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“[...] a região deve ser entendida não mais como fruto da solidariedade orgânica, mas de uma
solidariedade organizacional” (ELIAS, 2003, p. 20).
“As novas formas de produção e consumo, associadas aos novos padrões econômicos e
culturais, não poderia se instalar em outro meio que não o dessas grandes cidades, as quais se
tornam metrópoles como resultado da aceleração do processo de modernização e urbanização
que lhes atribui um papel de macro-organização do território” (p. 45).
Uma das novas características da urbanização brasileira é que, desde a década de 1970, dois
fenômenos ocorrem com força e paralelamente: o fortalecimento da metropolização como o
das cidades locais e intermediárias pari passu ao desenvolvimento das atividades agrícolas,
sustentando pela expansão do meio-técnico-científico-informacional, pela nova divisão interna
do trabalho (resultando em mais intensa e extensa atividades agrícolas de alto nível de capital,
tecnologia e organização empresarial) e pela maior rigidez do território apontando a chamada
“involução metropolitana” como resultado da difusão do meio-técnico-científico-informacional
– cria-se um verdadeiro exército industrial de reserva (p. 47). Durante a fase do “milagre
brasileiro” as migrações – fluxos de população – passaram a ocupar também as cidades
intermediárias, especialmente aquelas que adotaram as inovações técnico-científicas e que
mudaram a “composição técnica e orgânica da terra” pelo fenômeno da “fazenda moderna
dispersa” (p. 48).
Esse novo espaço nacional altamente diferenciado e complexo, desenhado por uma teia de
“circuitos espaciais de produção e círculos de cooperação” torna inviável a continuidade da
separação tradicional entre um Brasil urbano e um Brasil rural, da mesma forma que se impõe
uma revisão dos critérios de divisão regional do país que, em cinco grandes regiões, encontra-
se já ultrapassada (p. 49).
A velocidade das transformações foi mais intensas nas regiões sudeste, sul e partes do centro-
oeste, as quais responderam rapidamente às necessidades colocadas pelos agentes
econômicos hegemônicos (p. 49). Essa é a Região Concentrada, na qual desde o início da
mecanização do território ocorre uma adaptação aos interesses do capitalismo hegemônico,
reconstituindo-se à imagem do presente momento do meio-técnico-científico-informacional, o
qual se dá como área contínua na Região Concentrada, como manchas e pontos nas outras
regiões do país (p. 50).
“Milton Santos [...] admite que a noção de região concentrada pode der considerada como
herdeira da noção de core, introduzida na literatura da economia espacial em torno de 1950 e
desenvolvida sobretudo por John Friedmann, assim como da noção de região polarizada,
herdeira das ideias de François Perroux e cujo desenvolvimento devemos, sobretudo, a
Jacques Boudeville. O core se define como sendo a área, num país dado, que apresenta os
mais altos índices de modernidade e de crescimento, ao contrário do resto do país. Já como
região polarizada entende-se aquela cujos pontos estabelecem fluxos mais numerosos e mais
importantes do que entre a região formada como um todo e o resto do país. Milton Santos
acredita que essas duas noções se recobrem à medida que o país se desenvolve e três
tendências se associam para redefinir a noção de região concentrada, sinônimo de core e de
região polarizada. Primeiro, o número e a intensidade de fluxos aumentam; segundo, a área
geográfica em que tais relações se exercem tende a ser mais vasta e, por último, a região
concentrada, além de ser a área do país que dispõe de maiores relações internas do que com o
resto do território, é também a área onde as relações externas de tipo internacional são
também mais numerosas, mais importantes e indispensáveis à economia como um todo” (p.
50)
Elias (2003, p. 55 e 56) compreende a região no sentido abordado por Milton Santos, para
quem a região é entendida como fruto de uma solidariedade organizacional e não mais de
uma solidariedade orgânica localmente teleguiada, própria da definição do fenômeno regional.
