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Beatriz Caiuby Labate, Frederico Policarpo, Sandra Lucia Goulart e Pablo O. Rosa
(organizadores)
Índice:
Prefácio
Michel Misse
Este artigo parte de autores clássicos das ciências sociais para apresentar a
constituição da abordagem analítica dos efeitos das drogas como fenômenos culturais
e sociais. Se atualmente esta ideia é quase senso comum, a atualização radical deste
princípio entra em conflito com os paradigmas médicos e legais ainda dominantes.
Mais do que demonstrar como o contexto modula as experiências, investigamos como
os controles culturais e informais regulam o consumo de drogas. Exploramos uma
série de exemplos empíricos de como o uso de drogas é ‘controlado’ pela cultura, seja
em contextos tradicionais indígenas (ie peyote, ayahuasca), rituais contemporâneos
não indígenas (ie Santo Daime), recreativos (ie MDMA em raves, uso social do
álcool) ou abusivos (ie, crack nas ruas, ou drogas em prisões). Sugerimos que o uso de
drogas pode ocorrer de maneira não-problemática não apenas em contextos
tradicionais, mas também em sociedades contemporâneas, observando ainda que o
uso de drogas é sempre de alguma maneira regulado, mesmo em contextos
potencialmente abusivos. Argumentamos que mais do que ir além de um modelo
criminalização para reivindicar um de saúde/ redução de danos, é necessário
reconhecer a legitimidade e positividade cultural do uso de drogas, entendendo-a a
partir de uma perspectiva de direitos humanos.
Este capítulo realiza uma análise sobre a demanda de reconhecimento do uso ritual da
bebida psicoativa ayahuasca como patrimônio imaterial da cultura brasileira,
apresentada por alguns grupos religiosos que fazem do consumo desta bebida o centro
de suas cerimônias. O objetivo é apontar para as estratégias e argumentações que são
privilegiadas por esses grupos na sua mobilização pelo registro do uso da ayahuasca
como patrimônio cultural nacional. Trabalho com a hipótese de que esta mobilização
implica numa transformação dos modos de relacionamento destes grupos religiosos
com outras esferas da sociedade e com o Estado. Há uma alteração na forma de
apresentação pública destas religiões: da associação ao debate sobre drogas passa-se à
definição da religião como cultura. Comparo esse processo vivido por grupos
religiosos ayahuasqueiros com o caso de outras religiões brasileiras. A analogia visa
apontar como diferentes definições de religião são construídas no processo de
legitimação social de cultos brasileiros. Aponto, especialmente, para as articulações
entre as definições de religião e de cultura nesse processo.
Desde que entrou em vigor a atual lei de drogas em 2006, o número de pessoas presas
por tráfico de drogas passou a aumentar consideravelmente, ao passo que casos por
uso de drogas registram proporcional queda. O objetivo deste capítulo é analisar como
as representações sociais sobre o tráfico e as drogas incidem na prática judicial e
como símbolos são mobilizados e expressados nos discursos de magistrados,
promotores, advogados de defesa e depoentes em julgamentos de pessoas acusadas
por tráficos de drogas na cidade do Rio de Janeiro. Procuramos identificar de que
forma variáveis como origem e status social dos acusados são mobilizados para
classificar os réus como traficantes ou não, e no caso dos incriminados, como
interferem nas sentenças.
Frederico Policarpo
Eduardo Zanella