio
Rangel, Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Dorival Caymmi, Raymun-
do Nogueira, Otelo Caçador e Stanislaw Ponte Preta. Com um time desses,
como não torcer pelos piratas?
Desde o começo da carreira, Maria Clara reuniu, em torno de sua obra,
gente especial que atesta um enorme prestígio intelectual e artístico. Resenhas

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e críticas entusiasmadas recheiam o arquivo do Tablado: Carlos Drummond de
Andrade, Manuel Bandeira, Eneida, Décio de Almeida Prado, Van Jafa, os tabla-
dianos Yan Michalski e Barbara Heliodora. Da amiga de infância Maria Julieta
Drummond de Andrade recebeu crônicas emocionantes e belas traduções para
o espanhol de algumas de suas peças. Do também tabladiano Ivan Junqueira,
Maria Clara ganhou, em 1960, um soneto chamado Cavalo azul.

E assim de azul vestiram tua imagem,


Outrora esboço lento e fatigado,
Andrajo submerso na paisagem
Do tempo, como um gesto abandonado.

Recordo tuas crinas, teu selvagem


Perfil rasgando o espaço calcinado,
Teus flancos de aleluia, tua linguagem
Onírica — monólogo cifrado...

Depois não vi mais nada. Em meio à bruma


Teu vulto fez-se treva e solidão...
Às vezes, todavia, quando o grito

De minha infância acorda a escuridão,


Ainda ouço teu tropel pelo infinito,
Catarse azul, visão, corcel de espuma!

Maria Clara certamente adorou.


Em 2009, a escritora Livia Garcia-Roza publicou o livro Era outra vez. O conto
que abre o volume é Mamãe fantasma, “inspirado na peça Pluft, o fantasminha, e dedi-
cado à memória de nossa querida autora Maria Clara Machado”. Nele, ainda grávida,
a mãe começa conversando com Pluft e depois vai contando coisas da infância dele
até o momento em que, “fantaslescente”, ele teima em casar com Maribel. A deli-
cadeza do texto mostra bem o rastro luminoso que Pluft deixou na alma de quem
veio a ser psicanalista e escritora. Rastro que também iluminou várias gerações e que
continuará a brilhar. Maria Clara ia adorar.
A versão cinematográfica de O cavalinho azul, de Eduardo Escorel, tem, no
papel da Velha Que Viu, a própria Maria Clara. Ela, atriz infelizmente bissexta, fi-
cou na lembrança de quem a viu no palco, por sua profunda sensibilidade e presen-
ça tocante. Se no teatro as emoções vêm e passam como fantasminhas, os filmes e
as fotos guardaram a imagem desta mágica, fada, bruxa, mestra: uma velha que viu
gulosamente a vida e a recriou em palavras e gestos e luz e espaço e cor e arte.

Envoi

No dia do enterro de Maria Clara, Ana Maria Machado não estava no Rio.
Mandou para Cacá Mourthé, herdeira da tia no Tablado, um “texto / lembrança /
evocação”. Afirma a contribuição única de Maria Clara à dramaturgia brasileira,
“pela qualidade da escrita, pelo sopro poético, pelo senso de humor, pela exímia

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construção de situações, pela criação de personagens densos e multifacetados,
pela linguagem viva e rica, pelo ritmo ágil e variado em que a ação se processa,
pela densidade dos problemas que abordou sob a forma de divertidas brincadei-
ras, pela inquestionável comunicação com plateias de todas as idades, pelo res-
peito à inteligência e à sensibilidade da criança”.
Buscava um fecho para estas notas introdutórias quando a minha gaveta me
forneceu um texto de 1987, em que eu relatava um fato acontecido com um me-
nino de cinco anos e sua relação com o teatro. Não sei se a peça mencionada era
de Maria Clara, mas devia ser. Por mostrar uma criança sensível, uma mãe que
respeita seus desejos e sua intuição, pela descoberta de poesia e de vida, fica como
homenagem a Maria Clara Machado.
Eu tenho um velho amigo de cinco anos. Desde cedo ele foi acostumado a
frequentar teatro e é um espectador sensível e altamente crítico. Recentemente,
ele soube pela mãe que podia cursar uma escola de teatro.
— Você quer?
— Eu vou pensar e depois te digo.
Essa conversa foi antes deles assistirem a um espetáculo de bom teatro
infantil. No meio da peça, a mãe observa que o menino está quase levitando de
emoção diante do que se desenrola à sua frente.
— Mãe, eu não vou fazer teatro, não.
— Por quê?
— Porque precisa de muita coragem.
(Pausa. Mãe preocupada. Coragem? Como? Donde é que ele tirou isso?)
— Por que, filho?
— Porque mesmo pra quem tá fingindo, isso dói.
Contei esse fato pra uma atriz sensível. Ela chorou e me pediu que escre-
vesse pra ela botar na parede do camarim. (Camarim é lugar de grande intimi-
dade e concentração. É sacristia onde estranhos sacerdotes de ritos estranhos se
paramentam e se preparam pro ofício litúrgico). A atriz sentiu — não fosse dessa
espécie esquisita que tem antenas especiais — que o menino tinha captado com
rara felicidade a essência do que é fazer teatro.
O que ela talvez não tenha percebido é que o meu velho amigo de cinco
anos tinha definido não só o teatro mas aquilo que os poetas vêm dizendo há
alguns séculos e que o Pessoa resumiu em três quadrinhas e em versos de sete
sílabas, como o povo gosta de se expressar. “O poeta é um fingidor...” O ator é um
fingidor — por definição e obrigação de ofício. O homem e a mulher são fingi-
dores — mas as máscaras que usam estão pregadas à pele e são às vezes seu rosto
mais verdadeiro. E chegam a fingir que é dor a dor que deveras sentem. Afinal,
de poeta e de louco... E quem mais poeta e mais louco que uma criança? Este
ser absurdo, extraterrestre, supersensível, com antenas ligadas e sensores (com
s) ainda sem censores (com c), que costuma ir direto ao centro das questões
realmente importantes, com uma simplicidade que nós lutamos para readquirir
num trabalho de toda uma vida (ou várias). Em busca da coragem de fazer teatro
(no theatrum mundi), mesmo sabendo que mesmo pra quem tá fingindo isso dói.
Profundamente.

Obrigado pelo toque, Pedro.


Obrigado por tudo, Maria Clara.

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