“As regiões existem porque sobre elas se impõem arranjos organizacionais, criadores de
coesão organizacional baseada em racionalidades de origens distantes, mas que se tornam
fundamento da existência e da definição desses subespaços”. “Diante disso, a região é
resultado do impacto das forças externas/modernizantes e a capacidade de suas virtualidades,
mero espaço de conveniência, mero lugar funcional do todo; uma fração do espaço total do
planeta, cada vez mais aberta às influências exógenas e aos novos signos do período atual.
Como objeto e sujeito da economia globalizada, é um espaço que pouco possui de autônomo,
não se fechando sobre si mesmo de forma independente do resto do mundo, com o qual
interage permanentemente para a renovação tecnológica e para a acumulação ampliada do
capital” (ELIAS, 2003, p. 56).
A análise de uma região é uma delimitação territorial para desvendar as relações que
se estabelecem na atual fase da história. Significa detalhar sua composição enquanto
organização social e econômica na tentativa de entender o modo como essa região
está inserida na ordem econômica mundial e as formas de re-organização do seu
espaço (p. 82);
o Nordeste permaneceu sem transformações fundamentais no conjunto de sua
agropecuária ate a década de 1980;
Ate década de 50, a economia cearense continuava extremamente dependente da
pecuária extensiva (bovinos, ovinos e caprinos), da agricultura de subsistência (feijão,
milho e mandioca) e do extrativismo vegetal (castanha de caju e da carnaúba), com
uma inexpressiva agropecuária comercial e um papel irrelevante na divisão do
trabalho agropecuário do Brasil;
Na década de 1990, o sul dos Estados do Maranhão e do Piauí foi invadido pela
produção de grãos, especialmente soja. O vale do Assú, no Rio Grande do Norte,
transformou-se no principal produtor de melão do país. Neste contexto, o Estado do
Ceará ganha destaque passando a merecer a atenção das empresas nacionais e
multinacionais hegemônicas no agribusiness;
A ação do Estado no Nordeste iniciou-se com na virada do século com a Inspetoria de
Obras Contra as Secas (IOCS), hoje DNOCS, cuja principal forma de intervenção
centrava-se na política de contenção de obras contra a seca (por meio da construção
de barragens e açudes), cuja primeira fase ficou conhecida como a fase hidráulica;
A fase hidráulica perdurou até a década de 1950, tendo servido mais como moeda de
negociação entre a elite local e o governo federal do que como vetor de mudanças
socioeconômicas porque continuou reproduzindo a “indústria da seca” ao preservar
toda a base socioprodutiva e econômica calcada no coronelismo e nas oligarquias
agrárias;
A efervescência do desenvolvimento do século XX e os amplos debates sobre as
desigualdades regionais culminaram na criação da SUDENE, do BNB e Cia de
Desenvolvimento do Vale do São Francisco assim como na construção de sistemas de
engenharias associados às infraestruturas produtivas – iniciava-se assim a atuação
planejada do Estado no Nordeste com vistas à expansão do capitalismo na região por
meio da reestruturação da agropecuária regional;
Em pouco tempo durante os governos militares a SUDENE transformou-se mais num
instrumento de poder político das elites regionais associadas aos grandes projetos
agrícolas e industriais;
Dentre as ações propostas pela SUDENE destacava-se a irrigação para produção
agrícola comercial no semiárido;
A década de 70 marca a criação de importantes políticas voltadas a irrigação. Destaca-
se o Programa de Irrigação do Nordeste, destinado ao aproveitamento dos vales
úmidos e a elevação da produtividade da faixa semiárida;
Grosso modo, poderíamos dividir em dois grandes momentos o processo de
reestruturação produtiva da atividade agropecuária nordestina e, consequentemente,
cearense, baseada na irrigação. O primeiro se daria na década de 70, quando passaram
a ser erigidos em toda a Região Nordeste, a construção de grandes perímetros
irrigados públicos. Neste primeiro momenta de incentivo a irrigação, os programas
inerentes associavam-se a irrigação pública, aos projetos de assentamento, a produção
de alimentos, a colonização e ao incentivo a produção familiar como um componente
da política de desenvolvimento regional;
Ainda na década de 70, período de centralização da política econômica e territorial,
houve varias derivações da atuação planejada do governo federal voltada ao
incremento da agropecuária nordestina. As ideias de PERROUX de "polos de
desenvolvimento" passaram a influenciar muito fortemente o planejamento voltado a
agricultura nordestina, especialmente os que tinham em organismos internacionais
suas fontes de financiamento, passando o Estado brasileiro autoritário ativo de forte
protagonista a um mero intermediário das políticas internacionais;
Na década de 1980, marcada por forte recessão econômica, passa a ser privilegiada a
irrigação privada orientada para e pela agricultura de mercado (priorizam-se lotes
privados voltados às empresas agrícolas e agroindustriais buscando-se a expansão das
cadeias produtivas). Privilegiou-se a gestão e administração privada dos perímetros
irrigados por parte dos empresários agrícolas e agroindustriais;
Na década de 90, acirram-se as bases para a promoção do apoio a irrigação privada.
No âmago de seus objetivos, encontra-se a busca da competitividade para o
agronegócio globalizado, centrado na expansão de uma agropecuária intensiva em
capital e tecnologia nas manchas irrigáveis, encabeçada pela iniciativa privada;
Neste momento, separam-se muito fortemente as políticas públicas voltadas aos
pequenos agricultores das associadas a irrigação empresarial: cria-se um cenário
favorável a atração de novos negócios no Nordeste: apresentam como objetivo
principal a promoção de programas e grupos de programas considerados
estruturantes para o crescimento econômico;
o incremento da irrigação privada é uma característica dos perímetros irrigados que se
construíram a partir de então. No caso do Ceara, o destaque fica para o perímetro
localizado no Baixo Jaguaribe, denominado Jaguaribe-Apodi, na fronteira com o Rio
Grande do Norte, que iniciou suas operações em princípios da década de 90;
Outro programa do Brasil em Ação que começa a promover mudanças na produção e
na gestão da agropecuária cearense trata-se da política dos "Polos de
Desenvolvimento Integrado", áreas consideradas com potencial para o incremento
agropecuário e agroindustrial. O Banco do Nordeste (BN) é o órgão gestor do
programa, tendo selecionado dez áreas em todo o Nordeste, sendo uma no Ceará
(Polo de Desenvolvimento Integrado do Baixo Jaguaribe);
Mostra-se, assim, a tendência e a consolidação de polos agroindustriais associados a
uma agricultura moldada em padrões da competitividade contemporânea, baseada
em produtos de alto valor agregado, com aumento da produção e da produtividade.
No Nordeste, a agroindústria, que sempre foi o ramo mais importante do setor
industrial, desenvolveu-se sobremaneira a partir da criação do Programa de
Agroindústria no Nordeste (PNAN), instituído em 1974 pelo Conselho de
Desenvolvimento Econômico. Os subsetores que obtiveram maior incentivo foram os
de produção de conservas de frutas, legumes e outros vegetais inclusive concentrados;
Para José Graziano da Silva (1993) a modernização da agricultura brasileira é recente. Pós 1965
se quisermos datá-la. Ela perpassa a formação dos Complexos Agroindustriais (CAIs) que, a
partir dos anos 1970, consistiu na integração de:
Agropecuária - não mais apenas rural, dada a urbanização de inúmeros ramos de atividades e
do próprio trabalho no campo; segmentada não mais em grandes ou pequenos produtores,
mas em produtores integrados ou não-integrados aos CAIs.
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Ricardo. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. São Paulo: HUCITEC,
1992.
MARTINS, José de Souza. Impasses sociais e políticos em relação à Reforma Agrária e a
agricultura no Brasil. Disponível em <http://www.nead.org.br> Acesso em: 17 de Fevereiro de
2009.
NAVARRO, Z. S. Desenvolvimento rural no Brasil: os limites do passado e os caminhos do
futuro. Estudos Avançados, USP, v. 15, n. 43, p. 83-100, 2001.
TEIXEIRA, Jodenir Calixto. Modernização da agricultura no Brasil: impactos econômicos, sociais
e ambientais. Três Lagoas ? MS, Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros, v.
2, n. 2, ano 2, Setembro, 2005. Disponível em: <http// www.cptl.ufms.br/revista-geo>. Acesso
em 18 de Fevereiro de 2009.